quarta-feira, 10 de outubro de 2012

SANÇÃO DISCIPLINAR - CADUCIDADE DA ACÇÃO DISCIPLINAR - DANOS NÃO PATRIMONIAIS - RESPONSABILIDADE CIVIL




534/06.3TTFAR.E1 TR Évora     15/02/2011

A figura do relatório final, que muitas vezes é elaborado pelo instrutor do processo disciplinar, não é contemplada na tramitação do procedimento disciplinar, prevista nos art. 411º e seguintes do Código do Trabalho, pelo que constituindo, em substância, um resumo das diligências instrutórias e encerrando as conclusões do instrutor, nunca pode ser entendido como uma diligência probatória, para efeitos do disposto nos números 3º do art. 414º do referido diploma legal.


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:

A…, residente na Praceta…, T…, intentou contra Caixa…CRL, com sede na Rua …, T…, acção de processo declarativo comum alegando, em síntese, que:
- Na sequência de contrato de trabalho celebrado com a Ré foi admitido em 1/6/1985;
- Foi-lhe instaurado um processo disciplinar tendo a Ré emitido decisão disciplinar de despedimento com alegada justa causa, datada de 12/10/2006;
- As infracções disciplinares que lhe foram imputadas estão prescritas, verificando-se ainda a caducidade do procedimento disciplinar, bem como a caducidade do direito de aplicar a sanção;
- O processo disciplinar é nulo por violação do direito de defesa;
- Não se verificaram, nem ficaram provados no processo disciplinar, os pressupostos de que depende a justa causa de despedimento;
- Face à conduta da Ré sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais.
Termina pedindo que seja:
- Declarada a nulidade do seu despedimento, por ilícito, com as legais consequências, em virtude da total ausência de fundamento legal do mesmo, decretando-se a subsistência do vínculo laboral e condenando-se a Ré a reintegrá-lo no seu posto de trabalho e ao seu serviço, com a categoria, antiguidade e retribuição que teria se não tivesse sido despedido e desde a data da decisão do despedimento;
- A Ré condenada a pagar-lhe as retribuições e subsídios já vencidos desde a data do despedimento, aquelas no valor, à data em que foi intentada a presente acção judicial, de €1.626,93, acrescidas de juros à taxa legal, até integral pagamento e que perfazem, até à data, €5,42€;
- Ainda a Ré condenada a pagar-lhe as prestações pecuniárias vincendas, relativas às retribuições e subsídios que deixou de auferir desde a data do seu despedimento até à data da sentença, acrescidas de juros à taxa legal desde o vencimento de cada uma dessas importâncias;
- Também a Ré condenada a reparar os danos não patrimoniais que causou ao Autor, pagando para tal uma indemnização compensatória no valor de € 13 350,00, acrescida de juros de mora vencidos, calculados à taxa legal, no valor de €15 401,28 € e juros vincendos.
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A Ré contestou pugnando pela improcedência da acção e deduziu pedido reconvencional no montante de € 19.963,78, com o fundamento nos prejuízos que sofreu pelo facto do Autor não ter incluído nas estimativas nem nas subsequentes declarações modelo 22 do IRC relativas aos anos de 2003 e 2004 os benefícios previstos no art. 12 do Estatuto Fiscal Cooperativo aprovado pela Lei nº 75/98, de 16/12.
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O Autor respondeu ao pedido reconvencional no sentido da sua improcedência.
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Foi proferido despacho saneador, no qual se conheceu da excepção da caducidade do direito da Ré de aplicar a sanção disciplinar, que foi julgada procedente, tendo, em consequência, a acção sido logo julgada procedente quanto à ilicitude do despedimento, pelo que se decidiu:
a) Declarar a nulidade do despedimento do Autor, por ilícito (caducidade do direito da Ré aplicar a sanção de despedimento do Autor), decretar a subsistência do vínculo laboral e condenar a Ré a reintegrá-lo no seu posto de trabalho e ao seu serviço, com a categoria, antiguidade e retribuição que teria se não tivesse sido despedido e desde a data da decisão do despedimento;
b) Condenar a Ré a pagar as retribuições e subsídios do Autor já vencidos desde a data do despedimento, aquelas no valor, à data em que foi intentada a presente acção judicial, de € 1.626,93, acrescidas de juros, vencidos e vincendos, calculados à taxa legal, até integral pagamento e que perfazem, até à data, € 5,42; e
c) Condenar ainda a pagar-lhe as prestações pecuniárias vincendas, relativas às retribuições e subsídios que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da sentença, acrescidas de juros à taxa legal desde o vencimento de cada uma dessas importâncias.
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O processo prosseguiu seus termos para apreciação do restante pedido deduzido por via de acção pelo Autor e da reconvenção pela Ré.
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Não se tendo conformado com a decisão que conheceu da excepção da caducidade do direito de aplicar a sanção a Ré interpôs o recurso de apelação, tendo na sua alegação concluído:
a) Na douta sentença considerou-se que «(…) caducou o direito da Ré despedir o Autor, pois que entre o dia 29-08-2006 (data das duas últimas inquirições de testemunhas) e o 16-10-2006 (data da recepção da decisão pelo Autor) decorrem mais do que os trinta dias que a lei lhe concedia para o efeito.»
b) Para se ter decidido como se decidiu, considerou-se na sentença que «(…) a lei não prevê em lado algum a existência de uma fase para parecer de quem quer que seja, a não ser, como vimos, da comissão de trabalhadores.» e que « ( ...) Nem sequer a existência desse procedimento integrado numa qualquer fase do procedimento disciplinar (que, de jure condendo, poderia ser o da decisão)
c) Com efeito, prevê o art. 415.º, nº 1, do Código do Trabalho (CT) que « Decorrido o prazo referido no nº 3 do artigo anterior, o empregador dispõe de 30 dias para proferir a decisão, sob pena de caducidade do direito de aplicar a sanção.» e o art. 414. nº 3, d o C T que «Concluí das as diligências probatórias, o processo é apresentado, por cópia integral, à comissão de trabalhadores, e no caso do nº 3 do artigo 411º à associação sindical respectiva que podem, no prazo de cinco dias úteis, fazer juntar ao processo o seu parecer fundamentado.
d) Ora, é verdade que a lei não prevê especificamente a existência de um relatório final no âmbito de um procedimento disciplinar e a isso se referem diversos arestos, nomeadamente, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 9 de Março de 1988, in Colectânea de Jurisprudência de 1988, tomo II, página 164, referido na sentença.
e) A sentença considerou liminarmente que não existindo comissão de trabalhadores a entidade patronal disporia de um prazo de 30 (trinta) dias para proferir a decisão final, ocorrendo o termo inicial do prazo de caducidade para aplicar a sanção no dia das últimas inquirições.
f) Ou seja, não considerou que o relatório final integrasse a fase da instrução e, consequentemente, fosse a partir da sua data que se contasse o termo inicial do prazo de caducidade.
g) Contudo, se existir um relatório final, como aconteceu o caso em apreço, esse terá de ser incluído na fase da instrução e não na fase da decisão como se considerou na sentença, sendo até sustentado pelo Conselheiro Pedro de Sousa Macedo, que o relatório final, a existir, é parte integrante da fase da instrução, como escreveu em Poder Disciplinar Patronal, Livraria Almedina, 1990, página 128 (referido na sentença): «(...) fase da decisão, precedida ou não de relatório do instrutor (...).»
h) Assim sendo, decidiu-se mal na sentença quando se referiu que a existir relatório final este corresponderia à fase decisão.
i) Acresce que, com a existência de um relatório final se á como assente a matéria relevante para aferição da conduta do trabalhador face aos seus deveres profissionais.
j) E tanto assim é que a própria lei que lhe atribui expressa relevância jurídica, quando no art. 414º nº3, do CT, refere que concluídas as diligências probatórias o processo é apresentado por cópia integral à comissão de trabalhadores.
k) Ora, a cópia integral do procedimento disciplinar terá forçosamente de conter o relatório final subscrito pelo instrutor, pois esta comporta, não só os actos de instrução, as também o relatório final do instrutor do processo.
l) Na verdade, cópia integral corresponde a todos os elementos que o processo contenha, onde se inclui o relatório final quando este exista, como acontece no caso apreço.
m) O que significa que terá que se interpretar as normas do art. 414º nº3, e 415º, nº 1, ambos os d o CT, no sentido de o relatório final integrar a fase instrutória do procedimento disciplinar.
n) E não existindo comissão de trabalhadores, como acontece no caso em apreço, será a partir da data da sua elaboração que ocorre o termo inicial da contagem do prazo caducidade para a entidade patronal proferir a sua decisão.
o) Ou seja, a existência de um relatório final, apesar de não ser condição da existência de procedimento disciplinar, afecta-o, na medida em que é a partir da sua prolação que se determina o termo inicial do prazo de contagem do direito de aplicar a sanção.
p) E tendo em conta que o relatório data de 15 de Setembro de 2006 e a data da recepção pelo Autor da decisão é de 16 de Outubro de 2006 (tendo sido este dia ma Segunda-Feira), não caducou o direito de aplicar a sanção.
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O Autor respondeu pugnando pela improcedência do recurso.
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Foi realizado o julgamento para apreciar o restante pedido deduzido por via de acção pelo Autor e da reconvenção pela Ré, tendo sido proferida sentença que decidiu:
Julgar o remanescente da acção parcialmente procedente por só em parte provada e, por consequência, condenar a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 5.000,00 a título de reparação dos danos não patrimoniais que lhe causou, acrescida de juros de mora, à taxa supletiva legal de 4% ao ano, vencidos desde a citação e absolvendo-a do restante pedido.
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Inconformada com a sentença a Ré interpôs recurso de apelação, tendo concluído:
a) Não existe fundamentação fáctica na douta sentença que permita, aplicadas as regras da equidade resultantes do disposto no art. 496º, nº 3 do Código Civil e a prova produzida em julgamento, fixar em € 5.000,00 o valor da indemnização por os não patrimoniais devida ao Autor.
b) Provou-se que o Autor sofreu desgosto e tristeza pelo sucedido e que foi confrontado por pessoas sobre o sucedido.
c) Mas não se sabe, nem ficou demonstrado qual a verdadeira e real dimensão da vox populi, já que ficou por demonstrar se foram muitas ou poucas pessoas que souberam do que sucedeu e que o abordaram.
d) O Autor peticionou uma indemnização por danos não patrimoniais, no valor de € 5.000,00 Euros;
e) Nos danos não patrimoniais reclamados, entende a recorrente e inexiste fundamento para fixar os mesmos no montante peticionado.
f) O legislador deixa ao tribunal a tarefa de, por um lado, aferir o que é a gravidade merecedora da tutela jurídica e, por outro, em caso de verificação desse merecimento, determinar o valor adequado a ressarcir o dano, valor que será necessariamente influenciado pela extensão da respectiva gravidade.
g) A medição da gravidade do dano há-de ser feita com ponderação das circunstâncias do caso concreto, à luz de critérios objectivos e não com base em padrões subjectivos e será apreciada em função da tutela do direito isto é, o dano deve revelar tal gravidade que justifique a atribuição de uma satisfação de natureza pecuniária ao lesado.
h) A verdade é que o montante fixado deve acompanhar a gravidade do dano, gravidade essa que não ficou demonstrada, já que, como se disse, não se consegue aferir a sua real dimensão.
i) Atendendo a que o quantum indemnizatório será tanto maior quanto maior a gravidade do dano, devendo presidir à fixação do mesmo uma proporcionalidade.
j) A natureza compensatória da indemnização a arbitrar pressupõe, como acima se disse, que se tenha em conta não só o grau de culpabilidade do agente e a situação económica deste e do lesado, mas também, as demais circunstâncias do caso entre os quais se contam a gravidade do dano causado – a intensidade e duração da dor física ou psíquica, ou dos sentimentos negativos provocados – sob pena de se pôr em causa a sua seriedade e o respeito devido a quem o sofreu.
k) Mas também não se pode arbitrar um valor superior à gravidade do dano, que foi o que sucedeu no presente caso.
l) Como se disse, nos danos não patrimoniais, na atribuição da indemnização deverá ter-se em consideração um juízo de equidade – ponderando o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso.
m) Tudo com o objectivo de, após a adequada ponderação, poder concluir a respeito do valor pecuniário que considere justo para, no caso concreto, compensar o lesado pelos danos não patrimoniais que sofreu.
n) É sabido que as indemnizações a arbitrar a esse título se traduzem em compensações de carácter pecuniário tendentes a proporcionar um certo grau de satisfação vivencial em ordem a atenuar, tanto quanto possível, os sofrimentos de ordem moral, física ou afectiva sofridos pelo lesado em resultado da conduta ilícita do lesante.
o) Percorrida a matéria fáctica considerada provada não pode a recorrente deixar de discordar quanto ao facto do dano em causa ser indemnizável pelo valor fixado, por o mesmo não possuir a gravidade necessária que mereça o referido valor.
p) Considera a recorrente adequado em termos de equidade, terá de ser necessariamente inferior, representando uma compensadora reparação pelo eventual sofrimento moral do Autor, pelo que a indemnização arbitrada a título de danos não patrimoniais deve ser reduzida.
q) A douta sentença, violou por isso o nº3, do art. 496º e o art. 562º do Código Civil;
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O Autor não apresentou resposta.
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Neste Tribunal o Exmo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que os recursos devem improceder.
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Os autos foram com vista aos Ex.mos Juízes adjuntos.
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Delimitado o objecto dos recursos pelas conclusões da recorrente temos que as questões a decidir são as seguintes:
1. No primeiro recurso interposto suscita-se a questão de saber se caducou ou não o direito de aplicar a sanção disciplinar de despedimento ao Autor;
2. No segundo recurso discute-se se deve ou não ser arbitrada indemnização ao Autor por danos não patrimoniais, e no caso afirmativo que montante.
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A) Vamos começar por apreciar o primeiro recurso, em que se discute se caducou ou não o direito de aplicar a sanção disciplinar de despedimento ao Autor.
Na decisão recorrida foi consignada como provada a seguinte factualidade:
1. O Autor celebrou com a Ré um contrato de trabalho e nela foi admitido em 01-06-1985.
2. Tendo-lhe sido instaurado processo disciplinar, foi o Autor notificado da nota de culpa mediante carta datada de 11/07/2006, recebida, em mão, no dia 12 de mesmo mês.
3. Tendo apresentado a sua defesa em 31-07-2005.
4. As duas últimas inquirições de testemunhas realizaram-se em 29-08-2006.
5. O relatório final do processo disciplinar tem a data de 15-09-2006.
6. Após a instrução do processo disciplinar, a Caixa Ré emitiu decisão disciplinar, datada de 12-10-2006, procedendo ao despedimento do Autor, ali alegando justa causa.
7. A data da recepção da decisão pelo Autor é 16-10-2006.
8. Na Caixa Ré inexiste comissão de trabalhadores.

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Feita esta enumeração, e delimitado como está o objecto do recurso pelas conclusões das alegações do recorrente, passaremos a apreciar a questão a decidir, que como já se referiu consiste em saber se caducou ou não o direito de aplicar a sanção disciplinar de despedimento ao Autor.
Esta questão já foi apreciada em sede de recurso por este Tribunal da Relação de Évora a propósito do procedimento cautelar instaurado pelo Autor.
Na altura teceram-se as seguintes considerações:
“O processo disciplinar foi iniciado no ano de 2006, portanto já na vigência da aplicação do Código do Trabalho, aprovado pela lei nº 99/2003, de 27/8.
Este diploma legal, no seu art. 434º, estatui que o trabalhador pode, mediante providência cautelar regulada no Código de Processo do Trabalho, requerer a suspensão preventiva do despedimento no prazo de cinco dias úteis a contar da data da recepção da comunicação de despedimento.
No Código de Processo de Trabalho a referida providência cautelar vem regulada nos art. 34º e segs.
Estamos perante uma providência cautelar que tem natureza antecipatória que se destina a facultar ao trabalhador o direito a uma reintegração imediata no seu posto de trabalho assegurando também, desde logo, o seu direito à retribuição.
Como refere António Santos Abrantes Geraldes, em Temas da Reforma do Processo Civil, IV volume, Almedina, pág. 328, a suspensão do despedimento constitui o instrumento prioritário destinado a assegurar as condições normais de subsistência do trabalhador perante situações de despedimento ilícito, garantindo temporariamente os efeitos práticos e jurídicos da relação laboral.
Acrescenta ainda o mesmo Autor que o Estado Social de Direito ainda dominante, reflectindo, além do mais, na consagração constitucional do direito ao trabalho (art. 53º e 58º da CRP), não poderia deixar de prestar a devida atenção aos despedimentos e assegurar os meios expeditos susceptíveis de atenuar os efeitos de actuações ilícitas das entidades empregadoras.
Para obviar a que o trabalhador não fique a aguardar a decisão definitiva, o que pode demorar um lapso de tempo mais ou menos longo, a lei permite-lhe o recurso a esta providência para acautelar o perigo da demora da decisão.
Tratando-se de uma relação jurídica laboral a demora da decisão pode acarretar sérios prejuízos para o trabalhador, que muitas vezes sobrevive apenas da retribuição que aufere.
Esses prejuízos podem ser de carácter meramente patrimonial ou também de carácter não patrimonial uma vez que, cada vez mais, a realização pessoal de cada pessoa passa pelo trabalho que realiza.
Os requisitos exigidos pela lei para que esta providência cautelar especificada seja decretada constam do art. 39º do CPT: falta de instauração ou nulidade do processo disciplinar e probabilidade séria de inexistência de justa causa.
Para além destes requisitos a jurisprudência tem frisado que é pressuposto existir um contrato de trabalho e uma situação efectiva de despedimento (Cfr. Ac. da Rel. de Lisboa, de 16/6/99, CJ, Ano XXIV, tomo III, pág. 172).
A falta de instauração ou nulidade do processo disciplinar são requisitos que se estribam em razões de natureza formal que se prendem com a inexistência do processo ou à sua nulidade.
A probabilidade séria de inexistência de justa causa é um requisito de natureza substancial ou material que tem a ver com a licitude da desvinculação operada unilateralmente pela entidade patronal.
A suspensão do despedimento só deve ser decretada quando, após apreciação do processo disciplinar ou dos restantes meios de prova, o tribunal formar a convicção, suportada em critérios de séria probabilidade, de que os fundamentos invocados pelo empregador para proceder ao despedimento não obedecem aos requisitos impostos na lei laboral.
No caso concreto dos autos foi elaborado processo disciplinar, mas o recorrente suscitou, desde logo, a questão da caducidade do direito de aplicar a sanção, o que a verificar-se colide com a validade do respectivo processo.
Na verdade, o recorrente alegou que entre a última diligência probatória e a comunicação da decisão do despedimento decorreram mais de trinta dias.
Na decisão recorrida reconheceu-se o factualmente alegado pelo recorrente, mas defendeu-se que o decurso do prazo de caducidade de aplicar a sanção não é fundamento de ilicitude do despedimento, face ao disposto no art. 429º do CT e 39º do CPT, não tendo efeitos em termos de procedimento cautelar.
Dos pontos 37 a 41 da matéria de facto dada como assente, e que resulta directamente do processo disciplinar, temos que a conclusão das diligências probatórias ocorreu em 01/09/2006, data em que trabalhador foi notificado do indeferimento de um requerimento de prova que havia formulado, e que a sanção de despedimento lhe foi comunicada por carta datada de 12/10/2006.
Não existindo na requerida comissão de trabalhadores, como resulta do ponto 42 da matéria de facto assente, nem sendo o requerente representante sindical, o termo inicial do prazo de trinta dias ocorre aquando da conclusão das diligências probatórias.
Perante estes factos não existe qualquer dúvida de que foi ultrapassado o prazo de trinta dias a que alude o art. 415º nº1 do Código do Trabalho.
Esta disposição legal tem a seguinte redacção:
“ Decorrido o prazo referido no nº3 do artigo anterior, o empregador dispõe de 30 dias para proferir a decisão, sob pena de caducidade do direito de aplicar a sanção.”
Por sua vez o nº3 do artigo anterior (414º) dispõe que concluídas as diligências probatórias, o processo é apresentado, por cópia integral, à comissão de trabalhadores e, no caso do nº3 do artigo 411º, à associação sindical respectiva, que podem, no prazo de cinco dias úteis, fazer juntar ao processo o seu parecer fundamentado.
Os antecedentes destas disposições legais encontravam-se nos nº 7 e 8 do art. 10º do DL nº 64-A/89, de 27/2, só que a redacção deste nº8 era diferente da redacção da disposição legal actualmente em vigor.
A disposição revogada pelo Código do Trabalho estatuía que decorrido o prazo referido no número anterior, a entidade empregadora dispunha de 30 dias para proferir a decisão.
Existiu controvérsia na doutrina e na jurisprudência quanto a saber se o prazo referido no nº8 do art. 10º da LCCT era um prazo de caducidade do procedimento disciplinar, mas o Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a decidir reiteradamente e de forma uniforme, desde há vários anos, que o prazo em questão não tem natureza peremptória e que a sua inobservância não acarreta nem a caducidade do procedimento disciplinar nem a nulidade do processo disciplinar, sendo apenas relevante para efeitos de apreciação da justa causa de despedimento. [1]
Com a redacção dada pelo legislador ao art. 415º nº1 do Código do Trabalho não existem agora quaisquer dúvidas de que estamos perante um prazo de caducidade.[2]
Constatando-se que entre a última diligência probatória (01/09/06) e a comunicação da decisão do despedimento (12/10/2006) decorreram mais de trinta dias, verifica-se a caducidade do direito de aplicar a sanção, face à disposição legal referida.
A aplicação da sanção do despedimento ao requerente fora do prazo previsto na lei afecta directamente a validade do processo disciplinar determinado a ilicitude do despedimento, nos termos do art. 429º al. a) do Código do Trabalho.
Na verdade, estamos perante um despedimento que não foi precedido do respectivo procedimento válido o que preenche a previsão do art. 39º do Código de Processo do Trabalho para se decretar a suspensão do despedimento.”
(fim de transcrição)
Apreciada que foi a questão nos termos referidos, tendo por base a mesma factualidade, não se vislumbram razões para alterar a posição então assumida.
Na verdade, é pacífico na jurisprudência que não havendo comissão de trabalhadores o termo inicial do prazo de cinquenta dias é aferido em função da conclusão das diligências probatórias[3].
A figura do relatório final, que muitas vezes é elaborado pelo instrutor do processo disciplinar, não é contemplada na tramitação do procedimento disciplinar previsto nos art. 411º e seguintes do Código do Trabalho.
A lei apenas faz referência à decisão final que deve ser proferida no prazo de trinta dias decorrido o prazo referido no nº3 do art. 414.
De qualquer forma, o relatório final, constituindo um resumo das diligências instrutórias e encerrando as conclusões do instrutor, nunca poderia ser entendido como uma diligência probatória.

Assim, pelas razões já expostas na decisão do procedimento cautelar e sufragando ainda a fundamentação da decisão recorrida, decide-se julgar improcedente o recurso interposto pela Ré, mantendo a decisão da primeira instância
*
B) Resta agora apreciar o segundo recurso em que se suscita a questão de saber se deve ou não ser arbitrada indemnização ao Autor por danos não patrimoniais, e no caso afirmativo que montante.
Na sentença recorrida foram consignados como provados os seguintes factos:
1. O trabalho do Autor constituía a sua realização profissional.
2. O Autor foi confrontado, quer em privado, quer em espaços públicos, por pessoas que o conheciam e que o interpelaram acerca do despedimento.
3. Correndo na cidade de T…, onde habita e trabalha, que causou fortes prejuízos à Caixa Ré.
4. Devido ao seu despedimento pela Ré, o Autor sofreu angústia, humilhação e ansiedade.
5. O seu despedimento pela Ré afastou-o do convívio com amigos e familiares.
*
Feita esta enumeração, e delimitado como está o objecto do recurso pelas conclusões das alegações da recorrente, passaremos a apreciar a questão a decidir que consiste em saber se deve ou não ser arbitrada indemnização ao Autor por danos não patrimoniais, e no caso afirmativo que montante.
O art. 436º nº1 al. a) do Código do Trabalho refere que sendo o despedimento ilícito, o empregador é condenado a indemnizar o trabalhador por todos os danos, patrimoniais e não patrimoniais, causados.
No que respeita aos danos não patrimoniais o art. 496º nº1 e 3 do Código Civil dispõe que “na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”, e que “o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos número anterior”.
A satisfação ou compensação por danos morais não é uma verdadeira indemnização no sentido equivalente ao dano, isto é, de valor que reponha as coisas no estado anterior à lesão, tratando-se apenas de dar ao lesado uma satisfação ou compensação do dano sofrido, uma vez que este, sendo apenas moral, não é susceptível de equivalente.
Como refere Almeida Costa/ Direito das Obrigações/398, “ admite-se, em suma, a plena consagração, tanto do princípio da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais (art. 496º nº1 do CC), como do critério de fixação equitativa da indemnização correspondente (art. 496º nº3 do CC) .
Assim, a determinação do montante indemnizatório ou compensatório que corresponde aos danos não patrimoniais calcula-se segundo critérios de equidade. Atende-se, portanto, ao grau de culpabilidade e à situação económica do responsável, ao que se verifique, a tal respeito, em relação ao lesado e ao titular da indemnização, bem como a todas as outras circunstâncias que permitam apurar essa indemnização equitativa.
O princípio geral no que concerne à responsabilidade civil encontra-se consagrado no art. 483º do Código Civil: “ Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação” (nº1), acrescentando-se no nº2 que “ Só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos especificados na lei”.
Da análise desta disposição legal decorre que o dever de indemnizar resultante da responsabilidade civil por factos ilícitos depende dos seguintes pressupostos:
- Facto voluntário do agente;
- A ilicitude desse facto;
- Nexo de imputação do facto ao lesante;
- Que da violação do direito subjectivo ou da lei derive um dano;
- Existência de um nexo de causalidade entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido pela vítima.
Vejamos o caso concreto:
Relativamente a esta matéria interessa ponderar que:
- Ficou provado que o trabalho do Autor constituía a sua realização profissional;
- O Autor foi confrontado, quer em privado, quer em espaços públicos, por pessoas que o conheciam e que o interpelaram acerca do despedimento;
- Correu na cidade de T…, onde o Autor habita e trabalha, que causou fortes prejuízos à Caixa Ré.
- Devido ao seu despedimento pela Ré, o Autor sofreu angústia, humilhação e ansiedade.
- O seu despedimento pela Ré afastou-o do convívio com amigos e familiares.
O facto de se ter provado que o Autor foi confrontado, quer em privado, quer em espaços públicos, por pessoas que o conheciam e que o interpelaram acerca do despedimento, e que correu na cidade de T…, onde o Autor habita e trabalha, que causou fortes prejuízos à Ré, denota que se terá gerado uma situação propiciadora de causar angústia, humilhação e ansiedade.
A angústia, a humilhação e a ansiedade provocadas pelo despedimento merecem a tutela do direito e como tal devem ser indemnizados devendo o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal.
Atendendo às circunstâncias do caso concreto parece-nos que a quantia fixada pelo tribunal é adequada, devendo pois manter-se o montante de cinco mil euros.
Pelo exposto, acorda-se em negar provimento aos recursos de apelação decidindo-se manter as decisões recorridas.
Custas a cargo da recorrente.
( Processado e revisto pelo relator que assina e rubrica as restantes folhas).
Évora, 15/02/2011
________________
[1] Cfr. entre outros Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 05/02/2007 e 06/08/2006 em www.dgsi.pt.
[2] Cfr. Pedro Romano Martinez, Apontamentos sobre a cessação do contrato de trabalho à luz do código do trabalho, 1ª reimpressão, Lisboa 2005, edição da A.A.F.D.L. e Acórdão do STJ de 05/02/2007 e de 06/08/2006 em www.dgsi.pt.
O Ac. do STJ de 06/08/06, em www.dgsi.pt, considerou que o art.415º nº1 do Código do Trabalho não tem natureza de lei interpretativa, em relação ao nº8 do art. 10º da LCCT, na parte em que o primeiro estabelece, com consequência da inbservância do prazo para proferir a decisão final no processo disciplinar, a caducidade do direito de aplicar a sanção.
[3] Cfr. entre outros o Acórdão da Relação do Porto de 18/12/05, in www.dgsi.pt – JTRP 00038626

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