quinta-feira, 29 de novembro de 2012

CONTRATO DE TRABALHO A TERMO – MOTIVAÇÃO - DESEMPREGO DE LONGA DURAÇÃO - NULIDADE DE ESTIPULAÇÃO DE PRAZO - SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA



Proc. Nº 4872/09.5TTLSB.L1-4     TRLisboa     31.10.2012

I - O motivo justificativo da aposição do termo nos contratos de trabalho a termo certo não se pode limitar a transcrever secamente uma das alíneas dos números 2 ou 4 do artigo 140.º do atual Código do Trabalho, sob pena de o mesmo se converter em contrato por tempo indeterminado (artigo 147.º, número 1, alínea c)).
II - Tal motivo, se não pode ser tão vago e indefinido que impeça o trabalhador e, depois, a ACT e o tribunal de trabalho, de compreender e fiscalizar, devida e efetivamente, as razões em que se radica a necessidade de firmar um tal contrato, também não reclama que o empregador escreva e descreva o motivo explicativo com o máximo de detalhe ou pormenor que, materialmente, lhe for possível, bastando-lhe fazê-lo de maneira a que se ache suficientemente definida e percetível a situação de facto real e concreta que reclama a celebração do contrato de trabalho a termo certo em questão, possibilitando, dessa forma, a um qualquer declaratário colocado na mesma posição do trabalhador, a exata e objetiva compreensão do motivo invocado pela entidade patronal.
III - No contrato de trabalho a termo certo em que é contratado um trabalhador em situação de «desemprego de longa duração», as exigências formais do número 3 do artigo 141.º e da alínea c) do número 1 do artigo 147.º do Código do Trabalho de 2009 não ficam satisfeitas com a mera reprodução/referência à alínea b) do número 4 do artigo 140.º e uma declaração complementar do trabalhador no sentido de se com-siderar um «desempregado de longa duração».
IV - A fronteira entre a licitude ou ilicitude do motivo justificador da aposição do termo certo passa exatamente pela existência ou inexistência de uma realidade factual concreta e verdadeira a que aquele necessariamente se tem de referir e à inerente possibilidade ou impossibilidade de acompanhamento e controlo pelo trabalhador e, depois, pela inspeção do trabalho e pelos tribunais do foro laboral, daquela correspondência e conformidade.
V - A desconformidade material entre o motivo invocado no contrato e renovações e a realidade empresarial e laboral que justificou a sua celebração implica a nulidade do termo do respetivo contrato de trabalho bem como a aquisição da qualidade de trabalhador permanente do Autor, desde o momento inicial da sua celebração, por força do artigo 147.º, número 1, alíneas a) e b) do Código do Trabalho de 2009).
VI - O empregador, nos termos dos números 1 a 3 do artigo 829.º-A do Código Civil, pode ser condenado numa sanção pecuniária compulsória, de montante diário a fixar pelo tribunal, por cada dia em que não proceder à reintegração do trabalhador, como lhe foi judicialmente determinado, operando a mesma desde o trânsito em julgado da correspondente decisão judicial

ACORDAM NESTE TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:

I – RELATÓRIO

AA, casada, contribuinte fiscal n.º (…) e residente na Avenida (…), nº 51, r/c direito, ..., Amadora, veio, em 31/12/2009, propor a presente ação declarativa de condenação com processo comum laboral, contra BB, LDA, pessoa coletiva n.º (…), com sede na Rua (…), n.º 420, Lisboa, pedindo, em síntese, o seguinte:
a) Seja declarada a nulidade do despedimento da Autora, por ilícito;
b) Seja reconhecida a existência de um contrato de trabalho sem termo entre Autora e Ré, com efeitos reportados a 7 de Abril de 2009, com consequente nulidade da estipulação do termo;
c) Seja a Ré condenada a reintegrar a Autora no seu posto de trabalho, com a categoria e antiguidade que tinha à data do despedimento
d) Seja a Ré condenada no pagamento das retribuições vencidas desde aquela data (que, com os juros, computou no total de € 706,39 até à data da instauração da presente ação);
e) E na quantia de € 76,72 a título de trabalho suplementar e respetivos juros;
f) No pagamento da quantia de € 68,77 a título de descanso compensatório e respetivos juros;
g) Na quantia de € 616,72 a título de remunerações, férias, subsídio de férias e de Natal e proporcionais respetivos, impossibilidade de gozo de férias, tudo tendo em consideração o valor da retribuição correspondente, além do salário base, ao subsídio de turno, trabalho noturno e suplementar, já computados os juros devidos;
h) No pagamento das retribuições e subsídios de férias e de Natal que se vencerem até final, a liquidar em execução de sentença,
i) No pagamento de sanção pecuniária compulsória e
j) No pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais, no valor de € 10.000,00.
*
A Autora alegou, em suma, o seguinte:
a) Foi admitida ao serviço da Ré em 07.04.2009, mediante a celebração de um contrato de trabalho a termo certo (seis meses) para, sob as suas ordens, direção e fiscalização, exercer as funções correspondentes à categoria de caixeira Ajudante 1.º ano na loja da Ré sita no Centro Comercial C... e, posteriormente, na loja da Ré sita no Centro Comercial A... ...;
b) As partes acordaram um horário rotativo de modo a perfazer 40 horas semanais de trabalho, embora a autora prestasse trabalho para além destas horas, que não foi pago;
c) Auferia a quantia de € 450,00 a título de remuneração mensal base, acrescida de subsídio de alimentação no montante de € 4,68 por dia e, ainda, de subsídio de turno no montante de € 90 e de um subsídio noturno de montante variável;
d) No decurso da relação laboral a autora comunicou à Ré que se encontrava grávida, tendo esta, posteriormente, informado a autora que iria proceder ao encerramento das instalações onde a Autora prestava o seu trabalho;
e) Comunicando à Autora, por carta expedida em 21.09.2009, a caducidade do contrato de trabalho que as unia, com efeitos a 07.10.2009, alegando já não existir o acréscimo de trabalho que tinha fundamentado a celebração do contrato de trabalho com a Autora;
f) No contrato outorgado pelas partes não constam concretamente referidos os factos e circunstâncias que integram o motivo justificativo da aposição do termo, limitando-se a Ré a fazer alusão, em abstrato, a uma das situações fixadas no artigo 140.º do Cód. Trabalho («contratação de trabalhadores em situação de desemprego de longa duração»), o que não basta;
g) Designadamente, não consta do contrato há quanto tempo estaria a Autora desempregada, sendo que, in casu, a Autora tinha cessado a sua atividade com a anterior entidade empregadora em Novembro de 2008;
h) A invocada diminuição de atividade também não corresponde à verdade porquanto a ré contratou outras trabalhadoras para ocupar o lugar da autora, donde conclui que a atividade exercida pela Autora correspondia a uma necessidade contínua da Ré;
i) E a loja onde a Autora exercia funções não foi encerrada, como tinha sido alegado pela Ré;
j) Donde conclui que o único motivo que motivou o fim do contrato de trabalho que unia as partes se relacionou com o facto de a Autora se encontrar grávida.
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Foi agendada data para a realização da Audiência de partes (despacho de fls. 55), tendo a Ré sido citada por carta registada com Aviso de Receção, como resulta de fls. 58 e 59.
Mostrando-se inviável a conciliação das partes, foi a Ré notificada para, no prazo e sob a cominação legal contestar (fls. 69 e 70), o que a Ré fez, em tempo devido, e nos seguintes termos, conforme ressalta de fls. 71 e seguintes, onde, em síntese, impugnou os factos alegados pela Autora, designadamente:
- Sustentando a veracidade do motivo invocado para o termo e invocando abuso de direito porquanto a Autora entregou à Ré um documento onde constava que se encontrava desempregada há mais de doze meses, documento no qual a Ré acreditou;
- Negando o conhecimento da situação de gravidez da Autora à data em que comunicou a caducidade do contrato de trabalho que as unia e - negando que a autora tenha sido contratada para substituir outra trabalhadora ou que a Ré tenha celebrado outros contratos de trabalho nos 30 dias posteriores à cessação do contrato de trabalho com a Autora.
Concluiu por pedir a procedência parcial da ação, admitindo apenas que deve à autora a quantia de € 73,77 a título de diferenças dos montantes pagos por trabalho suplementar e € 63,13 referentes a descanso compensatório remunerado não gozado.
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Foi proferido despacho saneador, no qual se considerou regularizada a instância, depois de ter sido dispensada a realização da Audiência Preliminar, não se fixou a matéria de facto assente e elaborou a base instrutória, admitiu-se os róis de testemunhas das partes, juntos a fls. 29/30 e 86, e designou-se data para a realização da Audiência de Discussão e Julgamento (fls. 110 e 111).
Procedeu-se à realização da Audiência de Discussão e Julgamento com observância do legal formalismo, tendo a prova aí produzida sido objeto de registo-áudio (fls. 138 a 142).
Foi proferida, a fls. 144 a 148, Decisão sobre a Matéria de Facto, que foi objeto de reclamação pela Autora, mas indeferida nos moldes constantes de fls. 150 e 151 (cf. Ata de fls. 143 a 151).       
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Foi então proferida a fls. 152 a 165 e com data de 21/11/2011, sentença que, em síntese, decidiu o litígio nos termos seguintes:
“Pelo exposto, julga-se a presente ação parcialmente procedente e, em consequência,
a) Condena-se a Ré a pagar à Autora as quantias a liquidar em execução de sentença e relativas ao descanso compensatório devido pelo trabalho suplementar prestado nos dias feriados de 10, 12 e 25 de Abril, 1 de Maio, 10 e 11 de Junho e 15 de Agosto de 2009 e algumas horas para além do seu horário de trabalho, nos meses de Julho e Setembro de 2009 e, ainda, a doze dias de férias de 2009, tomando-se em consideração, para efeitos de retribuição, os valores auferidos a título de remuneração base, subsídio de turno e subsídio noturno e
 b) Condena-se a Ré a pagar à Autora as quantias a liquidar em execução de sentença e relativas às diferenças salariais nas retribuições de férias, subsídio de férias e de Natal resultantes da inclusão nos mesmos dos valores médios recebidos pela autora a título de subsídio de turno e subsídio noturnos,
c) Tudo acrescido dos respetivos juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos, desde as datas em que cada prestação deveria ter sido posta à disposição da autora e até efetivo e integral pagamento,
d) Absolvendo a Ré dos demais pedidos peticionados.
Custas da ação pela Autora e pela Ré, na proporção do respetivo decaimento - cfr. artigo 446º, nºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil e 16.º do Cód. Custas Judiciais -, devendo tomar-se em consideração que foi concedido à Autora apoio judiciário na modalidade de dispensa total de taxa de justiça e demais encargos com o processo.
Registe e notifique.”
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A Autora AA, inconformada com tal sentença, veio, a fls. 162 e seguintes, interpor recurso da mesma, que foi admitido a fls. 196 dos autos, como de Apelação, a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
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A Apelante apresentou, a fls. 179 e seguintes, alegações de recurso, onde, para além de arguir a nulidade da sentença, formulou as seguintes conclusões:
(…)
*
A Ré apresentou contra-alegações dentro do prazo legal, na sequência da respetiva notificação, tendo respondido à nulidade de sentença arguida pela Autora, requerido, ao abrigo do disposto no artigo 684.-A, número 2, do Código de Processo Civil, a ampliação do objeto do recurso da trabalhadora e formulado as seguintes conclusões (fls. 240 e seguintes): 
(…)
*
A Ré interpôs igualmente recurso subordinado, conforme fls. 239 e 264 a 271, tendo formulado as seguintes conclusões:
(…)
*
Tendo os autos ido aos vistos, cumpre apreciar e decidir.
                
II – OS FACTOS

O tribunal da 1.ª instância considerou provados os seguintes factos:
 
1. Em 7 de Abril de 2009 a Ré (na qualidade de 1.ª outorgante) e a Autora (na qualidade de segundo outorgante) subscreveram o escrito particular junto aos autos a fls. 31 a 33, e que aqui se dá por integralmente reproduzido, o qual denominaram de “Contrato de Trabalho a Termo Certo”.
2. Constam do referido escrito particular as seguintes cláusulas:
«Primeira: 1. O primeiro Outorgante admite ao seu serviço o segundo Outorgante, com a categoria profissional de caixeiro, a fim de desempenhar as funções daquela categoria, ou quaisquer outras, desde que compatíveis com a sua qualificação profissional. 2. O segundo Outorgante é admitido com a categoria profissional de Caixeira Ajudante 1.º Ano.(…)
Quinta: 1. O presente contrato é celebrado pelo período de 6 meses, com início em 08.04.2009 e termo em 07.10.2009. 2. O presente contrato caduca no termo do prazo estipulado desde que, para o efeito, o Primeiro Outorgante comunique tal facto ao Segundo Outorgante, por escrito e com 15 (quinze) dias de antecedência. 3. Na falta da comunicação referida na alínea anterior, considera-se que o contrato se renovou por prazo idêntico. (…)
Sexta: O presente contrato é celebrado ao abrigo da alínea b) do n.º 4 do artigo 140.º do regime anexo à Lei n.º 7/2009 de 12.02, tendo concretamente por fundamento a contratação de trabalhadores em situação de desemprego de longa duração.
Dois – Para efeito do disposto no número anterior o Segundo Outorgante declara que se encontra em situação de desempregada de longa duração e inscrita no centro de emprego da área de residência. (…)»
3. Quando o referido escrito particular foi subscrito pelas partes, a Autora entregou à Ré o documento junto aos autos a fls. 137 que consiste na cópia do «Extrato dos dados registados – Alteração/Correção» que a Segurança Social remeteu à Autora com data de 30.05.2008 e onde constam a sua identificação, designadamente, nome, data de nascimento, número de identificação fiscal e da segurança Social, nacionalidade, naturalidade e morada, bem como um «extrato de remunerações» igualmente emitido pela Segurança Social, de data e teor desconhecidos.                                
4. A Autora exerceu as suas funções, sob as ordens, direção e fiscalização da Ré, na loja sita no Centro Comercial C... e, posteriormente, na loja sita no Centro Comercial A... ....
5. Foi acordado entre as partes um horário rotativo semanal, de acordo com escalas de serviço (turnos) elaboradas pela Ré, distribuído da seguinte forma alternada:
1.º Período: das 10 horas às 17 horas e 30 minutos;
(na semana seguinte prestava trabalho no)
2.º Período: das 13 horas e 30 minutos às 21 horas;
(na semana seguinte prestava trabalho no)
3.º Período: das 16 horas e 30 minutos às 24 horas.
6. De modo a perfazer um período normal de trabalho de 40 horas semanais.
7. A Autora auferia, como contrapartida do seu trabalho, a quantia mensal de € 450,00 a título de remuneração base, acrescido de um subsídio de alimentação no montante diário de € 4,68.
8. Auferia também a quantia mensal de € 90,00 a título de subsídio de turno.
9. E ainda, mensalmente, quantia variável a título de subsídio noturno, quando trabalhava depois das 20 horas.
10. A Autora realizou, por ordem e no interesse da Ré, trabalho suplementar.
11. Designadamente em dias feriados - 10, 12 e 25 de Abril, 1 de Maio, 10 e 11 de Junho e 15 de Agosto - e algumas horas para além do seu horário de trabalho, em Julho e Setembro.
12. Tendo auferindo, em contrapartida desse trabalho suplementar, os montantes melhor discriminados nas cópias de recibos juntos aos autos a fls. 36 a 40, a título de «hora extra 100% (100%)».
12-A - A Ré não entregou à Autora a quantia de 73,77 € a título de parte da contrapartida do trabalho suplementar pela mesma prestado durante os meses de Abril, Maio, Junho, Julho e Agosto de 2009, não tendo igualmente lhe entregue o montante de € 68,77, correspondente ao descanso compensatório não gozado e relativo a esse mesmo trabalho suplementar.    
13. Em data que não foi possível apurar, a Ré informou a Autora de que pretendia encerrar a loja onde esta prestava as suas funções, sita no Centro Comercial A... ....
14. O que não chegou a fazer.
15. No dia 21 de Setembro de 2009, a Autora recebeu uma carta enviada pela Ré, datada de 18 de Setembro de 2009, com o seguinte teor:
«Assunto: Comunicação de não renovação do contrato de trabalho a termo certo
Exma. Senhora,
A BB, LDA., contribuinte fiscal n.º (…) vem pela presente comunicar a V. Exa que não pretende renovar o Contrato de Trabalho a termo Certo que mantém com V. Exa desde o dia 8 de Abril de 2009, e que terminará no próximo dia 7 de Outubro de 2009, por já não existir o acréscimo de trabalho que era previsível haver na data do contrato.
Com os melhores cumprimentos (…)»
16. A Autora trabalhou para a empresa “CC, LDA” de Junho a Novembro de 2008.
17. A Autora ficou grávida de gémeos em Agosto de 2009.
18. A Ré teve ao seu serviço, entre outras, as seguintes trabalhadoras: DD (de 26.10.2009 a 14.08.2010), EE (de 09.10.2009 a 08.10.2010) e FF (de 09.10.2009 a 27.08.2010).
19. A Autora não gozou o descanso compensatório relativamente ao trabalho suplementar mencionado em 11.
20. A Autora não gozou 12 (doze) dias de férias.
21. Terminado o contrato de trabalho que a unia à Ré, a Autora ficou desempregada, passando a fazer face à sua subsistência apenas com o ordenado do companheiro e a ajuda de terceiros.
22. Sentindo uma grande instabilidade emocional por força dessa situação e por se encontrar grávida de gémeos.

Factos não Provados
(…)
NOTA: A Matéria de Facto acima transcrita já contém, devidamente assinalada a negrito, as alterações à mesma introduzidas por este Tribunal da Relação de Lisboa em sede da Impugnação da Decisão sobre a Matéria de Facto  (Pontos 3. e12-A.)   
*
III – OS FACTOS E O DIREITO

É pelas conclusões do recurso que se delimita o seu âmbito de cognição, nos termos do disposto nos artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e 685.º-A e 684.º n.º 3, ambos do Código de Processo Civil, salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 660.º n.º 2 do Código de Processo Civil).
*
A – REGIME ADJECTIVO E SUBSTANTIVO APLICÁVEIS

Importa, antes de mais, definir o regime processual aplicável aos presentes autos, atendendo à circunstância da presente ação ter dado entrada em tribunal em 31/12/2009, ou seja, antes da entrada em vigor das alterações introduzidas no Código do Processo do Trabalho pelo Decreto-Lei n.º 295/2009, de 13/10, que segundo o seu artigo 6.º, só se aplicam às ações que se iniciem após a sua entrada em vigor, tendo tal acontecido, de acordo com o artigo 9.º do mesmo diploma legal, em 1/01/2010.
Esta ação, para efeitos de aplicação supletiva do regime adjetivo comum, foi instaurada depois da entrada em vigor (que ocorreu no dia 1/1/2008) das alterações introduzidas no Código de Processo Civil pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24/08, e que só se aplicaram aos processos instaurados a partir de 01/1/2008 (artigos 12.º e 11.º do aludido diploma legal) bem como da produção de efeitos das mais recentes alterações trazidas a público pelo Decreto-Lei n.º 226/2008, de 20/11 e parcialmente em vigor desde 31/03/2009, com algumas exceções que não tem relevância na economia dos presentes autos (artigos 22.º e 23.º desse texto legal), mas esse regime, centrado, essencialmente, na ação executiva, pouca ou nenhuma relevância tem, de qualquer maneira, para a economia deste processo judicial.        
Será, portanto, de acordo com o regime legal decorrente do anterior Código do Processo do Trabalho e da reforma do processo civil de 2007 e dos diplomas entretanto publicados e com produção de efeitos até ao dia da instauração dos presentes autos, que iremos apreciar as diversas questões suscitadas neste recurso de apelação.
Também se irá considerar, em termos de custas devidas no processo, o Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26/02, retificado pela Declaração de Retificação n.º 22/2008, de 24 de Abril e alterado pelas Lei n.º 43/2008, de 27-08, Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28-08, Lei n.º 64-A/2008, de 31-12 e Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, que entrou em vigor no dia 20 de Abril de 2009 e só se aplica a processos instaurados após essa data.  
Importa, finalmente, atentar na circunstância dos factos que se discutem no quadro destes autos terem ocorrido na vigência do Código do Trabalho de 2009, que entrou em vigor em 17/02/2009, sendo, portanto, o regime deste derivado que aqui irá ser chamado à colação.    

B - NULIDADE DA SENTENÇA

A Recorrente veio nas suas alegações arguir a nulidade da saneador/sentença que se mostra vertida no número 1, alínea d) do Código de Processo Civil (“É nula a sentença: d) Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”), convindo ainda visitar os artigos 264.º, número 2 e 660.º, número 2, do mesmo texto legal, quando, respetivamente, estatuem que “O juiz só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes, sem prejuízo do disposto nos artigos 514.º e 665.º e da consideração, mesmo oficiosa, dos factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa” e “O juiz deve resolver todas as questões que nas partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se ali lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”.
 Chegados aqui, impõe-se, desde logo e antes de mais, atentar na regra especial, de índole formal, que, no quadro do direito processual laboralista, vigora nesta matéria e que se acha contida no número 1 do artigo 77.º do Código de Processo de Trabalho:   

Artigo 77.º
Arguição de nulidades da sentença
1 – A arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso.
2 – (…)

Ora, se compulsarmos as alegações de recurso da Apelante verificamos que a mesma dá cumprimento integral a tal exigência legal específica do regime adjetivo juslaboralista, pois invoca, de forma autónoma, no quadro do requerimento de interposição do recurso, a irregularidade em questão, vindo depois resumir tal arguição nas primeiras conclusões das alegações de recurso propriamente ditas, nos seguintes termos:
«O presente recurso é ainda desencadeado pelo facto de no entender da Recorrente, o Tribunal a quo não ter apreciado devidamente questões que lhe foram submetidas ao longo da causa de pedir e dos pedidos formulados por aquela, omitindo a sua pronúncia em relação às mesmas, originando consequentemente a nulidade da sentença.
Nestes termos e em cumprimento ao que obrigatoriamente estabelece o referido art.º 77.º, n.º 1, do CPT, vem a Recorrente arguir a nulidade da sentença apresentando em síntese as seguintes motivações:
Em conformidade com a lei, o juiz tem de conhecer de todas as questões que lhe são submetidas: pedidos formulados, causas de pedir invocadas e exceções, arguidas ou de que deva conhecer oficiosamente.
Ao longo da causa de pedir a Recorrente invoca nos artigos 8.º a 11.º; 89.º a 95.º da P.I o conveniente pagamento das horas suplementares prestadas de acordo com a compensação horária que serve de base de cálculo do trabalho suplementar, e que é apurada segundo a fórmula prevista no artigo 271.º do C.T de 2009, peticionando por conseguinte o pagamento dos remanescentes devidos nas quantias auferidas a esse título.
Mais, a Recorrente invoca ainda nos artigos 87.º, 88.º, 99.º a 111.º da P.I, a regularidade e a periodicidade (entre outros) da realização de trabalho suplementar prestado ao longo do vínculo laboral, peticionando por conseguinte, no que aqui diz respeito, a inclusão dos acréscimos devidos pela prestação de trabalho suplementar (valores médios dessa prestação) na respetiva remuneração de férias, respetivo subsidio de férias e de natal ao longo do vínculo laboral e na remuneração devida nos doze dias de férias não gozados pela Autora.
Elementos consignados simultaneamente nos pedidos formulados, designadamente nas alíneas e) e g) do pedido formulado na P.I.
As supracitadas questões não foram devidamente apreciadas quando existia juntos aos autos elementos factuais suficientes que as sustentavam,
Desde logo, a própria Ré no seu articulado dá por assente a factualidade mencionada pela Autora referente ao pagamento dos remanescentes devidos nas quantias auferidas a titulo de trabalho suplementar prestado, reconhecendo assim como devida a esse título a quantia peticionada pela A. no valor de € 73,77, cfr. melhor evidencia os artigos 5.º, 63.º da sua contestação e ponto 3.º 1.ª parte, do requerido na parte final dessa peça processual.
Por outro lado, pelo teor dos recibos de vencimento que foram juntos como Docs. n.ºs 2 a 8 à Petição Inicial, e que se encontram juntos aos autos, pode-se verificar uma prestação regular e periódica de trabalho suplementar, pois em todos os meses do vínculo laboral, a Autora foi remunerada a título de “hora extra”,
Aliás como resulta dos factos dados como provados, (vide pontos 10,11,12 dos factos provados inseridos no teor da douta sentença)
Factos estes que poderiam influir na decisão da causa relativamente à mencionada matéria, pois suficientes para que tais prestações se possam integrar na retribuição da Autora, atenta à disposição do artigo 258.º do C.T/2009.
Não obstante tal, o Tribunal a quo, não condenou a Ré no supra peticionado pela Autora, não esclarecendo sequer os motivos da não pronúncia sobre tal, bem como nada tendo sido invocado para fundamentar a conduta omissa não obstante na obrigação de julgar se impor procedimento diferente.
Porquanto a decisão de tais questões também submetidas pela Autora à apreciação do julgador, não estavam prejudicadas pela solução dada a outras, pois, como se referiu, tratava-se de analisar questões relativas ao processamento correto de remunerações - remanescentes devidos nas quantias auferidas pela Autora a título de trabalho suplementar (de acordo com a compensação horária que serve de base de cálculo do trabalho suplementar, e que é apurada segundo a fórmula prevista no artigo 271.º do C.T de 2009) - e - remanescentes nas retribuições de férias, subsídio de férias e de natal e pagamento da remuneração referente a doze dias de férias de 2009 vencidas e não gozadas, com a inclusão das prestações complementares a titulo de trabalho suplementar, atenta a regularidade e periodicidade com que foi prestado,
Constituindo questões que não estariam de modo algum prejudicadas pela solução que o Tribunal adotou referente à questão do trabalho suplementar (pagamento a esse título efetuado pela Ré) e de não reconhecer a cessação ilícita do contrato por parte da Ré e respetivas consequências (demais créditos laborais devidos pelo despedimento ilícito).
O não conhecimento de qualquer das questões submetidas à apreciação pelo Tribunal a quo, constitui nulidade, cfr. dispõe o artigo 668.º, n.º 1 alínea d) do CPC; cuja arguição aqui se submete.»
A Apelada respondeu a tal nulidade nos moldes que constam de fls. 240 a 243, tendo-se oposto à mesma e pugnado pela sua improcedência.       
Acerca do vício de natureza formal que deixámos enunciado, convirá ouvir Fernando Amâncio Ferreira, em “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 6.ª Edição, Almedina, páginas 54 e 55, quando afirma o seguinte:
“À omissão de pronúncia alude a 1.ª parte da alínea d) do número 1 do artigo 668.º e traduz-se na circunstância de o juiz se não pronunciar sobre questões que devesse apreciar, ante o estatuído na 1.ª parte do número 2 do artigo 660.º.
Trata-se da nulidade mais invocada nos tribunais, originada na confusão que se estabelece com frequência entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos no decurso da demanda (…)”.
Será conveniente chamar aqui à colação o disposto no artigo 664.º do Código de Processo Civil, quando determina que “o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito; mas só pode servir-se dos factos articulados pelas partes, sem prejuízo do disposto no artigo 264.º.”
O Prof. Alberto dos Reis, na obra citada, página 453 refere que “(…) O Juiz pode ir buscar regras diferentes daquelas que as partes invocaram; pode atribuir às regras invocadas pelas partes sentido diferente do que estas lhe deram; pode fazer derivar das regras de que as partes se serviram efeitos e consequências diversas das que estas tiraram …”, defendendo, por seu turno, João de Castro Mendes, em “Direito Processual Civil”, Volume I, Edição da AAFDL, 1980, págs. 218 e seguintes que «Estabelece-se que o Juiz não está sujeito à vontade das partes quanto às soluções de direito (art.º 664.º). Isto porque, em princípio, se pretende que a solução dada à hipótese presente ao Tribunal seja a realmente verdadeira (princípio da verdade material) e não apenas aquela que se justifica em face da maneira como decorreu o processo (princípio da verdade formal). Neste campo o Juiz só é limitado pela lei, não pela vontade das partes».
Importa por, outro lado, lembrar que as questões a que alude a transcrita alínea d) do número 1 do art.º 668.º do Código de Processo Civil são as concernentes ao pedido e à causa de pedir que suportam a demanda judicial e não a todas e cada uma das razões, fundamentos, motivações ou meios de prova apresentados pelas partes ao longo da tramitação dos autos, defendendo, a este propósito, o Professor Lebre de Freitas, na obra citada, página 670 que o juiz deve “ (…) conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e de todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer, …, não podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de exceções na exclusiva disponibilidade das partes…”, ao passo que o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11.01.2000, publicado no BMJ n.º 493.º, páginas 385 e seguintes, “… Questões para este efeito são, desde logo, as que se prendem com o pedido e a causa de pedir. São, em primeiro lugar, todas as pretensões formuladas pelas partes, que requerem decisão do juiz, qualquer que seja a forma como são deduzidas (pedidos, exceções, reconvenção) …”.
Chegados aqui e depois de compulsada a sentença recorrida, consta-se o seguinte acerca da matéria suscitada pelo Apelante:
«No que respeita ao trabalho suplementar, realizado e alegadamente não pago, a Autora não logrou fazer prova do mesmo, como lhe competia (artigo 342.º n.º 1 do Cód. Civil), sendo certo que relativamente ao trabalho suplementar prestado e descrito sob o facto provado n.º 11, a Ré procedeu ao pagamento devido – cfr. facto provado sob o n.º 14. Improcede, pois, nesta parte, o pedido formulado.
No que respeita ao descanso compensatório, o mesmo é devido – cfr. facto provado sob o n.º 19, tal como são devidos os doze dias de férias não gozados – cfr. facto provado sob n.º 20.
Relativamente ao descanso compensatório e às férias não gozadas, o valor devido pela Ré à Autora tem de considerar o montante por esta auferido e melhor descrito nos factos provados sob os n.ºs 7 e 8.
Com efeito, o montante de retribuição a considerar, para este efeito, é o resultante da soma da remuneração-base e das quantias auferidas a título de subsídio de turno, posto que se tratavam de valores auferidos pela autora de forma regular e periódica e, consequentemente, integram o conceito de retribuição.
No que respeita ao subsídio noturno, pese embora o mesmo só fosse recebido quando a autora prestava trabalho depois das 20 horas (cfr. facto provado sob o n.º 9.), a verdade é que, por força do horário de trabalho da autora, distribuído de forma alternada (cfr. facto provado sob o n.º 5), era igualmente auferido de forma regular e periódica, razão pela qual também tem de integrar o conceito de retribuição.
Pelas mesmas razões, tem de se julgar procedente o pedido de pagamento das diferenças respeitantes a férias e subsídio de férias e de natal, posto que, ainda que a atribuição de tais prestações pecuniárias se tenha ficado a dever a determinadas condições especiais da prestação de trabalho, enquanto as mesmas se mantivessem, deveriam ter sido consideradas como parte integrante da retribuição (para efeitos de determinação da mencionada remuneração de férias e subsídio de férias e de Natal).»
Se confrontarmos esta vertente da fundamentação da decisão impugnada, bem como a sua parte decisória, com as pretensões formuladas pela Autora e correspondentes causas de pedir, constata-se que inexiste qualquer omissão de pronúncia quanto à inclusão ou não da retribuição média paga a título de trabalho suplementar nas remunerações das férias, correspondente subsídio e subsídio de Natal, dado a decisão em questão, ainda que de uma forma implícita, excluir tal realidade das prestações auferidas pela Autora e que deverão ser consideradas para aquele preciso efeito (cf. fls. 164., que se acha acima reproduzida, nos seus três últimos parágrafos).
Também o mesmo se pode dizer, com rigor e certeza, relativamente à outra problemática suscitada pela recorrente, pois a sentença em análise, ainda que de uma forma muito sintética (primeiro parágrafo do excerto acima reproduzido), parece abordar a questão das diferenças salariais referentes ao trabalho suplementar liquidado pela Ré à trabalhadora.             
Logo, pelos motivos expostos, tem a nulidade de sentença em questão de ser julgada totalmente improcedente.    

C – IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
(…)

D – OBJECTO DO RECURSO DA AUTORA - MATÉRIA DE DIREITO

As questões de índole jurídica que se suscitam no âmbito do recurso de Apelação interposto pela Autora são as seguintes:
1) A de saber se o motivo justificativo do contrato de trabalho a termo certo celebrado entre a Autora e a Ré e que se acha juntos aos autos se mostra conforme as exigências legais que ressaltam dos artigos 140.º, números 4, alínea b) e 5, 141.º, números 1, alínea e) e 3 e 147.º, número 1, alíneas b), c) do Código do Trabalho de 2009;
2) Caducidade ou despedimento ilícito;
3) Trabalho suplementar (diferenças salariais);
4) Integração da média da remuneração do trabalho suplementar nas retribuições das férias, correspondente subsídio e subsídio de Natal.
    
D1 - SENTENÇA RECORRIDA

A decisão impugnada, acerca da validade jurídica do motivo invocados pela Ré para a aposição do prazo de 6 meses ao contrato de trabalho a termo certo dos autos, desenvolveu a seguinte argumentação jurídica:
«Sustenta a Autora que o contrato celebrado com a Ré não apresenta um motivo justificativo válido para a sua celebração a termo, uma vez que no contrato outorgado pelas partes não constam concretamente referidos os factos e circunstâncias que integram o motivo justificativo da aposição do termo, limitando-se a Ré a fazer alusão, em abstrato, a uma das situações fixadas no artigo 140.º do Cód. Trabalho («contratação de trabalhadores em situação de desemprego de longa duração»), o que não basta. Mais alegou que não consta do contrato há quanto tempo estaria a Autora desempregada, sendo que, in casu, a Autora tinha cessado a sua atividade com a anterior entidade empregadora em Novembro de 2008. Mais alega que a invocada diminuição de atividade também não corresponde à verdade, porquanto a Ré contratou outras trabalhadoras para ocupar o lugar da Autora, donde conclui que a atividade exercida pela autora correspondia a uma necessidade contínua da Ré.
Contrapõe a Ré sustentando a veracidade do motivo e que fez fé no documento da Segurança Social apresentado pela Autora. Mais alegou que a Autora não foi contratada para substituir qualquer trabalhadora nem a Ré contratou outras trabalhadoras nos 30 dias subsequentes à cessão do contrato de trabalho que unia as partes.
Apreciando.
Os contratos de trabalho são, em regra, celebrados por tempo indeterminado, em respeito ao princípio constitucionalmente consagrado de segurança (e estabilidade) no emprego, garantes do sustento e dignidade do trabalhador (e sua família).
Contudo, é admissível, sempre a nível excecional, o contrato de trabalho a termo, desde que respeitados os limites plasmados no artigo 140.º do Cód. Trabalho onde se concretizavam as situações em que é lícito ao empregador lançar mão de um vínculo laboral precário.
Nos termos deste preceito legal devem distinguir-se duas situações, a saber, os casos de contratação a termo com uma motivação de gestão normal ou corrente (artigo 140.º n.ºs 1 e 2 quanto aos contratos a termo certo e 140.º n.º 3 quanto aos contrato a termo incerto) e os casos de contratação a termo com uma motivação de iniciativa económica e com uma motivação social (artigo 140.º n.º 4, alíneas a) e b), respetivamente).
Especificamente, no que respeita aos contratos a termo certo com motivação social como é o caso da contratação de trabalhadores em situação de desemprego de longa duração (cfr. artigo 140.º n.º 4, al. b)), o contrato de trabalho a termo funciona como “instrumento de prossecução de políticas sociais, no caso para favorecer a integração no mercado de trabalho de pessoas com dificuldades acrescidas de colocação” sendo que, “como decorre expressamente do corpo do n.º 4 do artigo 140.º, o contrato não depende dos requisitos constantes da cláusula geral do n.º 1 do mesmo artigo, o que significa que estes trabalhadores podem ser contratados para a satisfação de necessidades permanentes da empresa”[1].
Como dispõe o artigo 3.º do Dec. Lei n.º 34/96 de 18 de Abril, é desempregado de longa duração o trabalhador que não tem emprego e se encontra inscrito num centro de emprego há mais de doze meses.
Deve ser considerado sem termo o contrato de trabalho que, contendo uma motivação contemplada na Lei, não tenha “qualquer correspondência com a realidade, tendo sido celebrado com essa justificação única e simplesmente para iludir as disposições legais que regulam o contrato sem prazo e impedir a integração do trabalhador nos quadros da empresa”[2].
É sobre o trabalhador que recai o ónus de prova do cometimento de um vício (no caso em apreço, a falsidade do motivo justificativo) determinante da nulidade dos contratos celebrados; sobre o empregador recai o ónus da prova da justificação do termo[3].
No caso em apreço, o “contrato de trabalho a termo” outorgado entre a Autora e a Ré tinha a seguinte cláusula de justificação do termo: «Sexta: O presente contrato é celebrado ao abrigo da alínea b) do n.º 4 do artigo 140.º do regime anexo à Lei n.º 7/2009 de 12.02, tendo concretamente por fundamento a contratação de trabalhadores em situação de desemprego de longa duração. Dois – Para efeito do disposto no número anterior o Segundo Outorgante declara que se encontra em situação de desempregada de longa duração e inscrita no centro de emprego da área de residência (…)»
Relativamente à justificação aposta no contrato em análise, verifica-se que a fórmula utilizada é suficientemente concretizadora atenta, designadamente, a especificação de consta do número dois da cláusula sexta, não se vislumbrando necessidade de ser mais concretizada para se poder apreciar da veracidade do motivo invocado.
Com efeito, a obrigatoriedade de indicar a razão justificativa do termo visa prevenir eventuais divergências entre as partes, permitir o exercício da atividade fiscalizadora e visa ainda permitir que o trabalhador fique esclarecido sobre as razões que determinaram a precariedade do seu emprego, dando-lhe a possibilidade de aferir da validade das mesmas e de as discutir em juízo.[4]
Ora, no caso em apreço não se vislumbra que tais pressupostos não se mostrem verificados.
Acresce que é a própria Autora que declara que se encontra em situação de desempregada de longa duração, não se vislumbrando base legal que exija à Ré necessidade de indagar se a declaração é verídica ou não, sendo certo que a Ré presumiu que sim, atento o documento que a própria Autora lhe apresentou, melhor descrito no facto provado sob o n.º 3. Por esta razão, concorda-se que o facto de a declaração da Autora não corresponder à verdade não pode ser por esta invocado, sob pena de abuso de direito, por «venire contra factum proprium», nos termos do artigo 334.º do Cód. Civil.
Por outro lado, quaisquer considerações relativas ao facto de, alegadamente, a Autora ter sido contratada para substituir uma outra trabalhadora, ou outras trabalhadoras tenham sido contratadas, depois da Autora, para exercer as mesmas funções que ela exercia, são irrelevantes, uma vez que não são aplicáveis, in casu, os requisitos constantes da cláusula geral do n.º 1 do mesmo artigo; ou seja, os trabalhadores contratados em situação de desemprego de longa duração podem ser contratados para a satisfação de necessidades permanentes da empresa.
A verdade é que a Ré não tinha, no caso em concreto, que invocar razões para não renovar o contrato de trabalho que a unia à Autora, donde a alegada necessidade permanente de quem exercesse as funções que eram exercidas pela Autora (que não ficou demonstrada), ou o não encerramento da loja onde a mesma exercia funções, também são irrelevantes e não procedem.
Finalmente, a Autora não logrou demonstrar que a não renovação do seu contrato de trabalho se deveu ao facto de se encontrar grávida; mais, a Autora nem sequer demonstrou que a Ré tivesse conhecimento de tal facto quando enviou a comunicação melhor descrita no facto provado sob o n.º 15.
Entende, assim, este Tribunal, por um lado, que a justificação apresentada satisfaz a exigência legal. Por outro, e dado que foi a própria Autora quem declarou que se encontrava na situação de desempregada de longa duração (sem que tenha provado que se não subscrevesse o contrato naqueles termos a Ré não a deixaria trabalhar), entende-se que a falsidade do motivo apenas lhe pode ser imputável e, nessa medida, não pode invocar essa falsidade sob pena de abuso de direito.
Face ao supra exposto, considera-se válida a estipulação do termo no contrato celebrado entre as partes em 07.04.2009 e, em consequência, e porque a declaração de não renovação do mesmo preenche todos os requisitos de forma exigidos por lei, conclui-se que o referido contrato de trabalho caducou em 07.10.2009.
Assim, não estão preenchidos os pressupostos legais para se poder afirmar que a Ré despediu a Autora ilicitamente e, em consequência, são improcedentes os pedidos da Autora de receber as quantias correspondentes às remunerações vencidas e vincendas, à indemnização ou de ser reintegrado e, ainda, o de condenação da Ré em sanção compulsória.
Do mesmo modo, e porque não existe qualquer comportamento ilícito por parte da Ré, improcede igualmente o pedido de indemnização por danos morais.»

D2 - CONTRATO DE TRABALHO A TERMO CERTO - VALIDADE FORMAL E MATERIAL DO TERMO APOSTO

O contrato de trabalho a termo certo dos autos, por ter sido celebrado no dia 07/04/2009, ou seja, depois da entrada em vigor do Código do Trabalho de 2009, tem o seu quadro normativo legitimador e regulador vertido, em primeira linha, no seu próprio clausulado e, depois, nos artigos 139.º a 149.º, 343.º a 345.º, 348.º e 393.º do referido diploma legal.
Tornando-se talvez fastidioso transcrever aqui todas as disposições legais acima indicadas, julgamos, contudo, importante, fazer uma rápida resenha pelos requisitos de natureza formal e material de que o aludido regime legal fazia depender a validade e eficácia jurídicas do contrato de trabalho a termo certo e que eram os seguintes:
- Celebração por escrito, devendo do mesmo constar expressamente o “termo estipulado e do respetivo motivo justificativo”, sob pena de ser considerado contrato sem termo;
- Por prazo igual ou superior a 6 meses, exceto em situações excecionais previstas legalmente;
- Para acorrer às situações taxativamente contempladas nos números 2, 3 e 4 do artigo 140.º, sob pena da nulidade da estipulação do termo;
- Não podendo ultrapassar, consoante os casos, 18 meses, 2 anos ou três anos consecutivos e as três renovações, sob pena de conversão em contrato sem termo;
- Caducando mediante comunicação escrita do empregador com a antecedência mínima de 15 dias antes do termo do prazo ou da sua renovação.
Perante este quadro legal - dizendo ainda o número 3 do artigo 141.º que a indicação do motivo justificativo do termo deve ser feita com menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado -, o que dizer face ao contrato de fls. 31 e 32 e do qual consta, como cláusula 6.ª, que “Sexta: O presente contrato é celebrado ao abrigo da alínea b) do n.º 4 do artigo 140.º do regime anexo à Lei n.º 7/2009 de 12.02, tendo concretamente por fundamento a contratação de trabalhadores em situação de desemprego de longa duração. Dois – Para efeito do disposto no número anterior o Segundo Outorgante declara que se encontra em situação de desempregada de longa duração e inscrita no centro de emprego da área de residência.”?
O Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28/10/992, em CJ, 1992, Tomo IV, pág. 221, sustentava, no quadro do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27/02, que, nos contratos de trabalho a termo, a indicação dos motivos da contratação pode ser mais ou menos circunstanciada, mas não satisfaz a mera remissão para um dado preceito legal, dizendo o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 8/11/94, em CJ, 1994, Tomo V, págs. 298 e segs. que, sendo mencionadas tarefas ocasionais a executar, é preciso identificá-las, pois, caso contrário, o contrato passa a contrato sem termo. 
Se confrontarmos o teor da referida cláusula contratual com o da alínea b) do número 4 do artigo 140.º do Código do Trabalho de 2009, verificamos que a Apelante no seu número 1 se limitou a transcrever tal regra, tendo depois no seu número 2 procurado enquadrar e circunstanciar o fundamento alegado para a aposição do termo de 6 meses, restando-nos saber se o seu conteúdo se revela suficientemente concretizado, de maneira a satisfazer as exigências do legislador nesta matéria.
O fundamento justificativo da aposição do termo neste tipo negocial não pode limitar-se a transcrever secamente uma das alíneas dos números 2 a 4 do artigo 140.º do atual Código do Trabalho, sob pena de o mesmo se converter em contrato por tempo indeterminado - artigo 147.º, número 1, alínea c) do mesmo diploma legal - mas também não pode ser tão vago e indefinido que impeça o trabalhador e, depois, a ACT e o tribunal de trabalho, de compreender e fiscalizar, devida e efetivamente, as razões em que se radica a necessidade de firmar um tal contrato, o que não significa que o empregador se encontre obrigado a escrever e a descrever o motivo explicativo com o máximo de detalhe ou pormenor que, materialmente, lhe for possível.
Basta-lhe fazê-lo de maneira a que se ache suficientemente definida e percetível a situação de facto real e concreta que reclama a celebração do contrato de trabalho a termo certo em questão, possibilitando, dessa forma, a um qualquer declaratário colocado na mesma posição do trabalhador, a exata e objetiva compreensão do motivo invocado pela entidade patronal.
Embora admitindo uma maior exigência formal e material no que concerne à motivação dos contratos de trabalho a termo certo ou incerto radicada em qualquer um das alíneas do número 2 do artigo 140.º do que nas hipóteses do seu número 4 - até por referência à regra geral do seu número 1, que ali, ao contrário das situações contempladas nesse número 4, lhe serve também de pressuposto necessário -, seguro é que relativamente a qualquer uma delas, ainda que com as devidas adaptações, funciona a indicada imposição de índole forma e material contida no número 3 do artigo 141.º. [5]
Será que o legislador, para dar cumprimento a tal norma, se satisfaz com a mera remissão para a alínea correspondente, complementada depois com uma declaração do trabalhador, em que este assume a referida qualidade de desempregado de longa duração?      
Pensamos sinceramente que não![6]
Julgamos que, no mínimo, o empregador tem de averiguar, confirmar e referir na cláusula em questão as circunstâncias particulares do trabalhador contratado a termo (designadamente, por documentação que este lhe entregue e que, ficando em poder da entidade patronal e anexa ao contrato escrito, comprove a dita qualidade), de maneira a qualquer declaratário normal, colocado na posição do trabalhador, do inspetor da ACT ou do julgador, ficar a saber as condições concretas em que o primeiro foi admitido e confrontá-las com o fundamento legal abstrato que foi invocado para tal.
Sendo assim, para que uma cláusula como a dos autos tenha uma correspondência mínima, quer formal como substancial, com a letra e o espírito da lei, deverá especificar que o trabalhador x, tem a situação de desempregado de longa duração por já não desempenhar funções remuneradas desde o dia y ou, pelo menos, há mais de doze meses[7], não nos parecendo necessário qualquer menção à inscrição no Centro de Emprego, dado a sua irrelevância em sede do direito do trabalho e deste tipo negocial em particular[8].
Possuindo a noção de «desempregado de longa duração» uma índole essencialmente jurídica e que se busca em legislação de cariz não laboral, importa não ignorar que a mesma, segundo a Dr.ª Susana Sousa Machado, obra e local citados (cf. Nota 7), em nota de pé de página (472), deixou de ser unívoca, dado a Portaria n.º 130/2009, de 30/01, que entrou em vigor em 31/01/2009, no seu artigo 3.º, números 1, alínea c) e 2, definir aquele como o «que se encontra inscrito em centro de emprego há mais de nove meses», não sendo «a qualificação como desempregado de longa duração (…) prejudicada pela celebração de contratos a termo ou trabalho independente, por período inferior a 6 meses, cuja duração conjunta não ultrapasse os 12 meses.»[9]
Ora, concorrendo essa nova noção de «desempregado de longa duração» com a tradicional, quando as partes no contrato dos autos se limitam a referir que é essa a qualidade da Autora, querem referir-se exatamente a quê: ao conceito jurídico habitual ou ao acima enunciado?
Dir-se-á que tal dúvida é despicienda no caso dos autos porque, quer ao abrigo do primeiro, como do segundo, a Apelante não possui manifestamente tal estatuto, dado ter prestado serviço para a empresa CC, LDA durante seis meses, entre Junho e Novembro de 2008, não mediando mais de 12 ou 9 meses entre esta última data e o início do contrato dos autos (7/04/2009), tendo o vínculo laboral estabelecido (presumivelmente, com base num contrato de trabalho a termo certo) com aquela sociedade durado 6 meses.
Se tal conclusão é, na hipótese dos autos, absolutamente correta, não invalida minimamente o que temos vindo a defender em sede de motivação dos contratos de trabalho a termo certo firmados com referência a «desempregados de longa duração» (ou melhor dizendo, de trabalhadores em situação de desemprego de longa duração): não é irrelevante - e com mais nitidez, durante os últimos onze meses do ano de 2009 e os dois primeiros meses do ano de 2010 -, que se proceda à concretização do conceito em questão.      
A mera declaração de que se é um desempregado de longa duração - sem se preencher adicional e minimamente tal conceito com as características essenciais e pertinentes da situação laboral do trabalhador visado -, impossibilita este último, em muitos casos, (por não conhecer, de todo ou com exatidão a noção referida) de verificar se existe uma conformidade ou desconformidade entre o conceito jurídico e o cenário real e, nessa medida, de alertar o empregador para esse facto, de acordo com o disposto nos artigos 227.º do Código Civil e 102.º do Código do Trabalho de 2009.
Só se o trabalhador estiver na posse de todos os elementos pertinentes à exata compreensão do seu alegado estatuto de «desempregado de longa duração» é que se poderá falar depois e em tais circunstâncias em abuso de direito (artigo 334.º do Código Civil), caso o mesmo venha arguir a nulidade da dita cláusula por não haver correspondência entre a noção legal e a realidade subjacente.
O mesmo raciocínio pode ser feito relativamente à falta e vícios da vontade previstos nos artigos 240.º e seguintes do Código Civil, pois se o trabalhador estiver munido de todos os dados relevantes, mais dificilmente pode vir invocar e provar que foi intencionalmente enganado ou induzido em erro (ainda que não se ignore a dificuldade de prova de tais factos impeditivos, modificativos ou extintivos por parte daquele).
O cenário descrito também beneficia o empregador, pois se do texto do contrato constarem todos os dados fornecidos pelo trabalhador quanto à sua qualidade de «desempregado de longa duração», mais facilmente o mesmo alegará e demonstrará que foi enganado, por lhe ter sido falseada ou truncada a realidade exposta e demonstrada por aquele.                             
Convirá não olvidar também que a forma escrita do contrato de trabalho a termo, bem como a menção dos seus elementos essenciais, entre os quais se encontra o da indicação do motivo para a aposição do termo, possuem, inequivocamente, a natureza de formalidade “ad substantiam” (cf., quanto à distinção entre esse tipo de formalidades e aquelas qualificadas como “ad probationem”, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, 3.ª Edição Revista e Atualizada, 1982, páginas 321 e 322, em anotação ao artigo 364.º do Código Civil), dado o artigo 141.º, número 1, do Código do Trabalho fazer depender a validade do prazo aposto nos respetivos contratos de trabalho da utilização obrigatória da forma escrita para a sua celebração (ressalvadas as exceções dos contratos de muito curta duração, previstos nos artigos 142.º do Código do Trabalho e 10.º-A da Lei n.º 4/2008, de 7/02, e dos contratos a termo certo de 6 meses referidos no artigo 348.º do Código do Trabalho), conforme ressalta do artigo 147.º, número 1, alínea a) do mesmo diploma legal, quando estatui que “considera-se sem termo o contrato de trabalho (…) em que falte a redução a escrito...”.
Ora, tendo os referidos motivos de obrigatoriamente constar (e de forma suficientemente circunstanciada – artigo 147.º, número 1, alínea c) do Código do Trabalho) do documento onde se acha vertido o contrato de trabalho a termo, qualificando-se a sua inserção nele como uma formalidade “ad substantiam”, cuja falta ou insuficiência implicam a nulidade do termo aposto, pois não podem ser supridas por outro meio, que não seja a da sua efetiva existência formal (Pires de Lima e Antunes Varela, obra e local citados, afirmam que o “negócio é nulo, salvo se constar de documento de força probatória superior”, hipótese essa de muito difícil, senão mesmo nula, verificação no quadro do direito laboral), tal implica que, no âmbito de uma ação judicial e face ao que estatuem os artigos 141.º, número 1 e 147.º, número 1, alínea c) do Código do Trabalho e 364.º, número 1, 371.º, 372.º, 374.º, 376.º, 393.º, 394.º, 351.º, 388.º e 390.º do Código Civil, o empregador não possa vir demonstrar os motivos que o levaram a contratar a prazo aquele trabalhador, de maneira a sanar a sua falta e a obstar à nulidade daquele termo.
Impõe-se, finalmente, atentar na norma contida no número 5: «cabe ao empregador a prova dos factos que justificam a celebração de contrato de trabalho a termo».
Logo, o empregador que contrate um trabalhador que seja desempregado de longa duração está obrigado, caso seja necessário, quer face à ACT, quer perante o tribunal do trabalho, a demonstrar os factos em que se radica a celebração do contrato de trabalho a termo certo.
Importa esmiuçar este ónus de prova, para dizer que o mesmo recai sobre a entidade patronal e que, em nosso entender, não se preenche com uma aparência simplista e formal da realidade do motivo mas que visa mais longe e fundo, reclamando a realidade e veracidade do fundamento invocado, mesmo que se trate de um trabalhador à procura do primeiro emprego ou em situação de desemprego há mais de 12 meses.
Considerar suficiente uma mera declaração do trabalhador no sentido de ser um desempregado de longa duração, sem que o empregador esteja obrigado a um controlo mínimo acerca da substância da mesma, é transferir para aquele uma responsabilidade que a lei, em rigor, não lhe assaca, desonerando, nessa medida, a entidade patronal de qualquer atuação de carácter material e esvaziando a norma em análise de conteúdo, alcance e sentido.[10]            
 A conjugação desta norma com o regime anteriormente analisado consubstancia e reforça a necessidade de fazer verificar e constar do contrato o motivo circunstanciado para a sua celebração e aposição do termo, nos moldes acima perspetivados. 
Ora, chegados aqui e cruzando os factos dados como assentes e a documentação que os complementa com a interpretação jurídica dos preceitos legais aplicáveis que deixámos exposta, vislumbra-se que o contrato de trabalho a termo certo dos autos não concretiza suficientemente o motivo invocado, o que implica a nulidade da aposição do prazo em questão, não tendo a Ré, por outro lado, como lhe competia, nos termos do número 5 do artigo 140.º do Código do Trabalho de 2009, demonstrado a correspondência entre a concreta situação da Autora e o estatuto de «desempregado de longa duração» que lhe foi imputado no contrato dos autos e que esta formalmente reconheceu (em rigor, a trabalhadora demonstrou que não estava há mais de 12 ou 9 meses na situação de desempregada, o que afasta, inequivocamente, o aludido estatuto).
A Ré também não logrou provar factos suficientes à configuração de uma eventual situação de abuso de direito (ou de erro na formação da sua vontade, que, aliás, nem sequer invocou), pois ignora-se, desde logo, o teor do «extrato de remunerações» que lhe foi apresentado pela Autora no momento da celebração do contrato dos autos (e que poderia estar convenientemente incompleto, por forma a excluir a última contratação da Apelante, dessa maneira se pretendendo iludir a empregadora aqui recorrida, indiciando tal conduta a consciência por parte daquela do que estava verdadeiramente em jogo, na sua qualificação como «desempregada de longa duração»).                 
Logo, concluímos pela invalidade jurídica da cláusula do contrato de trabalho a termo certo de 07/04/2009, encarada em si e por si mesma, no que à sua suficiência formal do seu conteúdo respeita, bem como no que concerne à desconformidade material da qualificação da recorrente como «desempregada de longa duração» e a sua situação real e concreta.
Sendo assim, estamos face a um contrato de trabalho por tempo indeterminado, firmado entre a Autora e a Ré em 7/04/2009 e cessado, de forma ilícita, dado a caducidade invocada pela Apelada para o mesmo não constituir um meio legal de pôr um fim à relação laboral de índole permanente que emerge daquele negócio, configurando-se, por isso, como um despedimento informal e sem justa causa, porque não precedido do correspondente procedimento disciplinar, nem suportado em qualquer conduta culposa, ilícita e grave da trabalhadora (cfr. artigos 340.º, 344.º, 351.º a 358.º, 381.º, 382.º, 387.º, 389.º a 392.º do Código do Trabalho de 2009).           

D3 - CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO DESPEDIMENTO SEM JUSTA CAUSA

Ora, tendo considerado ilícito o referido despedimento, pelas razões expostas, impõe-se então chamar à colação o disposto nos artigos 389.º a 392.º do Código do Trabalho de 2009, que, relativamente à materialidade espelhada nos autos, se desdobra nos seguintes direitos:

- Artigo 389.º do Código do Trabalho

A Autora pede a reintegração na sua petição inicial, não tendo até à proferição da sentença da 1.ª instância optado pela indemnização em substituição da antiguidade prevista no artigo 391.º do Código do Trabalho de 2009, não podendo a recorrida, por seu turno, lançar mão do estatuído no artigo 392.º do mesmo diploma legal.
Logo, a Ré está obrigada a reintegrar a recorrente ao seu serviço, nos termos do artigo 389.º, número 1, alínea b) do Código do Trabalho de 2009.                        

- Artigo 390.º do Código do Trabalho 

A compensação referida nesta disposição legal reconduz-se às retribuições vencidas e vincendas entre a data do despedimento (que ocorreu em 07/10/2009 - cf. fls. 43 e 44 dos autos e Ponto 15.) e a data do trânsito em julgado deste Acórdão (pois foi ele que declarou ilícito o despedimento e condenou a Ré nas prestações previstas na lei), sendo certo que a presenta ação deu entrada em juízo no dia 31/12/2009 (2 meses e 24 dias após a cessação do contrato de trabalho).
Constata-se que a Apelante recebia a título de retribuição-base o montante de 450,00 Euros x 14 meses + 4,68 Euros x 22 dias a título de subsídio de refeição, ou seja, 102,96 Euros mensais x 11 meses + 90,00 €, a título de subsídio de turno x 13 meses (€ 1.170,00) + subsídio noturno, em montante variável x 13 meses, sendo que, no que respeita ao subsídio de Natal, só teria direito a auferir 450,00 Euros (artigos 262.º e 263.º do Código do Trabalho de 2009).
Logo, a Autora tem direito a perceber as remunerações vencidas entre 1/12/2009 (30 dias anteriores à data da propositura da ação) e 31/10/2012, data do presente Acórdão, tudo sem prejuízo das retribuições que se vencerão até ao trânsito em julgado do mesmo.
Importa não esquecer que a mesma já recebeu os proporcionais das férias, correspondente subsídio e subsídio de Natal, importando operar a correspondente dedução nos termos do artigo 390.º, número 2, alínea a) do Código do Trabalho (a dedução prevista na alínea b) do esmo dispositivo legal já se acha acima concretizada).       
O valor ainda por apurar do subsídio noturno impede-nos de dar integral cumprimento ao disposto no artigo 75.º do Código do Processo do Trabalho, relegando-se a quantificação da compensação prevista no número 1 do artigo 390.º do Código do Trabalho para incidente de liquidação, nos termos dos artigos 661.º, números 2 e 378.º e seguintes do Código de Processo Civil.    

D4 - SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA

Importa recordar que a Autora no seu petitório final formulou - sob a alínea i) no quadro do Relatório deste Aresto - a seguinte pretensão: “i) No pagamento de sanção pecuniária compulsória”, sustentando a mesma nos moldes constantes do artigo 114.º da sua petição inicial: «Deve também a Ré ser condenada no pagamento da sanção pecuniária compulsória à taxa diária de pelo menos 150 € por cada dia em que não se realize de modo total e perfeito a reintegração da Autora».   
Julgamos que é a sanção pecuniária compulsória prevista nos números 1 a 3 do artigo 829.º-A do Código Civil que tem que ser chamada a esta ação, por nos acharmos face ao incumprimento de uma prestação de facto infungível (reintegração, só possível de ser concretizada pela Ré).
Tal artigo 829.º-A, nos seus números 1 a 3, do Código Civil possui a seguinte redação, reproduzindo-se o restante número, por haver interesse no seu confronto com aquela outra regra:

Artigo 829.º-A
Sanção pecuniária compulsória
1. Nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infração, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso.
2. A sanção pecuniária compulsória prevista no número anterior será fixada segundo critérios de razoabilidade, sem prejuízo da indemnização a que houver lugar.
3. O montante da sanção pecuniária compulsória destina-se, em parte iguais, ao credor e ao Estado.
4. Quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, são automaticamente devidos juros à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros de mora, se estes forem também devidos, ou à indemnização a que houver lugar.
 
Olhando para o regime consagrado no número 1 do artigo 829.º-A do Código Civil, dir-se-á que o mesmo só funciona caso a Ré, após o trânsito em julgado da sentença condenatória, não proceder, de imediato, à reintegração da Autora na empresa, nos moldes previstos no artigo 389.º, número 1, alínea b) do Código do Trabalho de 2009 (caso não o tenha feito antes, durante o decurso do prazo para recorrer, por se ter conformado com a condenação de que foi alvo).
Não vislumbramos nenhuma norma laboral que impeça a aplicação no seio do Direito do Trabalho de tal instituto jurídico[11], entendendo como adequado e razoável aos interesses em jogo nos autos e à obrigação que se visa fazer cumprir, a fixação do montante diário de 60,00 €.   

D5 - INDEMNIZAÇÃO POR DANOS MORAIS 

A Autora pediu a condenação da Ré no pagamento da quantia de 10.000,00 € a título de indemnização pelos danos morais por ela sofrido em virtude do despedimento ilícito de que foi alvo, mas da factualidade dada como provada e a esse respeito, só ressaltam os seguintes factos:
17. A Autora ficou grávida de gémeos em Agosto de 2009.
21. Terminado o contrato de trabalho que a unia à Ré, a Autora ficou desempregada, passando a fazer face à sua subsistência apenas com o ordenado do companheiro e a ajuda de terceiros.
22. Sentindo uma grande instabilidade emocional por força dessa situação e por se encontrar grávida de gémeos.
Em termos de regime legal, importa chamar à colação os artigos 389.º do Código do Trabalho de 2009 e 496.º do Código Civil, na sua redações originais, rezando tais disposições legais o seguinte, na parte que para aqui releva: 

Artigo 389.º
Efeitos da ilicitude de despedimento
1 - Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado:
a) A indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais;
b) (…)
Artigo 496.º
Danos não patrimoniais
1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
2. (…)
3. O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos número anterior
   
Ora, cruzando tal regime legal com a factualidade dada como assente, afigura-se-nos que não ficaram demonstrados factos suficientes para fundar a condenação da Ré no pagamento de uma indemnização por danos morais no montante de 10.000,00 €, dado a grande instabilidade emocional - que, convirá lembrar, é motivada, quer pela gravidez de risco de dois gémeos, como pela situação de insuficiência económica em que ficou, por força do seu despedimento - sem quaisquer outro circunstancialismo complementar e explicativo (nomeadamente, em termos de reflexos negativos na sua vida pessoal, familiar e até profissional), não se revestir só por si, da gravidade que o número 1 do artigo 496.º do Código Civil reclama para a sua relevância jurídica, em termos de fixação de um montante indemnizatório, com base nas regras da equidade (mesmo lançando mão das presunções judiciais previstas nos artigos 351.º e seguintes do Código Civil, não é possível extrair do simples facto da Autora sentir essa grande instabilidade emocional a existência de prejuízos suficientemente sérios para justificar o recebimento da pretendida indemnização).     
Sendo assim, é inevitável a improcedência desta Apelação na vertente agora abordada.        

E - TRABALHO SUPLEMENTAR - DIFERENÇAS SALARIAIS

Este pedido da Autora foi desconsiderado pelo tribunal recorrido (muito embora pensemos que o foi por manifesto lapso, em função do que pudemos ouvir à Exma. Juíza em sede da produção de prova em Audiência de Discussão e Julgamento), apesar da posição assumida pela Ré no final da sua contestação e dos factos dados como provados na sequência da mesma. 
A Apelada, no final da sua contestação, concluiu da forma seguinte:
«Nestes termos deverá a presente ação ser julgada parcialmente improcedente por não provada e em consequência: (…)
3. Reconhecer como créditos laborais da Autora as quantias de € 73,77 referente a retificações dos montantes pagos a título de trabalho suplementar, bem como € 63,13 referente a descanso compensatório remunerado não gozado.»
Por seu turno, a factualidade dada como assente foi a seguinte:
«10. A Autora realizou, por ordem e no interesse da Ré, trabalho suplementar.
11. Designadamente em dias feriados - 10, 12 e 25 de Abril, 1 de Maio, 10 e 11 de Junho e 15 de Agosto - e algumas horas para além do seu horário de trabalho, em Julho e Setembro.
12. Tendo auferindo, em contrapartida desse trabalho suplementar, os montantes melhor discriminados nas cópias de recibos juntos aos autos a fls. 36 a 40, a título de «hora extra 100% (100%)».
12-A - A Ré não entregou à Autora a quantia de 73,77 € a título de parte da contrapartida do trabalho suplementar pela mesma prestado durante os meses de Abril, Maio, Junho, Julho e Agosto de 2009, não tendo igualmente lhe entregue o montante de € 68,77, correspondente ao descanso compensatório não gozado e relativo a esse mesmo trabalho suplementar.»
Ora, face a tal confissão da Ré e aos factos que a exprimem, não vemos como não a havemos de condenar no pagamento da aludida quantia de 73,77 € a título de parte da contrapartida do trabalho suplementar pela mesma prestado durante os meses de Abril, Maio, Junho, Julho e Agosto de 2009, bem como dos respetivos juros de mora desde a data do seu vencimento, face ao disposto nos artigos 405.º, 762.º, 763.º, 798.º, 799.º, 804.º a 806.º e 559.º do Código Civil, 268.º e 271.º do Código do Trabalho de 2009 e Portaria n.º 291/2003, de 8/04 (taxa legal de 4%).
Importa realçar que, tendo a recorrida confessado igualmente o débito relativo ao descanso compensatório, o tribunal da 1.ª instância, ainda que por via diversa, condenou a mesma no pagamento de tal prestação à Autora.       
Sendo assim, tem este recurso de Apelação de ser julgado procedente nesta parte, com a alteração da sentença recorrida nessa parte, substituindo-se, nessa medida, a absolvição da Ré pela sua condenação no pagamento das referidas diferenças salariais, a título de trabalho suplementar.              

F - INTEGRAÇÃO DA RETRIBUIÇÃO DO TRABALHO SUPLEMENTAR NA REMUNERAÇÃO DE FÉRIAS, CORRESPONDENTE SUBSÍDIO E SUBSÍDIO DE NATAL 

A Apelante viu indeferida a arguição da nulidade de sentença, no que concerne a esta temática, mas tal não nos impede de apreciar e decidir tal matéria.
A questão radica-se na integração da média das verbas auferidas pela recorrente a título de trabalho suplementar ao longo dos 6 meses do contrato dos autos na retribuição de férias, correspondente subsídio e subsídio de Natal.
Dir-se-á, desde logo e no que toca a esta última prestação, que os artigos 263.º e 262.º do Código do Trabalho de 2009, à falta de qualquer disposição legal, convencional ou contratual em contrário - como é o caso dos autos - impõem que o subsídio de Natal seja integrado unicamente pela retribuição base e diuturnidades, o que afasta a possibilidade de, em termos jurídicos, se considerar a média do trabalho extraordinário prestado pela Autora.
No que toca às restantes prestações e tendo em atenção o estatuído nos artigos 264.º e 258.º do Código do Trabalho de 2009, afigura-se-nos manifestamente insuficiente para caracterizar como regular e periódica, para efeitos da sua consideração como «outras prestações (….), direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie» ou como «contrapartida do modo específico do trabalho» ou que a Autora sempre receberia, caso «estivesse em serviço efetivo», a remuneração percebida pela trabalhadora ao longo do meio ano do vínculo laboral que a ligou à Ré, relativa aos sete feriados que ficaram demonstrados (Ponto 11 e documentos complementares - hora extra a 100%), raciocínio que igualmente tem de se aplicar à referência remissiva constante da parte final do Ponto 11 e do Ponto 12, para os recibos de fls. 36 a 42, onde se constata 2,5 horas de trabalho suplementar a 50% (e não a 100%, como dito no Ponto 12) no mês de Julho de 2009 (em Setembro, ao contrário do que é afirmado no aludido Ponto 11, não se descortina qualquer pagamento a esse título - fls. 41).        
Logo, tem este recurso de ser julgado improcedente, nesta parte, o que implica, à imagem do que fez a sentença impugnada, que a Ré seja absolvida de tal pedido da Autora.                    

G - RECURSO SUBORDINADO DA RÉ - DOZE DIAS DE FÉRIAS

A Ré vem, no âmbito do seu recurso subordinado, impugnar a sentença do tribunal da 1.ª instância, na parte em que a condenou a pagar à Autora os doze dias de férias que esta não gozou e que, para o efeito, em termos de retribuição devida, considerou a retribuição base, o subsídio de turno e o subsídio noturno, dado tais prestações - retribuição de férias e correspondente subsídio - terem já sido liquidadas à recorrida no acerto de contas final, após a cessação do contrato de trabalho a terno certo dos autos.
Tal decisão final tem o seguinte teor:
“Pelo exposto, julga-se a presente ação parcialmente procedente e, em consequência,
a) Condena-se a Ré a pagar à Autora as quantias a liquidar em execução de sentença e relativas ao descanso compensatório devido pelo trabalho suplementar prestado nos dias feriados de 10, 12 e 25 de Abril, 1 de Maio, 10 e 11 de Junho e 15 de Agosto de 2009 e algumas horas para além do seu horário de trabalho, nos meses de Julho e Setembro de 2009 e, ainda, a doze dias de férias de 2009, tomando-se em consideração, para efeitos de retribuição, os valores auferidos a título de remuneração base, subsídio de turno e subsídio noturno e
 b) Condena-se a Ré a pagar à Autora as quantias a liquidar em execução de sentença e relativas às diferenças salariais nas retribuições de férias, subsídio de férias e de Natal resultantes da inclusão nos mesmos dos valores médios recebidos pela autora a título de subsídio de turno e subsídio noturnos,
c) Tudo acrescido dos respetivos juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos, desde as datas em que cada prestação deveria ter sido posta à disposição da autora e até efetivo e integral pagamento,
d) Absolvendo a Ré dos demais pedidos peticionados. (…)”
Importa atentar ainda nos seguintes factos e documentos:
20. A Autora não gozou 12 (doze) dias de férias.
A fls. 42 dos autos consta um único recibo composto por duas folhas, relativo aos sete primeiros dias do mês de Outubro de 2009 e devidamente assinado pela Autora (muito embora a primeira folha não se ache rubricada por ela), onde se verifica que foi entregue à Autora os montantes ilíquidos de 225,00 Euros (450,00 € : 6/12) x 3, a título de proporcionais da retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.  
A unidade formal e material referida ressalta do conteúdo de ambas as folhas do recibo, dado o total das parcelas da primeira só se encontrar vazado na segunda, conjuntamente com as parcelas constantes desta última.   
Ora, tais documentos, juntos pela trabalhadora conjuntamente com a sua petição inicial e aceites pela Ré, foram efetivamente considerados pelo Tribunal do Trabalho de Lisboa, conforme resulta dos últimos três parágrafos de fls. 164 e da alínea b) da mencionada parte decisória, em que existe a condenação da Ré no pagamento das diferenças salariais referentes à não inclusão na retribuição de férias, correspondente subsídio (e subsídio de Natal, que está excluído do objeto deste recurso) do subsídio de turno e da média do subsídio noturno.
O que ressalta da sentença impugnada é uma duplicação de condenações, pois os referidos 12 dias de férias não gozadas, em parte liquidadas no final do contrato (225,00 € x 2), não tinham de ser referidas na alínea a) da parte decisória, por já estarem consumidos pela alínea b), na parte juridicamente relevante.
Não há nos autos e no quadro do vínculo laboral que aqui se discute, duas realidades distintas - os 12 dias de férias não gozadas e os proporcionais pagos por defeito a título de férias e subsídio de férias - mas antes um único cenário, que emerge do facto de estarmos face a um contrato de trabalho a termo certo de 6 meses, que, nos termos do artigo 239.º do Código do Trabalho de 2009, confere à Autora o direito a 12 dias úteis de férias (2 dias úteis x 6 meses), que podem ser efetivamente usufruídas ou substituídas pelo seu equivalente em dinheiro, como aconteceu nos autos, ainda que incorretamente calculado (cf. artigos 237.º, número 3, 239.º, número 5 e 245.º do Código do Trabalho de 2009).
Logo, este recurso subordinado da Ré tem de ser julgado procedente, no que respeita à eliminação dessa duplicação condenatória, com reflexos na segunda parte da alínea a) da aludida decisão final.                       

IV – DECISÃO

Por todo o exposto, nos termos dos artigos 87.º, número 1, do Código do Processo do Trabalho e 713.º do Código de Processo Civil, acorda-se, neste Tribunal da Relação de Lisboa, no seguinte:
1) Em julgar procedente o recurso de apelação interposto por AA, na vertente da impugnação da Decisão sobre a Matéria de Facto, aditando-se à Factualidade dada como Assente o Ponto 12-A e alterando-se o Ponto 3. da mesma;   
2) Em julgar procedente o recurso de apelação interposto por AA, bem como o recurso subordinado de Apelação interposto pela Ré BB, LDA, nessa medida se alterando a sentença recorrida nos seguintes termos:
«Pelo exposto, julga-se a presente ação parcialmente procedente e, em consequência:
a) Reconhece-se, por força da nulidade da estipulação do termo que nele foi aposto, a existência de um contrato de trabalho sem termo entre Autora e Ré, com efeitos reportados a 7 de Abril de 2009;
b) Declara-se a ilicitude do despedimento de que a Autora foi alvo por parte da Ré;
c) Condena-se a Ré a reintegrar a Autora no seu posto de trabalho, com a categoria e antiguidade que tinha à data do despedimento;
d) Condena-se a Ré no pagamento de todas as retribuições vencidas entre 1/12/2012 e o trânsito em julgado deste Acórdão, relegando-se a sua quantificação para incidente de liquidação, nos termos dos artigos 661.º, números 2 e 378.º e seguintes do Código de Processo Civil, tudo sem prejuízo da dedução prevista no número 2, alínea a) do artigo 390.º do Código do Trabalho de 2009;   
e) Condena-se a Ré a pagar, desde o trânsito em julgado deste Acórdão e nos termos do artigo 829.º-A, números 1 a 3, do Código Civil, a sanção pecuniária compulsória no valor diário de 60,00 €, por cada dia em que não proceda à ordenada reintegração da Autora;   
f) Condena-se a Ré a pagar à Autora a quantia de € 73,77 € a título de parte da contrapartida do trabalho suplementar prestado durante os meses de Abril, Maio, Junho, Julho e Agosto de 2009; 
g) Condena-se a Ré a pagar à Autora as quantias a liquidar em execução de sentença e relativas ao descanso compensatório devido pelo trabalho suplementar prestado nos dias feriados de 10, 12 e 25 de Abril, 1 de Maio, 10 e 11 de Junho e 15 de Agosto de 2009 e algumas horas para além do seu horário de trabalho, nos meses de Julho e Setembro de 2009, tomando-se em consideração, para efeitos de retribuição, os valores auferidos a título de remuneração base, subsídio de turno e subsídio noturno;
h) Condena-se a Ré a pagar à Autora as quantias a liquidar em execução de sentença e relativas às diferenças salariais nas retribuições de férias, subsídio de férias e de Natal (proporcionais) resultantes da inclusão nos mesmos dos valores médios recebidos pela Autora a título de subsídio de turno e subsídio noturnos;
c) Tudo acrescido dos respetivos juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos, desde as datas em que cada prestação deveria ter sido posta à disposição da Autora e até efetivo e integral pagamento,
d) Absolvendo a Ré dos demais pedidos peticionados. (…)”
*
Custas da ação na proporção do decaimento - fixando-se o mesmo, provisoriamente, em 1/3 para a Autora e 2/3 para a Ré -, e dos recursos de Apelação a cargo da Ré (principal) e da Autora (subordinado) - artigo 446.º, número 1 do Código de Processo Civil.

Registe e notifique.

Lisboa, 31 de Outubro de 2012

José Eduardo Sapateiro
Sérgio Almeida
Jerónimo Freitas
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[1] Maria do Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 3.ª edição, Almedina, pág. 273
[2]
Vd. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.02.2004 in Coletânea de Jurisprudência, I, pág. 160.
[3]
Cfr. Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.02.2004 e de 12.03.2002 in Coletânea de Jurisprudência, 2004, I, pág. 160 e 2003, II pág. 146, respetivamente.
[4]
Vd. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 3 de Março de 1997 in Coletânea de Jurisprudência, 1997, Tomo II, pág. 238.
[5]
Neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12/09/2007, processo n.º 1210/05.0TTLRA.C1, relator: Serra Leitão, publicado em www.dgsi.pt.  
[6]
Contra, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 18/11/2002 e 27/10/2003, processos n.ºs 0210805 e 0314001, relator: Sousa Peixoto e do Tribunal da Relação de Lisboa de 4/12/2006, processo n.º 4239/2006-4, relator: Duro Mateus Cardoso, ambos publicados em www.dgsi.pt.
[7]
Acerca do conceito legal e jurisprudencialmente aceite de «desempregado de longa duração», ver, para além do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 34/96, de 18/04, citado na sentença, o artigo 4.º, número 1, do Decreto-Lei n.º 64-C/89, de 27/02, o artigo 4.º, número 1, do Decreto-Lei n.º 89/95, de 6/05 e artigo 6.º, número 4, da Portaria n.º 196-A/2001, de 10/03, bem como a posição adotada pelo Dr. Pedro Ortins de Bettencourt, em “Contrato de Trabalho a termo”, Erasmos Editora, 1996, página 162 e Suasana Sousa Machado, “Contratos de Trabalho a Termo - a transposição da Diretiva 1999/70/Código da Estrada para o Ordenamento Jurídico Português: (In) compatibilidades”, 2009, Coimbra Editora, páginas 184 e seguintes, bem como a jurisprudência referida por esses autores.          
[8]
Cfr., Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24/10/2006, processo n.º 06S1961, relator: Sousa Peixoto, publicado em www.dgsi.pt, referenciado pela Autora no artigo 36.º da sua petição inicial. 
[9]
Esta Portaria n.º 130/2009, de 30/01 foi revogada pela Portaria n.º 125/2010, de 1/03 (com retificação através da Declaração de Retificação n.º 13/2009, de 10/02), com exceção do artigo 4.º, que só veio a ser revogado pela Portaria n.º 353/2010, de 21/06, sem prejuízo da aplicação da redução da taxa contributiva prevista às contribuições devidas até 31 de Maio de 2010, ainda que o respetivo prazo legal de pagamento seja posterior, dessa forma tendo sido derrogada a prorrogação de tal regime até 31/12/2010, introduzida anteriormente pela Portaria n.º 99/2010, de 15/02.
A Portaria n.º 125/2010, de 1/03 deixou de ter qualquer referência ou noção do «desempregado de longa duração», repondo aparentemente a inicial (sem trabalho há mais de 12 meses). 
[10]
Tal suficiência da declaração formal do trabalhador, levada ao extremo, implicaria, em última análise, que o empregador, ao abrigo da mesma e à circunstância de não estar dependente da existência de necessidades temporárias da sua empresa, poderia contratar sem limites e sem precisão de confirmar a fidedignidade da situação de «desempregado de longa duração» qualquer trabalhador, mesmo que este tivesse cessado um anterior contrato de trabalho no dia antecedente.     
[11]
Cfr., acerca desta figura, em termos gerais, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol II, Coimbra Editora, 4.ª Edição, 1997, págs. 102 a 105, Mário Júlio de Almeida Costa, em “Direito das Obrigações”, 4.ª Edição, 1984, Coimbra Editora, páginas 746 a 749 e Dr. João Calvão da Silva na sua obra "Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória", Coimbra, 1997, 2.ª Edição; no que concerne à aplicação de tal instituto no campo do Direito do Trabalho, ainda que incidindo sobre o número 4 do artigo 829.º-A do Código Civil, ver este último autor, a páginas 452 e seguintes e Dr. Ferreira Marques, publicado no Prontuário da Legislação do Trabalho, CEJ, Atualização n.º 52, págs. 57 e seguintes. Ver, finalmente, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça  de 16/11/2005, processo 05S2138.dgsi.Net