quarta-feira, 10 de outubro de 2012

MOTIVO JUSTIFICATIVO - CONTRATO DE TRABALHO A TERMO - CONTRATO DE TRABALHO SEM PRAZO



Proc. 370-09.5TTSR.E1    TRÉvora   2010/10 /12


O motivo justificativo consignado num contrato de trabalho a termo pelo prazo de uma ano em que se referia que “o prazo estabelecido justifica-se pelo facto de o primeiro se encontrar numa fase de profunda reestruturação, com consequente aumento temporário de actividade”, é demasiado genérico não permitindo a verificação externa da conformidade da situação concreta com a tipologia legal, nem estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e a duração convencionada para o contrato, pelo que nos termos do nº 4 do art. 131º do Código do Trabalho tal contrato de trabalho tem de considerar sem termo face à insuficiência das referências exigidas pela al. e) do nº1 da disposição legal citada


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:

I. R…, residente na Avenida M… Santarém, intentou contra Banco…, S.A., com sede na Av. Porto, acção declarativa de condenação com processo comum, alegando, em síntese que:
- foi admitida ao serviço da Ré por contrato a termo certo com início em 13 de Março de 2006, e pelo período de um ano, para, sob as respectivas, ordens, direcção e fiscalização, lhe prestar trabalho como “administrativa”;
- o contrato foi outorgado sem menção, nos moldes legalmente exigíveis, do motivo justificativo da aposição do termo, o que importa a conversão do contrato em contrato sem termo;
- a ré denunciou o contrato para o dia 12 de Março de 2009, pelo que foi ilicitamente despedida.
- a ré causou-lhe danos não patrimoniais, pois ficou numa situação financeira delicada o que lhe gerou um grave estado de ansiedade.
Conclui pedindo a condenação da Ré a:
a) reconhecer a ilicitude do seu despedimento, promovido pelo Réu;
b) reintegrá-la no seu posto de trabalho com a respectiva categoria profissional, ou, caso faça tal opção, a pagar-lhe a compensação legal;
c) pagar-lhe as retribuições a que tem direito desde o dia 29/06/09, até à data do trânsito em julgado da decisão que ponha termo à lide e efective a sua reintegração ao serviço, incluindo subsídios de almoço a partir de 29/07/2009, sendo que a retribuição vencida até 29/07/2009 ascendem a € 840,40;
d) pagar-lhe a diferença de retribuição do Nível 4 desde 01.01.2009 até 30.03.2009 no montante de € 65,07;
e) reconhecer-lhe a promoção ao nível 5 a partir de 12.03.2009.
f) pagar-lhe a título de danos patrimoniais a quantia de 8.000,00 €;
g) a suportar uma sanção pecuniária compulsória a seu favor no montante de 300,00 € por cada dia decorrido, após a exequibilidade da sentença sem que a Ré a reintegre efectivamente nas suas funções.
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A Ré contestou a acção, pugnando pela sua integral improcedência, defendendo-se por via de impugnação, alegando, em síntese:
- o termo aposto no contrato da autora estava devidamente fundamentado, tendo a autora perfeita consciência dos motivos que levaram à sua contratação, pelo que o contrato cessou por caducidade, nos termos legalmente permitidos, inexistindo qualquer despedimento;
- não se justifica qualquer pedido de reintegração ou de indemnização;
- a Autora não sofreu quaisquer danos não patrimoniais tutelados pelo direito.
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Procedeu-se à audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, decidiu:
a) Declarar ilícito o despedimento perpetrado pela ré na pessoa da autora;
b) Condenar a ré a reintegrar a autora no seu posto de trabalho, mantendo-lhe a categoria e computando-lhe a antiguidade como se tal despedimento não tivesse existido;
c) Condenar a ré a pagar à autora as retribuições e subsídio de almoço a que esta tinha direito, computadas desde o dia 29 de Junho de 2009 e até à data do trânsito em julgado da decisão que ponha termo à lide, devendo nesta compensação ser deduzida a quantia entregue pela ré à autora a título de compensação pela caducidade do contrato de trabalho, bem como a quantia percebida pela autora a título de subsídio de desemprego, devendo a ré, quanto a esta última, entregá-la à segurança social;
d) Condenar a ré a pagar à autora a quantia de dois mil e quinhentos euros (2.500,00) a título de indemnização dos danos não patrimoniais por esta sofridos com o despedimento;
e) Condenar a ré a reconhecer que a autora tem direito, desde 12 de Março de 2009, a perceber a retribuição definida no anexo ao ACTV para o Sector bancário para o Nível 5 do Grupo I, facto que deverá ser tido em conta na definição da compensação atribuída na alínea c) deste dispositivo;
f) Condenar a ré a pagar uma sanção pecuniária compulsória de cem euros (100,00) por cada dia decorrido após a exequibilidade desta sentença e até à efectiva reintegração da autora no seu posto de trabalho;
g) Absolver a ré do pedido de pagamento da “…diferença de retribuição do Nível 4 desde 01.01.2009 até 30.03.2009, no montante de €65,07”.
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Inconformada com a sentença a Ré interpôs recurso de apelação, tendo concluído:
l.ª - A sentença padece de erro na decisão fazendo uma errónea aplicação do direito ao vertente caso, contrariando assim a Lei, o Direito e a Justiça.
2.ª - O Recorrente defende que os factos assentes e provados impunham decisão diversa, conforme especificadamente se alega ao longo deste recurso.
3.ª - Embora a validade da cláusula do contrato a termo, seja questão de direito, haveria aspectos que a A. teria de demonstrar em sede de audiência de discussão e julgamento, designadamente, o do uso abusivo e fraudulento do seu contrato de trabalho a termo, que manifestamente não demonstrou.
4.ª - Tal não só não foi demonstrado pela A., como o Recorrente logrou provar o contrário que existia efectivamente uma situação excepcional de acréscimo da sua actividade que motivavam e justificavam a utilização da contratação a termo certo, porquanto, desconheciam de tal situação iria perdurar no tempo.
5.ª - Com o devido respeito, o Tribunal a quo não deveria ter decidido a questão de direito como fez, pois em nossa opinião a concretização do termo constitui uma formalidade ad probationem e não ad substantiam, o Recorrente provou a sua necessidade temporária e a reestruturação invocada na cláusula do contrato de trabalho a termo certo celebrado com a Recorrida.
6.ª - Como supra-alegado inexistiu qualquer despedimento ilícito ou ad nutum. A causa de cessação do contrato de trabalho entre A./Recorrida e o R./Recorrente foi a caducidade do contrato a termo certo, que era justificado.
7.ª - A estipulação do prazo não foi abusiva nem teve como fim iludir as disposições do regime de celebração de contratos a termo.
8.ª - Entendendo-se que a referência à relação entre a justificação invocada e o termo pode ser feita nos termos em que o Recorrente o fez, não se exigindo uma clareza de redacção e o rigor na concretização de factos e circunstâncias, nos mesmos termos anteriormente previstos na Lei n.º 38/96 de 31 de Agosto que foi expressamente revogada com a entrada do Código do Trabalho, conforme dispõe o art. 21,º, n.º 1, alínea u) da Lei n.º 99/2003 de 27 de Agosto que aprovou o CT.
9.ª - A Recorrida alegando que tinha um vínculo duradouro, quando sabia perfeitamente que tinha um vínculo precário age com abuso de direito e má fé.
10.ª - Não se justifica qualquer pedido de indemnização ou reintegração, nem tampouco a aplicação de uma qualquer sanção pecuniária compulsória, salienta-se que os danos não patrimoniais não foram sequer concretizados e demonstrados.
11,ª - Em suma, no caso sub judice, a sentença é errónea, porque conflitua com os valores da segurança, certeza jurídica, imanentes à exigência da forma escrita dos contratos a termo que foi verificada; com a verificação da relação de facto existente entre as partes que foi demonstrada e com o princípio de justiça, ou ideia de direito, por causa do abuso de direito com que a A./Recorrida alegou.
12.ª - Na verdade, é incongruente um direito seguro, mas injusto. Daí que a cláusula geral de abuso de direito, tenha a função de colmatar estas situações de injustiça, fazendo prevalecer a ideia de justiça, mesmo sacrificando o valor da segurança, devendo ser este o sentido com que, no entender do Recorrente, a decisão devia ter sido interpretada e aplicada.
13.ª - Pelo exposto, a sentença traduziu-se num resultado ética e juridicamente injusto, entendendo o apelante que a decisão sob recurso fez uma inexacta interpretação e aplicação da lei, violando, entre outros, o disposto nos artigos 496.º do Código Civil e 515º e 659º n.º 3 do Código de Processo Civil.
14.ª - Concluindo, a sentença traduziu-se num resultado ética e juridicamente injusto, pelo que se pede aos Venerandos Desembargadores que apreciem a matéria de direito e de facto do aresto em crise, elegendo, interpretando e aplicando a lei e julgando procedente a presente apelação.

O A. contra-alegou concluindo que deve ser negado provimento ao recurso.
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O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de dever manter-se a sentença recorrida.
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Os autos foram com vista aos Ex.mos Juízes-adjuntos.
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Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da recorrente temos que as questões a decidir consistem em saber se o motivo justificativo para a celebração do contrato a termo é ou não suficiente face à exigência legal e ainda se a Autora agiu com abuso de direito ao invocar que o vínculo que a ligava à Ré era duradouro.

II. Na sentença recorrida foi consignada a seguinte factualidade que, por não ter sido impugnada, se considera fixada:
a) A Autora foi admitida ao serviço do Banco…, S.A., mediante contrato de trabalho a termo certo que se iniciou a 13/03/2006 e que caducaria, atento o prazo de um ano nele aposta em 13/03/2007, mas, foi, sucessivamente, renovado por igual período, tendo sido dado como caduco no dia 12/03/2009;
b) A Autora foi admitida ao serviço da Ré, na categoria de “Administrativa” e classificada, no Grupo I, nível 4, nos termos estabelecidos no ACT para o Sector Bancário” (cfr. Cláusula 3ª) para sob as suas ordens, direcção, fiscalização e mediante retribuição, lhe prestar aquela actividade;
c) Nesse nível retributivo (Nível 4) auferia uma retribuição base mensal ilíquida de 718,71 €, sujeita aos respectivos impostos e descontos legais.
d) Este montante era acrescido, por cada dia de trabalho efectivamente prestado, de 8,81 €, a título de subsídio de almoço, no total mensal de 193,82;
e) Por carta datada de 21/01/09, recebida no dia 13/02/09, o Réu comunicou à A. que: “nos termos do artº 46º/1 e 2 do D.L. 64-A/89, de 27 de Fevereiro, revogado pelo artº 388º do Código de Trabalho, vimos informá-la (sic) que o Banco… S.A. não pretende renovar o contrato estabelecido em 13/03/2006, e que o mesmo caducará no próximo dia 12/03/09.
f) No contrato a termo certo, firmado entre a A. e o Réu, a referência ao motivo justificativo da sua celebração é a seguinte: “(…) o prazo justifica-se pelo facto de o primeiro se encontrar numa fase de profunda reestruturação, com consequente aumento temporário de actividade”.
g) A. foi colocada a trabalhar, desde que entrou até sair na Unidade de Meios Electrónicos de Pagamento – Aquiring, sita na Av. 5 de Outubro, nº 75, em Lisboa.
h) Este tipo de serviço, destinava-se a prestar apoio comercial e técnico à rede nacional de balcões do R., esclarecendo dúvidas dos Colegas, analisando procedimentos contratuais referentes ao produto Netpay, exclusivo do Banco…, que consiste num terminal de pagamento electrónico p.o.s. com aceitação de cartões das redes Visa e Mastercard.
i) A A., nesse âmbito, executava as seguintes tarefas:
-Aprovação de Propostas de adesão ao serviço Netpay.
- Elaboração e Adendas a contratos de adesão.
- Rescisão de contratos e abates de terminais.
- Identificava processos fraudulentos.
- Eclarecia e informava os Colegas dos procedimentos comerciais e questões técnicas relacionadas com a rede Netpay, que era uma rede concorrencional com a rede Unicre, exclusiva do Banco...
j) Quando a A. ingressou naquela Unidade, já estava implantada havia 1 (um) ano, estava em desenvolvimento e crescimento;
k) Subsistindo e continuando a funcionar normalmente, traduzindo-se numa área indispensável ao bom funcionamento do Banco no negócio daquele produto, muito rentável, tendo sido considerado pela Administração como o Produto – Estrela do Banco;
l) Tanto quanto sabe, a sua saída provocou acumulação de serviço, visto que eram apenas 6 trabalhadoras.
m) O produto Netpay era apenas uma das áreas de exploração do Banco, criada em 2005, que se encontrava em constante desenvolvimento tecnológico e cujo funcionamento permanece;
n) A atitude da ré provocou-lhe um grave estado de ansiedade, atenta a situação económica em que a colocou, obrigando-a a viver a expensas parciais dos seus pais;
o) A autora percebe subsídio de desemprego, no montante de € 577,00 por mês;
p) A A. é sócia do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, com o nº 78363.
q) O réu subscreveu o Acordo Colectivo de Trabalho do Sector bancário, publicado no BTE, n.º 4, de 29 de Janeiro de 2005, com última alteração publicada no BTE n.º 3, de 22 de Janeiro de 2009;
r) A Autora foi colocada pelo réu a trabalhar numa unidade que estava ainda em fase de desenvolvimento e crescimento;
s) O produto Netpay, exclusivo do Banco…, consiste num terminal de pagamento electrónico com aceitação de cartões das redes Visa e Mastercard, o qual visava fazer concorrência ao sistema Multibanco da SIBS, o único existente no mercado nacional e concorrência à UNICRE;
t) A autora aceitou de forma livre e espontânea celebrar contrato com a ré, tendo-lhe sido esclarecidas as funções que iria desempenhar;
u) Na vigência do contrato, o Réu mudou 3 vezes de administração;
v) A actual administração decidiu substituir o sistema Netpay pelo sistema já experimentado da SIBS;
x) Por outro lado, manifestou-se no segundo semestre do ano de 2008 uma crise económica mundial sem precedentes e, posteriormente, profundas alterações no seio do Réu, decorrentes das mudanças na administração e, posteriormente, com a nacionalização operada.
z) Tendo o banco perdido clientes e volume de negócio;
aa) A autora recebeu da ré uma compensação pela caducidade do seu contrato de trabalho a termo certo.
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Fixada a matéria de facto dada como provada, passaremos a apreciar as questões a decidir, que consistem em saber se o motivo justificativo para a celebração do contrato a termo é ou não suficiente, face à exigência legal e ainda se a Autora agiu com abuso de direito ao invocar que o vínculo que a ligava à Ré era duradouro.
Tendo o contrato de trabalho se iniciado em 13/03/2006, o regime aplicável, no que diz respeito à forma e admissibilidade do contrato a termo, é o que resulta do Código do Trabalho que entrou em vigor no dia 1 de Dezembro de 2003.
O carácter excepcional da contratação a termo deriva da própria Constituição da República Portuguesa que no seu art. 53º garante aos trabalhadores a segurança no emprego, sendo proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos.
Escorado neste princípio constitucional, que impõe que a regra seja a contratação por tempo indeterminado, o DL nº 64-A/89, de 27/2- LCCT[1] apenas admitia a celebração de contratos a termo em situações excepcionais e transitórias ou para satisfazer necessidades de carácter precário ou sazonal.
A lei permitia a celebração de contratos de trabalho a termo nos casos de acréscimo temporário ou excepcional da actividade da empresa e actividades sazonais.[2]
O motivo justificativo da celebração do contrato a termo tinha de constar no documento escrito de uma forma concreta, ou seja tinha de se fazer menção aos factos que justificavam a contratação a termo, não bastando a simples alusão, em abstracto, a uma das situações que estavam descritas nas alíneas do nº1 do art. 41º. da LCCT ( cfr. entre outros os Ac. RP, de 20/4/95, CJ, II,246, Ac.RL de 13/7/95, CJ,IV,152, Ac. RE, de 4/7/85, CJ, IV, 313 e de 8/11/94, CJ, IV,292, Ac. RC, de 2/3/95, BMJ,445º,624).[3]
Na linha desta jurisprudência, que floresceu logo nos primeiros anos da vigência da LCCT, o legislador pretendendo clarificar a situação fez uma interpretação autêntica do art. 41º e 42º, nº2 al. e) da LCCT, através do art. 3º da Lei 38/96, de 31/8, estabelecendo que a motivação do contrato de trabalho a termo só é atendível se mencionar concretamente os factos e as circunstâncias que integram essa motivação.
A questão ficou ainda mais clara com a nova redacção dada ao art. 3º da lei 38/96, de 31/8, pela Lei nº 18/2001, de 3 de Julho que referia que a indicação do motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo, em conformidade com o nº1 do art. 41º e com a alínea e) do nº1 do artigo 42º do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo, aprovado pelo DL nº 64-A/89, de 27/2, só é atendível se mencionar concretamente os factos e circunstâncias que objectivamente integram esse motivo, devendo a sua redacção permitir estabelecer com clareza a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.
A indicação da motivação do contrato a termo para ser válida, tinha de estar concretizada de tal forma que pudesse permitir a verificação externa da conformidade do motivo invocado com as situações previstas no art. 41, nº1, da LCCT, e a verificação da autenticidade da justificação invocada face à duração estipulada para o contrato.
Como refere a Mestre Joana Nunes Vicente[4] pretendeu-se, definitivamente, pôr termo a uma prática bastante arreigada junto dos nossos empregadores de recorrer massivamente ao contrato de trabalho a termo, fundamentando aquela utilização através de fórmulas genéricas e abstractas como “ suprir necessidades transitórias de serviço por motivo de acréscimo temporário da actividade da empresa”, “ necessidades transitórias decorrentes da reestruturação dos serviços”, “substituição de trabalhadores” – as quais mais não eram do que meras remissões para as hipóteses previstas na lei.
O Código do Trabalho acolheu todo este acervo não tendo introduzido, nesta matéria, alterações de relevo.
Assim, no seu art. 129º nº1 dispõe que o contrato de trabalho a termo só pode ser celebrado para a satisfação de necessidades temporárias da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades.
O nº2 da mesma disposição legal refere que consideram-se, nomeadamente, necessidades temporárias da empresa as seguintes:

f) Acréscimo excepcional de actividade da empresa.
Por seu turno, o art. 131º do mesmo diploma legal estatui:
1 — Do contrato de trabalho a termo devem constar as seguintes indicações:
a) Nome ou denominação e domicílio ou sede dos contraentes;
b) Actividade contratada e retribuição do trabalhador;
c) Local e período normal de trabalho;
d) Data de início do trabalho;
e) Indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo;
f) Data da celebração do contrato e, sendo a termo certo, da respectiva cessação.
2 — Na falta da referência exigida pela alínea d) do número anterior, considera-se que o contrato tem início na data da sua celebração.
3 — Para efeitos da alínea e) do nº 1, a indicação do motivo justificativo da aposição do termo deve ser feita pela menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.
4 — Considera-se sem termo o contrato em que falte a redução a escrito, a assinatura das partes, o nome ou denominação, ou, simultaneamente, as datas da celebração do contrato e de início do trabalho, bem como aquele em que se omitam ou sejam insuficientes as referências exigidas na alínea e) do nº 1.
Como já se referiu, as fórmulas genéricas constantes das várias alíneas do nº2 do art. 129 do Código do Trabalho têm de ser concretizadas em factos.
A exigência legal de concretização tem em vista permitir duas coisas: a verificação externa da conformidade da situação concreta com a tipologia legal; e a realidade e a adequação da própria justificação invocada face à duração convencionada para o contrato.
Atenta a matéria de facto provada, nomeadamente a que consta na alínea f), temos de concluir que, efectivamente, o motivo justificativo invocado é demasiado genérico não permitindo a verificação externa da conformidade da situação concreta com a tipologia legal, nem estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e a duração convencionada para o contrato.
Com efeito, consignou-se que o contrato era celebrado pelo prazo de um ano, com início em 13.03.2006, justificando-se pelo facto da Ré se encontrar numa fase de profunda reestruturação, com consequente aumento temporário de actividade.
Esta justificação não se encontra minimamente concretizada não se fazendo referência aos serviços que estavam a ser objecto de reestruturação e à previsível duração da mesma.
A este propósito escreveu-se, com toda a pertinência, na sentença recorrida o seguinte:
“Com efeito, de onde se pode extrair a razão da previsão de um ano como termo do contrato. A profunda reestruturação que a ré levava a cabo estaria, previsivelmente, concluída, nesse prazo? Se assim era, porque é que tal não foi afirmado?
Inexistindo tais referências no contrato, apenas se pode concluir pela insuficiência da motivação do termo e, por aplicação do n.º 3 do artigo 131.º do CT, pela sua conversão ope legis em contrato sem termo.
De outro ângulo, na sua contestação, veio a ré dizer que a autora foi contratada numa altura em que a ré alterava a sua área comercial, com segmentação dos serviços de empresas e particulares e especialização de algumas áreas de negócio, designadamente a implementação e desenvolvimento do produto “netpay”. Mais, refere que foi a autora foi contratada para trabalhar na “unidade” afecta à gestão deste último produto, o qual se encontrava ao tempo em fase de desenvolvimento e crescimento, e que, por razões de mercado, era um produto de sucesso imprevisível.
Então, se assim era, a contratação da autora ter-se-ia inserido numa estratégia de dinamização de uma unidade de negócio cuja manutenção, atendendo às circunstâncias de mercado, seria incerta.
Ora, não foi essa a razão espraiada no contrato como fundamento da aposição do termo, sendo certo de que, enquanto lançamento de uma actividade de duração incerta, o artigo 139.º/3 do Código do Trabalho apenas permitiria um duração máxima de contrato de dois anos…”
Na verdade, a Autora desde a sua admissão até ao termo do contrato foi colocada na Unidade de Meios Electrónicos de Pagamento, que já estava implantada havia um ano, desde 2005, encontrando-se em desenvolvimento e crescimento.
A única referência que resulta da matéria de facto a uma reestruturação da Ré consta na alínea x) quando se refere que no segundo semestre do ano de 2008 manifestou-se uma crise económica mundial sem precedentes e, posteriormente, profundas alterações no seio da Ré, decorrentes das mudanças na administração e, posteriormente, com a nacionalização operada.
Estes factos que porventura levaram à reestruturação da Ré são muito posteriores à contratação da Autora.
Temos pois de concluir que o motivo justificativo invocado “ o prazo estabelecido justifica-se pelo facto de o primeiro se encontrar numa fase de profunda reestruturação, com consequente aumento temporário de actividade” é demasiado genérico não permitindo a verificação externa da conformidade da situação concreta com a tipologia legal.
Assim, nos termos do nº 4 do art. 131º do Código do Trabalho o contrato de trabalho celebrado entre as partes tem de se considerar sem termo face à insuficiência das referências exigidas pela al. e) do nº1 da disposição legal citada.
No que diz respeito à cessação do contrato, a R., segundo a alínea e) dos factos provados, por carta datada de 21.01.2009, comunicou à A. a caducidade do referido contrato, com efeitos a 12/03/2009.
Ora, considerando-se o contrato de trabalho que vinculou as partes sem termo a desvinculação adoptada pela entidade patronal, através de uma mera comunicação da caducidade do referido contrato, consubstancia um despedimento ilícito.
Nesta linha, nada há a apontar à decisão recorrida no que diz respeito à solução dada às questões suscitadas em sede de recurso pela R.
Neste contexto, também não nos parece procedente a argumentação da Ré quando afirma que a Autora agiu com abuso de direito e má-fé ao invocar um vínculo duradouro.
A Autora apenas se limitou a retirar a conclusão que deriva da lei face ao incumprimento por parte da Ré das disposições legais referentes ao contrato a termo.

III. Pelo exposto, acorda-se, na secção social deste Tribunal da Relação de Évora, em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela R. decidindo-se manter a sentença recorrida.
Custas a cargo da recorrente.
(Processado e revisto pelo relator que assina e rubrica as restantes folhas).
Évora, 2010/10 /12
Joaquim António Chambel Mourisco (relator)
António Gonçalves Rocha
Alexandre Ferreira Baptista Coelho

_________________
[1] Regime revogado pelo art. 21º nº1 al. m) da Lei nº 99/2003, de 27/8, que aprovou o Código do Trabalho.
[2] O art. 41º nº1 al. e) do DL nº 64-A/89, de 27/2, estatuia que “sem prejuízo do disposto no art. 5º, a celebração de contrato de trabalho a termo só é admitida nos casos seguintes:
a)…

b) Acréscimo temporário ou excepcional da actividade da empresa;
c) Actividades sazonais;
….”
[3] O art. 42º nº1 al. e) do DL nº 64-A/89, de 27/2 dispunha que “o contrato de trabalho a termo certo ou incerto está sujeito a forma escrita, devendo ser assinado por ambas as partes e conter as seguintes indicações:
a) …
….
e) Prazo estipulado com indicação do motivo justificativo ou, no caso de contratos a termo incerto, da actividade, tarefa ou obra cuja execução justifique a respectiva celebração ou o nome do trabalhador substituído.”
[4] Falsidade do motivo justificativo no contrato a termo de interinidade, no nº82 no Prontuário de Direito do Trabalho, publicação do Centro de Estudos Judiciários/Coimbra Editora, pág. 173

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