sexta-feira, 16 de novembro de 2012

DENÚNCIA DO CONTRATO DE TRABALHO - ASSINATURA - RECONHECIMENTO NOTARIAL



Processo n.º 1050/08.4TTVNG.P1   TRPorto     04-07-2011


O reconhecimento notarial presencial da assinatura da denúncia do contrato de trabalho a que se reporta o art. 449º, nºs 1 e 4, do CT/2003 não pode, para efeitos do previsto nessa norma, ser efectuado por advogado pese embora o disposto no art. 38º, nºs 1 e 2 do DL 76-A/2006, de 29.03. 

Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. 435)
Adjuntos: Dr. António José Ramos
Dr. Eduardo Petersen Silva 

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto
 
I. Relatório
B..., aos 10.11.2008, instaurou contra C..., SA, acção declarativa de condenação, com processo comum, pedindo que seja declarada a ilicitude do seu despedimento e que se condene a Ré a: (a) reintegrá-lo no seu posto de trabalho com a mesma categoria profissional, funções e retribuição que auferia à data do despedimento; (b) caso o A. não venha a optar pela sua reintegração na empresa R., a pagar-lhe uma indemnização por antiguidade no valor de €20.624,99, correspondente a 11 anos de antiguidade; (c) a pagar-lhe a diferença entre o valor pago a título de subsídio de férias, férias e subsídio de Natal de 2007 e o efectivamente devido, a qual orça em €224,34; (d) a pagar-lhe todos os créditos laborais vencidos e vincendos até à data da sua efectiva reintegração na empresa R., sendo que, nesta data, se encontra já vencida a retribuição respeitante aos 30 dias anteriores à data da propositura da acção, no valor de €1.250,00; (e) a pagar uma indemnização por danos morais, no valor de €5.000,00; (f) a pagar juros devidos, à taxa legal, contados desde a data da citação da R. até efectivo e integral pagamento.
Para tanto, alega em síntese que:
É trabalhador da Ré desde Julho de 1998, com a categoria e exercendo as funções de Técnico de Sistemas Informáticos e auferindo a retribuição mensal de €1.282,00, a que acresce o subsídio de alimentação.
Aos 15.11.2007, foi convocado para uma reunião, no decurso da qual lhe foram imputadas as acusações, falsas e que descreve, feitas ameaças, designadamente o seu eventual despedimento com justa causa e participação criminal e concluindo a proporem-lhe a imediata resolução do contrato de trabalho por mútuo acordo.
Perturbado com o ambiente à sua volta, sem tempo para pensar ou se aconselhar, receoso dos danos para o seu futuro que a Ré lhe poderia causar, por medo e contra sua vontade, acedeu aos desejos da Ré, assinou um documento denominado acordo de cessação do contrato de trabalho, cuja cópia não lhe foi facultada e cujos termos desconhece. E, nessa mesma data, a Ré transferiu para a conta do A. as verbas que aquela entendia serem-lhe devidas. Aos 20.11.2007, o A., depois de melhor reflectir e "no uso da faculdade de arrependimento", revogou o mencionado acordo revogatório do contrato de trabalho, mais referindo que iria comparecer ao trabalho no dia 22.11,o que fez por carta registada com aviso de recepção e devolvendo as quantias que havia recebido. A Ré respondeu-lhe recusando aceitar a cessação por revogação dos efeitos do referido acordo alegando, para além do mais, que o A. não beneficiava do direito ao arrependimento uma vez que a sua assinatura, aposta no acordo de revogação, foi reconhecida presencialmente.
Tal reconhecimento presencial foi feito pelos próprios Advogados da Ré e não por notário (art. 33º da p.i.), pelo que não se verifica qualquer impedimento ao exercício dessa faculdade.
No dia 22.11.07, a ré deu instruções para que o A. não pudesse entrar nas suas instalações, tendo o A., quando se apresentou para retomar o trabalho, sido efectivamente impedido de aí entrar, o que consubstancia um despedimento ilícito, uma vez que não precedido de processo disciplinar.
O A. exerce actualmente actividade profissional para outra empresa, onde aufere a retribuição de €750,00, pelo que o seu prejuízo mensal é de €500,00. Mais entende que a indemnização de antiguidade, caso não opte pela reintegração, deve ser fixada em 45 dias de retribuição por cada ano de antiguidade. A título de subsídio de férias, férias não pagas não gozadas e subsídio de Natal recebeu apenas €1.175,22 quando o devido era de €1.250,00, pelo que se lhe encontra em dívida €224,34. Sofreu os danos não patrimoniais que invoca, pelo que deverá a ser condenada a pagar-lhe indemnização não inferior a €5.000,00.
A Ré contestou, apresentando a sua versão dos factos, designadamente quanto à reunião invocada pelo A., mais alegando, em síntese e no que importa ao recurso, que: nessa reunião o A. manifestou a sua vontade de fazer cessar voluntariamente o seu contrato de trabalho, pelo que, à sua frente, foi redigida e impressa a carta de fls. 70, na qual o mesmo, voluntariamente, comunica a "rescisão" do contrato e que, aí, a assinatura foi objecto de reconhecimento presencial por parte de advogado, reconhecimento esse devidamente registada no site da Ordem dos Advogados, tudo em conformidade com o disposto no art. 38º do DL 76-A/2006 (e na Portaria 657-B/2006, de 29.06), nos termos do qual tal reconhecimento confere ao documento a mesma força probatória que teria se tais actos tivessem sido realizados com intervenção notarial.
Impugna a alegada coacção e acrescenta que, face à denúncia do contrato pelo A., seria descabido permitir-lhe a continuação da prestação da actividade, pelo que não existiu qualquer despedimento.
Termina concluindo no sentido da improcedência da acção.
O A. respondeu à contestação, impugnando a factualidade alegada pela ré e concluindo como na petição inicial.
Proferido despacho saneador tabelar, com dispensa da selecção da matéria de facto, e realizada a audiência de discussão e julgamento, cujo encerramento, com as alegações orais, ocorreu aos 09.12.2010, foi proferida decisão da matéria de facto e sentença que julgou a acção totalmente improcedente por não provada, absolvendo-se a Ré dos pedidos contra ela formulados pelo A.
Inconformado, veio o A. recorrer, formulando, a final das suas alegações, as seguintes conclusões:
"1. O reconhecimento da assinatura aposta pelo Recorrente na denúncia do contrato de trabalho por ele subscrita em 15 de Novembro de 2007, apenas foi feita por semelhança e não presencialmente, como resulta do doc. n.º 3, junto aos autos pela Ré com a sua douta Contestação, (fls 71 dos autos).
2. Pelo que a douta sentença recorrida deverá, quanto à decisão sobre a matéria de facto, ser alterada, alterando-se a redacção do facto constante do parágrafo 15 da resposta à matéria de facto, na parte em que se diz "... tal reconhecimento presencial", pela redacção "... tal reconhecimento por semelhança";
3. O reconhecimento da assinatura aposta pelo Recorrente na denúncia do contrato de trabalho por ele subscrita em 15 de Novembro de 2007, foi feita por Advogado e não por notário, como a lei exige no art.º 449.º do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto.
4. O reconhecimento da assinatura do trabalhador na denúncia do contrato de trabalho feito por Advogado não afasta a faculdade de arrependimento do trabalhador até ao 7.º dia seguinte à data em que aquela chegou ao poder da Ré.
5. As instruções dadas pela recorrida para que o recorrente não pudesse entrar nas instalações da empresa para retomar a sua actividade profissional, tendo sido impedido, efectivamente, de ai entrar, quando pelas 9.00 horas do dia 22 de Novembro se apresentou nas instalações da Ré, onde habitualmente exercia a sua actividade profissional, correspondem a um despedimento ilícito do trabalhador;
6. Pelo que a sentença recorrida deverá ser revogada e substituída por uma outra decisão que condene a Ré, ora recorrida, no pedido formulado pelo Autor na petição inicial, junta aos autos a fls..
Foi violado o disposto no artigo 449.º do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto e o disposto no art.º 38.º do DL 76-A/06 der 29/03.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO DEVERÁ A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA SER ALTERADA NOS TERMOS REFERIDOS NAS CONCLUSÕES DAS PRESENTES ALEGAÇÕES, (...)"
A Recorrida contra-alegou, tendo, a final, formulado as seguintes conclusões:
I - O recorrente não tem razão na argumentação que apresenta nas suas alegações.
II - É ponto assente e reconhecido pelo próprio Recorrente no artigo 33.º da Petição Inicial, que o Reconhecimento que o Recorrente invoca é presencial: "Ora, tal reconhecimento presencial, foi feito pelos próprios Advogados da R. e não por Notário."
III - Em todo o caso, da análise da legislação que regula a competência dos advogados em matéria de actos notariais e que passaremos a fazer, podemos retirar essa conclusão.
IV - Dispõe o artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 76-A/2006 de 29 de Março, sob a epígrafe de Reconhecimentos de assinaturas e autenticação e tradução de documentos:
Extensão do regime dos reconhecimentos de assinaturas e da autenticação e tradução de documentos.
1- Sem prejuízo da competência atribuída a outras entidades, as câmaras de comércio e indústria, reconhecidas nos termos do Decreto-Lei Nº 244/1992, de 29 de Outubro, os conservadores, os oficiais de registo, os advogados e os solicitadores podem fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, autenticar documentos particulares, certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos nos termos previstos na lei notarial. (sublinhado nosso)
2- Os reconhecimentos, as autenticações e as certificações efectuados pelas entidades previstas nos números anteriores conferem ao documento a mesma força probatória que teria se tais actos tivessem sido realizados com intervenção notarial. (sublinhado nosso)
V - Portanto, no que diz respeito aos reconhecimentos, ressalta claramente da lei que os advogados têm agora competência para fazer todos os reconhecimentos de assinatura.
VI - Com efeito, a declaração de cessação do contrato de trabalho em causa, foi objecto de reconhecimento presencial da assinatura do Recorrente no dia 15 de Novembro de 2007, devidamente registado no site da Ordem dos advogados.
VII - Contrariamente àquilo que é sustentado pelo Recorrente, os reconhecimentos simples são sempre presenciais, enquanto que os reconhecimentos com menções especiais podem ser presenciais ou por semelhança, conforme resulta do n.º 4 do artigo 153.º do Código do Notariado.
VIII - Assim, tendo sido feito o reconhecimento da assinatura do Recorrente na presença de advogado e do signatário e efectuado o correspondente registo informático encontram-se reunidos todos os elementos necessários para o reconhecimento presencial simples, aqui posto em causa pelo Recorrente.
IX - Encontrando-se apenas em crise o reconhecimento da assinatura do Recorrente e uma vez que esse reconhecimento foi feito nos termos da lei sem que se verifique qualquer irregularidade, não se vislumbra, pois, qualquer despedimento ilícito.
Termos em que Requer,
- Se mantenha a Douta Sentença recorrida e se julgue totalmente improcedente o recurso jurisdicional interposto pelo Recorrente.
O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso, sobre o qual as partes, notificadas, não se pronunciaram.
Colheram-se os vistos legais.
*
II. Matéria de Facto Provada
Na 1ª instância foi dada como provada a seguinte factualidade [1]:
1. O autor é trabalhador da ré desde Julho de 1998.
2. Com a categoria profissional e exercendo funções de Técnico de Sistemas Informáticos.
3. Auferindo o vencimento mensal ilíquido de € 1282,00.
4. A que acresce o respectivo subsidio de alimentação.
5. No dia 15 de Novembro de 2007, pela manhã, nas instalações da ré, o autor foi convocado para uma reunião.
6. Na qual estavam presentes os seguintes elementos da ré: D..., administradora da ré, E..., chefe da área onde o autor trabalhava, F..., responsável pelo sector de serviços da ré e ainda dois advogados da ré.
7. No decurso de tal reunião, o autor foi confrontado com acusações de ter, alegadamente, acedido pela via informática a dados da empresa com carácter secreto e/ou reservado, cuja consulta lhe estava interdita.
8. Na sequência de um acordo com a ré, esta procedeu ao calculo dos créditos laborais a que o autor teria direito, tendo procedido nesse mesmo dia pelas 13.27 horas à transferência daqueles para a conta bancária do autor, conforme recibo e comprovativo de folhas 10 e 11, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
9. Entretanto no dia 20/11/2007, o autor revogou o acordo que tinha feito com a ré enviando-lhe uma carta registada com o teor de folhas 12.
10. Junto com a qual procedeu à devolução das quantias que entretanto haviam sido transferidas para a sua conta, a titulo de pagamento dos créditos laborais.
11. Na referida carta de revogação o autor comunicava à ré que iria comparecer ao trabalho na quinta-feira seguinte, dia 22 de Novembro, pelas 9.00 horas, para retomar a sua actividade profissional.
12. A essa carta respondeu a ré, através de uma outra que está junta e aqui se dá por integralmente reproduzida.
13. Na qual recusou a aceitar a revogação dos efeitos daquele acordo.
14. Alegando, entre outros motivos, que o autor, não beneficiava da faculdade de arrependimento, em virtude da sua assinatura, aposta no documento de cessação do contrato de trabalho, ter sido reconhecida presencialmente.
15. Ora, tal reconhecimento presencial, foi feito por advogado da ré, e não por um notário.
16. No dia 22/11/2007, a ré deu instruções para que o autor não pudesse entrar nas instalações da empresa para retomar a sua actividade profissional.
17. Tendo o autor sido impedido, efectivamente de ai entrar, quando pelas 9.00 horas do dia 22 de Novembro se apresentou nas instalações da ré onde habitualmente exercia a sua actividade profissional.
18. O autor exerce actualmente a sua actividade profissional numa outra empresa, onde aufere o vencimento mensal ilíquido de € 750,00.
19. A ré pagou ao autor, por transferência bancária, a quantia liquida de € 3115,06, correspondente aos proporcionais de férias, férias não gozadas em 2007, subsidio de natal, etc, devidos, conforme discriminação constante do doc 1 junto aos autos com a petição.
20. Tendo pago, a título de subsídio de férias, férias não gozadas e subsidio de natal a quantia de € 1175,22 por cada um desses direitos.
21. O autor esteve desempregado durante alguns meses, tendo-se sentido incomodado com a situação.
22. A ré é uma sociedade comercial que se dedica à comercialização de software, hardware e prestação de serviços de informática.
23. Correu termos um processo-crime no Tribunal Judicial de Matosinhos, em que o Ministério Publico, autonomamente, deduziu acusação por crime de acesso ilegítimo praticado pelo autor, conforme doc 2 junto com a contestação, tendo a ré aderido e deduzido o correspondente Pedido de Indemnização Civil.
24. A reunião ocorrida com o autor no dia 15/11/2007 visou evitar que se desse publicidade ao caso.
25. Com efeito, se tal se viesse ou vier a verificar traria ou trará consequências altamente prejudiciais à ré quer a nível interno, no que concerne à relação com os seus trabalhadores, quer a nível externo, uma vez que a ré trabalha no ramo da informática e uma quebra nas suas redes e bases pode provocar-lhes os maiores prejuízos.
26. Foi então explicado ao autor que não era do interesse da ré dar publicidade ao caso face ao reflexos negativos que daí adviriam, mas que não poderia um caso de tal gravidade passar sem as necessárias consequências, sob pena de se abrir um gravíssimo precedente.
27. E no seguimento dessa conversa, foi perguntado ao autor se estava na disposição de cessar por sua iniciativa a relação com a empresa, circunscrevendo assim a difusão do acidente.
28. Na reunião estava presente F..., que mantinha uma relação de amizade com o autor.
29. O autor manifestou então a sua vontade de cessar voluntariamente o seu contrato de trabalho, pelo que à sua frente foi redigida e impressa a correspondente carta, reconhecida presencialmente, conforme documento 3 junto com a contestação e que aqui se dá por integralmente reproduzido.
30. É certo que o autor, mesmo quando confrontado com as informações recebidas da policia judiciaria, manteve sempre a afirmação de que nada havia feito.
31. Pelo que o referido amigo do autor, F..., reiterada e veemente lhe dizia: "Se tens a consciência tranquila não assines".
32. Foi o próprio autor que de seguida propôs que fossem a sua casa para verificação dos seus computadores.
33. O autor foi então a sua casa acompanhado do seu amigo e do referido E..., e noutro carro o advogado que reconheceu a assinatura daquele.
34. O autor subscreveu a declaração junta a folhas 84, cujo teor se dá por reproduzido.
35. A carta de rescisão do contrato de trabalho de folhas 70 foi assinada pelo autor, tendo a sua assinatura sido reconhecida pelo advogado e nos demais termos que constam de folhas 69.
36. O registo electrónico do reconhecimento da assinatura do autor foi efectuado às 14.46 horas do dia 15/11/2007, conforme consta de folhas 71.
*
As expressões "Ora", "etc" e "É certo que" constantes, respectivamente, dos nºs 15, 19 e 30 não devem figurar em sede de matéria de facto, pelo que se eliminam (art. 646º, nº 4, do CPC) e reformula-se, ainda, o nº 19 dos factos provados, que passará a ter o seguinte teor:
"19. A ré pagou ao autor, por transferência bancária, a quantia liquida de €3115,06, correspondente aos proporcionais de férias, férias não gozadas em 2007, subsidio de natal e demais devido, conforme discriminação constante do doc 1 junto aos autos com a petição (de fls. 10)."
*
Adita-se à matéria de facto provada os nºs 37, 38 e 39 com a transcrição dos documentos de fls. 69, 70 e 71 dos autos a que se reportam os nºs 35 e 36 dos factos provados:
37. É o seguinte o teor do documento de fls. 70, assinado pelo Autor:
"(...)
Matosinhos, 15 de Novembro de 2007
Assunto: Comunicação de Resolução do Contrato de Trabalho
Exmos. Senhores
Venho por este meio comunicar a rescisão do contrato de trabalho com V. Exas. A partir desta data, por razões meramente pessoais, nada tendo a exigir por força da presente rescisão.
(...)".
38. É o seguinte o teor do documento de fls. 69:
"G...
ADVOGADO
(...)
RECONHECIMENTO
Reconheço a assinatura na declaração anexa de 15/11/2007 que se consubstancia em comunicação de rescisão de contrato de trabalho, como pertencente a B..., feita perante mim, pelo próprio, cuja identidade verifiquei por exibição do respectivo B.I. nº ........, emitido em 23/02/2006, pelos S.I.C. de Lisboa, que depois de conferido restituí ao apresentante, a qual consta de uma página.
O presente reconhecimento vai por mim, rubricado e carimbado.
O presente acto de reconhecimento é feito nas instalações da C..., S.A., gratuitamente, em 15 de Novembro de 2007, sob o nº de registo ...../..
O Advogado,"
(assinatura e carimbo)
39. É o seguinte o teor do documento de fls. 71:
"REGISTO ONLINE DOS ACTOS DOS ADVOGADOS
ARTIGO 38º DO Decreto-Lei nº 76-a/2006, de 29-03
Portaria nº 657-B/2006, de 20-06
Dr. (a) G...
CÉDULA PROFISSIONAL: .....
IDENTIFICAÇÃO DA NATUREZA E ESPÉCIE DO ACTO
Reconhecimento simples
IDENTIFICAÇÃO DOS INTERESSADOS
B...
B.I. nº ........
EXECUTADO A: 2007-11-15 14:46
REGISTADO A: 2007-11-15 14:46
COM O Nº: ...../.
Poderá consultar este registo em (...)"
*
Porque documentalmente provado, adita-se à matéria de facto provada o nº 40, com o seguinte teor:
40. O Exmº Sr. Dr. G... interveio nos diversos actos processuais praticados nos presentes autos como mandatário judicial da Ré, havendo-lhe sido outorgada a procuração de fls. 27 da qual consta, para além do mais, que a Ré lhe confere "os poderes de representação necessários para confessar, transigir e desistir e para todos os efeitos representar a sociedade na audiência de partes a ter lugar no âmbito do processo 1050/08.4TTVNG - 2º Juízo - Tribunal de Trabalho de Vila Nova de Gaia. (...)".
*
III. Fundamentação
1. Nos termos do disposto nos artºs 684º, nº 3, e 685º-A, nº 1, do CPC, na redacção introduzida pelo DL 303/2007, de 24.08, aplicáveis ex vi do disposto nos artºs 1º, nº 2, al. a), e 87º do CPT, as conclusões do recurso, com excepção das matérias de conhecimento oficioso, delimitam o seu objecto.
Daí que sejam as seguintes as questões a apreciar:
a. Alteração da matéria de facto;
b. Se o reconhecimento, feito por advogado, da assinatura do trabalhador da denúncia do contrato de trabalho não afasta o direito de revogação dessa denúncia;
c. Do despedimento e, em caso de procedência, das respectivas consequências.
2. Da 1ª Questão
Pretende o Recorrente que, no nº 15 dos factos provados, se substitua a parte em que se refere "tal reconhecimento presencial..." por "tal reconhecimento por semelhança...", alteração essa que sustenta no documento de fls. 71 (registo online do reconhecimento) uma vez que dele consta ter sido registado um "reconhecimento simples".
Em tal ponto da matéria de facto, com a alteração por nós antes introduzida, refere-se que: "15. Tal reconhecimento presencial, foi feito por advogado da ré, e não por um notário."
2.1. Desde já se dirá que não assiste razão ao Recorrente, tal como, e bem, o refere a Recorrida.
Com efeito, dispõe o art. 153º do Código do Notariado, com a redacção introduzida pelo DL 250/96, de 24.12., que:
1 - Os reconhecimentos notariais podem ser simples ou com menções especiais.
2 - O reconhecimento simples respeita à letra e assinatura, ou só à assinatura, do signatário de documento.
3 - O reconhecimento com menções especiais é o que inclui, por exigência da lei ou a pedido dos interessados, a menção de qualquer circunstância especial que se refira a estes, aos signatários ou aos rogantes e que seja conhecida do notário ou por ele verificada em face de documentos exibidos e referenciados no termo.
4 - Os reconhecimentos simples são sempre presenciais; os reconhecimentos com menções especiais podem ser presenciais ou por semelhança. (sublinhado nosso)
5 - Designa-se presencial o reconhecimento da letra e assinatura, ou só da assinatura, em documentos escritos e assinados ou apenas assinados, na presença de notários, ou o reconhecimento que é realizado estando o signatário presente ao acto. (sublinhado nosso).
6 - Designa-se por semelhança o reconhecimento com a menção especial relativa à qualidade de representante do signatário feito por simples confronto da assinatura deste com a assinatura aposta no bilhete de identidade ou documento equivalente emitidos pela autoridade competente de um dos países da União Europeia ou no passaporte ou com a respectiva reprodução constante de pública-forma extraída por fotocópia.
Ou seja, de acordo com a referida versão do art. 153º, que alterou o anterior esquema tradicional, os reconhecimentos simples são sempre presenciais, enquanto que os reconhecimentos com menções especiais podem ser presenciais ou por semelhança, sendo que os reconhecimentos notarias de letra e de assinatura ou só de assinatura, feitos por semelhança e sem menções especiais foram abolidos - cfr. Ricardo Nascimento, Da Cessação do Contrato de Trabalho, Em Especial Por Iniciativa do Trabalhador, nota 707, págs. 302/303.
No caso, do registo online do reconhecimento em causa (fls. 71 - cfr. nº 39 dos factos provados) consta que foi registado um "reconhecimento simples", ou seja e pelo que se referiu, um reconhecimento presencial, o que, aliás, está em consonância com o teor do reconhecimento documentado a fls. 69 (cfr. nº 38 dos factos provados), no qual se refere ter sido ele feito presencialmente, documento este cuja falsidade não foi, oportunamente, invocada pelo Autor, ora Recorrente. Aliás, é o próprio Autor quem, no art. 33º na petição inicial, refere que "Ora, tal reconhecimento presencial foi feito pelos próprios Advogados da Ré e não por um Notário", sendo que o facto dado como provado, mas agora questionado pelo A., foi retirado da petição inicial e, por consequência, por si próprio alegado.
Assim, e sem necessidade de considerações adicionais, improcedem, nesta parte, as conclusões do recurso, sendo, por consequência, de manter o referido ponto da matéria de facto.
3. Quanto à 2ª Questão
Tem ela por objecto saber se, como pretende o Recorrente, o reconhecimento, feito por advogado, da assinatura do trabalhador da denúncia do contrato de trabalho não afasta o direito de revogação dessa denúncia.
Na sentença recorrida entendeu-se que, face ao disposto no art.º 38º, nº 1, do DL 76-A/06, os advogados passaram a poder fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança e que, nos termos do nº 2 desse preceito, eles conferem ao documento a mesma força probatória dos actos realizados com intervenção notarial, desde que registados no sistema informático próprio. Assim, aí se entendeu que o reconhecimento, efectuado por advogado, no dia 15.11.2007 à assinatura aposta pelo autor na denúncia do contrato de trabalho tem o mesmo valor que um reconhecimento por notário, tornando a denúncia desse contrato, nos termos do art. 449º, nºs 1 e 4, do Código do Trabalho aprovado pela Lei 99/2003, de 27.08 (CT/2003), irrevogável.
Importa referir que o A., na petição inicial, havia ainda invocado factualidade susceptível de consubstanciar vício da vontade (coação moral) determinante da anulabilidade dessa denúncia, vício esse que a sentença recorrida teve por inexistente, nessa parte julgando igualmente improcedente a acção. O A. não recorreu de tal segmento decisório, pelo que, nessa parte, a decisão transitou em julgado.
3.1. O designado direito ao arrependimento[2] por parte do trabalhador que denuncia o contrato de trabalho, facultando-se-lhe a possibilidade de revogar essa denúncia, já estava prevista na pela Lei 38/96, de 31.08, cujo art. 1º dispunha que "1. A rescisão do contrato de trabalho por iniciativa do trabalho sem assinatura reconhecida notarialmente pode por este ser revogada por qualquer forma até ao 2º dia útil seguinte à data da produção dos seus efeitos.".
Tinha esse direito, nos termos estatuídos na norma, a dupla finalidade de garantir a devida ponderação, pelo trabalhador, das consequências da sua declaração de denúncia, evitando eventuais decisões precipitadas e, por outro lado, minimizar as situações, que frequentemente ocorriam, dos denominados despedimentos dissimulados, em que o empregador, designadamente aquando da admissão do trabalhador, deste obtinha uma declaração de denúncia do contrato, não datada e que, posteriormente, quando entendesse, utilizava para por termo ao contrato de trabalho.
Porém, do nº 1 decorre que, sendo a denúncia do contrato feita com assinatura reconhecida notarialmente, já o trabalhador não podia exercer tal direito de revogação.
Entretanto, o CT/2003 (o aplicável ao caso atenta a data dos factos), passou a dispor, no seu art. 449º, que:
1 - A declaração de cessação do contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador, tanto por resolução como por denúncia, sem assinatura objecto de reconhecimento notarial presencial, pode por este ser revogada por qualquer forma até ao 7º dia seguinte à data em que chega ao poder do empregador.
2 - No caso de não ser possível assegurar a recepção da comunicação prevista no número anterior, o trabalhador deve remetê-la ao empregador, por carta registada com aviso de recepção, no dia útil subsequente ao fim desse prazo.
3 - A cessação prevista no nº 1 só é eficaz se, em simultâneo com a comunicação, o trabalhador entregar ou puser por qualquer forma à disposição do empregador, na totalidade, o valor das compensações pecuniárias eventualmente pagas em consequência da cessação do contrato de trabalho.
4 - Para a cessação do vínculo, o empregador pode exigir que os documentos de onde conste a declaração prevista no nº 1 do artigo 442º e o aviso prévio a que se refere o nº 1 do artigo 447º tenham a assinatura do trabalhador objecto de reconhecimento notarial presencial.
5 - No caso a que se refere o número anterior, entre a data do reconhecimento notarial e a da cessação do contrato não pode mediar um período superior a 60 dias.
Com este preceito, o prazo (então de dois dias) para o exercício do direito de revogação da denúncia do contrato de trabalho deixou de ser contado a partir da data da produção dos efeitos da denúncia, tendo sido aumentado para 7 dias, porém contados da data em que a denúncia chega ao poder do empregador[3]. Por outro lado, passou a ser permitido ao empregador exigir do trabalhador que a sua assinatura, constante do documento que titula a denúncia do contrato, seja objecto de reconhecimento notarial presencial, sendo que, tal como anteriormente, só as denúncias sem tal reconhecimento poderão ser revogadas pelo trabalhador.
O reconhecimento notarial da assinatura da denúncia é uma faculdade conferida ao empregador, visando a tutela de um seu interesse, qual seja o de lhe permitir, mediante a imposição da observância de um formalismo reforçado na declaração extintiva do trabalhador, precaver-se contra uma eventual mudança de ideias ou de planos por parte deste [4]. Naturalmente que o trabalhador não tem qualquer interesse em formalizar, desse modo, a denúncia do contrato de trabalho, sendo certo que tal lhe irá impedir o exercício do "direito ao arrependimento".
Mas, precisamente porque está em causa a restrição do exercício desse direito, entendeu também o legislador que a realização da assinatura na presença do notário garante a genuinidade e a actualidade da declaração extintiva proferida pelo trabalhador, evitando práticas fraudulentas por parte do empregador e exigindo do trabalhador uma reflexão acrescida"[5], assim se exigindo esse formalismo reforçado .
É certo que, aquando da publicação do CT/2003, o reconhecimento presencial da letra e/ou assinatura de documentos era exclusivamente um acto notarial[6]. E que, apenas posteriormente, com o DL 76-A/2006, de 29.03, é que veio a ser conferida aos advogados[7] a possibilidade de efectuarem reconhecimentos simples e presenciais, diploma esse cujo artigo 38º (na redacção introduzida pelo art. 19º do DL 8/2007, de 17.01[8]), sob a epígrafe de Extensão do regime dos reconhecimentos de assinaturas e da autenticação e tradução de documentos, veio dispor que:
1 - Sem prejuízo da competência atribuída a outras entidades, as câmaras de comércio e indústria, reconhecidas nos termos do Decreto-Lei n.º 244/92, de 29 de Outubro, os conservadores, os oficiais de registo, os advogados e os solicitadores podem fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, autenticar documentos particulares, certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos, nos termos previstos na lei notarial, bem como certificar a conformidade das fotocópias com os documentos originais e tirar fotocópias dos originais que lhes sejam presentes para certificação, nos termos do Decreto-Lei nº 28/2000, de 13 de Março.
2 - Os reconhecimentos, as autenticações e as certificações efectuados pelas entidades previstas nos números anteriores conferem ao documento a mesma força probatória que teria se tais actos tivessem sido realizados com intervenção notarial.
3 - Os actos referidos no n.º 1 apenas podem ser validamente praticados pelas câmaras de comércio e indústria, advogados e solicitadores mediante registo em sistema informático, cujo funcionamento, respectivos termos e custos associados são definidos por portaria do Ministro da Justiça.
4 - (...)
5 - (...).
6 - (...)
7 - (...)
O nº 3 foi regulamentado pela Portaria 657-B/2006, de 29.06, dispondo os seus arts. 1º, 3º e 4º que:
- A validade dos reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, das autenticações de documentos particulares e da certificação, ou realização e certificação, de traduções de documentos nos termos previstos na lei notarial, efectuados por câmaras de comércio e indústria, reconhecidas nos termos do Decreto-Lei nº 244/92, de 29 de Outubro, advogados e solicitadores, depende de registo em sistema informático. (art. 1º).
- Relativamente a cada um dos actos referidos no artigo 1º, devem ser registados no sistema informático os seguintes elementos: a) identificação da natureza e espécie dos actos; b) identificação dos interessados, com menção do nome completo e do número do documento de identificação; c) identificação da pessoa que pratica o acto; d) data e hora de execução do acto; e) número de identificação do acto (art. 3º).
- O registo informático é efectuado no momento da prática do acto, devendo o sistema informático gerar um número de identificação que é aposto no documento que formaliza o acto. (art. 4º, nº 1).
Sendo, até então, os reconhecimentos presenciais um acto da competência notarial, entendeu o legislador estender tal competência às entidades acima referidas, conferindo aos respectivos documentos a mesma força probatória que teriam se tais actos tivessem sido realizados com intervenção notarial.
Não obstante, e salvo melhor opinião, não se nos afigura que tanto baste para que, nos termos e para os efeitos do art. 449º, nº 1, do CT/2003, se possa equiparar o reconhecimento presencial feito por advogado ao "reconhecimento notarial presencial" previsto nesse art. 449º.
Na verdade, e pese embora, à data do CT/2003, o reconhecimento presencial fosse um acto notarial, a verdade é que a letra da lei, ainda assim, não dispensou a referência à competência "notarial". Se se poderia dizer, tal como o entende a Recorrida e pressuposto na sentença, que essa referência decorreria apenas da circunstância de os reconhecimentos presenciais serem actos notariais, poder-se-á, na defesa da tese oposta, argumentar que, então e se assim é, escusado seria o legislador ter feito tal menção (pois se os reconhecimentos presenciais simples eram actos praticados apenas pelo notário para quê dizê-lo?).
O que nos parece é que o legislador, não obstante o regime que, à data da publicação do CT/2003, vigorava em matéria de reconhecimento presencial simples de letra e/ou assinaturas de documentos, pretendeu enfatizar a natureza exclusivamente notarial de tal reconhecimento[9], propósito este tanto mais evidente quanto se tivermos em conta que o CT/2009[10], no seu art. 402º, nº 1, manteve a exigência do reconhecimento notarial presencial. Ou seja, quando este foi publicado, em 2009, já estava em vigor o DL 76-A/2006, de 29.03, pelo que o legislador, certamente, não desconhecia que a lei permitia que tais reconhecimentos fossem levados a cabo por advogado. E, ainda assim, o CT/2009, no seu art. 402º, nº 1, ao invés de utilizar uma formulação mais ampla (reportando-se tão-só ao reconhecimento presencial da assinatura) caso a sua intenção tivesse sido a de incluir os reconhecimentos feitos por advogado, manteve a exigência do "reconhecimento notarial presencial"[11].
Por outro lado, afigura-se-nos que a ratio do art. 449º do CT/2003 (e 402º do CT/2009) aponta no sentido da competência exclusivamente notarial.
Com efeito, a lei consagra o direito do trabalhador (que denuncia o contrato de trabalho) ao arrependimento, o qual pode ser exercido no prazo de 7 dias. Confere-lhe, pois, um prazo em que ele, de forma mais reflectida e, designadamente, livre que qualquer eventual constrangimento, possa melhor ponderar a sua decisão.
Todavia, em benefício do empregador, a lei introduz uma restrição a esse direito, ao impedir o seu exercício se a assinatura do trabalhador for objecto de reconhecimento notarial presencial. A exigência da intervenção notarial, face, designadamente, à maior solenidade do acto, ao peso institucional e social que a intervenção notarial reveste e à equidistância relativamente a qualquer interesse particular, foi, precisamente, o meio que a lei entendeu ser de exigir, em contrapartida da restrição do direito, como forma de garantir ao trabalhador a necessária ponderação e consciencialização da importância do acto de denunciar o contrato de trabalho.
Acresce que a equiparação mencionada no art. 38º, nº 2, do DL 76-A/2006 se reporta aos efeitos probatórios. Ora, parece-nos, a ratio da exigência do reconhecimento notarial prevista no art. 449º do CT/2003 extravasa os efeitos meramente probatórios do documento. Tal exigência não visa, apenas, conferir ao empregador a segurança de que, por via do reconhecimento notarial, o trabalhador não venha, mais tarde, a impugnar a sua assinatura[12]. Com efeito, e como decorre do que acima dissemos, essa exigência é estabelecida não apenas no interesse do empregador, mas também no interesse do trabalhador, na medida em que visa, como contrapartida da eliminação do seu direito ao arrependimento, garantir-lhe a possibilidade de uma adequada e actual ponderação da sua decisão.
A terminar, resta apontar o elemento literal da lei que, indiscutivelmente, se reporta ao reconhecimento notarial.
Deste forma, e em conclusão, entendemos que o reconhecimento presencial da assinatura da denúncia, pelo trabalhador, do contrato de trabalho feito por advogado não substitui ou dispensa, para efeitos do disposto no art. 449º, nºs 1 e 4, do CT/2003, o reconhecimento notarial (presencial).
Deste modo, e nesta parte, procedem as conclusões do recurso.
4. Da 3ª questão
Tem esta questão por objecto, em consequência do referido no ponto precedente, o alegado despedimento do A.
No caso, o A., aos 15.11.2007, na sequência do circunstancialismo descrito na matéria de facto provada, denunciou, por escrito, o contrato de trabalho que mantinha com a ré, havendo a assinatura por si aposta nessa denúncia sido, nesse dia, reconhecida por advogado.
Porém, por carta registada enviada à Ré aos 20.11.2207, o A. comunicou à Ré a revogação dessa denúncia, disse-lhe que iria retomar o trabalho no dia 22.11.07 e devolveu-lhe as quantias que lhe tinham sido pagas na sequência da denúncia do contrato de trabalho, ao que a Ré, se opôs conforme nºs 12, 13, 16 e 17 do factos provados, não aceitando essa revogação e não permitindo que o A. retomasse o trabalho.
Ora, tendo em conta o que dissemos no ponto anterior, o reconhecimento presencial da assinatura do A. na denúncia do contrato de trabalho, porque não foi feita notarialmente, mas perante advogado, não obsta à revogação, pelo A., dessa denúncia, pelo que nada o impedia de a revogar, o que o mesmo fez dentro do prazo legal e devolvendo as quantias que havia recebido.
Assim sendo, carece de fundamento legal a recusa da Ré em aceitar tal revogação, consubstanciando o seu comportamento, ao não permitir que o A. retomasse a sua actividade, um despedimento ilícito porque não precedido de processo disciplinar - art. 429º, al. a), do CT/2003 - procedendo, nesta parte, as conclusões do recurso.
4.1. Em consequência da ilicitude do despedimento, tem o trabalhador direito:
- Nos termos do disposto nos arts. 438º, nº 1 e 439º, nºs 1 e 2, do CT/2003, à reintegração ou à indemnização, conforme opção do mesmo, sendo, em caso de indemnização, a mesma fixada entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada não completo ou fracção de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente do disposto no art. 429º.
No caso, o A., tal como o pedido foi formulado na petição inicial, peticionou a condenação da ré a reintegrá-lo ou, caso não optasse pela sua reintegração, na indemnização de antiguidade no valor de €20.624,99.
Ou seja, e em primeira linha, o que o A. peticionou foi a condenação da ré na indemnização de antiguidade, sendo que a reintegração foi a alternativa que diferiu para posterior opção, pela qual não veio a optar.
Assim sendo, é-lhe devida a indemnização de antiguidade que, face à retribuição auferida e tendo em conta que a ilicitude do despedimento decorreu da inexistência de processo disciplinar, entendemos adequado e proporcional fixar em 30 dias de retribuição base por cada não de antiguidade ou fracção. Refira-se que inexistindo, como é o caso, razões ponderosas que determinem a fixação da indemnização em limites aquém ou além da média entre os limites fixados, a estes se deverão atender, até porque, no que se reporta à graduação abaixo desse limite médio e tendo em conta a unidade e harmonia do sistema jurídico, não faria sentido que a um despedimento ilícito corresponda indemnização inferior àquela a que corresponderia nos casos de cessação lícita do contrato de trabalho por causas objectivas (despedimento colectivo e por extinção do posto de trabalho). E, por outro lado, também não existem razões que, de forma relevante, apontem no sentido da sua fixação acima desse limite médio. A retribuição do sinistrado é cerca de duas vezes superior ao salário mínimo nacional, para além de que, tendo em conta o grau de ilicitude face à ordem estipulada no art. 429º, existirão outras situações mais graves (designadamente as previstas na sua al. b)) a reclamar montante superior.
Considerando ainda que o A. peticionou uma indemnização de antiguidade correspondente a 11 anos (o A. foi admitido ao serviço em Julho de 1998) e não também a correspondente à antiguidade vencida até à data do trânsito em julgado da decisão, entendemos, atento o princípio do dispositivo e não se tratando de matéria subtraída à disponibilidade das partes, ser de atender a tal antiguidade e não já à reportada até ao trânsito em julgado do presente acórdão.
Assim, e a esse título, tem o A. direito à quantia de €14.102,00.
Nos termos do disposto no art. 437º do CT/2003, tem ainda o A. direito às retribuições, à razão de €1.282,00 mensais, que teria auferido desde os 30 dias anteriores à propositura da acção, ou seja, desde 10.10.2008 (a acção foi proposta aos 10.11.2008) até à data do trânsito em julgado do presente acórdão, às quais haverá que descontar o subsídio de desemprego que o A. haja porventura recebido, que deverá ser entregue pela Ré à Segurança Social (art. 437º, nº 3), bem como, tendo em conta o referido no nº 18 dos factos provados (nos termos do qual o A. exerce actividade profissional remunerada), as importâncias que o A. tenha auferido em consequência da actividade profissional remunerada exercida no referido período (entre 10.10.08 e a data do trânsito em julgado da presente decisão), cuja liquidação se relega para o respectivo incidente (arts. 661º, nº 2 e 378º, nº 2, do CPC).
Há que esclarecer que, atento o disposto no art. 260º, nº 2, do CT/2003, entendemos que o subsídio de refeição não integra, para efeitos do disposto no art. 437º, nº 1, a retribuição.
O A. reclamou, ainda, o pagamento da quantia de €5.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais. Contudo, não tendo sido feita prova dos alegados danos, e sobre ele, A., impendendo o respectivo ónus (art. 342º, nº 1, do Cód, Civil), improcede, nesta parte, o pedido.
Por fim, o A. reclamou o pagamento dos juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.
Nos termos do disposto nos arts. 804º, 805º, 806º e 559º. Todos do Cód. Civil, o A. tem direito, sobre as quantias que lhe são devidas a título de indemnização de antiguidade e retribuições intercalares, a juros de mora. Porém, os mesmos não são devidos desde a citação.
Com efeito, relativamente à indemnização de antiguidade, os juros de mora são devidos, apenas, desde a data do trânsito em julgado do presente acórdão, pois que apenas neste se procedeu à fixação, e consequente liquidação, da quantia devida a esse título - art. 805º, nº 3, do Cód. Civil (cfr. Acórdãos do STJ de 25.06.08 e de 21.10.09, in www.dgsi.pt, Processos nºs 08S1033 e 1996/05.TTLSB.S1).
Relativamente às retribuições devidas desde os 30 dias anteriores à propositura da acção até à data do trânsito em julgado da decisão, os juros são devidos desde o trânsito em julgado da decisão que venha a proceder à liquidação do montante devido - citado art. 805º, nº 3.
4.2. Assim, em conclusão e nesta parte, são o pedido e recurso parcialmente procedentes.
*
IV. Decisão
Em face do exposto, acorda-se em conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, revoga-se a sentença recorrida, que é substituída pelo presente acórdão em que se decide:
A. Julgar ilícito o despedimento do A., B... e condenar a Ré, C..., SA, a pagar ao Autor:
a.1. A quantia de €14.102,00 a título de indemnização de antiguidade, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data do trânsito em julgado do presente acórdão até efectivo e integral pagamento;
a.2. As retribuições que o A. teria auferido desde 10.10.2008 (30º dia anterior à propositura da acção) até ao trânsito em julgado do presente acórdão, à razão de €1.282,00 mensais, mas sem prejuízo das deduções a que se reportam quer o nº 3 do art. 437º, do CT/2003 (subsídios de desemprego que o A. haja auferido em consequência do despedimento, que deverão ser entregues pela Ré à Segurança Social), quer, nos termos do nº 2 do citado preceito, das importâncias que o A. auferiu ou haja auferido, designadamente das referidas no nº 18 dos factos provados, em consequência da actividade profissional remunerada exercida no referido período (entre 10.10.08 e a data do trânsito em julgado da presente decisão), tudo a liquidar, nos termos dos arts. 661º, nº 2 e 378, do CPC, em incidente de liquidação, bem como a pagar-lhe, sobre as retribuições devidas, juros de mora, à taxa legal, desde a data do trânsito em julgado da decisão que venha a proceder à liquidação das quantias em dívida até efectivo e integral pagamento.
B. Absolver a Ré do demais peticionado contra ela peticionado.
Custas, em ambas as instâncias, pelo Autor e Ré na proporção do decaimento.
 
Porto, 04-07-2011
Paula Alexandra Pinheiro Gaspar Leal Sotto Mayor de Carvalho
António José da Ascensão Ramos
Eduardo Petersen Silva
___________________
[1] A numeração é da nossa autoria (uma vez que, na decisão da matéria de facto, esta não se encontra numerada).
[2] Cfr. sobre o tema, designadamente, João Leal Amado, Contrato de Trabalho à Luz do Novo Código do Trabalho, Coimbra Editora, 436 a 441; Júlio Manuel Vieira Gomes, Direito do Trabalho, Volume I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora, pág. 942; Pedro Romano Martinez e outros, Código do Trabalho Anotado, Almedina, 4ª edição, 2005, págs. 730 a 732; Ricardo Nascimento, Da Cessação do Contrato de Trabalho, em Especial Por Iniciativa do Trabalhador, Coimbra Editora, pág. 301 a 304; Albino Mendes Baptista, Estudos sobre o Código do Trabalho, Coimbra Editora, págs. 53 e 54.
[3] Com tal alteração deixou a possibilidade de revogação da denúncia de constituir uma defesa contra o risco dos referidos despedimentos dissimulados, tendo subjacente, apenas, a consagração do direito ao arrependimento - cfr. autores e ob. citadas na nota anterior.
[4] Romano Martinez, ob. citada, pág. 732.
[5] João Leal Amado, ob. citada, pág. 439.
[6] À data da publicação do CT/2003, o DL 237/2001, de 30.08, apenas previa os reconhecimentos com menções especiais, por semelhança, feitos por advogados - cfr. art. 5º, nº 1, do citado diploma.
[7] Bem como aos conservadores, oficiais de registo, advogados e solicitadores.
[8] Esse art. 38º, nº 1, na redacção original, dispunha que: "1. Sem prejuízo da competência atribuída a outras entidades, as câmaras de comércio e indústria, reconhecidas nos termos do Decreto-Lei Nº 244/1992, de 29 de Outubro, os conservadores, os oficiais de registo, os advogados e os solicitadores podem fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, autenticar documentos particulares, certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos nos termos previstos na lei notarial."
[9] E/ou até, eventualmente, para evitar qualquer confusão com o regime de reconhecimentos previsto no art. 5º, nº 1, do DL237/2001, de 30.08.
[10] Aprovado pela Lei 7/2009, de 12.02.
[11] Cfr. Diogo Vaz Marecos, Código do Trabalho Anotado, Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro. pág. 989, nota 7 - artigo 402º e Abílio Neto, Novo Código do Trabalho, 2ª edição, pág. 961, anotação ao artigo 402º, nota 3.
[12] Como se sabe, a letra e assinatura do documento reconhecida presencialmente têm-se por verdadeiras, só podendo ser ilididas através da invocação e prova da falsidade

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