sexta-feira, 16 de novembro de 2012

PERÍODO EXPERIMENTAL - CONTAGEM DO RESPECTIVO PRAZO - ACÇÕES DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL



Proc. Nº 832/08.1TTSTB.E1   TRE   24/11/2009

1. Para efeitos de contagem do período experimental, constitui excepção à regra do art.º 104º, nº 1, do Código do Trabalho de 2003 (segundo o qual o referido período corresponde ao tempo inicial de execução do contrato de trabalho) a existência de acções de formação ministradas pelo empregador ou frequentadas por determinação dele (art.º 106º, nº 1, do mesmo C.T.).

2. Nessa eventualidade, é irrelevante que as acções formativas tenham lugar antes de firmado o vínculo laboral, ou que ocorram já no decurso da execução do contrato, exigindo-se apenas que entre a formação e a celebração do contrato de trabalho subordinado se verifique uma relação de estreita proximidade

Acordam os juízes que compõem a Secção Social deste Tribunal da Relação de Évora:

No Tribunal do Trabalho de Setúbal, e em acção com processo comum, G., identificado nos autos, demandou IP..., com sede em Lisboa, pedindo a condenação da R. na sua reintegração, ou no pagamento de indemnização por despedimento, se por ela vier a optar, e bem assim no pagamento das retribuições vencidas e vincendas até trânsito em julgado, e em indemnização por danos morais. Para o efeito alegou em resumo ter sido admitido na R. em 17/9/2007, ao abrigo de um contrato de formação para frequência de um estágio profissional em contexto de trabalho, no seguimento do qual foi celebrado um contrato individual de trabalho, com início em 1/1/2008, pelo qual auferia ultimamente o salário base mensal de € 1.417,05, acrescido de 40% de subsídio de turno; em 20/6/2008 a R. remeteu-lhe uma carta comunicando a denúncia desse contrato, nos termos dos arts.º 104º e ss. do Código do Trabalho (C.T.) de 2003; trata-se porém de um despedimento ilícito, porque o contrato não podia ser então ainda considerado no período experimental.
Gorada a tentativa de conciliação efectuada no âmbito da audiência de partes prevista no art.º 54º do código de Processo do Trabalho (C.P.T.), a R. veio contestar de seguida, impugnando os factos e os pedidos alegados na p.i., afirmando que a denúncia do contrato foi válida, por ter ocorrido no decurso do período experimental, e concluindo pela improcedência da acção e consequente absolvição.
Procedeu-se a audiência de julgamento, e foi proferida sentença, que julgou a acção procedente, salvo quanto ao pedido de indemnização por danos morais, condenando a R. a reintegrar o A., , e a pagar-lhe as retribuições deixadas de auferir após o despedimento, em montante a apurar em liquidação de sentença.
Inconformada com o assim decidido, dessa sentença veio então apelar a R.. Na respectiva alegação de recurso, formulou as seguintes conclusões:
- o recorrido frequentou, entre 17/9/2007 e 31/12/2007, um programa de estágio profissional remunerado, ministrado pelo recorrente;
- o referido programa de formação incluiu uma parte teórica e outra prática (em simulador), com visitas ao Centro de controlo de Tráfego Marítimo do Continente (então ainda em obras), onde o recorrido viria a exercer a sua actividade em caso de admissão pela entidade patronal, bem como visitas a torres e centros de Controlo de Tráfego Marítimo;
- com data de 16/1/2008, mas assinada pelo recorrido apenas em 5/2/2008, apelante e apelado outorgaram um contrato de trabalho, com efeitos desde 1/1/2008, em que este foi admitido como técnico daquele;
- ficou estipulado um período experimental de 180 dias, atento o elevado grau de responsabilidade e a especial qualificação exigida para o exercício das funções que constituem o objecto do contrato;
- em 22/6/2008, o recorrente entregou ao recorrido uma carta a denunciar o contrato alegadamente em período experimental;
- o Tribunal a quo considerou que o período de formação (ocorrido entre 17/9/2007 e 31/12/2007), anterior à celebração e início de vigência do contrato de trabalho, já deveria ser considerado para efeitos de contagem do período experimental;
- esta interpretação viola frontalmente o disposto no art.º 106º do C.T.;
- esta disposição prescreve que ‘o período experimental começa a contar-se a partir do início da execução da prestação do trabalhador’;
- decorre expressamente da letra da lei que o pressuposto básico do início de contagem do período experimental é a vigência de um dado contrato individual de trabalho;
- também o nº 1 do art.º 104º do C.T. reforça esta interpretação ao dizer que ó período experimental corresponde ao tempo inicial de execução do contrato (de trabalho)...’;
- o período experimental destina-se a permitir que trabalhador e empregador se conheçam por forma a que cada um deles possa aferir do interesse na manutenção do contrato;
- tal desiderato só se concretiza face à efectiva execução daquele contrato, em que as partes já estão aos deveres e obrigações recíprocas, típicas de um contrato individual de trabalho;
- a segunda parte do nº 1 do art.º 106º do C.T. não é excepção relativamente à primeira parte , antes dependência da regra estabelecida nesta;
- ou seja, uma vez iniciada a execução do contrato de trabalho, o período experimental também abrange as acções de formação, mas apenas desde que não excedam metade daquele período experimental;
- a interpretação do preceito em causa não comporta, sob pena de estarmos confrontados com uma solução absurda, a possibilidade de o período experimental poder ocorrer (mesmo que parcialmente) antes da própria existência e início da vigência desse contrato de trabalho;
- e, por maioria de razão, em que o período de formação consistiu meramente em aspectos teóricos, visitas a instalações (de resto ainda em obras) e práticas em simulador;
- a pouca jurisprudência disponível (Ac. Rel´. Lisboa de 3/5/2006 e 7/3/2007, in www.dgsi.pt) é unânime ao considerar que o período experimental começa a contar-se a partir do início da execução do contrato de trabalho;
- o Tribunal a quo interpretou e aplicou erradamente o nº 1 do art.º 106º do C.T., ao considerar que o período experimental iniciou-se antes da celebração e início da vigência e da execução do contrato de trabalho dos autos, contabilizando (pela metade) o período compreendido entre 17/9/2007 e 31/12/2007;
- nestes termos, a sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que declare a denúncia do contrato inteiramente legítima, porque levada a cabo durante o período experimental, absolvendo o R. do pedido formulado pelo A., com as demais consequências legais.
*
Notificado da interposição do recurso, o A. veio contra-alegar, aí concluindo o seguinte:
- de facto, o recorrido frequentou entre 17/9/2007 e 31/12/2007, um programa de estágio profissional remunerado, ministrado pelo recorrente;
- com data de 16/1/2008, mas assinado pelo recorrido apenas em 5/2/2008, os apelante e apelado outorgam um contrato de trabalho, com efeitos desde 1/1/2008, em que este foi admitido como técnico daquele;
- ficou estipulado um período experimental de 180 dias, atento o elevado grau de responsabilidade e a especial qualificação exigida para o exercício das funções que constituem o objecto do contrato;
- em 22/6/2008, o recorrente entregou uma carta a denunciar o contrato alegadamente em período experimental;
- o Tribunal a quo considerou que o período de formação (ocorrido entre 17/9/2007 e 31/12/2008), já deveria ser considerado para efeitos de contagem do período experimental;
- esta interpretação funda-se no disposto no art.º 106º do C.T., nomeadamente na 2ª parte do nº 1;
- o período experimental destina-se a permitir que trabalhador e empregador se conheçam por forma a que cada um deles possa aferir do interesse na manutenção do contrato;
- tal desiderato concretiza-se na formação promovida pela entidade patronal em que as partes já estão submetidas aos deveres e obrigações recíprocas, típicas de um contrato de trabalho;
- a segunda parte do nº 1 do art.º 106º do C.T. é excepção relativamente à primeira parte;
- mas a interpretação do preceito não comporta, sob pena de solução ilegal, a possibilidade de o período experimental poder ser alargado no respectivo prazo, pois o art.º 110º não o permite;
- acresce que, finda a formação ministrada pelo recorrente, não podia o recorrido furtar-se ao contrato de trabalho, sob pena de ter de indemnizar aquele;
- o Tribunal a quo interpretou e aplicou correctamente o nº 1 do art.º 106º do C.T., ao considerar que o período experimental se iniciou a 17/9/2007, contabilizando pela metade o período compreendido entre 17/9 e 31/12/2007;
- não tendo a recorrente indicado devidamente a caução a prestar deve fixar-se o efeito meramente devolutivo ao recurso.
*
Admitido o recurso, e subidos os autos a esta Relação, o Ex.º Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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Foi a seguinte a matéria de facto julgada provada no Tribunal recorrido:

1 - Em 17.09.2007, as partes outorgaram o escrito da fs. 87 a 89 dos autos, que denominaram de “Programa Estágios Profissionais – Contrato de Formação em Posto de Trabalho”, com os seguintes termos:
«Entre o IPT..., (…) como primeiro outorgante, e G., (…) como segundo outorgante, é celebrado o presente Contrato de Formação, o qual se rege pelas seguintes cláusulas:
CLÁUSULA 1ª
(Objecto do Contrato)
1 – O primeiro outorgante compromete-se a proporcionar ao segundo, um estágio profissional em contexto de trabalho, necessário e adequado ao exercício da função de Operador, em Regime de Contrato de Trabalho.
CLÁUSULA 2ª
(Direitos do Estagiário)
O segundo outorgante tem direito a:
a) Receber do primeiro outorgante, durante os períodos de estágio, a título de bolsa de estágio, a importância mensal de 745,00 € (setecentos e quarenta e cinco euros);
b) Receber do primeiro outorgante ou doutro(s) os ensinamentos e condições adequadas ao estágio profissional ao exercício da função de Operador;
c) Beneficiar de um seguro contra acidentes de trabalho que o proteja contra riscos de eventualidades que possam ocorrer durante e por causa das actividades correspondentes ao estágio profissional, bem como nas deslocações entre a residência e o local de estágio;
d) Obter gratuitamente do primeiro outorgante, no final do estágio, um certificado comprovativo da frequência obtida;
e) Obter do primeiro outorgante almoço ou subsídio de refeição;
f) Que o primeiro outorgante respeite e faça respeitar as condições de higiene e segurança no trabalho a que estiver obrigado nos termos legais;
CLÁUSULA 3ª
(Deveres do Estagiário)
São deveres do segundo outorgante:
a) Comparecer com assiduidade e pontualidade no estágio profissional, visando adquirir a formação ao exercício da função de Operador;
b) Tratar com urbanidade o primeiro outorgante e seus representantes;
c) Guardar lealdade ao primeiro outorgante, nomeadamente não transmitindo para o exterior informações sobre equipamentos e processos de trabalho de que tome conhecimento por ocasião do estágio;
d) Utilizar com cuidado e zelar pela boa conservação dos equipamentos e demais bens que lhe sejam confiados para efeitos de estágio pelo primeiro outorgante e seus representantes;
e) Suportar os custos de substituição ou reparação dos equipamentos e materiais que utilizar no estágio, fornecidos pelo primeiro outorgante e seus representantes, sempre que os danos produzidos resultem de comportamento doloso ou gravemente negligente.
CLÁUSULA 4ª
(Sanções)
A violação grave ou reiterada dos deveres do segundo outorgante confere ao primeiro outorgante o direito de rescindir o contrato de formação, cessando imediatamente todos os direitos dele emergentes, sem prejuízo da eventual responsabilidade civil ou criminal a que houver lugar.
CLÁUSULA 5ª
(Cessação do Contrato)
1 – O contrato pode cessar por mútuo acordo, por rescisão de uma das partes ou por caducidade.
2 – A rescisão unilateral por qualquer das partes tem que ser comunicada à outra, por documento escrito ou carta registada, devendo dela constar o(s) respectivo(s) motivo(s).
3 – O contrato de formação caduca quando se verificar a impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva, do segundo outorgante frequentar o estágio ou de o primeiro outorgante lho proporcionar.
4 – A rescisão unilateral por parte do 2º outorgante determina o dever de indemnizar o 1º outorgante pelos custos da formação.
CLÁUSULA 6ª
(Celebração de Contrato de Trabalho)
Findo o período de estágio, a recusa do 2º Outorgante em celebrar Contrato de Trabalho com o 1º Outorgante, para o exercício da função a que se destina o estágio, determina o dever de indemnização, nos termos do n.º 4 da cláusula 5ª.
CLÁUSULA 7ª
(Duração)
O presente contrato tem início em 17 de Setembro de 2007, terminando em 31 de Dezembro de 2007»;

2 - A celebração deste contrato visava a formação do A. como operador do Centro de Controlo de Tráfego Marítimo do Continente (CCTMC), que o R. pretendia colocar em funcionamento a partir de 01.01.2008, como veio a acontecer;
3 - Para o efeito, o A. e outras pessoas contratadas pelo R. nas mesmas circunstâncias, seguiram um programa de formação determinado por este, incluindo uma parte teórica e outra prática, em simulador, com visitas ao Centro (então ainda em obras), torres e centros de controlo do tráfego portuário;
4 - No final, a entidade formadora realizou uma apreciação sobre as capacidades e o resultado da formação de cada um dos formandos;
5 - Tendo sido colocado em funcionamento o CCTMC em 01.01.2008, e em resultado da formação fornecida e da apreciação feita pela entidade formadora, o R. admitiu ao seu serviço o A. e as demais pessoas que participaram naquela formação, os quais passaram a realizar as funções de supervisores ou operadores de tráfego marítimo no dito Centro;
6 - Durante cerca de um semana após a colocação em funcionamento do CCTMC, o A. e os demais operadores e supervisores admitidos pelo R. continuaram a receber formação enquanto desempenhavam as suas tarefas profissionais;
7 - Com data de 16.01.2008, mas sendo o contrato assinado pelo A. apenas a 05.02.2008, as partes outorgaram o escrito da fs. 77 a 80 dos autos, que denominaram de “Contrato Individual de Trabalho”, com os seguintes termos:

«IPT…, (…) adiante designado como Primeiro Outorgante, e G., (…) adiante designado como Segundo Outorgante, é celebrado o presente contrato individual de trabalho por tempo indeterminado, ao abrigo do disposto na Lei n.º 23/2004, de 22 de Junho, o qual se regerá pelos considerandos, que ambas as partes reconhecem como verdadeiros, e pelas cláusulas seguintes:

Considerandos:
A – Em 17 de Setembro de 2007, foi celebrado entre o Primeiro e o Segundo outorgantes um “Contrato de Formação em Posto de Trabalho”, mediante o qual o primeiro se comprometeu a proporcionar ao segundo um estágio profissional em contexto de trabalho, necessário e adequado ao exercício da função de “Operador”;
B – Nos termos que decorrem do contrato de formação, designadamente da sua cláusula 6.ª, o Segundo Outorgante assumiu o compromisso de, findo o período de estágio, celebrar um contrato de trabalho com o Primeiro Outorgante, para o exercício da função a que aquele se destina, determinando a recusa da sua celebração o dever de indemnizar o Primeiro Outorgante pelos custos da formação;
C – O custo individual de formação suportado pelo Primeiro Outorgante importa na quantia de € 31 460 (trinta e um mil, quatrocentos e sessenta euros), nela se compreendendo os montantes correspondentes às acções realizadas nos termos previstos no contrato com o consórcio, à bolsa de estágio e ao subsídio de refeição pagos ao Segundo Outorgante, ao seguro contra acidentes de trabalho e aos honorários pagos com os formadores.
Cláusula 1.ª
O Segundo Outorgante é contratado pelo Primeiro Outorgante para, sob a sua autoridade e direcção, exercer as funções de técnico superior, com a categoria profissional de Técnico Superior III-A.
Cláusula 2.ª
O Segundo Outorgante auferirá a retribuição base mensal ilíquida de € 1387,90 (mil trezentos e oitenta e sete euros e noventa cêntimos), sobre a qual incidirão os descontos legais.
Cláusula 3.ª
O presente contrato tem início no dia 1 de Janeiro de 2008 e durará até que as partes livremente o revoguem por comum acordo ou ocorra um facto que determine a sua caducidade ou importe a sua resolução.
Cláusula 4.ª
Sem prejuízo do estabelecido nas cláusulas seguintes, o Segundo Outorgante poderá resolver ou denunciar o contrato nos termos do art. 441º e seguintes e do art. 447º e seguintes do Código do Trabalho.
Cláusula 5.ª
O Segundo Outorgante obriga-se a permanecer ao serviço do Primeiro Outorgante pelo período de dois anos consecutivos, como compensação pelas despesas efectuadas pelo Primeiro Outorgante com a sua formação profissional.
Cláusula 6.ª
A suspensão do contrato de trabalho por facto respeitante ao Segundo Outorgante suspende o prazo referido na cláusula anterior.
Cláusula 7.ª
A denúncia do contrato de trabalho pelo Segundo Outorgante, antes de decorrido o prazo de duração efectiva de dois anos, determina a obrigação de indemnização ao Primeiro Outorgante, por um montante proporcional ao tempo em falta para o termo do contrato, calculada com base na quantia referida no Considerando “C”.
Cláusula 8.ª
O local da prestação de trabalho é nas instalações do IPT.., sitas em Lisboa (sede) ou em Paço de Arcos (Centro de Controlo de Tráfego Marítimo do Continente), ou ainda em outros locais resultantes da natureza da sua actividade.
Cláusula 9.ª
O período normal de trabalho é de 35 horas semanais.
Cláusula 10.ª
O horário de trabalho será fixado pelo Primeiro Outorgante, dentro dos condicionalismos legais.
Cláusula 11.ª
O processo de selecção obedeceu aos trâmites previstos no artigo 5.º da Lei n.º 23/2004, de 22 de Junho.
Cláusula 12.ª
A contratação foi autorizada pelo Conselho Directivo do IPT…, na sequência da competente autorização ministerial concedida para o efeito.
Cláusula 13.ª
Enquanto desempenhar as suas funções no Centro de Controlo de Tráfego Marítimo do Costeiro, o Segundo Outorgante fica sujeito à observância das “Normas de Gestão Interna para Controladores de Tráfego Marítimo”, as quais se encontram anexas e fazem parte integrante deste contrato.
Cláusula 14.ª
1 – Atento o elevado grau de responsabilidade e a especial qualificação exigida para o exercício das funções que constituem o seu objecto, o presente contrato fica sujeito a um período experimental de 180 dias, durante o qual qualquer das partes o poderá denunciar livremente, sem invocação de justa causa, sendo necessário o aviso prévio de sete dias, por parte do Primeiro Outorgante, apenas quando o período experimental tenha durado mais de sessenta dias.
2 – Caso a denúncia seja efectuada pelo Segundo Outorgante, este indemnizará o Primeiro Outorgante nos termos previstos na cláusula 7.ª.
Cláusula 15.ª
Em tudo o mais é aplicável o Código do Trabalho e legislação complementar, com as especificidades constantes do regime jurídico do contrato individual de trabalho da Administração Pública e, ainda os Regulamentos Internos do IPTM.»;

8 - Em anexo ao referido contrato constavam as “Normas Internas de Gestão Para o Serviço de Controle de Tráfego Marítimo”, que constam do documento de fs. 81 a 85 e que aqui se considera integralmente reproduzido, que o A. subscreveu igualmente a 05.02.2008;
9 - No dia 22.06.2008, pouco antes das 15.00 horas, quando o A. terminava o seu turno, o R. entregou-lhe o documento de fs. 91, com o seguinte texto:
«Nos termos do disposto na Cláusula 14.ª do Contrato Individual de Trabalho celebrado entre V. Ex.ª e o Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, I.P., datado de 16 de Janeiro do corrente ano, e nos termos dos artigos n.º 104 e seguintes do Código do Trabalho, publicado em anexo à Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, vimos por este meio denunciar o referido Contrato Individual de Trabalho»;
10 - Nessa altura, a chefia do A. solicitou-lhe a entrega dos cartões magnéticos das cancelas de acesso ao edifício, bem como as restantes chaves que o A. detinha, o que este fez voluntariamente;
11 - O gestor do CCTMC explorado pelo R. fez comunicar a todas as chefias, supervisores, operadores, técnicos, funcionários administrativos e pessoal de segurança que a partir de 22.06.2008, às 15.00 horas, estava vedado o acesso do A. àquele local, com fundamento na denúncia do seu contrato individual de trabalho;
12 - Em 01.07.2008, o R. entregou à A. a declaração de situação de desemprego, referindo como data de cessação do contrato de trabalho o dia 30.06.2008 e o valor base da última remuneração de € 1.967,24;
13 - Na data em que o R. fez cessar o contrato de trabalho do A., este auferia a remuneração base de € 1.417,05, acrescida de 40% a título de subsídio de turno e subsídio de alimentação no valor diário de € 6,16;
14 - Pela actividade prestada pelo A. entre 01.01.2008 e 15.06.2008, a supervisora deste, Ana Faneca, efectuou uma avaliação de desempenho, constante do documento n.º 8 junto em audiência, que aqui se considera integralmente reproduzido;
15 - O A. é membro da direcção do Sindicato dos Capitães, Oficiais Pilotos, Comissários e Engenheiros da Marinha Mercante – OFICIAISMAR, facto que era do conhecimento do R.;
16 - O R. não deu conhecimento da cessação do contrato do A. ao referido Sindicato;
17 - O A. não chegou a gozar férias, até ao momento em que o R. fez cessar o seu contrato de trabalho;
18 - O A. justificou faltas ao serviço nos dias 15, 28 e 29 de Maio, 18 e 19 de Junho de 2008, tendo nos dias 15 de Maio e 19 de Junho invocado o exercício de funções sindicais e nos dias 28 e 29 de Maio o estatuto do trabalhador-estudante;
19 - A funções desempenhadas pelo A. no CCTMC são de elevada exigência técnica e responsabilidade, consistindo na regulação e controlo do tráfego marítimo internacional, com repercussão na segurança deste, na medida em evitam colisões e assistem a situações de socorro;
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Coloca-se no caso dos autos a questão de saber da licitude, ou não, da desvinculação contratual do A., nos termos em que a mesma foi operada pelo recorrente, o que equivale a dizer que o que está em causa é, na prática, decidir se a denúncia do contrato de trabalho, tal como o R. a promoveu, ocorreu ou não no decurso do chamado ‘período experimental’.

É à luz da disciplina jurídica do Código do Trabalho (C.T.) de 2003, aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27/8, sob cuja vigência se desenrolou o vínculo contratual estabelecido entre as partes, que deve ser procurada a correcta solução do litígio. Nesse âmbito, a regra é como se sabe a que consta do art.º 105º: durante o período experimental qualquer das partes pode denunciar o contrato denunciar o contrato sem aviso prévio nem necessidade de invocação de justa causa, não havendo direito a indemnização (nº 1); porém, e no caso de esse período ter durado mais de 60 dias, o empregador terá então de dar um aviso prévio de 7 dias (nº 2).
Mas a aparente linearidade com que é tratado na lei o instituto jurídico-laboral do período experimental, assume na hipótese concreta dos autos, em face dos contornos fácticos que se descreveram, uma singular especificidade, que sem dúvida densifica os dados do problema.
Essa acrescida complexidade resulta do facto de, imediatamente antes de terem celebrado o contrato de trabalho em causa, A. e R. terem outorgado um denominado ‘Contrato de Formação em Posto de Trabalho’, mediante o qual, de 17/9 a 31/12/2007, o Instituto recorrente ministrou ao apelado um estágio profissional, remunerado, visando a formação do A. como operador do Centro de Controlo de Tráfego Marítimo do Continente (CCTMC), que aquele pretendia colocar em funcionamento a partir de 1/1/2008, como efectivamente veio a acontecer.
No entendimento da sentença recorrida, esse lapso de tempo cabe plenamente na previsão do art.º 106º, nº 1, 2ª parte, do C.T. [1] , e como tal deve ser computado para efeitos de contagem do período experimental; nessa lógica, quando o empregador denunciou o contrato, em 22/6/2008, já se haviam completado os 180 dias previstos para aquele efeito, reconduzindo-se portanto essa denúncia a um despedimento ilícito.
É naturalmente diversa a tese do apelante. Considerando que, tal como se afirma naquele preceito legal, o período experimental começa a contar-se, apenas, a partir do início da execução da prestação do trabalhador, entende o Instituto R. que a termo a quo do prazo em causa ocorreu somente a 1/1/2008, pelo que a denúncia operada a 22/6 desse ano foi tempestiva, e por isso o contrato foi feito cessar de maneira válida.

Convenhamos que é ponderoso o argumento aduzido pelo recorrente. Sendo o período experimental destinado a permitir aos contratantes um melhor conhecimento recíproco, e à tanto quanto possível correcta valoração das condições em que será oferecida e recebida a prestação de trabalho, de modo a cada um deles poder aferir do interesse na manutenção do vínculo laboral, essa desejável experiência só poderá naturalmente adquirir-se mediante o início da execução do contrato, e do cumprimento das obrigações dele decorrentes.
Mas se assim será na normalidade das coisas, a lei vem introduzir um importante desvio a essa regra, ao determinar, no citado art.º 106º, nº 1, que para efeitos de contagem do período experimental há que atender também às acções de formação ministradas pelo empregador, ou frequentadas por determinação dele.
De tal normativo não resulta porém que alguma vez possa prefigurar-se, no mundo do trabalho, um qualquer período experimental à margem da efectiva prestação contratual. O que dessa disposição decorre é, tão só, que o lapso de tempo ocupado com tais acções de formação releva na contagem do período experimental, desde que não exceda metade da duração do mesmo.
E compreende-se que assim seja: na medida em que as finalidades visadas pelo período experimental, que como se disse se prendem com o conhecimento mútuo de empregador e trabalhador, possam ser também prosseguidas no estrito âmbito da formação profissional, é razoável que essas acções de formação contem para a contagem do período experimental, em pé de igualdade com os lapsos de tempo em que ocorreu uma efectiva prestação de trabalho.
O que não nos parece legítimo é distinguir, para tal efeito, acções de formação que precedam o início da execução do contrato de trabalho (tal como a que ocorreu na hipótese dos autos), daquelas que venham a ter lugar, apenas, após o estabelecimento do vínculo laboral, e já durante a respectiva execução.
Para além de a lei, neste âmbito, não operar qualquer distinção relativamente ao momento em que a formação do trabalhador possa vir a ter lugar, as razões de fundo que poderiam, em abstracto, ditar a irrelevância dessas acções de formação na apreciação do período experimental são precisamente as mesmas qualquer que seja aquele momento. E a verdade é que a opção do legislador, ainda que discutível, foi inequivocamente no sentido de dar também relevo ao período de formação, a par da execução da prestação laboral em cumprimento das obrigações contratadas entre empregador e trabalhador.
É de notar, aliás, que na normalidade das situações, e por razões que se afiguram óbvias, a formação profissional de um trabalhador, para um determinado desempenho funcional, precederá naturalmente o início do exercício dessas funções. A hipótese inversa, de alguém ser admitido e começar a trabalhar num cargo específico, antes de estar habilitado para o fazer, é que nos parece menos habitual...
Muito embora a lei não o diga expressamente, o que será sempre exigível, em qualquer hipótese, é não ocorrer qualquer solução de continuidade entre o período formativo e a execução do contrato de trabalho, de modo a que a acção de formação se insira plenamente no contexto das obrigações emergentes da relação de trabalho subordinado.
Essa necessária proximidade está sem dúvida evidenciada na hipótese dos autos. A absoluta continuidade que se verificou entre uma e outra das situações (o contrato de formação do A. terminou a 31/12/2007, e o contrato de trabalho por ele celebrado com o apelante produziu efeitos a partir de 1/1/2008), bem assim a promessa de vinculação laboral ao Instituto R., manifestada pelo recorrido logo na Cl. 5ª do contrato de formação, e ainda o pacto de permanência do trabalhador ao serviço do R., por dois anos consecutivos, justificada pelas despesas com a sua formação (v. Cl. 5ª do contrato de trabalho), são elementos fácticos que demonstram inequivocamente o nexo causal, de absoluta complementaridade, que existiu entre a formação ministrada pelo recorrente, e o vínculo laboral que o A. com ele logo após veio estabelecer.
À luz do referido art.º 106º, nº 1, 2ª parte, não podem portanto restar dúvidas quanto à relevância do período de formação na contagem do período experimental. Que o Instituo R. estava de resto em condições privilegiadas para considerar, como considerou, na precisa medida em que, tal como vem apurado (v. nº 4 dos factos provados), no final da acção formativa empreendida, realizou uma apreciação sobre as capacidades e o resultado da formação de cada um dos formandos.
Daí que acompanhemos a solução acolhida pelo Ex.º Juiz a quo, que é de resto corroborada pelo Prof. Romano Martinez, no seu ‘Código do Trabalho anotado’, 4ª ed., quando afirma, a pág. 244, e em anotação àquele preceito da lei laboral: ‘...o legislador considera que o período experimental – no máximo, metade dele – abrange a formação ministrada ao trabalhador com o objectivo de o preparar par o desempenho das funções contratadas. Para este efeito, a formação profissional já constitui execução da prestação devida pelo trabalhador, não sendo legítimo iniciar a contagem daquele período apenas após o termo da formação (sublinhado nosso).
Em idêntico sentido decidiu o Ac. Rel. Lisboa de 7/3/2007, referenciado na sentença recorrida, em cujo âmbito o período de duas semanas de uma trabalhadora, antes de a mesma ser admitido ao serviço da empresa empregadora, foi expressamente considerado como devendo contar para efeitos de período experimental.
Concluímos pois, e em suma, pela improcedência de todas as conclusões da alegação da recorrente, e pela manutenção da decisão apelada.
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Nesta conformidade, e por todos os motivos expostos, acordam os juízes desta Secção Social em julgar a apelação improcedente, assim confirmando a sentença recorrida.

Custas pela apelante.


Évora, 24/11/2009

(Ass.)

Alexandre Ferreira Baptista Coelho
Acácio André Proença
Joaquim António Chambel Mourisco

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[1] Artigo 106º
Contagem do período experimental
1 – O período experimental começa a contar-se a partir do início da execução da prestação do trabalhador, compreendendo as acções de formação ministradas pelo empregador ou frequentadas por determinação deste, desde que não excedam metade do período experimental.
2 – Para efeitos da contagem do período experimental não são tidos em conta os dias de faltas, ainda que justificadas, de licença e de dispensa, bem como de suspensão do contrato.

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