terça-feira, 28 de julho de 2015

JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO – DIFAMAÇÃO – FACEBOOK - CONFIDENCIALIDADE DE MENSAGENS E DE ACESSO A INFORMAÇÃO



Proc. Nº 101/13.5TTMTS.P1    TRPorto   8  Setembro 204

I – As redes sociais fizeram surgir novos espaços que não se reconduzem facilmente às tradicionais esferas que se alargam progressivamente à volta do irredutível núcleo íntimo de privacidade do indivíduo, o que adensa as dificuldades em traçar os contornos da privacidade que merece a tutela da confidencialidade, pelo que se torna necessária, para a caracterização de cada situação, uma cuidada apreciação casuística.
II – Em tal apreciação, é de fundamental relevância a ponderação dos diversos factores em presença – designadamente o tipo de serviço utilizado, a matéria sobre que incidem as publicações, a parametrização da conta, os membros da rede social e suas características, o número de membros e outros factores que se perfilem como pertinentes em cada caso a analisar –, de molde a poder concluir-se se na situação sub judice havia uma legítima expectativa de que o círculo estabelecido era privado e fechado.
III – Tal ocorre se se descortina a existência de um laço estreito entre os membros da rede social que não era expectável que fosse quebrado, contando aqueles membros com a discrição dos seus interlocutores para a confidencialidade dos posts publicados e estando convictos de que mais ninguém terá acesso e conhecimento, em tempo real ou diferido, ao seu teor.
IV – Não havendo essa expectativa de privacidade, e estando o trabalhador ciente de que publicações com eventuais implicações de natureza profissional, designadamente porque difamatórias para o empregador, colegas de trabalho ou superiores hierárquicos, podem extravasar as fronteiras de um “grupo” criado na rede social facebook, não lhe assiste o direito de invocar o carácter privado do grupo e a natureza “pessoal” das publicações, não beneficiando da tutela da confidencialidade prevista no artigo 22.º do Código do Trabalho

Processo n.º 101/13.5TTMTS.P1
4.ª Secção
II
1. Relatório
1.1. B… veio em 30 de Janeiro de 2013 impugnar judicialmente no Tribunal do Trabalho de Matosinhos a regularidade e licitude do seu despedimento, efectuado por C…, S.A..
Realizada a audiência de partes (fls. 54-55) e não tendo havido conciliação, foi ordenada a notificação da empregadora para apresentar o articulado motivador do despedimento e o processo disciplinar, o que fez.
No seu articulado a R. empregadora alegou, em síntese: que o despedimento é lícito, porquanto o trabalhador publicou diversos posts no Grupo “Trabalhadores na C…” da rede social Facebook e neles pronunciou-se, na qualidade de trabalhador, sobre diversos temas relativos à organização e vida interna da C…, o que ocorreu nos dias 4, 5, 13, 24 e 27 de Setembro, bem como nos dias 7 e 17 de Outubro e 2, 9, 13, 21 e 23 de Novembro de 2012, nos termos que descreve; que o teor da generalidade das declarações do Autor não correspondia à verdade, tendo este perfeito conhecimento da falsidade das suas declarações; que as declarações do Autor são gravemente prejudiciais e lesivas do bom nome e imagem da C…, sendo altamente injuriosas; que o trabalhador desobedeceu aos seus superiores hierárquicos em dias que assinala nos mesmos meses de Outubro e Novembro; que o trabalhador faltou injustificadamente no dia 8 de Novembro de 2012, e sem previamente comunicar, o que acarretou danos para o empregador e para o trabalhador que o foi substituir; que o trabalhador violou os deveres legais das alíneas a), c), e) e f) do n.º 1 do artigo 128.º do Código do Trabalho, o que é reforçado pelo facto de ser delegado sindical; que as publicações naquele veículo de difusão sem qualquer ligação com a associação sindical de que é delegado é tanto mais grave quanto tem claramente subjacente o objectivo de perturbar o ambiente laboral no seio da C…; que o conteúdo o conteúdo de tais publicações não era direccionado a um grupo “íntimo” de amigos, mas aos trabalhadores da C…; que o trabalhador é reincidente em comportamentos sancionáveis em termos disciplinares, tendo já sido movidos dois procedimentos disciplinares contra o trabalhador, os quais culminaram em sanções disciplinares de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade e duas cartas de advertência por comportamentos indevidos no local de trabalho; que o comportamento descrito contribuiu para a quebra irremediável da confiança, na medida em que não lhe é exigível manter ao seu serviço um trabalhador que, forma voluntária e consciente, expõe na rede social facebook e de forma reiterada comentários sobre a natureza e o desenvolvimento da actividade prosseguido pela C…, com o intuito de denegrir a imagem do seu empregador; que o trabalhador desobedeceu, de forma expressa e reiterada, às ordens que lhe foram dadas pelo seu superior hierárquico, não cumpriu os procedimentos a que estava adstrito, essenciais para melhorar a produtividade da empresa, e encetou, ainda, uma “tática de guerrilha”, traduzindo-se esta nas repetidas ameaças de denúncia à ACT, bem como à PSP, que vieram a ser concretizadas, e não havendo, na génese das mesmas, qualquer fundamento credível, o que também contribuiu para a quebra irremediável da confiança em si depositada pelo empregador, bem como para tal contribuiu a falta dada em 8 de Novembro para o exercício de funções sindicais não previamente comunicada. À cautela, e para a hipótese de se considerar ilícito o despedimento, pede se deduzam às retribuições intercalares as retribuições auferidas após o despedimento e o subsídio de desemprego e se fixe a indemnização no limite mínimo de 15 dias de retribuição por cada ano de antiguidade.
Na contestação apresentada ao articulado de motivação do despedimento, o A. alegou que a página do facebook onde publicou os posts se encontrava definida como grupo fechado (serem os seus membros, ou terem sido, trabalhadores da C…) e apenas a ela acediam os membros do grupo, de cerca de 140, funcionava como sala de convívio e só de forma abusiva a R. tomou conhecimento das conversas e comentários. Impugnou parte dos factos alegados pela R. empregadora quanto à desobediência aos superiores hierárquicos, alegando ter dúvidas legítimas sobre se tinha que assinar o “diário de inspecção” e o “check list”, não ser obrigado a assinar um documento justificativo da ausência ao trabalho em dia de greve, ter o D… comunicado a sua falta antes do início do turno e ser de dois dias de suspensão de trabalho com perda de retribuição (não dez dias) uma das sanções anteriormente aplicadas ao A., concluindo que a R. pretendeu punir a legítima opinião do A. sobre as relações laborais existentes entre ela e os seus trabalhadores. Deduziu ainda reconvenção, pedindo a condenação da entidade empregadora a:
1. Reintegrar o Autor no seu posto de trabalho, caso este não opte, na devida altura, pela indemnização por despedimento ilícito, que deve corresponder a 50 dias de retribuição base por cada ano ou fracção por ser delegado sindical
2. Pagar ao Autor a quantia total de 2.774,42 € (dois mil setecentos e setenta e quatro euros e quarenta e dois cêntimos) a título de créditos laborais vencidos e relativos: ao acréscimo devido pelo trabalho prestado em dias feriados; ao subsídio de alimentação devido nos períodos de suspensão preventiva; à retribuição devida em consequência da ilicitude da sanção disciplinar de suspensão do trabalho por 10 dias com perda de retribuição; ao acréscimo médio mensal nocturno descontado nos períodos de suspensão preventiva; ao subsídio de alimentação descontado durante o exercício de actividade sindical; a diferenças salariais nos descontos referentes a faltas ao trabalho, ao desconto da retribuição referente à ausência em dia de greve/feriado; a que acresce juros legais desde a citação até efectivo e integral pagamento.
3. Pagar as prestações pecuniárias vincendas desde esta altura até ao trânsito em julgado da decisão judicial.
4. Pagar as custas e demais encargos legais.
A R. empregadora respondeu, referindo que aceita a confissão do trabalhador quanto aos factos invocados em fundamento do despedimento, impugnando os factos alegados pelo trabalhador e pugnando pela improcedência do pedido reconvencional (fls. 269 e ss.).
Foi realizada audiência preliminar em que as partes chegaram a acordo quanto a parte da matéria de facto em litígio e, após, proferiu-se autonomamente despacho saneador (fls. 315 e ss.) em que:
- se julgou admissível o pedido reconvencional;
- se julgou verificada a excepção de ineptidão da reconvenção na parte atinente à declaração de ilicitude da sanção disciplinar de suspensão do trabalho por 10 dias com perda de retribuição e subsídio de alimentação, por falta do respetivo pedido, absolvendo-se da instância a Ré C…, S.A. nos termos dos arts. 193º, n.ºs 1 e 2, al. a), 288º, n.º 1, al. b), 493º e 494º, n.º 1, al. b), todos do Código de Processo Civil então em vigor.
No mesmo despacho foi proferida decisão parcial de mérito quanto aos pedidos formulados em sede reconvencional, com excepção dos relativos às consequências da alegada ilicitude do despedimento e da sanção disciplinar, decisão que teve o seguinte teor:
“Nestes termos, tudo visto e ponderado, decide-se:
I – Julgar parcialmente procedente, por provado, o pedido reconvencional formulado sob o item 2.2 – no tocante aos créditos laborais reclamados a título de trabalho prestado em dias feriados, subsídio de alimentação descontado nos períodos de suspensão preventiva, acréscimo médio mensal noturno descontado nos períodos de suspensão preventiva, subsídio de alimentação descontado durante o exercício de atividade sindical, diferenças salariais nos descontos referentes a faltas ao trabalho e desconto de retribuição referente à ausência em dia de greve/dia feriado - e, em consequência, condeno a Ré C…, S.A., a pagar ao Autor B… a quantia de € 838,41 (oitocentos e trinta e oito euros e quarenta e um cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a notificação da reconvenção e até integral pagamento.
II - Julgar prejudicada a apreciação dos créditos reclamados no pedido reconvencional a título de restituição da quantia descontada por força da aplicação da sanção disciplinar de suspensão do trabalho por 10 dia (dada a ineptidão da reconvenção por falta do pedido que lhe serve de pressuposto).
III - Julgar parcialmente improcedente, por não provada, a reconvenção quanto ao mais peticionado no item 2/2 – no tocante aos créditos elencados em I - , absolvendo nessa parte do pedido a Ré C…, S.A.,
Custas a cargo de ambas as partes, na proporção do respectivo decaimento - (art. 446º, n.ºs 1 e 2 do C.P.C.).”
E foram, ainda no mesmo despacho, fixados os factos assentes e organizada a base instrutória, tendo a mesma sido objecto de reclamação por parte da R., oportunamente decidida (fls. 379 e ss.).
Realizada a audiência de julgamento, e após proferido despacho a decidir a matéria de facto em litígio, o Mmo. Juiz a quo proferiu em 10 de Dezembro de 2013 sentença que terminou com o seguinte dispositivo:
«Nestes termos, tudo visto e ponderado, decide-se:
- Julgar improcedente, por não provada, a ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento que o Autor B… move contra C…, S.A., e, em consequência, absolvo esta do pedido contra si formulado.
- Julgar improcedentes, por não provados, os pedidos reconvencionais formulados sob os itens 2.1 e 2.3, absolvendo a Ré/reconvinda de tais pedidos.
Custas a cargo do Autor (cfr. art. 527º do C.P.C.), sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que goza.
Ao abrigo do disposto nos arts. 296º, 297º e 306º do C.P.Civil/2013 – considerando já a reconvenção –, e sem prejuízo do disposto no art. 308º, n.º 4 do Código de Processo Civil [relativamente às prestações vincendas], fixo à ação o valor de € 40.798,42.
[…].»
1.2. O A. trabalhador, inconformado, interpôs recurso de apelação, tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões:
“1ª – São três as questões controvertidas:
a) Admissibilidade da valoração dos posts publicados pelo A. na página de facebook;
b) Averiguar a licítude do despedimento do A..
c) Determinar a reintegração do A. e a quantificação dos créditos laborais que detenha sobre a R., na hipótese da ilicitude do seu despedimento;
Da nulidade dos meios de prova consistentes nos posts publicados pelo A. no Facebook.
2ª - O artigo 26 da Constituição da Republica Portuguesa reconhece o direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar.
3ª - E o nº 8 do artigo 32 da Constituição da República Portuguesa dispõe ainda que “são nulas todas as provas obtidas mediante a abusiva intromissão na vida privada…, na correspondeência ou nas telecomunicações”.
4ª - A jurisprudência dos Tribunais Superiores é unânime quanto à tutela legal e constitucional da confidencialidade da mensagem pessoal e a consequente nulidade da prova obtida com base na mesma impede que o envio da mensagem com aquele conteúdo possa constituir o objecto do processo disciplinar instaurado com vista ao despedimento do trabalhador, acarretando assim a ilicitude do despedimento nos termos do artigo 429, nº 3 do C.T. (ver todos os Ac. do STJ de 05.07.2007 (Relator Mário Pereira).
5ª - O A. publicou diversos posts no “Grupo de Trabalhadores na C...”, nos quais se pronunciou sobre diversos temas relativos à organização e vida interna da C... (alíneas E) e F) dos factos admitidos por acordo).
6ª - A página do “Grupo de Trabalhadores na C...” no Facebook, de que o A. é administrador, é composta, pelo menos, por 140 membros, com o denominador comum o facto de serem ou terem sido trabalhadores da C... (al. KKK) dos factos admitidos por acordo);
7ª - O acesso à mesma referida página só era possível mediante pedido dirigido aos seus administradores, não se encontrando o mesmo acessível ao público, por não poder aceder a ela quem quisesse (als. LLL) e MMM) dos factos admitidos por acordo).
8ª - No que diz respeito à parametrização da conta, considerando que o acesso à referida página de Facebook é restrito, por não se encontrar acessível ao público, só podendo a ela aceder-se mediante pedido dirigido aos seus administradores, é inequívoco que os dados de partilhador estão englobados pelo conceito da esfera privada.
9ª - Sendo assim irrelevante o conteúdo dos posts publicados no “Grupo de Trabalhadores na C...”.
10ª - Isso porque os mesmos são exclusivamente da esfera privada dos seus membros e, assim sendo, não poderiam ser conhecidos da C..., a não ser que esta deles tenha tomado conhecimento abusivamente.
11ª - Sendo de resto inaceitável a conclusão a que chega a sentença de que se trata de uma página de cariz estritamente profissional, pela singela razão, de a mesma não resultar dos factos provados.
12ª - O que era da estrita esfera privada dos membros da página só foi conhecido da C... por facto abusivo que lhe é inteiramente imputável.
13ª - Deste modo, a existir a prática de um acto ilícito este terá de ser sempre imputado à C... por violação do direito à privacidade do A. e dos membros da descrita página de Facebook.
14ª - Com efeito, não está minimamente provado nos autos que o A. tenha tido qualquer responsabilidade no facto da C... ter tido conhecimento dos posts por si publicados na mencionada página, posts esses que deveriam ser apenas conhecidos dos seus membros.
15ª - Tendo em conta o atrás exposto a sentença recorrida não poderia ter aceite a valoração dos posts publicados pelo A. na página de facebook e, em consequência, aferir da licitude do seu despedimento com base no conteúdo dos mesmos.
16ª - E assim terá de improceder o despedimento com justa causa com base na natureza falsa, imprecisa e lesiva do bom nome e imagem da C... quanto aos posts publicados pelo A. no “Grupo de Trabalhadores na C...” da rede social Facebook.
17ª – Ao assim não decidir a sentença recorrida violou o disposto nos artigos 26 e no Nº 8 do Artº 32, ambos da CRP, e no Artigo 429, nº 3 do C.T..
b) Da desobediência reiterada aos superiores hierárquicos
18ª – Ao empregador compete, no âmbito dos seus poderes organizativos e conformativos da prestação laboral, definir as actividades e tarefas que tem por relevantes e que entende ser de incumbir aos seus trabalhadores, assim como os procedimentos que deverão ser seguidos na execução dessas funções, aos quais aqueles devem obediência, dentro dos limites da lei.
19ª - Ora, não foi o A. quem afrontou ou desafiou a autoridade da empresa mas esta quem tentou impôr-lhe condutas a que este, nos termos da lei, não estava obrigado.
20ª - E o autor tinha total legitimidade para desobedecer a ordens ilícitas da C..., sua entidade patronal.
21ª - De resto, é a própria sentença que levanta dúvidas quanto à licitude das ordens dadas pelo rondista/chefe de grupo E... no dia 15.11.2012 para que o A. assinasse o “Diário de Inspecção” e a “checlist” e isso, desde logo, por não ser inequívoco o dever de obediência ao rondista/chefe de grupo .
22ª - De facto, a claúsula 4ª, nº 4 do CCT aplicável define de forma clara as funções de Chefe de grupo: “Em cada grupo de cinco vigilantes, por turno e local de trabalho, a um deles serão atribuidas funções de Chefe de grupo …”.
23ª - Cabendo ao vigilante chefe as visitas de inspecção e apoio aos locais de trabalho, como de resto é expressamente referido na sentença recorrida e no CCT aplicável às partes.
24ª - E é a própria Recorrida que, apesar de ilegalmente, ter também, posteriormente, atribuido ao rondista a efectivação de visitas de apoio e acompanhamento aos postos de vigilância, não se atraveu ao conferir-lhe poderes inspectivos (resposta ao quesito 12 da base instrutória).
25ª - Assim sendo era perfeitamente legitimo que o A. tivesse declinado assinar os documentos supra-citados a pedido do rondista/chefe de grupo no dia 15 de Novembro de 2012.
26ª - Sendo certo que o próprio A. tinha alertado a R. para as dúvidas sobre a legitimidade do rondista/chefe de grupo ter poderes inspectivos (al. FF) dos factos admitidos por acordo).
27ª - E que as mesma dúvidas assaltaram os seus colegas de trabalho que lhe pediram para esclarecer a questão em causa junto da R., o que o A. fez junto do Vigilante chefe Sr. F... em 29 de Ourubro de 2012, não tendo deste obtido resposta (resposta ao quesito 7 da base instrutória e al. EE) dos factos admitidos por acordo).
28ª – Quanto à ocorrência do dia 20 de Novembro de 2012, é a própria sentença que admite que existem dúvidas quanto à licitude do preenchimento e assinatura do documento de comunicação da ausência ao trabalho do A. no dia 14 de Novembro de 2012, por esta se ter dado no exercício do direito de greve.
29ª - Com efeito, é ao trabalhador que assiste o direito de, se assim o entender, justificar a falta dada durante a greve por um outro motivo que julgue mais favorável, nomeadamente o de uma falta justificada e paga, e não à entidade patronal a faculdade de indagar dessa justificação.
30ª - E como é evidente, caso a C... pudesse exigir dos seus trabalhadores que assinassem um documento a justificar as faltas dadas durante o exerício do direito de greve, ficaria na sua posse com os elementos necessários e suficientes para a criação de uma base de dados pessoais dos trabalhadores que aderiram à greve.
31ª - A ordem em questão dada ao A. pelo Vigilante chefe F..., em 20 de Novembro de 2012, é manifestamente ilegal e o A. podia e devia desobedecer-lhe, o que fez, tanto mais que é delegado sindical.
32ª - Quanto à recusa do A. em assinar os “Relatórios de Ocorrências” elaborados pelo Vigilante chefe F... em 20 de Novembro de 2012, um deles referia-se à recusa do A. em preencher a comunicação de ausências e outro à recusa do A. em assinar o Check list, bem como o diário de inspecção referente ao dia 15 de Novembro de 2012 (alínea VV) dos factos admitidos por acordo).
33ª - É inequívoco que os ditos relatórios de ocorrências foram elaborados pelo Vigilante chefe F... que assim teria que os assinar e responder pelo seu conteúdo, e só ele.
34ª - Isso por só o referido Vigilante chefe tinha poderes para tanto.
35ª - Não podendo assim ser exigido ao Vigilante, neste caso, ao A., que co-assine documentos a que é completamente alheio e pelos quais não tem qualquer responsabilidade.
36ª - Acresce que os ditos relatórios não eram nem Diários de Inspecção, nem Check list, mas meros “relatórios de ocorrências”. 37ª - E mais grave ainda, um referia-se à recusa do A. em assinar o Relatório de Inspecção e a Check list do Chefe de grupo E... no dia 15 de Novembro de 2012, ou seja, um facto já conhecido da C... e devidamente testemunhado e o outro à recusa do A. em preencher e assinar um documento justificativo da falta por si dada durante o exercício do direito de greve, facto também já conhecido da C....
38ª - Sendo certo que o próprio A. assumiu expressamente a sua recusa em ambos os casos.
39ª - Os ditos “Relatórios de Ocorrências” e a exigência do A. em assinálos constituiram uma tentativa abusiva, prepotente e ilícita de “vergar” o A..
40ª - A ordem em causa é absolutamente ilegal e o A. não lhe devia obediência.
41ª - Não faz qualquer sentido a tese de que o Vigilante chefe precisou de chamar duas testemunhas para presenciar a recusa do A. em assinar os relatórios de ocorrências dado que ele próprio disso seria testemunha num eventual processo disciplinar a instaurar ao A. e como já atrás se salientou, os factos deles constantes estavam desde já expressamente admitidos pelo A..
42ª - Não se aceita assim a versão cândida do Vigilante chefe quanto à convocação de mais dois superiores hierárquicos, tanto mais que ficou provado que no local de trabalho estavam apenas o A. e os descritos três superiores hierárquicos, ou seja, o A. encontrava-se assim indefeso perante a coacção exercida por aqueles.
43ª - Dos factos provados resulta inequivocamente uma prática desreguladora da recorrida no tocante às relações laborais existentes entre si e os seus trabalhadores, consubstanciada na violação da lei e do CCT aplicável.
44ª - Era dever do A., delegado sindical, opôr-se a essa desregulação e dar o exemplo aos seus Colegas de trabalho.
45ª - E foi por isso que a recorrida o elegeu entre os seus trabalhadores membros do “Grupo de Tralhadores da C...” da rede social Facebook, para o perseguir disciplinarmente”.
46ª - Em síntese, o A. não desobedeceu a nenhuma ordem legitima da recorrida, pelo que cai também este fundamento para o seu despedimento com justa causa.
d) Dos ilícitos relacionados com o facto do dia 8.11.2012
47ª - Concorda-se inteiramente com a sentença recorrida quando conclui pela inverficação desta infracção disciplinar imputada pela recorrida ao recorrente, pelo que também este fundamento não é apto a servir como justificação para o despedimento do trabalhador.
48ª – Inexistem fundamentos justificativos para o despedimento do trabalhador, pelo que teria este de se considerar ilícito, com todas as legais consequências, mormente o da declaração da sua ilicítude e da procedência dos pedidos reconvencionais deduzidos pelo A., formulados sob os itens 2.1. e 2.3.
49ª - Ao não decidir assim, a sentença recorrida fez incorrecta interpretação e aplicação do direito aos factos provados e deve, portanto, ser integralmente revogada.
50ª - A decisão recorrida violou entre outros, a alínea b) do artigo 381 e o Nº 3 do Artº 429, ambos do Código do Trabalho, e o Artº 26 e o nº 8 do Artº 32, ambos da CRP.
Termos em que deve a sentença recorrida ser inteiramente revogada e substituída por outra que julgue ilícito o despedimento do a., por inexistência de justa causa, condene a R. a reintegrá-lo e a pagar-lhe o pedido reconvencional sobre o item 2.3, ou seja, as prestações pecuniárias vincendas desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial..”
1.3. Respondeu a R. recorrida pugnando pela improcedência do recurso e concluindo que:
“A. O Apelante não cumpriu o ónus que lhe é imposto pelo artigo 639.º n.º 1 do CPC (apresentar conclusões sintéticas), razão pela qual o presente recurso deverá ser desde logo liminarmente rejeitado.
B. Caso assim se não entenda, o que se admite por mero dever de patrocínio, mas sem conceder, sempre o presente recurso estaria, de uma forma ou de outra, inabalavelmente votado ao insucesso, na medida em que o Apelante nem sequer aduz argumentos capazes de minimamente abalar a douta sentença.
C. Analisadas as conclusões das alegações apresentadas pelo Apelante as questões que cumpre decidir no presente recurso são: (i) Da admissibilidade da valoração dos posts publicados pelo Apelante no Facebook; (ii) Da existência de justa causa.
DA ALEGADA NULIDADE DOS MEIOS DE PROVA
D. Da factualidade dada como provada não se retira o carácter privado da página do Facebook, bem pelo contrário.
E. Os posts publicados na página do Facebook não se inserem na esfera da vida privada do Apelante.
F. Ainda que o Apelante invoque o carácter privativo da página (o que não se admite), a partir do momento em que são feitas publicações numa página de uma rede social, tais publicações são suscetíveis de vir a ser conhecidas e partilhadas por terceiros (nada impede que os membros dessa página, que têm acesso autorizado, possam copiar os conteúdos e enviá-los a terceiros).
G. Conforme consta da matéria dada como provada (e não impugnada pelo Apelante), o conteúdo das mensagens publicadas no Facebook não se limita a aspetos atinentes à esfera intima e pessoal do Apelante, relacionando-se antes com a sua esfera profissional e com o quotidiano da atividade da Apelada.
H. Resultou provado que a página “Grupo de Trabalhadores na C...” é uma página de cariz estritamente profissional, composta por, pelo menos 140 membros, tendo como denominador comum o facto de serem ou terem sido trabalhadores da Apelada (vide ponto 28 da sentença).
I. Pela mera leitura das publicações feitas pelo Apelante e dadas como provadas nos pontos 9 a 27 da sentença, constata-se que os conteúdos partilhados, pelo menos a grande maioria deles, estavam indissocialvelmente conexos com a atividade da empresa, com interesses profissionais comuns aos trabalhadores e com as condições da prestação de trabalho asseguradas pela empresa aos seus colaboradores.
J. Na verdade, ficou provado que nos posts o Apelante pronunciou-se sobre diversos temas relativos à organização e vida interna da Apelada; sobre a divulgação que ele próprio fazia com o intuito de levar ao conhecimento de todos os membros da página; sobre um colega de trabalho acusado de pedofilia; sobre pagamento de trabalho prestado em feriados, eliminação destes, pagamento de descanso compensatório, etc.; sobre uma greve, tendo inclusive publicado o respetivo préaviso; sobre a liberdade de expressão dos colaboradores da Apelada; sobre o despedimento de um colega; sobre a justificação das ausências dos trabalhadores da Apelada durante o período de uma greve; sobre a adesão a uma greve; sobre as rondas de vigilantes que são realizadas pela Apelada; sobre superiores hierárquicos do Apelante; sobre o exercício de funções dos rondistas da Apelada, entre outros.
K. É de refutar igualmente a argumentação do Apelante de que os posts por si publicados na página do Facebook não podiam ser conhecidos pela Apelada, a menos que esta deles tivesse tomado conhecimento abusivamente.
L. A partir do momento em que são feitas publicações numa página de uma rede social, tais publicações são suscetíveis de vir a ser conhecidas e partilhadas por terceiros, sendo inadmissível que o Apelante tenha a expectativa de que os mesmos não extravasassem o círculo de membros da página.
M. Conforme ficou provado, não houve qualquer ato voluntário por parte da Apelada de aceder à mencionada página do Facebook - A Apelada teve conhecimento dos posts publicados no Facebook pelo Apelante por intermédio de alguns membros da página, ou seja, por pessoas com acesso autorizado à mesma.
N. Para além disso, conforme ficou provado em sede de audiência de julgamento, os referidos membros da página do Facebook levaram ao conhecimento da Apelada tais publicações por sua livre e própria iniciativa e não por lhe ter sido dirigido qualquer pedido para o efeito por parte da Apelada.
O. Tal como resulta do despacho de fls. 177 a 186 dos autos a quo, resultou provado que a testemunha G... teve conhecimento do post referido na alínea Y) por ter visto uma impressão do mesmo afixada na porta do frigorifico do seu posto de trabalho da H.... Confirmou também esta testemunha que as publicações colocadas no Facebook eram comentadas pelos diversos colaboradores, mesmo os que não eram membros daquele grupo.
P. Ainda no que diz respeito à publicação do dia 21.11.2012, a testemunha I... referiu que todo o pessoal das portarias ficou conhecedor do referido post (despacho de fls. 177 a 186 dos autos a quo).
Q. Para além disso, o alegado cariz abusivo do conhecimento por parte da Apelada não se presume, pelo que deveria ter sido devidamente demonstrado pelo Apelante, o que não foi.
R. De qualquer forma, e salvo melhor opinião, o modo como a Apelada teve conhecimento dos posts publicados pelo Apelante na referida página do Facebook é irrelevante. O que é relevante e interessa para a boa decisão da causa é que tais factos tenham efetivamente ocorrido e consubstanciem a violação dos deveres laborais a que o Apelante se encontra adstrito.
S. Não é defensável que a liberdade de expressão e de comunicação não tenham qualquer tipo de limites externos. Conforme tem sido entendimento da doutrina nesta temática, a liberdade de expressão conhece dois limites: o respeito pelos direitos de personalidade da outra parte e o normal funcionamento da empresa.
T. Admitir o contrário equivaleria a aceitar que todos os comentários colocados na página do Facebook relativos a questões conexas com a prestação de trabalho e que são suscetíveis de vir a ser conhecidos por qualquer pessoa, por mais graves que fossem, estavam imunes ao poder disciplinar da Apelada, o que não é admissível.
U. Apenas o conteúdo destas comunicações de natureza pessoal se encontra protegido pelo direito ao sigilo das comunicações.
V. Ora, pela potencialidade de os referidos posts serem conhecidos e partilhados, pelo elevado número de membros da página do Facebook, por se tratar de uma rede social enquanto plataforma aberta e de acesso generalizado,o caso sub judice não pode ser equiparado a instrumentos de comunicação privada online, tais como o instant messaging, chats privados ou correio eletrónico.
W. Alega ainda o Apelante que, se grande parte dos membros da página do Facebook são trabalhadores da Apelada, não se compreende por que motivo esta terá “escolhido” apenas o Apelante, insinuando assim que houve uma espécie de “incoerência” disciplinar por parte da Apelada por este ser delegado sindical ativo.
X. Acontece que, não foi dado como provada a prática de infrações disciplinares por parte de outros membros da página do Facebook.
Y. O Facebook constitui um veículo de difusão sem qualquer ligação com a associação sindical da qual o Apelante é delegado.
Z. Ficou, igualmente, provado que a publicação de tais declarações do Apelante tinham claramente o objetivo de perturbar o ambiente laboral no seio da Apelada. Tal objetivo de perturbação não tem qualquer correspondência legal nos direitos e poderes das associações sindicais e dos seus dirigentes na prossecução da atividade sindical.
AA. Independentemente do exercício de qualquer cargo numa estrutura representativa dos trabalhadores, enquanto trabalhador da Apelada, o Apelante sabe que deve pautar a sua conduta pela observância de determinados padrões, como a probidade e a lealdade, os quais têm como correspetivo a confiança na qual assenta o desenvolvimento e manutenção da relação de trabalho.
BB. Em face do exposto e não obstante o perfil aparentemente fechado ou reservado da página do Facebook “Grupo de Trabalhadores na C...”, andou bem o Tribunal a quo ao concluir que “dado se tratar de uma rede de cariz profissional ou na qual predominam interesses dessa natureza (…) a informação ou o conteúdo ali publicados, contanto que incorpore a violação de deveres laborais a que o utilizador/trabalhador está vinculado, pode – e deve – ser objeto de controlo por parte do empregador, para efeitos de punição disciplinar daquele”.
CC. Assim, a apreciação e valoração dos posts publicados pelo Apelante na mencionada página do Facebook não viola os artigos 26.º e 32.º, n.º 8 da CRP, constituindo um meio de prova válido e que, por isso, deverá ser tido em conta em sede de aferição da justa causa de despedimento do Apelante.
DA JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO
DD. A questão central a apreciar no presente recurso é, assim, a da existência ou inexistência de justa causa de despedimento do Apelante no concreto contexto em que este se verificou.
EE. Nos termos do n.º 1 do artigo 351.º do CT, constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.
FF. Para que seja possível configurar uma situação de justa causa para estes efeitos, é necessário que estejam preenchidos os requisitos do art. 351.º/1 do CT, a saber:
- Um comportamento ilícito, grave, em si mesmo ou pelas suas consequências, e culposo do trabalhador (o elemento subjectivo da justa causa);
- A impossibilidade prática e imediata de subsistência do vínculo laboral (o elemento objectivo da justa causa);
- A verificação de um nexo de causalidade entre os dois elementos anteriores, no sentido em que a impossibilidade de subsistência do contrato tem que decorrer, efectivamente, do comportamento do trabalhador.
GG. Assim, o artigo 351.º, n.º 3 do CT manda atender, no quadro de gestão da empresa (ou seja, tendo em conta o contexto concreto em que o comportamento ocorreu e a prática disciplinar de gestão naquele mesmo contexto) aos seguintes factores na avaliação do comportamento do trabalhador:
- O grau de lesão dos interesses do empregador que resulte do comportamento do trabalhador;
- O carácter das relações entre as partes;
- As demais circunstâncias que sejam relevantes no caso.
HH. Desta forma, existirá justa causa determinante da impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho quando, atentas as particulares circunstâncias do caso concreto, a exigência da conservação do contrato e a manutenção das relações pessoais e patrimoniais que ele pressupõe, tal subsistência se apresente como exagerada e injusta para uma pessoa normal colocada na posição do empregador.
II. Por outro lado, como é sabido, configura-se uma situação de impossibilidade prática e imediata de subsistência da relação de trabalho sempre que, nas circunstâncias concretas, ocorra uma absoluta quebra de confiança entre a entidade empregadora e o trabalhador susceptível de criar no espírito da primeira a dúvida sobre a idoneidade futura do último, deixando de existir o suporte psicológico mínimo para a manutenção dessa relação laboral.
JJ. Ora, in casu, ocorreu uma situação de absoluta quebra de confiança entre o Apelante e a Apelada, que originou no espírito da primeira uma dúvida incessante sobre a idoneidade futura da Apelante, pelo que existiu uma situação de impossibilidade prática e imediata de subsistência da relação de trabalho.
DOS ANTECEDENTES DISCIPLINARES
KK. O Apelante é reincidente em comportamentos sancionáveis em termos disciplinares, tendo sido movidos dois procedimentos disciplinares contra o Apelante, sendo que ambos culminaram em sanções disciplinares de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade e numa carta de advertência por comportamentos indevidos no local de trabalho.
LL. O segundo do procedimento disciplinar foi instaurado já no ano de 2012 e fundamentado precisamente numa múltipla prática de divulgação de comentários no Facebook sobre a organização e vida interna da Apelada (facto dado como provado no ponto 85 da sentença) e apresentavam igualmente declarações de teor falso, desleal, pejorativo e altamente ofensivo do bom nome da Apelada, à semelhança das publicações que culminaram com o despedimento do Apelante.
MM. Ainda assim, e não obstante a gravidade dos factos praticados, a Apelada resolveu conceder uma nova oportunidade à relação laboral que mantinha com o Apelante, não lhe tendo aplicado a sanção disciplinar de despedimento, mas apenas de suspensão do trabalho pelo período de 10 (dez) dias, com perda de retribuição e antiguidade, conforme dado como provado.
NN. O Apelante não impugnou judicialmente tal sanção disciplinar.
OO. Acontece que, volvidos nem quatro meses desde a decisão de aplicação da sanção disciplinar de suspensão do trabalho, o Apelante repetiu o seu comportamento.
PP. Com efeito e conforme tem sido entendimento da jurisprudência, o passado disciplinar do Apelante deverá ser um fator a ter em conta para efeitos de apreciação da justa causa de despedimento, nos termos do artigo 351.º, n.º 3 do CT (vide Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de novembro de 2003, Processo 02S4298, e de 27 de abril de 2006, Processo n.º 05S4320, disponíveis in www.dgsi.pt).
DA VIOLAÇÃO DO DEVER DE URBANIDADE, PROBIDADE E RESPEITO
QQ. Em primeiro lugar, importa referir que ficou provado que o Apelante publicou diversos posts na referida página do Facebook, tendo nesses posts se pronunciado sobre diversos temas relativos à organização e vida interna da Apelada.
RR. O teor da generalidade das declarações do Apelante não correspondia à verdade, tendo este perfeito conhecimento da falsidade das suas declarações.
SS. Para além disso, as declarações do Apelante são gravemente prejudiciais e lesivas do bom nome e imagem da Apelada, sendo altamente injuriosas.
TT. Não restando quaisquer dúvidas, conforme concluiu o Tribunal a quo, de que tais comentários do Apelante “são ofensivos da imagem, dignidade e bom nome da Ré, enquanto instituição, bem como das pessoas à frente dos seus destinos”e ainda que alguns dos comentários são “igualmente ofensivos da consideração e do respeito devido a outros colaboradores da empresa (…), o que é suscetível de causar uma perturbação no ambiente laboral da C...”.
UU. Para além disso, tendo em conta que tais comentários foram feitos na página de uma rede social, composta por, pelo menos, 140 membros, todos eles com o denominador comum o facto de serem ou terem sido trabalhador da Apelada, era exigível ao Apelante um cuidado acrescido em virtude do impacto que tais declarações podiam vir a ter no normal funcionamento da empresa.
VV. Neste sentido, não pode deixar de se concluir que o comportamento do Apelante contribuiu para a quebra irremediável da confiança em si depositada pela Apelada, na medida em que não lhe é exigível manter ao seu serviço um trabalhador que, de forma voluntária e consciente, expõe na rede social Facebook e de forma reiterada comentários sobre a natureza e o desenvolvimento da atividade prosseguido pela Apelada, com o intuito de denegrir a imagem do seu empregador.
WW. Aliás, atento o carácter grave e desnecessário das imputações falsas produzidas pelo Apelante relativamente à Apelada, não pode deixar de se assinalar que, na perspetiva do Apelada, a referida quebra irremediável de confiança é mútua.
XX. De facto, resulta clara e objetivamente das declarações do Apelante publicadas na rede social Facebook um cunho injurioso e difamatório do seu empregador.
YY. Atenta a natureza das funções exercidas pelo Apelante, tal conduta é incompatível com o cumprimento do dever laboral que sobre este impendia e que consiste na realização do trabalho com zelo e diligência.
ZZ. Consequentemente, no que à Apelada concerne, a descrita violação pelo Apelante de deveres básicos de conduta – a probidade, urbanidade e a lealdade, zelo e diligência – determinaram a quebra, de forma irreversível, da confiança depositada naquele, enquanto seu trabalhador.
AAA. Pelo exposto, merece o nosso acolhimento a conclusão do Tribunal a quo de que o Apelante “praticou, com culpa, infração disciplinar por violação do dever de urbanidade, probidade e respeito”, sendo que os ilícitos disciplinares supra elencados constituem, por si só, justa causa de despedimento.
DA DESOBEDIÊNCIA REITERADA AOS SUPERIORES HIERÁRQUICOS
BBB. Alega o Apelante que os poderes do empregador devem ser exercidos dentro dos parâmetros da lei, pelo que, tendo a Apelada alegadamente tentado impor-lhe condutas a que não estava obrigado, a desobediência do Apelante foi legítima.
CCC. Em primeiro lugar, repare-se que o próprio Apelante admite que desobedeceu aos seus superiores hierárquicos, no entanto, é de rejeitar por completo a legitimidade de tal desobediência.
DDD. Para efeitos de enquadramento, atente-se na seguinte factualidade dada como provada nas alíneas P), Q), R) BB), CC), DD), UUUU) e VVVV) dos factos admitidos por acordo.
EEE. Relativamente ao dia 15 de novembro de 2012, devemos atender aos factos e comportamentos dados como provados – alíneas EE), GG), HH), II) dos factos admitidos por acordo e resposta aos quesitos nº 2, 6, 7, 13 da base instrutória.
FFF. Alega o Apelante que foi legítima a sua recusa em assinar a “check list” e o “diário de inspeção”, aquando da visita inspetiva do chefe de grupo E..., por não reconhecer competência ao mesmo, uma vez que na comunicação datada de 22 de outubro de 2012 não constava expressamente que o vigilante tinha de assinar tais documentos.
GGG. Ora, atendendo ao conteúdo da check list e do diário de inspeção dúvidas não restam de que a recusa do Apelante em assinar os referidos documentos foi motivada apenas por uma vontade de afrontar a autoridade da Apelada, através de uma desobediência expressa a uma ordem que lhe foi dada por E....
HHH. A assinatura da “check list” e do “diário de inspeção” pelos colaboradores foi sempre a prática unanimemente seguida na empresa, relativamente à qual, até à data, o Apelante jamais havia assumido qualquer atitude de recusa.
III. Além disso, o Apelante sabia perfeitamente que a Apelada tinha atribuído ao chefe de grupo as funções de solicitar o preenchimento de documentação aos vigilantes, nas quais se incluía a de solicitar a assinatura dos referidos documentos.
JJJ. Aliás, tal conhecimento foi dado como provado pela douta sentença nas alíneas OO) e PP) dos factos admitidos por acordo e resp. ao ques. 14 da base instrutória.
KKK. Acresce que da check list e do diário de inspeção não consta nenhuma observação negativa quanto à conduta do Apelante (al. JJ) e KK) dos factos admitidos por acordo).
LLL. Deste modo, não subsistem dúvidas quanto à recusa injustificada do Apelante em assinar tais documentos e quanto à obrigatoriedade de assinatura dos mesmos, pelo que, conforme concluiu o Tribunal a quo, ao assumir tal atitude de recusa o Apelante “desobedeceu, de forma expressa e reiterada, às ordens que lhe foram dadas pelos seus superiores hierárquicos, recusando-se a cumprir práticas ou procedimentos que até aí ninguém questionara, como seja o de assinar o “Relatório de Inspeção” e a “check list”.
MMM. No que diz respeito aos acontecimentos do dia 20.11.2012, atente-se na seguinte factualidade dada como provada nas alíneas LL), MM), NN,) QQ), RR), SS), TT), UU), VV), WW), XX), YY), ZZ), BBB), CCC), DDD), EEE), FFF), UUUU) e VVVV) dos factos admitidos por acordo e a resposta aos quesitos. 9, 10, 12 15 da base instrutória.
NNN. A “comunicação de ausências” constitui um mero documento interno, que visa, entre outras finalidades, a proteção do trabalhador, permitindo, por exemplo, que, não obstante uma determinada ausência não poder ser subsumida ao elenco legal de faltas justificadas, a chefia, atendendo às circunstâncias do caso, possa justificá-la.
OOO. Para além disso, tal documento interno é da maior relevância para a organização e bom funcionamento da empresa, na medida em que a Apelada, tendo cerca de 2.200 trabalhadores, tem, a nível nacional, de assegurar o controlo das faltas dos trabalhadores e a respetiva justificação (o facto de muitos dos seus trabalhadores prestarem as suas funções fora das instalações da Apelada, torna necessária a adoção de cautelas acrescidas no que respeita ao controlo da assiduidade).
PPP. Acresce que, não obstante a ausência ao trabalho por motivo de adesão à greve não ser qualificada como falta para efeitos legais, a comunicação da ausência em dia de greve não é destituída de fundamento legal, conforme entendeu e bem o Tribunal a quo.
QQQ. Os efeitos da ausência resultante do exercício do direito à greve distinguem-se dos efeitos da faltas justificadas e injustificadas, conforme decorre do art. 536.º do CT.
RRR. Perante uma ausência ao trabalho sem que o empregador tivesse conhecimento da respetiva justificação, sempre caberia ao trabalhador o ónus de provar que a mesma se deveu à sua adesão à greve, de forma a evitar a qualificação da sua ausência como falta injustificada.
SSS. Na verdade, não existe qualquer presunção legal de adesão à greve por parte dos trabalhadores que não comparecem no local de trabalho durante o período para o qual a mesma foi decretada.
TTT. Menos legítima é ainda a recusa do Apelante em assinar os relatórios de ocorrências, que versavam sobre a referida recusa em preencher a comunicação de ausências, bem como em assinar a “check list” e o “diário de inspeção” referentes ao dia 15 de novembro de 2012.
UUU. Conforme o próprio nome indica, o relatório de ocorrências é um documento no qual são registados determinados acontecimentos relativos a um vigilante .
VVV. Havendo incumprimento de um procedimento interno, por parte de um trabalhador, a respetiva chefia deverá elaborar o relatório de ocorrências.
WWW. Ora, o Apelante sabia perfeitamente que o referido relatório deve ser assinado pelo respetivo trabalhador, no período imediatamente subsequente à sua elaboração, e que a exigência de assinatura pelo trabalhador tem como único propósito confirmar que este tomou conhecimento do conteúdo do relatório.
XXX. Nessa medida, ainda que o Apelante não concordasse com o conteúdo do relatório, deveria tê-lo assinado apenas para atestar que tomou conhecimento do mesmo, sendo que o relatório tem um espaço em branco, com a epígrafe “comentários do trabalhador”, no qual este poderá tecer as considerações que reputar como apropriadas.
YYY. Cconforme entendeu o Tribunal a quo, a conduta assumida pelo Apelante não só constitui “uma direta desobediência a uma ordem legítima”, como “traduz uma ostensiva violação dos procedimentos vigentes na empresa quanto à formalização das visitas de apoio e inspeção”.
ZZZ. Tal comportamento representa ainda uma “afronta e um desafio à autoridade da empresa, uma vez que colocou diretamente em causa a autoridade dos superiores hierárquicos, que o interpelaram no exercício legítimo das suas funções”.
AAAA. Note-se o Apelante tinha perfeito conhecimento de que os referidos superiores hierárquicos estavam devidamente mandatados pela Apelada para exercer as respetivas funções de chefia.
BBBB. Perante a recusa do Apelante em assinar os relatórios de ocorrência, o Vigilante chefe F... requereu a presença do Chefe de Secção J..., bem como do Chefe de grupo E... para que estes pudessem confirmar apenas que o Apelante tinha tomado conhecimento do conteúdo dos relatórios de ocorrência.
CCCC. Conforme concluiu a douta sentença “a mera presença dos três superiores hierárquicos, no contexto apurado, mostra-se perfeitamente justificada, nomeadamente para que a conduta do trabalhador pudesse ser ulteriormente confirmada em sede de processo disciplinar”.
DDDD. Ao contactar e exigir a presença de agentes da Polícia de Segurança Pública (PSP) no local de trabalho, ao levar as vozes à sua chefia, alegado, ironicamente, que “tinha problemas nas cordas vocais” (facto que não se provou), o Apelante violou o dever de respeito e urbanidade para com os seus superiores hierárquicos.
EEEE. Pelo exposto, dúvidas não restam de que o Apelante desobedeceu às ordens dadas pelos seus superiores hierárquicos, violando os deveres de (i) obediência; (ii) respeitar e tratar o empregador com urbanidade e probidade; (iii) cumprir as ordens e as instruções do empregador respeitante à execução ou disciplina no trabalho; (iv) guardar lealdade ao empregador e (v) promover ou executar atos tendentes à melhoria da produtividade da empresa, previstos no artigo 128.º, n.º 1, alíneas a), c), e) e h) do CT.
FFFF. Os ilícitos disciplinares supra elencados constituem, por si só, justa causa de despedimento.
GGGG. Acresce que, conforme apreciou o Tribunal a quo, “a partir do momento em que um conflito laboral passa a ser pautado pela presença da autoridade policial, sem que se vislumbre qualquer fundamento válido para tal intervenção, a relação de confiança que deve presidir à referida relação laboral mostra-se definitivamente comprometida”.
HHHH. Para além disso, a presença da autoridade policial é, ainda, suscetível de causar danos à imagem e reputação da Apelada, bem como de colocar em causa o normal funcionamento da empresa, destabilizando os restantes trabalhadores e diminuindo, por conseguinte, a produtividade da empresa.
IIII. Por fim, deverá ainda ter-se em conta o facto de o Apelante ser delegado sindical, pelo que tinha responsabilidades acrescidas, devendo dar o exemplo de uma boa conduta.
JJJJ. Em face do exposto e atenta a factualidade dada como provada pelo Tribunal a quo, dúvidas não restam de que os comportamentos do Apelante preenchem todos os requisitos do conceito de justa causa, nos termos do art. 351.º, n.º 2, alíneas a), c), d), e) e i) do CT, devendo, como tal, concluir-se pela licitude do seu despedimento.
KKKK. Bem andou, assim, o Tribunal do Trabalho de Matosinhos ao concluir que a conduta do Apelante “era – e é – merecedora de sanção disciplinar mais grave: o despedimento”, não merecendo qualquer tipo de censura a sentença que julgou a ação totalmente improcedente e absolveu a Apelada de todos os pedidos.
LLLL. Face ao exposto, somos forçados a concluir que são, assim, manifestamente improcedentes as alegações do Apelante, devendo manter-se nos seus exatos termos a Sentença proferida pelo Tribunal do Trabalho de Matosinhos.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, deverá o presente recurso ser rejeitado com fundamento na preterição dos requisitos processuais impostos pelo artigo 639.º do CPC.
Ainda que assim não se entenda, deverá ser negado provimento ao presente recurso e, em consequência, confirmar-se na íntegra a sentença do Tribunal a quo que julgou a ação improcedente, por não provada, absolvendo, por conseguinte a Apelada dos pedidos,”
1.4. O recurso foi admitido por despacho de fls. 641.
1.5. Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta, emitiu Parecer no sentido de que deve ser concedido provimento ao recurso.
Recorrente e recorrida pronunciaram-se sobre este Parecer nos termos de fls. 655 e 693 e ss., respectivamente.
*
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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2. Objecto do recurso
Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente – artigo 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1 do Código de Processo Civil aplicável “ex vi” do art. 1.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo do Trabalho –, e tendo ainda em consideração a questão prévia suscitada nas contra-alegações, as questões que incumbe enfrentar são, por ordem lógica da sua apreciação, as seguintes:
1.ª – da pretendida rejeição do recurso por falta de concisão das conclusões;
2.ª – da admissibilidade da valoração dos posts publicados pelo autor[1] na rede social facebook;
3.ª – da justa causa para o despedimento do autor;
4.ª – das consequências do despedimento em caso de ilicitude do mesmo.
*
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3. Questão prévia
Quanto à primeira questão, invoca a apelada que não existiu por parte do apelante qualquer preocupação de sintetismo nas conclusões que, pese embora com uma formatação ligeiramente diferente, são uma cópia fiel das alegações e têm a mesma dimensão, pelo que não cumpriu o ónus que lhe é imposto pelo artigo 639.º n.º 1 do CPC (de apresentar conclusões sintéticas), pelo que deveria o presente recurso ser liminarmente rejeitado.
Nos termos do preceituado no artigo 639.º do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, em vigor à data em que o recorrente apresentou as suas alegações:
“1. O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
2. Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar:
a) As normas jurídicas violadas;
b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas;
c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada.
3. Quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tinha procedido às especificações a que alude o número anterior, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, no prazo de cinco dias, sob pena de não se conhecer do objecto do recurso, na parte afectada.
4. O recorrido pode responder ao aditamento ou esclarecimento no prazo de cinco dias.
5. (…)”
Decorre deste preceito que nas conclusões, deverá o recorrente indicar, de forma clara e sintética ou resumida, as questões que pretender ver reapreciadas e a fundamentação das mesmas, conclusões essas que visam permitir que o tribunal ad quem, de forma rápida e segura, apreenda a pretensão do recorrente e a sua fundamentação essencial (que não toda a argumentação).
A exigência da apresentação de conclusões tem em vista apresentar-se ao tribunal superior um quadro sintético, um resumo, das questões que se pretende ver submetidas ao tribunal para que se recorre, para lhe permitir uma mais fácil e rápida percepção dos fundamentos do recurso, assim se assegurando, em última instância, “a defesa dos direitos e a objectividade da sua realização”[2].
Deste modo, o critério subjacente à definição da conformidade das conclusões com o comando da lei está necessariamente relacionado com a respectiva aptidão para exercerem a sua função delimitadora e sinalizadora do campo de acção interventiva do tribunal de recurso. É esta função das conclusões que legitima a existência de normas processuais que as exijam.
No caso sub judice, verifica-se que as conclusões do recorrente são, na verdade, prolixas, reproduzindo essencialmente o que já havia sido feito constar das alegações, pelo que não cumprem de modo exemplar a função de apresentar um quadro sintético, um resumo, das questões que se pretendem ver submetidas ao tribunal para que se recorre.
Contudo, não deixam as mesmas de permitir uma fácil e rápida percepção dos fundamentos do recurso, começando exactamente por uma delimitação sucinta e precisa das questões sobre que versa a sua discordância (vide a conclusão 1.ª) e discorrendo sobre tais questões ao longo de 50 conclusões que elenca, o que faz de modo a permitir a este tribunal de recurso descortinar o sentido em que, no entendimento do recorrente, o tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento.
Além disso, resulta da leitura das contra-alegações que a apelada bem compreendeu o alcance da impugnação e que não foi perturbado o exercício do contraditório, não podendo deixar de se notar que, ela sim, foi claramente excessiva nas conclusões que apresentou (chegam as mesmas ao ponto LLLL., o que perfaz 90 conclusões).
Aliás, é de notar que a consequência do incumprimento do dever processual prescrito no artigo 639.º, n.º 1 não acarreta a imediata rejeição do recurso, como parece entender a recorrida, pois quando o recorrente não tenha procedido em conformidade com a ali prescrito, deve o relator proferir despacho de convite ao aperfeiçoamento, com a cominação de não conhecimento do objecto do recurso na parte afectada (n.º 3 do preceito).
No caso sub judice, atendendo a que as razões da discordância do recorrente são suficientemente apreensíveis apesar da prolixidade das conclusões, e para não protelar ou prejudicar a celeridade do processo, em desconformidade com o comando de celeridade contido nos artigos 6.º, n.º 1 e 7.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicável “ex vi” do art. 1.º, n.º 2 al. a) do Código de Processo do Trabalho, entende-se não ser necessária a formulação de convite ao aperfeiçoamento das conclusões.
Assim, julga-se improcedente a questão prévia suscitada a este propósito.
*
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4. Fundamentação de facto
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Os factos materiais relevantes para a decisão da causa foram fixados pela sentença recorrida nos seguintes termos:
«[...]
1. A Ré é uma sociedade comercial que se dedica à prestação de serviços de segurança, designadamente serviços de vigilância de pessoas e bens, recolha, contagem, manuseamento, guarda e transporte de valores. - al. A) dos factos admitidos por acordo;
2. A Ré C… tem, a nível nacional, cerca de 2.200 trabalhadores. - al. O) dos factos admitidos por acordo;
3. Muitos trabalhadores prestam as suas funções fora das instalações da C…. - al. P) dos factos admitidos por acordo;
4. O Autor era trabalhador da C… desde o dia 29 de Julho de 2002 e desempenhava as funções inerentes à categoria profissional de Vigilante. - al. B) dos factos admitidos por acordo;
5. No âmbito das funções desempenhadas, competia ao Autor a prestação de serviços de vigilância, prevenção e segurança em instalações industriais, comerciais e outras, públicas ou particulares, para as proteger contra incêndios, inundações, roubos e outras anomalias; o Trabalhador também efetuava rondas periódicas para inspecionar as áreas sujeitas à sua vigilância, controlava e anotava o movimento de pessoas, veículos ou mercadorias, de acordo com as instruções recebidas. - al. C) dos factos admitidos por acordo;
6. O Autor era delegado sindical. - al. D) dos factos admitidos por acordo;
7. O Autor publicou diversos posts no “Grupo “Trabalhadores na C…” da rede social Facebook. - al. E) dos factos admitidos por acordo;
8. Nesses posts, o Autor pronunciou-se sobre diversos temas relativos à organização e vida interna da C…. - al. F) dos factos admitidos por acordo;
9. No dia 04.09.2012, o Autor publicou no Facebook o seguinte post:
“Agora pergunto eu:
Será que quando os responsáveis da empresa prestaram as declarações acerca do “segurança”, em questão, não lhes ocorreu que a notícia seria divulgada, e desde logo de forma precisa, solicitaram a não referência do nome da empresa?
Se o fizeram, ou não, perante este facto, o que irão agora fazer os mesmos que preocupadamente, em defesa do bom nome da empresa, moveram processo contra o Delegado Sindical?
Tem mais impacto uma noticia aqui publicada, num grupo restrito, de que num órgão de comunicação com tiragem de 150 MIL EXEMPLARES?
Ou a defesa do bom nome da empresa, só é para invocar em momentos estratégicos, com o único objetivo de atacar os colaboradores, que aqui denunciam situações, que entendem dever ser do conhecimento de todos nós?”,
conforme documento constante de fls. 64 do procedimento disciplinar apenso. - al. G) dos factos admitidos por acordo;
10. No dia 05.09.2012, o Autor publicou no Facebook o seguinte post:
“Sendo o tema pedofilia um tema sensível, vamos supor que a nossa empresa tinha apresentado uma proposta para prestar serviço, numa escola, infantário ou noutro local frequentado por crianças. Pergunto, no momento de decisão do cliente para atribuição do serviço (não iria este cliente, considerando a delicadeza do tema, e tendo em conta as reações dos pais, que tendo conhecimento da notícia em questão, poderiam manifestar desagrado) e por isso e só por isso excluir a nossa empresa? Pois, espero que com o mesmo empenho com que me atacaram, prejudicaram e tentaram humilhar e calar, façam agora perante os acontecimentos, e perante este órgão de comunicação as semelhantes diligências nesse sentido. Sugerir acho que também me é permitido e não dá processo…”,
conforme documento constante de fls. 65 do procedimento disciplinar apenso. - al. H) dos factos admitidos por acordo;
11. No dia 13.09.2012, o Autor publicou no Facebook o seguinte post:
“Isto não me sai da cabeça, não me dão aumento, não me dão os dias compensatórios, não me pagam os feriados a 100% (5.20 liquido pelas 8 horas), não me dão 4 feriados, não me dão sapatos, e ainda tenho que lhes pagar 6%, dos 7% que me tiram... Acho que não é justo, somos 2330 (?) trabalhadores, não se paga 4 feriados, não se paga os 50% nos feriados, não se paga 50% do trabalho suplementar, não se atribui os dias compensatórios, não se dá aumentos, e ainda se recebe 6% direitinho do esforço a quem não se dá – total, DOIS MILHOES E QUINHENTOS MIL EUROS…? Temos que fazer alguma coisa…?”, conforme documento constante de fls. 66 do procedimento disciplinar apenso.
- al. I) dos factos admitidos por acordo;
12. No dia 24.09.2012, o Autor publicou no Facebook um pré-aviso de greve, bem como o seguinte post:
“Porque a opinião de todos é relevante, porque a mobilização coletiva é importante, informo todos os colegas que objectivamente pretendam demonstrar a sua indignação pelo trabalho gratuito nos dias feriados, foi DECRETADA GREVE ATÉ 31 DE JANEIRO 2013, ao trabalho suplementar – folgas – feriados, nos termos do comunicado anexo. O efeito prático da greve só será obtido perante a adesão massiva de todos os trabalhadores. Como todos nós sabemos existirão sempre os oportunistas (vulgo parasitas) que obtêm benefícios pelo trabalho e luta dos outros, e desses já ninguém espera nada, continuarão unicamente limitados à sua insignificante existência. No entanto é com os colegas trabalhadores, zelosos, profissionais, empenhados em dignificar a nossa profissão, e exigindo o respeito enquanto humanos, que contámos, estes sim que sentem desvalorizado o seu trabalho, e a sua dignidade… A nossa união é, e sempre será a nossa real força. ADESÃO À GREVE CONTRA O TRABALHO GRATUITO – PELA NOSSA DIGNIDADE”. …”,
conforme documento constante de fls. 67 do procedimento disciplinar apenso. - al. J) dos factos admitidos por acordo;
13. No dia 27.09.2012 o Autor publicou no Facebook o seguinte post:
“Pois V…, no contexto das tuas palavras, e enquadrado na tua forma de expressão, tenho as minhas dúvidas, se serão os imbecis que levam as notícias aos padrinhos, se serão os próprios padrinhos que aqui intencionalmente investigam as frases, para as colocarem “no ar”, fora de contexto, para tentarem fazer os outros acreditar em algo que não corresponde à real verdade. Na minha convicção, não o fazem “sem querer”, como tu o dizes, pois não acredito em “padrinhos” inocentes. Na minha convicção penso que o fazem, por falta de argumentos que validem as suas más atitudes, tentando manipular a opinião e decisão dos outros. Depois como a censura deixou de ter “formato jurídico” após o 25 de Abril, não será essa a censura manipuladora e não-inocente, que me impedirá de continuar aqui a partilhar a minha opinião, PORQUE SOU LIVRE DE A TER – LIBERDADE DE OPINIÃO, utilizando a minha forma de expressão, LIBERDADE DE EXPRESSÃO. Depois como tu e eu sabemos, não reconheço a mínima moralidade a essas pessoas que pretendem fazer os outros acreditar que se sentem chocados com a minha forma de expressão, e diariamente não se importam de com os seus ACTOS, humilhar, ofender, espezinhar, maltratar, despedir, o outro. Como sabes – reconhecidamente – a forma de me expressar, resumo à moda do Porto: (cá vai mais uma frase para os falsos moralistas aproveitarem, para tentar manipular os outros) - Hipocrisias, E HIPÓCRITAS para o carago com eles (expressão utilizada na região Porto)”,
conforme documento constante de fls. 68 do procedimento disciplinar apenso. - al. K) dos factos admitidos por acordo;
14. No dia 07.10.2012, o Autor publicou no Facebook o seguinte post:
“Este texto (acima), foi publicado por mim em meados de Fevereiro de 2012, no entender da empresa este texto, foi também uma das razões para processo disciplinar ao Delegado Sindical.
Após o despedimento do nosso colega K…, foi movida ação no Tribunal de Trabalho do Porto.
Autor: K…
Ré: C…, SA
Dito isto, no próximo dia 9 de Outubro – 3ª feira – às 9H30, será o Julgamento no Tribunal de Trabalho do Porto, situado na …. Quem quiser ouvir os testemunhos, e concluir quem diz as verdades e/ou mentiras, é estar presente…”,
conforme documento constante de fls. 69 do procedimento disciplinar apenso. - al. L) dos factos admitidos por acordo;
15. No dia 17.10.2012, o Autor procedeu igualmente à publicação no Facebook do seguinte post:
“Ora bem, parece que as perseguições voltaram… hoje num posto onde a greve do passado dia 5 de Outubro teve adesão a 100%, foi lá um auto-intitulado vigilante chefe duas vezes, em visita a vigilantes distintos, das duas visitas resultaram duas – vulgo – participações. Ou aquilo é pago à comissão ou é coisa encomendada para intimidar. Como fui um dos contemplados numa das ocorrências, divulgo que o motivo da participação foi o facto de não ter assinado a comunicação de ausências do dia da greve. Acerca deste novo impresso, como todos já verificaram não existe local de assinatura para autenticar a comunicação, existe sim um local destacado para assinar, no caso da tomada de conhecimento de que a falta foi considerada injustificada… e nada mais. Se foi erro de quem criou o impresso, não sei… se realmente o objetivo é só para intimidar, já deviam ter chegado à conclusão que andam a perder tempo… se realmente as participações são pagas à comissão… até entendo afinal a vida está difícil para todos… mas é melhor não abusar muito… digo eu! Já agora dia 1 de Novembro é feriado, é dia de greve”,
conforme documento constante de fls. 70 do procedimento disciplinar apenso. - al. M) dos factos admitidos por acordo;
16. Posteriormente, o Autor publicou igualmente o seguinte comentário:
“Claro que a lei da greve é para todos, mas estes "engravatados" nem sabem ler sequer, por isso guarda esse artigo para o caso de ser preciso. E claro que não pode constar registo no processo individual do trabalhador se aderiu à greve ou não, mas neste sector com a "gente" que por cá existe... é o que se vê... vale o que vale... para mim vale(m) pouco. E é claro como diz lá que a falta só terá de ser justificada sendo outro o motivo, a greve está comunicada pelos sindicatos, isso é ilegal, na folga tenho que ir à Boavista se tiver tempo passo na ACT, estou à espera das cópias da dita comunicação e participação...” ,
conforme documento constante de fls. 70 do procedimento disciplinar apenso. - al. N) dos factos admitidos por acordo;
17. No dia 2 de Novembro de 2012, o Autor procedeu a uma publicação no Facebook do seguinte post:
“No posto onde presto serviço, apesar das “habilidades”…, dos atos discriminatórios praticados…, e 2 colegas de folga (no mesmo dia?!), a adesão à greve foi de 100%. OS HOMENS estão em luta…pelos nosso direitos, incluindo os /dos Fura- Greves. De Eduardo Moraes – Historiador – “greve é um direito e não um delito – Porém, sempre há colegas atuando contra si próprios. Ao exercer o seu suposto direito de trabalhar, o fura-greve dificulta e inviabiliza o movimento, numa atitude individualista, irresponsável, oportunista e egoísta. Ele luta contra os que lutam por novos e maiores direitos”,
conforme documento constante de fls. 79 do procedimento disciplinar apenso. - al. S) dos factos admitidos por acordo;
18. No mesmo dia (2 de Novembro de 2012), quando questionado sobre a obrigatoriedade de assinatura de folha de ausências em virtude de adesão à greve, o Autor procedeu a outra publicação no Facebook referindo o seguinte:
“Não tem que assinar nada. Só o facto de alguém fazer tal pedido, deve ser informado o Delegado-Sindical ou D…, para que possa atuar nesse sentido”,
conforme documento constante de fls. 81 do procedimento disciplinar apenso. - al. T) dos factos admitidos por acordo;
19. No dia 9 de Novembro de 2012, o Autor publicou um comentário no Facebook referindo, a respeito das rondas de vigilantes que são realizadas pela C…, o seguinte:
“Ora 3, cada um no “seu” carro…o cenário está montado…a trabalhar…e novos contratos com clientes fizeram? Só pode, para tal gasto de recursos…ora, antecipadamente parabéns!”,
conforme documento constante de fls. 82 do procedimento disciplinar apenso. - al. U) dos factos admitidos por acordo;
20. No dia 09.11.2012, o Autor trabalhou no horário das 00h00 às 08h00 (relatório junto a fls. 83 do procedimento disciplinar apenso) e publicou este comentário às 01h55, do dia 09.11.2012. - al. V) dos factos admitidos por acordo;
21. No dia 13 de Novembro de 2012, o Autor procedeu a uma publicação no Facebook do seguinte post:
“Ao comentário (no mínimo idiota) “e como é que eu sei que você fez greve ou outra coisa qualquer”.
A resposta merecida seria “você é mesmo idiota”. A que se poderá dar, é que o estado ainda não criou um balcão onde se vá recolher uma justificação ou impresso a dizer – este fez greve, e com carimbo em tamanho gigante, a dizer – GREVE”. Já ouvi coisas que envergonham o verdadeiro idiota, mas esta… He, he.”. !”,
conforme documento constante de fls. 84 do procedimento disciplinar apenso. - al. W) dos factos admitidos por acordo;
22. No mesmo dia, o Autor procedeu ainda à publicação no Facebook do seguinte post:
“Mais uma vez acerca das visitas aos VIGILANTES que aderiram à greve, para justificarem a “falta” (entenda-se ausência) no dia de greve, abaixo publico o decreto elucidativo de que ninguém tem que justificar a ausência em questão. Se algum iluminado conhecer outra normativa legal que diga algo em sentido contrário…”,
conforme documento constante de fls. 85 do procedimento disciplinar apenso. - al. X) dos factos admitidos por acordo;
23. No dia 21 de Novembro de 2012, o Autor publicou no Facebook o post constante de fls. 86 do procedimento disciplinar apenso, mencionado “o dia de ontem foi assinalado” e colocando uma imagem de três palhaços. - al. Y) dos factos admitidos por acordo;
24. Com a colocação no dia 21 de Novembro de 2012 de uma imagem de três palhaços [al. Y)], o Autor quis retratar os seus superiores [al. AAA)] como palhaços. - cfr. resp. ao ques. 4 da base instrutória;
25. Nos dias em que a Ré refere que o Autor publicou os posts, a página foi visitada por, pelo menos, 92 pessoas. - cfr. resp. ao ques. 5 da base instrutória;
26.No dia 23 de novembro de 2012, o Autor procedeu à publicação no Facebook do post constante de fls. 87 do procedimento disciplinar apenso, no qual se referiu ao exercício de funções dos rondistas da C… através do seguinte comentário “17 dias, 16 “visitas”… He, he, he…”, acompanhado com um vídeo da personagem de animação Speedy Gonzales. - al. Z) dos factos admitidos por acordo;
27. Perante a publicação de outros colaboradores a referirem a presença de rondistas da C… nos seus locais de trabalho, o Autor comentou o seguinte:
“A sério L…? Não me digas também aderiste à GREVE, e não alinhas em irregularidades…?”,
conforme documento constante de fls. 88 do procedimento disciplinar apenso. - al. AA) dos factos admitidos por acordo;
28. A página do “Grupo de Trabalhadores do na C…” no Facebook, de que o autor é administrador, é composta por, pelo menos, 140 membros, com o denominador comum o facto de serem ou terem sido trabalhadores da C…. - al. KKK) dos factos admitidos por acordo;
29. Sendo que o acesso à mesma só era possível mediante pedido dirigido aos seus administradores. - al. LLL) dos factos admitidos por acordo;
30. A referida página não se encontrava acessível ao público, não podendo aceder a ela quem quisesse. - al. MMM) dos factos admitidos por acordo;
31. No “Procedimento de Trabalho Gestão e Tratamento de Comunicação de Ausências”, datado de 31/08/2012, no qual se encontram definidas as regras relativas às ausências dos trabalhadores, é referido no ponto segundo do mesmo (“2. ÂMBITO”) que “este Procedimento de Trabalho é aplicável (…) a todos os colaboradores do Grupo C…”, assim como no ponto primeiro (“1. OBJECTIVO”) que “todas as ausências dos colaboradores são registadas” e que “todas as comunicações de ausência são assinadas pelo colaborador”, conforme documento constante de fls. 71 a 76 do procedimento disciplinar apenso. - al. Q) dos factos admitidos por acordo;
32. É disponibilizado aos trabalhadores da C… um documento denominado “Comunicação de Ausências”, conforme documento constante de fls. 77 do procedimento disciplinar apenso. - al. R) dos factos admitidos por acordo;
33. Por comunicação datada de 22 de outubro de 2012, a C… notificou os seus trabalhadores de que os elementos das equipas de Ronda Móvel, com a classificação interna de chefe de grupo, poderiam “efectuar visitas de apoio aos postos de vigilância”, “devendo os colaboradores facultar toda a documentação, bens e meios necessários relacionados com o serviço e cooperar com estas chefias no acto de visitas de acompanhamento aos postos”, conforme documento constante de fls. 89 do procedimento disciplinar apenso. - al. BB) dos factos admitidos por acordo;
34. No dia 22 de Outubro de 2012 a Ré emitiu um comunicado, que foi notificado aos seus trabalhadores, com o seguinte teor:
“Comunicamos a todos os colaboradores que as Equipas de Ronda Móvel da Zona Norte poderão efectuar visitas de apoio aos postos de Vigilância.
(…)
Os elementos das equipas de Ronda Móvel têm a função de Chefes de Grupo, razão pela qual devem os colaboradores facultar toda a documentação, bens e meios necessários relacionados com o serviço e cooperar com estas Chefias no acto das visitas de acompanhamento aos postos”,
conforme documento constante de fls. 89 do procedimento disciplinar apenso. - al. CC) dos factos admitidos por acordo;
35. O Autor não tinha a classificação interna de chefe de grupo. - al. DD) dos factos admitidos por acordo;
36.No dia 29 de outubro de 2012, o Autor contactou, telefonicamente, o Vigilante chefe F…. - al. EE) dos factos admitidos por acordo;
37. Nesse telefonema, o Autor mencionou ter contactado a ACT e a PSP, de forma a serem apuradas ilegalidades, alegadamente cometidas pela C…, na atribuição de poderes de chefia aos Rondistas/Chefes de Grupo. - al. FF) dos factos admitidos por acordo;
38. No contacto telefónico referido na al. EE), o Autor mencionou que não reconhecia o Rondista/chefe de grupo como cargo de chefia e que não reconhecia validade à comunicação interna de serviço entregue na portaria. - cfr. resp. ao ques. 1 da base instrutória;
39. No dia 15 de novembro de 2012, os chefes de grupo solicitaram aos vigilantes da C… – Autor incluído - que assinassem o check list, bem como o diário de inspeção. - al. GG) dos factos admitidos por acordo;
40. Na check list e no diário de inspeção o chefe de grupo regista, designadamente, informação relativa à utilização dos documentos por parte dos vigilantes, ao uso dos equipamentos que estão ao dispor dos vigilantes, à identificação do vigilante, à necessidade de esclarecimentos que o Vigilante possa sentir relativamente a diferentes aspetos da sua vida profissional, entre outros. - al. HH) dos factos admitidos por acordo;
41. O Autor, não obstante lhe ter sido transmitido a importância que revestiam os referidos documentos, no dia 15 de novembro de 2012, aquando da visita inspetiva do chefe de grupo, E…, recusou-se a assinar os referidos documentos. - al. II) dos factos admitidos por acordo;
42. Aquando do referido na al. II) o Autor argumentou que não devia obediência ao E…. - cfr. resp. ao ques. 2 da base instrutória;
43. Quando lhe foi solicitado que assinasse o “diário de inspeção” e o “checlist”, o Autor não assinou, alegando que na referida comunicação da Ré não vinha referido que o vigilante tinha de assinar o “Diário de Inspeção”. - cfr. resp. ao ques. 6 da base instrutória;
44. Como esta questão estava também a ser levantada por outros colegas do seu e de outros locais de trabalho que o interrogaram sobre tal obrigação, o Autor, enquanto delegado sindical, contactou o seu superior hierárquico, o Vigilante chefe Sr. F…, a quem, telefonicamente, deu conta das suas dúvidas sobre se os vigilantes teriam de assinar o “Relatório de Inspeção” e o “checlist” uma vez que a citada comunicação não referia essa obrigação, com o esclarecimento que o Autor lhe mencionou também o que consta da resposta ao ques. 1. - cfr. resp. ao ques. 7 da base instrutória;
45. Da check list de 15 de novembro não consta nenhuma observação negativa ou reparo à conduta do Autor, tendo sido aposta a menção “ok” a todos os itens mencionados, conforme documento constante de fls. 90 do procedimento disciplinar apenso. - al. JJ) dos factos admitidos por acordo;
46. O mesmo se passando com o diário de inspeção em que o Rondista/ Chefe de grupo apôs a menção “a visita de apoio e acompanhamento ao vigilante B…, n.º …., tendo decorrido na normalidade”, conforme documento constante de fls. 91 do procedimento disciplinar apenso. - al. KK) dos factos admitidos por acordo;
47. No dia 20 de novembro de 2012, o Vigilante-Chefe E… efetuou uma visita de apoio e inspeção ao posto M…, onde o Autor prestava as suas funções. - al. LL) dos factos admitidos por acordo;
48.No âmbito da mencionada visita de apoio, o F… perguntou ao Autor porque é que não tinha assinado o Diário de Inspeção, bem como a check list, conforme lhe fora solicitado por E…, no dia 15 de novembro de 2012, tendo o Autor respondido que não reconhecia competências a E…. - al. NN) dos factos admitidos por acordo;
49. O Autor sabia – por lhe ter sido comunicado - que a C… tinha atribuído a E… a classificação de chefe de grupo . - al. OO) dos factos admitidos por acordo;
50.O Autor sabia, em conformidade com a comunicação interna a que teve acesso, que a C… tinha atribuído ao chefe de grupo as funções de solicitar o preenchimento de documentação aos vigilantes. - al. PP) dos factos admitidos por acordo;
51. Uma das funções dos chefe de grupo consiste em acompanhar os trabalhadores que estão afetos às diversas portarias da C…. - al. UUUU) dos factos admitidos por acordo;
52. Esse acompanhamento passa, designadamente, por estabelecer uma maior proximidade entre as chefias e os trabalhadores, atendendo a que a grande maioria destes presta a sua atividade fora das instalações da C…, sem controlo imediato por parte da hierarquia. - al. VVVV) dos factos admitidos por acordo;
53. Os Vigilantes-Chefes estão incumbidos de verificar e dar assistência a diversos locais de trabalho, o que implica que questionem os trabalhadores sobre o incumprimento de procedimentos a que estes estão adstritos. - al. MM) dos factos admitidos por acordo;
54. Desde sempre a Ré atribuiu aos Vigilantes Chefes as visitas de inspeção e apoio aos locais de trabalho, aos Rondistas atribuiu a função de rondas móveis a edifícios e outros bens imóveis que normalmente se encontram sem vigilantes no período noturno e aos Chefes de Grupo atribuiu a coordenação do serviço em locais de trabalho onde operam vários vigilantes em simultâneo, com o esclarecimento que posteriormente passou também a atribuir aos rondistas a efetivação de visitas de apoio e acompanhamento aos postos de vigilância. - cfr. resp. ao ques. 12 da base instrutória;
55. Após o Chefe de grupo /Rondista averbar na check list, bem como no diário de inspeção, as menções que reputa como conveniente, os vigilantes devem assinar a referida check list, bem como o diário de inspeção. - cfr. resp. ao ques. 13 da base instrutória;
56. O Autor sabia que nas funções atribuídas ao chefe de grupo (al. PP) estavam incluídas as de solicitar a assinatura pelo vigilante da check list e do diário de inspeção. - cfr. resp. ao ques. 14 da base instrutória;
57. O Autor tinha conhecimento que o relatório de ocorrência deveria, no período imediatamente subsequente à sua elaboração, ser assinado pelo trabalhador para atestar que dele tomou conhecimento. - cfr. resp. ao ques. 15 da base instrutória;
58.O Autor não compareceu ao local de trabalho no dia 14 de novembro de 2012. - al. QQ) dos factos admitidos por acordo;
59. A C… utiliza um documento interno denominado de comunicação de ausências, conforme documento constante de fls. 92 do procedimento disciplinar apenso. - al. RR) dos factos admitidos por acordo;
60. O preenchimento do documento visa, entre outras finalidades, permitir, por exemplo, que, não obstante uma determinada ausência não poder ser subsumida ao elenco legal de faltas justificadas, a chefia, atendendo às circunstâncias do caso, possa justificá-la. - al. SS) dos factos admitidos por acordo;
61. Na sequência da referida ausência ao local de trabalho do Autor, no mesmo dia 20 de novembro de 2012, o Vigilante-Chefe F… solicitou ao Autor o preenchimento do referido documento de comunicação de ausência, tendo-se este recusado a preencher o documento em causa. - al. TT) dos factos admitidos por acordo;
62. O Autor recusou assinar o documento justificativo da ausência ao trabalho do dia 14 de novembro de 2012 por entender que os trabalhadores não têm que, nem prévia nem posteriormente, comunicar ao empregador se aderiram ou não à greve. - cfr. resp. ao ques. 9 da base instrutória;
63. Perante tais recusas do Autor, o Vigilante-Chefe E… elaborou os correspondentes relatórios de ocorrência”, conforme documento constante de fls. 93 a 97 do procedimento disciplinar apenso. - al. UU) dos factos admitidos por acordo;
64. Um dos relatórios de ocorrência referia-se à recusa do Autor em preencher a comunicação de ausências e outro à recusa do Autor em assinar o check list, bem como o diário de inspeção referentes ao dia 15 de novembro de 2012, conforme documentos constantes de fls. 93 a 97 do procedimento disciplinar apenso. - al. VV) dos factos admitidos por acordo;
65. O relatório de ocorrências é um documento onde são registados determinados acontecimentos relativos a um vigilante. - al. WW) dos factos admitidos por acordo;
66. O Vigilante-Chefe F… solicitou ao Autor que assinasse o relatório de ocorrências, tendo-se o autor recusado a assinar o referido relatório. - al. XX) dos factos admitidos por acordo;
67. O Vigilante-Chefe, F…, requereu a presença do Chefe de secção, J…, bem como do Chefe de grupo, E…, para que estes pudessem confirmar que o Autor tinha tomado conhecimento do conteúdo dos relatórios de ocorrência. - al. YY) dos factos admitidos por acordo;
68. O Autor recusou-se, uma vez mais, a assinar o relatório. - al. ZZ) dos factos admitidos por acordo;
69. No dia 20 de novembro de 2012, o vigilante chefe F…, o chefe de secção J… e o chefe de grupo E…, foram os únicos superiores hierárquicos do Autor que estiveram em contacto com ele. - al. AAA) dos factos admitidos por acordo;
70. No dia em causa, o Autor telefonou à Polícia de Segurança Pública (PSP), solicitando a presença de agentes no local de trabalho, tendo, pelas 14:55 horas, comparecido no local de trabalho do Autor os Agentes N… e O…. - al. BBB) dos factos admitidos por acordo;
71. O Autor chamou a PSP ao seu local de trabalho alegando temer pela sua integridade física. - cfr. resp. ao ques. 10 da base instrutória;
72. Tendo a PSP permanecido no local, o Vigilante-Chefe F… releu ao Autor os dois citados relatórios de ocorrência, bem como um terceiro que foi elaborado por o Autor estar fardado com sapatos castanhos. - al. CCC) dos factos admitidos por acordo;
73. O Autor apenas assinou o relatório de ocorrência elaborado em virtude do fardamento, recusando-se novamente a assinar os restantes relatórios. - al. DDD) dos factos admitidos por acordo;
74. Quando as chefias do autor se preparavam para finalizar a visita de apoio e inspeção, o Autor, ainda na presença dos agentes, levantou a voz às suas chefias. - al. EEE) dos factos admitidos por acordo;
75. Tendo sido chamado à atenção, pelo Chefe de Secção, J…, o Autor alegou que tinha “problemas nas cordas vocais”. - al. FFF) dos factos admitidos por acordo;
76. No dia 8 de novembro de 2012, o Autor estava escalado para o turno compreendido entre as 00h00 e as 08h00, conforme horário de trabalho relativo à portaria da M…, conforme documento constante de fls. 98 do procedimento disciplinar apenso. - al. GGG) dos factos admitidos por acordo;
77. O Autor, nesse dia, não compareceu no local de trabalho. - al. HHH) dos factos admitidos por acordo;
78. Pelas 11h48 desse mesmo dia, a C… recebeu uma comunicação do D…, a comunicar a ausência do Autor, conforme documento constante de fls. 113. - al. III) dos factos admitidos por acordo;
79. A C… teve de diligenciar pela substituição do Autor, tendo sido designado o trabalhador P… para substituir o Autor. - al. JJJ) dos factos admitidos por acordo;
80. No dia 7 de novembro de 2012, pelas 21H45, o D…, na pessoa do seu Coordenador Regional Q…, contatou telefonicamente a Ré, tendo falado com a Centralista Srª D. S…, a quem comunicou que, por motivos de última hora, fora necessário convocar o Delegado Sindical B… para o exercício de atividades sindicais no dia 8 de novembro e que, como tal, a respetiva justificação só poderia seguir no dia seguinte visto que os serviços administrativos do D… já se encontravam encerrados. - cfr. resp. ao ques. 8 da base instrutória;
81. O Autor trabalhava num local onde, por cada turno, somente um vigilante se encontrava ao serviço. - al. NNN) dos factos admitidos por acordo;
82. Da alínea b) do ponto 2.3 (Fardamento) da ACTA da reunião realizada no dia 19/01/2012 entre o D… (sindicato onde se encontra inscrito o Autor) e a Ré consta que “o Calçado não faz parte do fardamento na vigilância estática”, conforme documento constantes de 196. - al. OOO) dos factos admitidos por acordo;
83. No dia 14 de Novembro de 2012, havia sido convocada uma greve geral pela T…, corroborada pelo D… – sindicato onde se encontra inscrito o Autor. - al. PPP) dos factos admitidos por acordo;
84. Por ordem da Ré, o Autor esteve suspenso preventivamente entre os dias 6 de Março e 10 de Maio de 2012 e entre os dias 6 de Dezembro de 2012 e 29 de Janeiro de 2013”, conforme documentos constantes de fls. 231 a 233. - al. UUU) dos factos admitidos por acordo;
85. Relativamente ao primeiro período de suspensão, o mesmo teve origem na abertura de um procedimento disciplinar instaurado pela Ré ao Autor, o qual versou sobre posts por este colocados sobre temas relativos à organização e vida interna da empresa (à semelhança do que aconteceu com o segundo procedimento disciplinar, que culminou com o despedimento do Autor), conforme documento constante de fls. 234. - al. VVV) dos factos admitidos por acordo;
86. O Autor respondeu à nota de culpa que lhe foi dirigida, impugnando os factos nela contidos, e requerendo o arquivamento do procedimento disciplinar, conforme documento constante de fls. 235 a 247. - al. WWW) dos factos admitidos por acordo;
87. No dia 5 de Outubro de 2012 (dia feriado) o Autor fez greve, tendo a Ré procedido ao desconto do valor da retribuição referente a esse dia, no montante de 29,63 € (cfr. doc. de fls. 263). - al. HHHH) dos factos admitidos por acordo;
88. O Autor estava escalado para trabalhar no dia 5 de Outubro de 2012, conforme documento constante de fls. 289. - al. IIII) dos factos admitidos por acordo;
89. Foram já movidos dois procedimentos disciplinares contra o Autor, os quais culminaram em sanções disciplinares de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade. - al. JJJJ) dos factos admitidos por acordo;
90. No primeiro processo, em 2006, o Autor foi sancionado com dez dias de suspensão do trabalho com perda de retribuição, sendo que, por acordo realizado no 2ª Juízo do Tribunal do Trabalho de Matosinhos, na sequência de uma ação intentada pelo Autor contra a Ré, esta aceitou reduzir a sanção disciplinar de 10 para 2 dias, conforme documento constante de fls. 207 e 208 e 114 a 117. - al. KKKK) dos factos admitidos por acordo;
91. O segundo procedimento disciplinar foi instaurado igualmente no ano de 2012, fundamentado numa múltipla prática de divulgação de comentários no Facebook, conforme documentos constantes de fls. 138 a 170. - al. LLLL) dos factos admitidos por acordo;
92. Nesse processo foi aplicada ao Autor, por decisão datada de 10.05.2012, a sanção disciplinar de suspensão do trabalho, pelo período de 10 (dez) dias, com perda de retribuição e de antiguidade, nos termos da cláusula 38.ª n.º 1, alínea e) do Convenção Colectiva de Trabalho aplicável e do artigo 328.º alínea e) e do Código do Trabalho, conforme documentos constantes de fls. 138 a 170. - al. MMMM) dos factos admitidos por acordo;
93. A Ré descontou ao A. o valor correspondente aos 10 dias de retribuição (296,00 €), conforme documento constante de fls. 256. - al. NNNN) dos factos admitidos por acordo;
94. A Ré instaurou processo disciplinar contra o A. por deliberação de 5/12/2012, conforme documento constante de fls. 27 e 28 do procedimento disciplinar apenso. - al. OOOO) dos factos admitidos por acordo;
95. O A. foi notificado da nota de culpa e da declaração de intenção de despedimento em 6/12/2012, conforme documentos constantes de fls. 29 a 63 do procedimento disciplinar apenso. - al. PPPP) dos factos admitidos por acordo;
96. O A. apresentou resposta à nota de culpa pugnando pelo arquivamento do processo disciplinar, conforme documentos constantes de fls. 131 a 136 do procedimento disciplinar apenso cujo teor se dá por reproduzido. - al. QQQQ) dos factos admitidos por acordo;
97. O sindicato emitiu parecer nos termos do n.º 5 do art. 356º do CT, manifestando oposição à aplicação de qualquer sanção disciplinar ao Autor, mormente a do despedimento, conforme documento constantes de fls. 350 a 354 do procedimento disciplinar apenso cujo teor se dá por reproduzido. - al. RRRR) dos factos admitidos por acordo;
98. Mediante decisão datada de 25.01.2013, a Ré aplicou ao A. a sanção de despedimento sem qualquer indemnização ou compensação, nos termos dos arts. 328º. N.º 1, al. f), 330º e dos n.ºs 1 e 2, als. a), d), e) e i) do art. 351º, todos do CT, conforme documento constantes de fls. 355 a 389 do procedimento disciplinar apenso cujo teor se dá por reproduzido. - al. SSSS) dos factos admitidos por acordo;
99. O Autor recepcionou a decisão da sanção de despedimento em 29/01/2013. - al. TTTT) dos factos admitidos por acordo;
100. O A. foi objeto de uma carta de advertência remetida pela ré. - cfr. resp. ao ques. 11 da base instrutória;
101. O Autor auferiu os seguintes vencimentos mensais e subsídio de alimentação:
http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/917c9c56c1c2c9ae80257d5500543c59/DECTINTEGRAL/4.2DF2?OpenElement&FieldElemFormat=gif
- al. QQQ) dos factos admitidos por acordo;
102. O A. tinha um horário semanal de 40 horas, trabalhando no regime de turnos rotativos. - al. RRR) dos factos admitidos por acordo;
103. Nos anos de 2009 a 2012, o Autor prestou trabalho nos seguintes dias feriados, num total de 10:
http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/917c9c56c1c2c9ae80257d5500543c59/DECTINTEGRAL/5.47B2?OpenElement&FieldElemFormat=gif
- al. SSS) dos factos admitidos por acordo;
104. A ré pagou ao Autor o trabalho prestado em dias feriado em singelo, juntamente com a retribuição “normal” do mês. - al. TTT) dos factos admitidos por acordo;
105. No período que decorreu entre 6 e 31 de Março de 2012, a Ré descontou ao Autor o subsídio de alimentação referente a 18 dias, no total de 102,42 € (5,69 € x 18), conforme documento constante de fls. 255. - al. XXX) dos factos admitidos por acordo;
106. No período que decorreu entre 1 e 30 de Abril de 2012, a Ré descontou ao Autor o subsídio de alimentação referente a 23 dias, no total de 130,87 € (5,69 € x 23), pelo que lhe deve esse montante (cfr. doc. constante de fls. 255). - al. YYY) dos factos admitidos por acordo;
107. No período que decorreu entre 1 e 10 de Maio de 2012, a Ré descontou ao Autor o subsídio de alimentação referente a 7 dias, no total de 39,83 € (5,69 € x 7), (cfr. doc. constante de fls. 256). - al. ZZZ) dos factos admitidos por acordo;
108. No período que decorreu entre 6 e 31 de Dezembro de 2012, a Ré descontou ao Autor o subsídio de alimentação referente a 17 dias, no total de 96,73 € (5,69 € x 17) (cfr. doc. constante de fls. 257). - al. AAAA) dos factos admitidos por acordo;
109. No período que decorreu entre 1 e 29 de Janeiro de 2013, a Ré descontou ao Autor o subsídio de alimentação referente a 21 dias, no total de 119,49 € (5,69 € x 21), (cfr. doc. constante de fls. 257). - al. BBBB) dos factos admitidos por acordo;
110. No período em que o Autor esteve suspenso preventivamente a ré descontou a retribuição especial de 25% referente ao trabalho noturno (cfr. doc. constantes de fls. 255 a 258). - al. CCCC) dos factos admitidos por acordo;
111. Na qualidade de Delegado Sindical, o Autor fez uso do regime legal de crédito de horas nos termos do artigo 467.º do código do trabalho e da cláusula 51ª do CCT, nas seguintes datas:
Ano 2011 – 30 de Maio; 8 de Junho; 15 de Julho; 16 de Agosto; 22 de Setembro; 1, 26 e 29 de Outubro; 4 de Novembro; 3, 10 e 31 de Dezembro;
Ano 2012 – 20 de Janeiro; 8, 14, 21 e 29 de Fevereiro; 19 de Junho; 25 de Julho; 11 de Agosto; 25 de Setembro; 1 e 20 de Outubro. - al. DDDD) dos factos admitidos por acordo;
112. A Ré descontou ao Autor o subsídio de alimentação nos dias acima indicados:
Ano 2011: 30 de Maio = 5,69 €; 8 de Junho = 5,69 €; 15 de Julho = 5,69 €; 16 de Ago. = 5,69 €; 22 de Set. = 5,69 €; 1, 26 e 29 de Out. = 17,07 € (5,69 € x 3); 4 de Nov.= 5,69 €; 3, 10 e 31 de Dezembro = 17,07 € (5,69 € x 3);
Ano 2012: 20 de Janeiro = 5,69 €; 8, 14, 21 e 29 de Fevereiro = 22,76 € (5,69 € x 4); 19 de Junho = 5,69 €; 25 de Julho = 5,69 €; 11 de Agosto = 5,69 €; 25 de Setembro = 5,69 €; 1 e 20 de Outubro = 11,38 € (5,69 € x 2). - al. EEEE) dos factos admitidos por acordo;
113. Nos anos de 2009 a 2012 o Autor faltou ao trabalho nos seguintes dias:
http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/917c9c56c1c2c9ae80257d5500543c59/DECTINTEGRAL/7.3CA6?OpenElement&FieldElemFormat=gif
- al. FFFF) dos factos admitidos por acordo;
114. A ré procedeu ao desconto desses dias na retribuição mensal do autor:
http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/917c9c56c1c2c9ae80257d5500543c59/DECTINTEGRAL/8.4CCC?OpenElement&FieldElemFormat=gif
- al. GGGG) dos factos admitidos por acordo.
[...]».
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5. Fundamentação de direito
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5.1. Admissibilidade da valoração dos posts publicados pelo A. no “grupo dos trabalhadores da C…” da rede social facebook
A primeira questão suscitada no recurso do A. consiste em aferir da admissibilidade da valoração dos posts publicados pelo A. no “Grupo dos trabalhadores da C…” da rede social facebook.
Alega o A. recorrente que a jurisprudência dos tribunais superiores é unânime quanto à tutela legal e constitucional da confidencialidade da mensagem pessoal e a consequente nulidade da prova obtida com base na mesma (o que impede que o envio da mensagem com aquele conteúdo possa constituir o objecto do processo disciplinar instaurado com vista ao despedimento do trabalhador), que o “Grupo de Trabalhadores na C…” de que é administrador é composto, pelo menos, por 140 membros, tendo como denominador comum o facto de serem ou terem sido trabalhadores da C…, que o acesso ao mesmo só era possível mediante pedido dirigido aos seus administradores, não se encontrando o mesmo acessível ao público, pelo que os “dados de partilhador” estão englobados pelo conceito da esfera privada e é irrelevante o conteúdo dos posts nele publicados, os quais não poderiam ser conhecidos da recorrida, que tomou conhecimento abusivamente do que era da estrita esfera privada dos membros, pelo que, a existir a prática de um acto ilícito, este terá de ser sempre imputado à C…, não estando minimamente provado nos autos que o A. tenha tido qualquer responsabilidade no facto da C… ter tido conhecimento dos posts por si publicados.
Alega, também, que é inaceitável a conclusão a que chega a sentença de que se trata de uma página de cariz estritamente profissional, o que não resulta dos factos provados e conclui que a mesma não poderia ter aceite a valoração dos posts publicados pelo A. e aferir da licitude do seu despedimento com base no seu conteúdo, pelo que terá de improceder o despedimento com justa causa com base na natureza falsa, imprecisa e lesiva do bom nome e imagem da R. quanto aos posts publicados pelo A. no “Grupo de Trabalhadores na C…” da rede social facebook e ao assim não decidir a sentença recorrida violou o disposto nos artigos 26 e no nº 8 do artº 32, ambos da CRP, e no artigo 429, nº 3 do C.T. (conclusões 2.ª a 17.ª).
A sentença sob censura, por seu turno, entendeu inexistir qualquer obstáculo, de índole formal, à apreciação e valoração dos posts publicados pelo A. no facebook, motivo por que julgou válido o meio de prova em causa.
Vejamos.
5.1.1. A tutela dos direitos de personalidade no âmbito da relação de trabalho
Anteriormente aos Códigos do Trabalho de 2003 e 2009, os direitos de personalidade não se encontravam contemplados em termos sistemáticos nas leis do trabalho.
Verificava-se contudo uma atenção crescente da doutrina aos direitos fundamentais não especificamente laborais do cidadão enquanto trabalhador da empresa, uma vez que nesta o trabalhador mantém, em princípio, todos os direitos de que são titulares todas as outras pessoas e a especificidade da prestação de trabalho (inseparável da pessoa do trabalhador e efectuada num contexto de subordinação jurídica) implica, por natureza, uma limitação da liberdade do contraente mais débil e um aumento da probabilidade de compressão dos seus direitos fundamentais, designadamente de invasão da sua esfera pessoal.
Com efeito, já então se mostrava explicitamente consagrado no n.º 1 do art. 18.º da Constituição, que os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas, ou seja, impõem-se directa e imediatamente nas relações entre particulares.
Como referem Gomes Canotilho e Vital Moreira, “a eficácia horizontal dos direitos, liberdades e garantias implica que tal como o Estado também todas as entidades privadas estão sujeitas a um dever de não perturbar ou impedir o exercício dos direitos fundamentais. Os direitos, liberdades e garantias traduzem-se assim num dever geral de todos os cidadãos de respeitar e não infringir os direitos alheios”[3].
Por seu turno, o n.º 1, do artigo 26.º da Constituição da República Portuguesa – norma constitucional esta que integra a categoria dos direitos, liberdades e garantias, e está, por isso, directamente submetida ao regime reforçado de tutela previsto no citado art. 18.º – dispunha, e continua a dispor, que “[a] todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação”.
E a lei substantiva civil consagrava nos artigos 70.º e ss. os direitos de personalidade, com uma tutela geral bem expressa no n.º 1 do artigo 70.º.
Segundo Rabindranath Capelo de Sousa, numa perspectiva mais geral, os negócios jurídicos, enquanto emanação da autonomia de vontade privada, são expressão do direito personalístico à liberdade, mas têm sempre como parâmetros, quanto à sua celebração e conteúdo, “a dignidade da pessoa humana e os bens mais fundamentais da personalidade”. Concretamente as relações negociais duradouras, embora possam incorporar algumas limitações ao exercício dos direitos de personalidade, como por exemplo o dever de obediência do trabalhador relativamente à sua entidade patronal, “não apagam nem diminuem entre as respectivas partes a generalidade dos direitos de personalidade, enquanto fautores de relações jurídicas absolutas, válidas erga omnes, mesmo no circunstancialismo de dependência ou de interdependência em que as pessoas se colocam em determinados negócios jurídicos”[4].
Já reportando-se à eficácia directa dos direitos fundamentais no domínio laboral, referia José João Abrantes que “o carácter privado do contrato de trabalho não lhe retira a sujeição à ordem constitucional e, por isso, a lógica que lhe está subjacente e os poderes do empregador terão sempre por limites a dignidade humana e os direitos fundamentais” em que esta dignidade se traduz[5]. De acordo com este autor, a função social do Direito do Trabalho hodierno é mesmo, antes de mais, a de tutelar os direitos fundamentais da pessoa humana no âmbito da relação de trabalho e garantir a intangibilidade do seu conteúdo essencial, implicando que se coloque como “questão central deste ramo do direito a cidadania na empresa”[6].
Na palavra de Maria do Rosário Palma Ramalho, a particular tutela dos direitos fundamentais da pessoa humana no contrato de trabalho justifica-se pelo “envolvimento integral da personalidade do trabalhador no vínculo laboral” e pela “componente dominial do contrato de trabalho” (amplamente evidenciada nos poderes de direcção e de disciplina do empregador e na correspondente subordinação jurídica do trabalhador)[7].
Era assim reconhecido o respeito no âmbito da relação de trabalho dos direitos de personalidade – quer dos que têm projecção legal nos arts. 70.º e ss. do Código Civil referentes à tutela geral da personalidade, quer dos demais previstos no catálogo mais amplo de direitos, liberdades e garantias previsto na Constituição da República Portuguesa –, como direitos fundamentais inerentes à dignidade da pessoa humana e, também, que a compressão dos direitos de personalidade do trabalhador deve limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos do empregador, segundo critérios de proporcionalidade e adequação (artigos 18.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa e 335.º do Código Civil).
O Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, veio inovatoriamente contemplar de modo expresso os direitos de personalidade das partes no contrato de trabalho (subsecção II - da Secção II, do Capítulo I, do Título II, do Livro I - relativa aos “Direitos de Personalidade”, que engloba os arts. 14º a 21º).
E o mesmo sucedeu com o Código do Trabalho de 2009, actualmente em vigor, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro.
Segundo estabelece o artigo 16.º deste diploma:
“Direito de reserva da intimidade da vida privada
1 - O empregador e o trabalhador devem respeitar os direitos de personalidade da contraparte, cabendo-lhes, designadamente, guardar reserva quanto à intimidade da vida privada.
2 - O direito à reserva da intimidade da vida privada abrange quer o acesso, quer a divulgação de aspectos atinentes à esfera íntima e pessoal das partes, nomeadamente relacionados com a vida familiar, afectiva e sexual, com o estado de saúde e com as convicções políticas e religiosas.”
Este preceito concretiza alguns aspectos que integram a esfera privada das partes, mas não constitui um elenco exaustivo, pelo que o direito em causa poderá envolver outros aspectos merecedores de idêntico grau de tutela. Em todo o caso, e como salienta Guilherme Dray, a tutela conferida por este artigo “só parece justificar-se perante aspectos da vida privada que revistam particular significado ético”, sendo de excluir aspectos relacionados com a experiência profissional do trabalhador, as suas habilitações literárias ou mesmo o seu domicílio. Mas, mesmo nestas situações, “importa atender aos princípios gerais da proporcionalidade e adequação: a reserva da vida privada deve ser a regra e não a excepção e a sua limitação só se justifica quando interesses superiores o exijam e dentro dos limites decorrentes do artigo 335.º do Código Civil” [8].
Por seu turno o artigo 14.º do Código do Trabalho de 2009 dispõe o seguinte:
“Liberdade de expressão e de opinião
É reconhecida, no âmbito da empresa, a liberdade de expressão e de divulgação do pensamento e opinião, com respeito dos direitos de personalidade do trabalhador e do empregador, incluindo as pessoas singulares que o representam, e do normal funcionamento da empresa”.
Relativamente à liberdade de expressão reconhecida nesta norma (e também com assento no artigo 37.º da lei fundamental, no artigo 11.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, no artigo 19.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e no artigo 10.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem) pode a mesma ser manifestada a propósito de questões conexas com o trabalho, mas a segunda parte do preceito determina a existência de dois limites ao seu exercício: o respeito pelos direitos de personalidade da outra parte e pelo normal funcionamento da empresa[9].
No que diz respeito à “confidencialidade das mensagens e do acesso a informação”, o artigo 22.º do Código do Trabalho estabelece que:
“1 - O trabalhador goza do direito de reserva e confidencialidade relativamente ao conteúdo das mensagens de natureza pessoal e acesso a informação de carácter não profissional que envie, receba ou consulte, nomeadamente através do correio electrónico.
2 - O disposto no número anterior não prejudica o poder de o empregador estabelecer regras de utilização dos meios de comunicação na empresa, nomeadamente do correio electrónico.”
Este preceito não alude directamente à publicação de textos em redes sociais, mas parece abranger todo o tipo de mensagens de natureza pessoal (não profissional), seja qual for o meio como estas sejam transmitidas. Segundo Júlio Gomes, o direito de reserva e confidencialidade é garantido ao trabalhador relativamente ao conteúdo das mensagens de natureza pessoal que envie e receba, bem como relativamente a informação de carácter não profissional que envie, receba ou consulte (o que abrange a navegação na internet), pelo que o preceito “não dispensa a delicada distinção entre mensagens de natureza pessoal e profissional”[10].
5.1.2. A ilicitude da prova obtida com indevida intromissão na vida privada
Conforme estabelece artigo 32.º, n.º 8 da Constituição da República Portuguesa “[s]ão nulas todas as provas obtidas mediante ... abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações”.
Por seu turno o artigo 16.º, n.º 2, do Código do Trabalho explicita que o direito à reserva quanto à intimidade da vida privada abrange quer o “acesso”, quer a “divulgação” de aspectos atinentes à esfera íntima e pessoal das partes.
Em face da proibição constitucional da ingerência na reserva da vida privada (art. 26.º), perante a própria tutela que agora lhe é expressamente conferida pela lei laboral (especificamente os artigos 16.º e 22.º), e tendo ainda em consideração a similitude do procedimento disciplinar com o criminal, é de considerar que o assinalado artigo 32.º, n.º 8 da lei fundamental impede que no procedimento disciplinar instaurado com vista ao despedimento do trabalhador e, ulteriormente, na acção instaurada pelo trabalhador com vista à impugnação da regularidade e licitude de tal despedimento, se lance mão de provas obtidas mediante uma intromissão abusiva na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações.
5.1.3. A natureza dos posts publicados pelo recorrente no “grupo de trabalhadores da C...”
Aqui chegados, e tendo por horizonte a consagração constitucional e legal da tutela geral da personalidade (artigos 24.º e ss. da CRP, 70.º do Código Civil e 16.º, n.º 1, primeira parte do Código do Trabalho) e, em especial, da reserva quanto à intimidade da vida privada como bem autónomo (artigos 26.º, n.º 1 da CRP, 80.º do Código Civil e 16.º, n.º 1, segunda parte e 22.º do Código do Trabalho), com a consagração expressa de que este direito à reserva quanto à intimidade da vida privada abrange quer o acesso, quer a divulgação de aspectos atinentes à esfera íntima e pessoal das partes, torna-se claro que o problema essencial a enfrentar para responder à questão da licitude da prova consubstanciada nos posts documentados a fls. 64 a 70 e 79 a 88 do procedimento disciplinar apenso, consiste em saber se a publicação pelo recorrente destes posts no “grupo de trabalhadores da C…” constitui, ou não, um acto da esfera privada do trabalhador ou, para usar a palavra da lei (artigos 16.º, n.º 2 e 22.º, n.º 1 do Código do Trabalho), se os mesmos têm natureza “íntima”, “pessoal” ou “não profissional”.
O direito constitucional à reserva da vida privada e familiar analisa-se principalmente em dois direitos menores: o direito a impedir o acesso de estranhos a informações sobre a vida privada e familiar e o direito a que ninguém divulgue as informações que tenha sobre a vida privada e familiar de outrem. Mas, como dizem Gomes Canotilho e Vital Moreira, “[n]ão é fácil demarcar a linha divisória entre o campo da vida privada e familiar que goza de reserva de intimidade e o domínio mais ou menos aberto à publicidade”, avançando que o “critério constitucional deve talvez arrancar dos conceitos de «privacidade» (n.º 1, in fine) e «dignidade humana», de modo a definir-se um conceito de esfera privada de cada pessoa, culturalmente adequado à vida contemporânea”[11].
A extensão da reserva será, assim, variável em função de circunstâncias concretas que terão que ser analisadas casuisticamente.
Em tal tarefa de determinação, em cada caso concreto, do que deve entender-se que integra o conceito de vida privada a chamada, é útil lançar mão, como fez a sentença da 1.ª instância, da «teoria dos três graus ou das três esferas», de criação jurisprudencial alemã. Segundo essa construção, podem diferenciar-se: a esfera da vida íntima ou da intimidade, correspondente a um domínio inviolável e intangível da vida privada, subtraído ao conhecimento de outrem; a esfera da vida privada propriamente dita, que abrange factos que cada um partilha com um núcleo limitado de pessoas, e a esfera da vida pública ou da vida normal de relação, envolvendo factos susceptíveis de serem conhecidos por todos, que respeita à participação de cada um na vida da colectividade.
5.1.3.1. A rede social online é uma estrutura social composta por pessoas ou organizações, conectadas por um ou vários tipos de relações e que, em princípio, compartilham valores e objectivos comuns[12]. Uma das características fundamentais na definição das redes é a sua abertura e porosidade, possibilitando relacionamentos horizontais e sem compromissos entre os participantes. Por isso se diz que “Redes não são, portanto, apenas uma outra forma de estrutura, mas quase uma não estrutura, no sentido de que parte de sua força está na habilidade de se fazer e desfazer rapidamente”[13].
Apesar desta inconsistência estrutural, as redes sociais são dos mais crescentes meios de interacção e partilha online - entre as mais conhecidas encontram-se, por exemplo, o Facebook, o Hi5, o Twitter, o Orkut (com extinção anunciada para o final deste mês de Setembro de 2014), o Friendster, o Netlog, o Linkedin, o Maisde50, o Google+, o Skype, o MySpace ou o Instagram –, sendo cada vez maior o número de utilizadores que aí procuram e partilham informação[14] e nelas é permitida a edição e partilha de informação nos mais diversos formatos (texto, imagem, vídeo, aposição de links). Os seus formatos são diversificados consoante a sua natureza e o objectivo, mas todos têm em comum o facto de permitirem alguma forma de interacção entre os membros[15].
Como diz Maria Regina Redinha[16], “depois do adro da igreja, do café, da praça e do centro comercial, o ponto de encontro parece agora ser a rede social, que há muito deixou de ser apenas o prolongamento do recreio da escola, para ser um local de convívio, de trabalho, de comércio, de propaganda política e até de prática de actos ilícitos”. É contudo patente que estas redes não são iguais àqueles meios onde uma conversa casual entre duas ou três pessoas em princípio permaneceria entre as mesmas. Com as redes sociais on line não só se confia desde logo uma multiplicidade de informação a uma empresa comercial, que pode usar tal informação para estratégias comerciais que nos são absolutamente estranhas[17], como é possível transmitir conversas, comentários, fotografias e filmes para outros “à distância de um simples click”[18].
5.1.3.2. O centro das dificuldades que se perfilam em torno deste fenómeno é ocupado pelas questões relacionadas com o grau de reserva dos textos, fotos, vídeos, links e notas fornecidos pelo trabalhador enquanto utilizador da rede social.
5.1.3.2.1. Perante a previsão dos artigos 22.º e 16.º do Código do Trabalho, o empregador não pode aceder ao conteúdo de mensagens “de natureza pessoal” ou comunicações “de carácter não profissional” do trabalhador, transmitidas através de rede social que não inclua o empregador no círculo ou esfera de contactos daquele, bem como que não pode aceder e servir-se de aspectos relativos à vida privada do trabalhador, mesmo através de rede social de livre acesso. A ilicitude aqui está na ultrapassagem da fronteira que separa a esfera profissional (em que o empregador se pode mover) da esfera privada (em que não pode entrar). O conteúdo da comunicação dita nestes casos a sua natureza privada, sendo irrelevante o veículo desse conhecimento ou o facto de ser o trabalhador a fornecer a informação sobre a sua vida privada[19].
Situam-se evidentemente aquém desta fronteira todas as informações relativas p. ex. a gostos pessoais, vida familiar, opções políticas, etc.
5.1.3.2.2. Mas tratando-se de textos, fotografias ou outras formas de expressão desabonatórios ou mesmo difamatórios do empregador, colegas de trabalho e superiores hierárquicos que, a serem verbalizados em público ou escritos em meios de comunicação social, poderiam integrar a prática de infracções disciplinares por extravasarem a liberdade de expressão e violarem o direito ao crédito e ao bom nome do empregador, colegas de trabalho e superiores hierárquicos visados, bem como de deveres laborais previstos no artigo 128.º do Código do Trabalho, a tarefa de discernir se a publicação daqueles textos, fotografias ou outras formas de expressão numa rede social se processou num meio de comunicação que beneficia de privacidade, conferindo natureza pessoal à própria comunicação – e, por isso, reconduzível à previsão do artigo 22.º do Código do Trabalho, não podendo o empregador aceder-lhe – ou num meio a que o empregador pode aceder, não é isenta de dificuldades, necessitando de uma apreciação casuística.
Como nota Teresa Coelho Moreira, a internet originou que muitas fronteiras caíssem o que, directa ou indirectamente, provocou a queda de outra barreira: a que separa a vida profissional e a vida pública, por um lado, da vida privada, por outro. Especialmente “no mundo do trabalho, pode colocar-se o problema de blogs pessoais e de redes sociais onde os trabalhadores exprimem as suas opiniões ou, até, divulgam informações preciosas sobre a empresa, ou onde criticam posições desta, o que coloca problemas ao nível da conciliação entre os direitos à privacidade e liberdade de expressão e de opinião dos trabalhadores e os direitos do empregador”[20].
Havendo diversos tipos de redes sociais e sendo várias as possibilidades que oferecem e as características concretas de que cada uma se reveste, só casuisticamente é possível aferir se o comportamento do trabalhador prosseguido na rede online é passível de ser conhecido pelo empregador e censurado disciplinarmente ou, ao invés, deve qualificar-se como uma “mensagem de natureza pessoal” ou uma “informação de carácter não profissional” submetidas ao princípio da confidencialidade plasmado no artigo 22.º do Código do Trabalho. Deverá pois ser apreciado caso a caso, atendendo aos diversos factores em presença e às circunstâncias concretas da situação a analisar, se as publicações em rede social efectuadas pelo trabalhador se devem considerar situadas aquém, ou além, da fronteira que protege a reserva de confidencialidade.
Um primeiro factor a atender é o tipo de serviço da rede social utilizada. Particularmente ao nível do facebook, parece-nos essencial: a distinção entre “perfil pessoal”, “página” e “grupo”. O facebook possibilita às pessoas escolherem entre a criação de um perfil, uma página ou um grupo, havendo regras para cada um deles[21]. Em termos sintéticos:
● um perfil é criado para uma pessoa individual que nela vaza a parte da sua história (em textos ou imagens) que entende divulgar,
● uma página tem como objectivo promover uma determinada empresa, marca, negócio, empresa, etc, e
● um grupo representa um local de discussão acerca de um determinado assunto entre pessoas com interesses comuns.
Qualquer deles é, em princípio, de acesso livre, mas o seu titular pode definir parâmetros de “privacidade” diversos.
Um segundo factor a atender são os próprios membros de cada rede social – que podem ser verdadeiramente “amigos”, como se intitulam, mas que podem nem sequer se conhecer, apesar desse título eufemista – e as características de que se revestem. Também eles auxiliam na caracterização da própria rede e da natureza das publicações que nela são feitas, designadamente no caso dos “grupos” quando a pertença ao grupo depende de determinados requisitos[22].
O mesmo se diga quanto à matéria sobre que incidem as publicações. Cabe aqui lembrar que o direito à reserva sobre a intimidade da vida privada não tutela, em princípio, «a actividade profissional que, tendo relações estreitíssimas com a pessoa, constitui, simultaneamente, uma das mais importantes manifestações da sua actividade social e cívica»[23], embora se possa admitir haver comentários relativos à actividade profissional que possam ser manifestados no círculo mais íntimo da pessoa e sobre os quais se justifica tal tutela[24].
Igualmente é relevante a parametrização da conta: se o seu titular restringiu o acesso da mesma apenas aos denominados “amigos”, pode entender-se que existe um grau acrescido de privacidade e que os dados partilhados podem ser considerados como englobados no conceito de esfera privada, mas se o conteúdo é marcado como público e visível online para todos, não há expectativa de privacidade. Este factor deve contudo ser conjugado com o anterior. Se, em face das características dos “amigos”, estes podem ser pessoas mal conhecidas ou até desconhecidas do titular da conta, dificilmente se poderá afirmar a natureza pessoal dos posts publicados no grupo, mesmo que apenas tais “amigos” a ele possam aceder.
Igualmente é relevante para aferir da natureza da rede social o número de “amigos” ou membros do grupo. Se a mesma é muito grande, ou pode abranger pessoas desconhecidas do administrador (no presente ou no futuro, pois o que é publicado fica na rede), cremos que dificilmente se poderá dizer que as pessoas se sentem em círculos privados e fechados, em que sabem que o que publicam só é visto por destinatários relativamente aos quais existe um mínimo de confiança no relacionamento que se estabelece, e em que contam com a discrição dos seus interlocutores para a confidencialidade do que vêem, confiando estar num ambiente restrito e reservado e convictas de que mais ninguém tinha acesso e conhecimento, em tempo real ou diferido, do teor das mesmas.
A este propósito é importante ter presente, também, que cada membro do grupo deve saber que os demais “amigos” podem expor o que vem publicado no grupo, seja através das identificações, os chamados “tags”, seja através de publicações no mural ou até de partilha de fotos e vídeos, o que é particularmente expectável quando os laços entre os “amigos” não são suficientemente estreitos ou, mesmo, não existem efectivamente apesar do título que ostentam no mundo virtual. Como se refere na sentença da 1.ª instância, isto diminui consideravelmente o carácter privado do grupo. Segundo ali é dito, “é muito fácil um utilizador perder o controlo dos dados que coloca na sua página pessoal: assim que um dado fica online, muito dificilmente desaparecerá, mesmo se depois for apagado. Ou seja, um facto que, à partida, seria enquadrável na esfera privada ou na esfera íntima, a partir da esfera pública do indivíduo, devido à potencialidade que este conteúdo tem de ser partilhado. A rede social é uma plataforma aberta, logo, por ser de acesso generalizado, isto significa que são factos suscetíveis de serem conhecidos por todos. Tudo o que for colocado na Internet deixa de ser privado e as redes sociais não serão exceção. Mesmo que o perfil esteja definido como privado, nada impede a quem tenha acesso autorizado ao mesmo de copiar os conteúdos e enviá-los a terceiros” e, acrescentamos nós, colocá-los em local de acesso generalizado.
O conceito novo e difuso de “amigos” com que se opera nas redes sociais online implica que o auxílio que possa ir buscar-se à teoria tradicional das três esferas (que deverá sempre conjugar-se com a análise dos factores supra-enunciados) se depare com acrescidas dificuldades.
Com efeito, e como se refere num estudo de Joana Veríssimo, Maria Macias e Sofia Rodrigues[27], também citado pelo tribunal a quo:
«Ao abrir-se uma conta numa rede social aceita-se “a priori” que parte da vida privada vai ser exposta, pelo menos aos nossos supostos “amigos”. No entanto, por mais íntimos que alguns desses “amigos” sejam, há sempre alguns que nunca o serão verdadeiramente.
Na concepção clássica da teoria das três esferas, a esfera privada cinge-se às informações que o indivíduo partilha com a sua família e amigos mais próximos; já a esfera pública é definida como sendo os factos susceptíveis de serem conhecidos por todos. Consequentemente, um perfil privado de uma rede social, não se enquadra nem totalmente na esfera da vida privada, nem na esfera pública.
(…)
O que nos pode levar a adoptar uma nova esfera: uma esfera que se situa entre a esfera privada e a esfera pública, uma esfera semi-pública (…). Esta nova concepção seria necessária pela falta de resposta dada nas concepções clássicas. Esta insuficiência compreende-se porque, embora sempre tivessem existido redes sociais, estas nunca foram pensadas num âmbito de uma plataforma como a internet. A questão fulcral neste tipo de concepção será de saber que tipo de protecção merece esta esfera. A regulação das redes sociais, pode passar por definir se existe ou não privacidade, ou seja, que tipo de protecção tem esta esfera semi-pública.»
Na análise a efectuar, não pode também perder-se de vista que o conteúdo dos posts publicados nas redes sociais, além de poder ser copiado para papel e exportado para outros sítios na internet ou para correios electrónicos privados, se mantém online por um período indeterminado de tempo[28].
Tendo presente esta realidade e a consciência de que as redes sociais fizeram surgir novos espaços que não se reconduzem facilmente às tradicionais esferas que se alargam progressivamente à volta do irredutível núcleo íntimo de privacidade do indivíduo – o que adensa as dificuldades em traçar os contornos da privacidade que merece a tutela da confidencialidade –, torna-se necessária, para a caracterização de cada situação, uma cuidada apreciação casuística.
Em tal apreciação, cremos ser de fundamental relevância a ponderação dos factores enunciados – e de outros que se perfilem como pertinentes em cada caso a analisar –, de molde a poder concluir-se se na situação em causa havia uma legítima expectativa de que o círculo estabelecido era privado e fechado, ou, por outras palavras, se havia um laço estreito entre os membros do grupo que não era expectável que fosse quebrado, contando aqueles membros com a discrição dos seus interlocutores para a confidencialidade dos posts publicados e estando convictos de que mais ninguém teria acesso e conhecimento, em tempo real ou diferido, ao seu teor.
Não havendo essa expectativa de privacidade, e estando o trabalhador ciente de que publicações com eventuais implicações de natureza profissional, designadamente porque difamatórias para o empregador, colegas de trabalho ou superiores hierárquicos, chegariam ao universo de pessoas que constituem o grupo e poderiam extravasar as suas fronteiras, cremos que não lhe assiste o direito de invocar o carácter privado do grupo e a natureza “pessoal” das publicações, não beneficiando da tutela da confidencialidade prevista no artigo 22.º do Código do Trabalho.
5.1.3.3. Antes de prosseguir, cabe salientar que, ao invés do que sucede na jurisprudência estrangeira que, apesar de escassa, se vai formando[29], a jurisprudência nacional ainda se não pronunciou sobre a publicação pelo trabalhador em redes sociais online de textos ou outro tipo de comunicações e sobre a possibilidade de o empregador aos mesmos aceder e, eventualmente, fundar no comportamento neles plasmado a justa causa de despedimento do trabalhador.
Apenas se pronunciou:
- sobre a inadmissibilidade do acesso do empregador ao conteúdo de mensagens do correio electrónico do trabalhador e do seu uso para fins disciplinares, qualificando-as como mensagens de natureza pessoal, especialmente se aquele não regulou a utilização do correio electrónico para fins pessoais [entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2007.07.05 (processo n.º 07S043) e o Acórdão da Relação do Porto de 2010.02.08 (processo n.º 452/08.0TTVFR.P1)];
- sobre as mensagens enviadas por telemóvel e acesso a dados de tráfego do telemóvel fornecido pela empresa [o Acórdão da Relação do Porto, de 2011.12.20 (processo n.º 520/08.9TTMTS.P2)] e
- sobre as mensagens instantâneas pessoais enviadas através do serviço de messenger no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa 2012.03.07 [(processo n.º 24163/09.0T2SNT.L1-4)[30]].
Ora, se relativamente às mensagens escritas enviadas através de e-mails, de telemóvel ou do serviço messenger sobre que se debruçou a nossa jurisprudência, não nos oferece dúvida de que se trata de “mensagens de natureza pessoal” submetidas à tutela do artigo 22.º, n.º 1 do Código do Trabalho, que estabelece o princípio da confidencialidade das mensagens e do acesso a informação – pelo que se mostra vedado ao empregador o acesso a estas comunicações privadas e é nula a prova obtida por via desse acesso, nos termos do artigo 32.º, n.º 8 da Constituição da República Portuguesa[31] –, quando se trata de publicações em redes sociais, haverá que avaliar em concreto se as mesmas se devem considerar revestidas de carácter público ou privado, tendo em consideração os diversos factores em presença e a expectativa de privacidade que estes inculcam relativamente ao meio em que foram vazados os textos, comentários, imagens e filmes em causa.
5.1.3.4. Expostas estas considerações retornemos ao caso sub judice.
Ficou provado nestes autos que:
7. O Autor publicou diversos posts no “Grupo Trabalhadores na C…” da rede social Facebook. - al. E) dos factos admitidos por acordo;
8. Nesses posts, o Autor pronunciou-se sobre diversos temas relativos à organização e vida interna da C…. - al. F) dos factos admitidos por acordo;
28. A página do “Grupo de Trabalhadores da C…” no Facebook, de que o autor é administrador, é composta por, pelo menos, 140 membros, com o denominador comum o facto de serem ou terem sido trabalhadores da C…. - al. KKK) dos factos admitidos por acordo;
29. Sendo que o acesso à mesma só era possível mediante pedido dirigido aos seus administradores. - al. LLL) dos factos admitidos por acordo;
30. A referida página não se encontrava acessível ao público, não podendo aceder a ela quem quisesse. - al. MMM) dos factos admitidos por acordo;
Em face destes factos, a primeira constatação é a de que a rede social em causa nestes autos constitui um “grupo”. Ora, se relativamente ao “perfil pessoal” do trabalhador em redes sociais, a Deliberação da Comissão Nacional de Protecção de Dados n.º 1638/2013, de 16 Julho 2013 (que reviu a Deliberação de 29 de Out. 2002) indica ser proibido “o acesso ao perfil pessoal do trabalhador em redes sociais”, justamente porque “nas redes sociais o perfis pessoais são espaços utilizados para expressar a individualidade de cada um, caindo no círculo restrito da reserva de intimidade da vida privada, contendo, por regra, informações de carácter pessoalíssimo e mesmo íntimo”, pelo que o acesso a tal informação está manifestamente fora do espectro da norma ínsita no artigo 22.º, n.º 2 do Código do Trabalho, já relativamente aos “grupos” – que representam um local de discussão acerca de um determinado assunto entre pessoas com interesses comuns –, esta deliberação não estabelece quaisquer condições a eles especificamente dirigidas.
Em segundo lugar, tendo em consideração o teor concreto dos posts publicados e referenciados nos pontos 9. a 27. da matéria de facto provada e as características das pessoas que compõem o “grupo”, é legítimo concluir, como a 1.ª instância, que o “grupo de trabalhadores na C…” é de cariz profissional. Não só os temas sobre que versam os posts publicados no “grupo” se reportam à organização e vida interna da empresa e se relacionam com os interesses profissionais dos respectivos trabalhadores, como o denominador comum dos seus membros (que são, simultaneamente, o público alvo do que ali é publicado) é o de serem, ou terem sido, trabalhadores da C…. Aliás, o recorrente admitiu, por acordo com a recorrida, que nos posts publicados no “grupo” se pronunciou “sobre diversos temas relativos à organização e vida interna da C…” – facto 8. que corresponde à alínea F) dos factos admitidos por acordo.
No que concerne à parametrização da conta, a circunstância de o acesso à mesma só ser possível mediante pedido dirigido aos seus administradores e de não se encontrar acessível ao público em geral, não podendo aceder a ela quem quisesse (factos 29. e 30.) indiciaria, à partida, o seu carácter restrito.
Simplesmente, este factor não pode deixar de ser concatenado com os demais que se perfilam no caso, designadamente no que se reporta ao número (efectivo e potencial) de pessoas que acedem ou podem aceder aos posts publicados no “grupo” e às características dos mesmos.
Como bem pondera a sentença da 1.ª instância, a resposta não é tão linear como a primeira vista parece apontar a indicada parametrização.
Recordemos o que ali foi dito a este propósito:
«[…] estando em causa uma página online de cariz profissional, cujos membros têm como denominador comum o de serem ou terem sido trabalhadores da C…, é de presumir que os conteúdos ali partilhados – pelo menos alguns deles, para não dizermos a sua maioria – estejam indissocialvelmente conexos com a atividade da empresa, com interesses profissionais comuns aos trabalhadores e, provavelmente, com as condições da prestação de trabalho asseguradas pela empresa aos seus colaboradores.
(…)
No mundo da internet, em que as redes sociais e os blogs permitem a qualquer autor colocar as informações e fazer as afirmações que pretende, é inaceitável que a liberdade de expressão e de comunicação não tenham qualquer tipo de limites externos.
De outro modo, aquela página do facebook equivaleria a uma coutada ou um feudo, na qual todos os comentários proferidos, por mais graves e torpes que pudessem ser, estariam subtraídos e imunes ao poder disciplinar do empregador, o que poderia colocar em causa o normal funcionamento da empresa (nomeadamente ao nível do relacionamento dos colaboradores entre si, que se pretende cordato, respeitador e caraterizado pela sua urbanidade), bem como a sua reputação e o bom nome.
E, no caso presente, essa incongruência seria mais acentuada porquanto estamos a falar de uma página de cariz estritamente profissional – ainda que não criada pela empresa -, pelo que escusado será dizer que os comentários e opiniões ali proferidos têm aptidão a ter reflexos (positivos nuns casos, desvantajosos noutros) na prestação de trabalho pelos colaboradores da empresa.
Ademais, possuindo a empresa, a nível nacional, cerca de 2.200 trabalhadores e sendo a página do “Grupo de Trabalhadores na C…” no Facebook composta por, pelo menos, 140 membros, com o denominador comum o facto de serem ou terem sido trabalhadores da C…, é de rejeitar que o A. tivesse a expectativa que os posts ali publicados não extravasariam o círculo dos membros que dela fazem parte. Aliás, o elevado número de membros da referida página – 140, como se disse -, todos eles trabalhadores ou ex-trabalhadores da C…, retira-lhe o cariz estritamente privado do referido perfil do facebook. Diverso seria se estivéssemos perante uma página de perfil eminentemente pessoal, cujo elo de ligação não se confundisse com a ligação profissional dos seus membros e se caracterizasse por colocar ênfase nas relações sociais/pessoais (envolvendo a troca e partilha de informação e de dados pessoais como o sexo, o género a idade, o estado civil, os hobbies, assim como ficheiros, música, vídeos e fotografias), sendo aí, sim, expectável que os conteúdos partilhados se confinassem à esfera privada.
[…]»
Com efeito, apesar de considerarmos possível em tese a existência de um “grupo” definido de trabalhadores de uma empresa, em número que se contenha em limites razoáveis, com laços de confiança estreitos e onde sejam veiculadas comunicações relativamente às quais os seus membros têm uma legítima expectativa de privacidade, e que pode, por isso, beneficiar da tutela conferida pelo artigo 22.º do Código do Trabalho, cremos que o caso sub judice não se reconduz a uma realidade com tais contornos.
O “grupo” em causa na presente acção tem pelo menos 140 pessoas e é susceptível de abranger o universo alargado dos trabalhadores de uma empresa (que sabemos orçar em cerca de 2.200 trabalhadores) e dos seus ex-trabalhadores, em número que se ignora – factos 2. e 28..
Trata-se pois de um universo com elevado número de pessoas conhecido e com uma extensão potencial que ultrapassa os dois milhares de pessoas (cuja dimensão efectiva se desconhece), o que impede a afirmação de que existe um laço de confiança estreito entre os membros do grupo e uma expectativa de privacidade dos seus membros relativamente ao que ali publicam.
Tendo em consideração que o conteúdo dos posts se mantém online por um período indeterminado de tempo, podemos conjecturar um pavilhão com capacidade para tal estimado número de pessoas, em que permanentemente são ditos os comentários e exibidos os vídeos e fotos postados, cuja porta se encontra fechada, mas pode ser aberta a novos membros que sejam ou tenham sido trabalhadores da empresa e que ascendem a número superior a dois milhares. Poderá dizer-se que as condutas eventualmente difamatórias do empregador e de colegas de trabalho prosseguidas em tal contexto são privadas, que não têm reflexos na empresa e o empregador não pode ter às mesmas acesso, ainda que cheguem ao seu conhecimento por intermédio de pessoas que a elas acederam por lhes ter sido franqueada a porta?
Como o Mmo. Juiz a quo, entendemos não ser aceitável que o empregador fique impedido de tomar em consideração os posts publicados num grupo com estas características que cheguem ao seu conhecimento e que revistam – ou possam traduzir – a violação de deveres laborais por parte dos utilizadores relativamente a questões conexas com a prestação de trabalho, sob pena de poder ficar gravemente comprometido o normal funcionamento da empresa, bem como a sua reputação ou a de colaboradores seus.
De modo algum se podem assemelhar os posts publicados numa rede social com as características que se apuraram nestes autos aos instrumentos de comunicação privada online, como ocorre com o messenger, os chats privados ou o correio electrónico, não sendo lícito ao recorrente invocar em abono da sua tese os arestos dos tribunais superiores nacionais que versaram sobre mensagens privadas veiculadas por e-mail ou através de Messenger, por se reportarem a distinta realidade. Se para tais meios de comunicação é defensável a tutela da privacidade e confidencialidade prevista no artigo 22.º do Código do Trabalho e a tutela do direito constitucional da liberdade de expressão e opinião com o âmbito alargado que lhe é reconhecido quando se expressa numa conversa privada entre familiares e/ou amigos – num ambiente restrito e reservado, em que se conta com a discrição dos interlocutores para a confidencialidade de algumas das coisas referidas e a compreensão e o inevitável “desconto” para as demais e há a legítima convicção de que mais ninguém terá acesso e conhecimento, em tempo real ou diferido, do teor das mesmas –, o mesmo não pode afirmar-se para os posts publicados na rede social em causa nos presentes autos.
Como se diz na sentença da 1.ª instância, “[p]ublicar posts para um potencial universo de 140 membros numa página do facebook, com os inerentes riscos dessas publicações poderem vir a ser partilhadas ou republicadas na rede social pelos supostos “amigos” [para além da partilha virtual, veja-se também, por exemplo, no caso de impressão do referido post e posterior divulgação ou afixação física num local de trabalho, de cujo teor os demais colaboradores (ainda que não membros da página) vêm a tomar conhecimento], não é confundível com aquelas comunicações de natureza pessoal, que têm como destinatários um número reduzido de pessoas, estando o conteúdo de tais mensagens protegido pelo direito ao sigilo das comunicações nos termos do art. 32º, n.º 8 da CRP e, também, do art. 22º do CT, sendo, assim, invioláveis”.
Em suma, no caso sub judice, avaliando os factores que emergem da factualidade apurada e que se perfilam como relevantes no caso concreto, entendemos que não havia qualquer expectativa de que o círculo estabelecido no “grupo de trabalhadores da C…” fosse privado e fechado, nada indiciando que no relacionamento estabelecido entre os seus membros houvesse um lastro mínimo de confiança que não era expectável que fosse quebrado com a divulgação do que nele era publicado. Aliás, dos próprios posts publicados pelo recorrente se retira que o mesmo não confiava em todas as pessoas do “grupo”, que havia “notícias” dele levadas por quem ao mesmo acedia (vide os factos 13. e 14.) e que o empregador tomava conhecimento do que ali se verificava, tanto que num dos posts se lhe dirigiu (facto 10.), o que vem reforçar a ideia de que não havia efectivamente uma expectativa de que os posts não extravasariam os limites, já de si substancialmente largos, do grupo, ou seja, vem reforçar a ideia de que não havia uma expectativa de privacidade.
Apesar de ser o A. um dos administradores do “grupo” e de o empregador não ter acesso directo ao que no mesmo se passava segundo a parametrização efectuada, o carácter privado e não profissional do “grupo” é infirmado:
● pelas características exigidas aos membros para a ele aceder (relacionadas com a sua qualidade de trabalhadores ou ex-trabalhadores da empresa),
● pelo temas de natureza profissional nele versados e
● pelo elevado número de membros efectivo (pelo menos 140 pessoas) e potencial (o universo dos trabalhadores e ex-trabalhadores) envolvidos no “grupo”,
não se vislumbrando justificação para haver uma expectativa de privacidade a tutelar, pelo que não estavam os posts ali publicados submetidos ao regime de confidencialidade expresso no artigo 22.º do Código do Trabalho.
Assim, desde que as condutas prosseguidas com as publicações efectuadas naquela rede social sejam violadoras de deveres laborais e susceptíveis de se reflectir na relação de trabalho, integrando infracção disciplinar, não pode considerar-se abusivo o conhecimento que delas tomou o empregador[32] nem nulas as provas obtidas com base em tal conhecimento como prescreve o artigo 32.º, n.º 8 da Constituição da República Portuguesa.
Pelo que não merece censura a decisão do tribunal a quo que julgou inexistir qualquer obstáculo de índole formal à apreciação e valoração dos posts publicados pelo recorrente no mencionado “grupo dos trabalhadores da C…” da rede social facebook e julgou válido aquele meio de prova.
Improcede, nesta parte, o recurso.
*
5.2. Da justa causa para o despedimento do autor
5.2.1. A questão de aferir se o despedimento do recorrente se fundou em justa causa, deverá sê-lo à luz do regime jurídico constante do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que procedeu à revisão do Código do Trabalho, revogando a Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto [cfr. os artigos 12º, nº 1, a) e 7.º, n.º 1 daquela Lei], pois que os factos em causa ocorreram já na vigência do mesmo.
*
5.2.2. O artigo 351.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2009 define o conceito de justa causa de despedimento como “o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho”, estabelecendo-se depois um quadro exemplificativo de comportamentos justificativos desse despedimento.
A metodologia utilizada pelo legislador da LCCT (Regime Jurídico da Cessação do Contrato Individual de Trabalho e da Celebração e Caducidade do Contrato de Trabalho a Termo aprovado pelo DL n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro) para regular o despedimento por motivo imputável ao trabalhador foi retomada nos Códigos do Trabalho de 2003 e de 2009. Com referência este último, a lei começa por apresentar uma cláusula geral de justa causa que integra com recurso a diversos critérios (art. 351.º, n.º 1); depois enumera um conjunto de situações típicas de justa causa para despedimento (art. 351.º, n.º 2); e por fim apresenta alguns critérios de apreciação das situações de justa causa no quadro da empresa (art. 351.º, n.º 3)[33]
A noção de justa causa decompõe-se em dois elementos: a) um comportamento culposo do trabalhador - violador de deveres de conduta ou de valores inerentes à disciplina laboral - grave em si mesmo e nas suas consequências; b) que torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.
Tem a jurisprudência considerado, a propósito destes elementos da justa causa:
– que a ilicitude consiste na violação dos deveres a que o trabalhador está contratualmente vinculado, seja por acção, seja por omissão, relativamente a deveres contratuais principais ou secundários, ou ainda a deveres acessórios de conduta, derivados da boa fé no cumprimento do contrato, o que afasta os factos sobre os quais não se pode fazer juízo de censura e aqueles que não constituam violação de deveres do trabalhador enquanto tal;
– que na apreciação da gravidade da culpa e das suas consequências deve recorrer-se ao entendimento de um "bonus pater familias", de um "empregador razoável", segundo critérios de objectividade e razoabilidade (artigo 487.º n.º 2 do Código Civil) em face do condicionalismo de cada caso concreto; e
– que a impossibilidade prática e imediata da relação de trabalho é o elemento que constitui o critério básico de "justa causa", sendo necessário um prognóstico sobre a viabilidade das relações contratuais para se concluir pela idoneidade ou inidoneidade da relação para prosseguir a sua função típica (vide, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2007.04.18, Processo n.º 2842/06 e de 2006.03.08, Processo n.º 3222/05, ambos da 4.ª Secção e sumariados em www.stj.pt).
Na efectivação destes juízos, deve o tribunal atender às circunstâncias enunciadas no n.º 3 do art. 351.º do Código do Trabalho, ou seja, ao “quadro da gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses da entidade empregadora, ao carácter das relações entre as partes ou entre os trabalhadores e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes”.
Há-de, outrossim, ter-se presente que o despedimento se apresenta, nos termos do artigo 328.º, n.º 1, alínea f), do Código do Trabalho, como a sanção disciplinar mais grave, que só deve ser aplicada quando outras medidas ou sanções de menor gravidade forem de todo inadequadas para a punição, para a prevenção das situações similares e para os interesses fundamentais da empresa, pois que, tendo a relação de trabalho vocação de perenidade, apenas se justificará, no respeito pelo principio da proporcionalidade (artigo 330.º, n.º 1), o recurso à sanção expulsiva ou rescisória do contrato de trabalho, que o despedimento representa, quando se revelarem inadequadas para o caso medidas conservatórias ou correctivas.
*
5.2.3. Na decisão proferida no processo disciplinar instaurado pela R., esta fez assentar o despedimento do A. nos comportamentos ali relatados que se subdividem, essencialmente, em três fundamentos:
1. na natureza falsa, injuriosa e lesiva do bom nome e imagem da recorrida através dos posts publicados pelo A. no “Grupo Trabalhadores da C…” na rede social facebook:
2. na desobediência reiterada aos superiores hierárquicos;
3. na falta que considerou injustificada dada pelo A. no dia 08 de Novembro de 2012.
Concluiu a R. ora recorrida que tais comportamentos constituem justa causa de despedimento nos termos do artigo 351.º, n.º 1 do Código do Trabalho e das alíneas a), d), e) e i), do n.º 2 do mesmo preceito.
5.2.3.1. Quanto ao primeiro fundamento
Na sentença recorrida, o Mmo. Juiz a quo, depois tecer doutas considerações sobre a liberdade de expressão e sobre os deveres laborais de respeito e urbanidade, contextualizou a actividade de serviços de segurança desenvolvida pela empresa, as funções de vigilante do trabalhador desde 2002 e a sua qualidade de delegado sindical, analisou os posts publicados pelo recorrente e concluiu pela sua natureza ofensiva e, nalguns casos injuriosa, com base nas seguintes considerações:
«[…]
Destacamos, a esse respeito, o post publicado no Facebook no dia 05.09.2012, no qual o Autor acusa a empresa de ter adotado comportamentos indevidos em relação à sua pessoa, ao mencionar que, de forma empenhada, o atacou, prejudicou e tentou “humilhar e calar”.
Por sua vez, no post publicado no Facebook no dia 24.09.2012, após fazer um legítimo apelo à adesão à greve, o A. parte para o insulto relativamente aos colegas de trabalho que não pretendam aderir a essa greve, catalogando-os como “oportunistas (vulgo parasitas) que obtêm benefícios pelo trabalho e luta dos outros, e desses já ninguém espera nada, continuarão unicamente limitados à sua insignificante existência”, por contraposição aos que aderirem à greve, estes, sim, apodados como «colegas trabalhadores, zelosos, profissionais, empenhados em dignificar a nossa profissão, e exigindo o respeito enquanto humanos».
Este tipo de afirmações é apto a criar clivagens no (amplo) universo dos trabalhadores, com reflexos negativos no ambiente laboral da empresa, já que o Autor não se coíbe de criticar, em termos inapropriados e acintosos, os colegas de trabalho que não pretendam aderir à greve.
Sendo inquestionável o legítimo exercício do direito de greve, constitucionalmente reconhecido (art. 57.º da Constituição da República Portuguesa), a verdade é que os trabalhadores devem ser livres na opção do exercício desse direito, pelo que os que decidirem a ela não aderir não deixam de ser menos dignos dos que a ela aderirem.
Saliente-se, igualmente, o post publicado no Facebook no dia 27.09.2012, no qual o Autor classifica os colegas delatores – membros da página do “Grupo de Trabalhadores da C…” - como “imbecis” e os superiores hierárquicos como “padrinhos”, conotação esta comummente associada aos que chefiam ou lideram associações de cariz mafiosas. Ainda nesse post, o A. retrata os superiores hierárquicos (sob a veste de “padrinhos”) como manipuladores, que exercem censura e que, diariamente, não se importam de, com os seus actos, “humilhar, ofender, espezinhar, maltratar, despedir”.
Para além disso, o Autor, ao abrigo do exercício da liberdade de opinião e de expressão, proferiu uma expressão descortês, qual seja, “Hipocrisias, E HIPÓCRITAS para o carago com eles”.
Relativamente ao post publicado no dia 07.10.2012, a propósito do anúncio do julgamento na ação intentada pelo colega K…, o qual impugnou o seu despedimento, o Autor insinua que a ré (através dos testemunhos por si a produzir) profere “mentiras”, incitando inclusivamente os membros daquela página online a comparecerem em julgamento para indagarem das “mentiras” proferidas pela empregadora.
Quanto ao post publicado no dia 17.10.2012, a propósito duma visita de um “auto-intitulado” vigilante chefe a um posto que no dia 5 de Outubro teve adesão à greve de 100%, o A. acusa a Ré de, com aquelas visitas, ter reatado as perseguições, pondo a hipótese das participações de ocorrências serem pagas à comissão ou de serem encomendadas pela ré com vista a intimidar os colaboradores.
Acresce que o Autor reporta-se a elementos da C… como «“estes “engravatados” nem sabem ler sequer», assim como «neste sector com a “gente” que por cá existe… é o que se vê… vale o que vale… para mim vale(m) pouco». Nestes comentários o Autor retrata a empregadora como uma entidade que persegue os seus trabalhadores, intimidando-os.
Além disso, a propósito da sua discordância quanto à obrigatoriedade da aposição da assinatura no impresso referente à comunicação de ausência no dia de greve, por não poder «constar registo no processo individual do trabalhador se aderiu» ou não à greve, retrata genericamente alguns dos colaboradores da C…, nomeadamente os que efetuam visitas aos postos, como analfabetos, que nem sabem ler.
Quanto ao post publicado no dia 2 de Novembro de 2012, o Autor refere que a C… se serviu de “habilidades” e de “atos discriminatórios” como forma de impedir a adesão à greve.
No que diz respeito ao post publicado no dia 21 de Novembro de 2012, no qual apôs o comentário “o dia de ontem foi assinalado” e colocou uma imagem de três palhaços, querendo com essa imagem retratar os seus superiores como palhaços, o Autor agiu com intuito ofensivo e injurioso, o que consubstancia uma violação muito grave dos deveres de respeito, urbanidade e lealdade que sobre ele impendiam.
E, como defende a ré, ao publicar no Facebook a fotografia alusiva aos seus superiores hierárquicos como sendo palhaços, «o Autor incitou a prestação de comentários igualmente graves, caluniosos e desrespeitosos por parte de outros colaboradores da C…».
Por último, quanto ao post publicado no dia 23 de novembro de 2012, no qual o Autor se referiu ao exercício de funções dos rondistas da C… através do seguinte comentário “17 dias, 16 “visitas”… He, he, he…”, acompanhado com um vídeo da personagem de animação Speedy Gonzalez, o Autor, pela referência ao elevado número de visitas realizadas e ao recurso à personagem de animação - que é um rato pequeno e muito veloz - voltou a referir-se aos mesmos de forma irónica e jocosa.
Ora, os comentários utilizados, e acima transcritos, são ofensivos da imagem, dignidade e bom nome da Ré, enquanto instituição, bem como das pessoas à frente dos seus destinos.
Além disso, alguns dos enunciados comentários são igualmente ofensivos da consideração e do respeito devido a outros colaboradores da empresa (seja por legitimamente se recusarem a aderir à greve, seja por realizarem funções de rondistas no âmbito de atribuições cometidas pela empresa, seja por exercerem funções de chefia), o que é suscetível de causar uma perturbação no ambiente laboral da C….
Acresce que o Autor proferiu tais comentários na página do “Grupo de Trabalhadores da C…” no Facebook, de que é administrador, a qual é composta por, pelo menos, 140 membros, com o denominador comum o facto de serem ou terem sido trabalhadores da C….
Não questionando o direito à liberdade de expressão do trabalhador e o direito à crítica relativamente à gestão da empresa e até de emitir juízos baseados em interpretações subjetivas dos factos, a verdade é que o trabalhador não pode olvidar que o seu direito à crítica não é ilimitado, devendo conter-se dentro dos limites do razoável com vista à defesa das suas convicções ou à denúncia de situações, procedimentos ou práticas que reporte como ilícitos ou irregulares.
Sucede que, proferindo tais afirmações ou comentários numa rede social que tem a virtualidade de servir como um instrumento expedito para divulgar as suas opiniões junto não só dos restantes colaboradores membros daquela página, mas também dos demais trabalhadores que dela não sejam membros, à distância de um simples click, o trabalhador terá de colocar um cuidado redobrado no teor das afirmações publicadas – melhor dizendo terá de atuar com ponderação e bom senso -, mercê do impacto ou repercussão que as mesmas podem ter no normal funcionamento da empresa.
Na verdade, o teor de tais posts é suscetível de ofender o bom nome e a imagem da C…, assim como o bom nome de outros colaboradores da empresa, além de contribuir para prejudicar a relação laboral mantida entre a C… e os restantes colaboradores.
Parafraseando o Ac. do STJ de 14-07-2010, dir-se-á que o Autor extravasou aquilo que se pode admitir como reação a situações que lhe pareceram injustas ou ilícitas, não se limitando a exercer o seu direito à contestação, consagrado no art. 45.º, n.º 2, da Constituição nem o direito de crítica, previsto no art. 37.º. «O trabalhador tem direito a reclamar da sua situação laboral, bem como a promover, junto da entidade patronal, a correcção de ilegalidades e/ou a denunciá-las às autoridades competentes.
Mas, para isso, importa que não adopte comportamentos também eles ilegítimos e desadequados».
Devido ao carácter grave e desnecessário dos comentários utilizadas nos posts, é de considerar ilidida a presunção de inexistência de culpa de que beneficia o Autor, em virtude da sua qualidade de delegado sindical.
Conclui-se, portanto, que o trabalhador praticou, com culpa, infração disciplinar por violação do dever de urbanidade, probidade e respeito.
[…]».
Nas conclusões do recurso (e igualmente no corpo das alegações), o A. nada diz susceptível de infirmar este juízo substancial sobre os posts que publicou, nem refutou a apreciação crítica que agora se reproduziu, limitando-se a dizer que os mesmos estão englobados na sua esfera privada por ser restrito o acesso à página e por esta não ser de cariz estritamente profissional, concluindo que a sentença recorrida não poderia ter aceite a valoração dos posts publicados pelo A. no facebook e, em consequência, aferir da licitude do seu despedimento com base no conteúdo dos mesmos (conclusões 2.ª a 15.ª).
Destas considerações que emite sobre a nulidade dos meios de prova retira que terá de improceder o despedimento com justa causa com base na natureza falsa, imprecisa e lesiva do bom nome e imagem da C… quanto aos posts publicados pelo A. no “Grupo de Trabalhadores na C…” (conclusão 16.ª) e que, ao assim não decidir, a sentença recorrida violou o disposto nos artigos 26º e no nº 8 do artº 32º, ambos da CRP, e no artigo 429º, nº 3 do C.T. (conclusão 17.ª), não dizendo uma palavra para infirmar as considerações tecidas na sentença quanto ao carácter ofensivo e difamatório dos posts e ao seu relevo disciplinar no âmbito do contrato de trabalho que executava ao serviço da R..
Ou seja, fundou a sua discordância quanto a este fundamento do despedimento em razões de forma – a nulidade da prova obtida – e não em razões substanciais de avaliação do carácter ofensivo dos posts publicados e da natureza infraccional da conduta retratada naqueles meios de prova que reputou de ilícita.
Nos termos do preceituado no artigo 635.º, n.º 5 do Código de Processo Civil “[o]s efeitos do julgado na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo.”
Assim, tendo em consideração que o apelante não se insurge contra este fundamento da decisão e que o decidido com o fundamento não impugnado não pode ver os respectivos efeitos modificados, é de considerar que se formou caso julgado sobre a questão do carácter ofensivo e difamatório dos posts publicados pelo recorrente e sobre a sua qualificação como infracção disciplinar no contexto do contrato de trabalho em vigor entre as partes[34].
5.2.3.2. Quanto ao segundo fundamento
No que diz respeito ao segundo fundamento invocado na decisão de despedimento – a desobediência reiterada do A. aos seus superiores hierárquicos – a sentença da 1.ª instância veio a concluir que as atitudes do Autor, exceptuando a recusa em assinar o documento de comunicação de ausência, foram culposas, violam os deveres previstos no artigo 128.º, n.º 1, a), c), e) e h) do Código do Trabalho e são objectivamente graves por claramente desrespeitadoras da entidade patronal, inviabilizando a relação de trabalho, por porem claramente em causa a autoridade da entidade patronal sobre o A., bem como a execução dos procedimentos vigentes na empresa que se recusou a cumprir, não obstante deles ter conhecimento.
Afirmou também a sentença que a actuação do A. foi levada a cabo com dolo directo (intenção de desobedecer e não respeitar a entidade patronal) e o A. persistiu numa atitude de afronta, mesmo depois de conhecer os motivos da ordem, tendo sido desrespeitoso ao insistir na sua recusa, pondo em causa a normal realização do trabalho, e considerou que, depois da ocorrência destes factos, dificilmente haveria diálogo profícuo entre o A. e a R., ficando a autoridade desta claramente afectada, quer face ao A., quer face a qualquer outro trabalhador, mostrando-se afastada a possibilidade de uma relação de confiança entre ambos já que, na ausência de uma punição exemplar do A., poderia ele pôr em causa a obediência a outras ordens superiores e os colegas questionariam o dever de eles próprios deverem obediência àquela ou a outras ordens da entidade patronal.
O recorrente discorda deste entendimento alegando, essencialmente, que a R. tentou impor-lhe condutas a que não estava obrigado nos termos da lei e a que tinha legitimidade para desobedecer.
Enfrentemos a argumentação que desenvolve quanto aos episódios verificados, sucessivamente, nos dias 15 e 20 de Novembro de 2001.
5.2.3.2.1. Quanto ao dia 15 de Novembro de 2012
Alega o recorrente que é a própria sentença que levanta dúvidas quanto à licitude das ordens dadas pelo rondista/chefe de grupo E… para que o A. assinasse o “Diário de Inspecção” e a “check list”, por não ser inequívoco o dever de obediência ao rondista/chefe de grupo e que a clausula 4ª, nº 4 do CCT aplicável define de forma clara as funções de Chefe de grupo (“Em cada grupo de cinco vigilantes, por turno e local de trabalho, a um deles serão atribuídas funções de Chefe de grupo …”).
Alega ainda que cabem ao vigilante chefe as visitas de inspecção e apoio aos locais de trabalho e que a própria Recorrida, apesar de ilegalmente ter também, posteriormente, atribuído ao rondista a efectivação de visitas de apoio e acompanhamento aos postos de vigilância, não se atreveu a conferir-lhe poderes inspectivos, pelo que era perfeitamente legitimo que o A. tivesse declinado assinar os documentos supra-citados a pedido do rondista/chefe de grupo no dia 15 de Novembro de 2012, sendo certo que o próprio A. tinha alertado a R. para as dúvidas sobre a legitimidade do rondista/chefe de grupo ter poderes inspectivos (al. FF) dos factos admitidos por acordo) e que as mesma dúvidas assaltaram os seus colegas de trabalho que lhe pediram para esclarecer a questão em causa junto da R., o que o A. fez junto do Vigilante chefe Sr. F… em 29 de Outubro de 2012, não tendo deste obtido resposta – conclusões 21.ª a 27.ª.
Perante os factos provados, não podemos reconhecer razão ao recorrente.
Com efeito, ficou provado que no dia 15 de Novembro de 2012, os chefes de grupo solicitaram aos vigilantes da C…, incluindo o A., que assinassem o “check list”, bem como o “diário de inspecção” (documentos em que o chefe de grupo regista, designadamente, informação relativa à utilização dos documentos por parte dos vigilantes, ao uso dos equipamentos que estão ao dispor dos vigilantes, à identificação do vigilante, à necessidade de esclarecimentos que o Vigilante possa sentir relativamente a diferentes aspectos da sua vida profissional, entre outros) e que o A., não obstante lhe ter sido transmitido a importância que revestiam os referidos documentos, se recusou a assiná-los aquando da visita do chefe de grupo, E…, argumentando que não devia obediência a este E… e que na comunicação da Ré de 22 de Outubro não vinha referido que o vigilante tinha de assinar o “Diário de Inspecção” (factos 39. a 43.).
É certo que o A., enquanto delegado sindical, havia contactado no dia 29 de Outubro de 2012 o seu superior hierárquico, o Vigilante chefe Sr. F…, a quem, telefonicamente, deu conta das suas dúvidas sobre se os vigilantes teriam de assinar o “relatório de inspecção” e o “check list” (factos 36. e 44.).
Mas, como diz a sentença recorrida, invocou um argumento meramente formal e insuficiente para justificar a conduta adoptada pelo A., “pois a prática até aí unanimemente seguida na empresa foi sempre a de os colaboradores assinarem os documentos referentes ao “Relatório de Inspeção” e à “checlist”, e o A., que até aí jamais tinha assumido qualquer atitude de recusa, sabia que a Ré tinha atribuído ao chefe de grupo as funções de solicitar o preenchimento de documentação aos vigilantes, onde se incluía as de solicitar a assinatura pelo vigilante daqueles documentos”.
Não é verdade que, como diz o recorrente nas suas alegações, a sentença levante dúvidas quanto à licitude das ordens do rondista/chefe de grupo de que o A. assinasse os documentos em causa. O que a sentença reconhece a este propósito é que o A. tinha dúvidas e as colocou, pelo que poderia justificar-se na “sua perspectiva” a objecção em relação à ocorrência de 15 de Novembro (como a sentença tem o ensejo de salientar), mas nunca afirma que aquela objecção foi efectivamente justificada.
E, na verdade, também não vemos que se possa considerar legítima a recusa do recorrente em assinar os documentos que lhe foram entregues pelo rondista/chefe de grupo E…, conforme este solicitou, tendo em consideração a determinação constante da comunicação interna de que os colaboradores cooperassem com os chefes de grupo nos actos das visitas de acompanhamento aos postos.
Recordemos os termos da referida comunicação interna da R. de 22 de Outubro de 2012, reproduzida no facto 34.:
“Comunicamos a todos os colaboradores que as Equipas de Ronda Móvel da Zona Norte poderão efectuar visitas de apoio aos postos de Vigilância.
(…)
Os elementos das equipas de Ronda Móvel têm a função de Chefes de Grupo, razão pela qual devem os colaboradores facultar toda a documentação, bens e meios necessários relacionados com o serviço e cooperar com estas Chefias no acto das visitas de acompanhamento aos postos”,
Esta comunicação interna foi emitida pelo empregador, no âmbito do seu poder de direcção previsto nos artigos 11.º e 97.º do Código do Trabalho, pois que a ele compete, dentro dos seus poderes organizativos e conformativos da prestação laboral ali compreendidos, estabelecer os termos em que o trabalho é prestado e definir as actividades e tarefas que tem por relevantes e que entende ser de incumbir os seus trabalhadores, assim como os procedimentos que deverão ser seguidos na execução dessas funções, aos quais aqueles devem obediência, dentro dos limites do contrato e das normas que o regem.
Cabendo ao vigilante chefe as visitas de inspecção e apoio aos locais de trabalho e ao chefe de grupo as de chefiar cada grupo de cinco vigilantes, por turno e local de trabalho, nos termos do instrumento de regulamentação colectiva invocado, não se vislumbra obstáculo nas normas que regem o contrato de trabalho a que o empregador, no âmbito daquele poder de direcção:
- atribua ao rondista/chefe de grupo a tarefa de efectivar visitas de apoio e acompanhamento na postos de vigilância sem que, note-se, lhe tenha atribuído simultaneamente os questionados poderes inspectivos que cabem ao vigilante chefe (conclusão 26.ª e facto 54.), e
- determine simultaneamente aos vigilantes que cooperem com o chefe de grupo nos actos das visitas de acompanhamento,
como fez a recorrida através da comunicação interna de 22 de Outubro (facto 34.).
Nesta cooperação determinada pela recorrida, deverá naturalmente considerar-se compreendido o acto de os vigilantes assinarem os documentos referentes à “check list” e ao “relatório de Inspecção”, sendo de notar que ficou provado que o A. sabia que nas funções atribuídas ao chefe de grupo estavam incluídas as de solicitar a assinatura pelo vigilante daqueles documentos (factos 49., 50., 55. e 56.).
Não vemos que esta assinatura possa ser assumida como o reconhecimento das funções inspectivas que o A. questiona poderem ser atribuídas ao rondista/chefe de grupo. E a verdade é que o recorrente, atentas as funções de delegado sindical que desempenhava, tinha um acesso privilegiado a dialogar com o empregador e, bem assim, a contactar as entidades oficiais com poderes na inspecção do trabalho, como aliás mencionou ao seu superior hierárquico ter feito (facto 37.) se entendia que o empregador não podia conferir aos rondistas/chefes de grupo as funções que lhes cometeu através da comunicação interna de 22 de Outubro de 2012, devendo privilegiar o uso destes meios e as respostas aí alcançadas antes de optar por uma desobediência ostensiva e injustificada, já que não estavam de modo algum em causa os seus direitos e garantias, pelo que corria o risco – que se concretizou – de incorrer em infracção disciplinar nos termos do artigo 128.º, n.º 1, alínea e) do Código do Trabalho.
Aliás, deve notar-se que da check list de 15 de Novembro não consta nenhuma observação negativa ou reparo à conduta do A., tendo sido aposta a menção “ok” a todos os itens mencionados, o mesmo se passando com o diário de inspecção em que o Rondista/chefe de grupo apôs a menção “a visita de apoio e acompanhamento ao vigilante B…, n.º …., tendo decorrido na normalidade” (factos 45. e 46.), o que torna ainda mais injustificada a atitude do A. de afrontamento ao determinado na comunicação interna da R. de cooperar com os chefes de grupo (facto 34.) ao recusar-se à assinatura de tais documentos solicitada pelo chefe de grupo E… por ocasião da visita deste (factos 41. e 43.).
5.2.3.2.2. Quanto ao dia 20 de Novembro de 2012
No que diz respeito aos factos ocorridos neste dia, alega o recorrente, relativamente ao “documento de comunicação de ausência”, que a própria sentença admite que existem dúvidas quanto à licitude do preenchimento e assinatura deste documento de comunicação da ausência ao trabalho do A. no dia 14 de Novembro de 2012, por esta se ter dado no exercício do direito de greve pois não tem a entidade patronal a faculdade de indagar da justificação para tal, sob pena de ficar na sua posse com os elementos necessários e suficientes para a criação de uma base de dados pessoais dos trabalhadores que aderiram à greve, pelo que a ordem dada ao A. pelo vigilante chefe F… é manifestamente ilegal e o A. podia e devia desobedecer-lhe, o que fez, tanto mais que é delegado sindical.
Alega ainda, relativamente à recusa em assinar os “Relatórios de Ocorrências” elaborados pelo Vigilante chefe F… em 20 de Novembro de 2012 (um deles referente à recusa desse dia em preencher a comunicação de ausências e outro à recusa do A. em assinar o check list e o diário de inspecção referente ao dia 15 de Novembro de 2012), que os ditos relatórios foram elaborados pelo Vigilante chefe F… e só ele teria que os assinar, não podendo assim ser exigido ao A. que co-assine documentos a que é alheio e pelos quais não tem qualquer responsabilidade, que os mesmos se reportavam a factos já conhecidos da recorrida, tendo o A. assumido expressamente a sua recusa em ambos os casos e que a exigência do A. em os assinar constituiu uma tentativa abusiva, prepotente e ilícita de “vergar” o A., sendo a ordem em causa ilegal, pelo que o A. não lhe devia obediência.
Alega, finalmente, que não faz sentido a tese de que foi preciso chamar duas testemunhas para presenciar a recusa do A. em assinar os relatórios de ocorrências e que não aceita a versão do Vigilante chefe quanto à convocação de mais dois superiores hierárquicos, que dos factos provados resulta uma prática desreguladora da recorrida no tocante às relações laborais existentes entre si e os seus trabalhadores, consubstanciada na violação da lei e do CCT aplicável e era seu dever, delegado sindical, o de se opor a essa desregulação e dar o exemplo aos seus colegas de trabalho, sendo por isso que a recorrida o elegeu para o perseguir disciplinarmente, pois que não desobedeceu a nenhuma ordem legitima da recorrida – conclusões 28.ª a 46.ª.
A este propósito ficou provado, em suma, o seguinte:
- os Vigilantes-Chefes estão incumbidos de fazer visitas de inspecção e apoio aos locais de trabalho e de verificar e dar assistência a diversos locais de trabalho, o que implica que questionem os trabalhadores sobre o incumprimento de procedimentos a que estes estão adstritos – factos 53. e 54.
- no dia 20 de Novembro de 2012, o Vigilante-Chefe F… efectuou uma visita de apoio e inspecção ao posto M…, onde o Autor prestava as suas funções e perguntou ao Autor porque é que não tinha assinado o Diário de Inspecção, bem como a check list, conforme lhe fora solicitado por E…, no dia 15 de Novembro de 2012, tendo o Autor respondido que não reconhecia competências a E…, apesar de saber que a R. tinha atribuído a este a classificação de chefe de grupo e as funções de solicitar o preenchimento de documentação aos vigilantes – factos 47. a 50., 55. e 56.
- o A. não compareceu ao local de trabalho no dia 14 de Novembro de 2012 – facto 58.
- a R. utiliza um documento interno denominado de comunicação de ausências constante de fls. 92 do procedimento disciplinar apenso – factos 59. e 60.
- o F… solicitou ao A. o preenchimento do referido documento de comunicação de ausência, tendo-se este recusado a preencher o documento em causa quanto à ausência ao trabalho do dia 14 de Novembro de 2012 por entender que os trabalhadores não têm que, nem prévia nem posteriormente, comunicar ao empregador se aderiram ou não à greve – factos 61. e 62.
- perante tais recusas do A., o E… elaborou dois relatórios de ocorrência, um referente à recusa em preencher a comunicação de ausências e outro à recusa do dia 15 em assinar o check list e o diário de inspecção – factos 63. e 64.
- o relatório de ocorrências é um documento onde são registados determinados acontecimentos relativos a um vigilante e o A. tinha conhecimento que o mesmo deveria, no período imediatamente subsequente à sua elaboração, ser assinado pelo trabalhador para atestar que dele tomou conhecimento – facto 57. e 65.
- o F… solicitou ao Autor que assinasse o relatório de ocorrências, tendo-se o autor recusado a fazê-lo – facto 66.
- o F…, requereu a presença do Chefe de secção, J…, bem como do Chefe de grupo, E…, para que estes pudessem confirmar que o Autor tinha tomado conhecimento do conteúdo dos relatórios de ocorrência, tendo estes comparecido nesse mesmo dia 20 de Novembro – factos 67. e 69.
- o Autor recusou-se, uma vez mais, a assinar o relatório – facto 68.
- e telefonou à PSP, solicitando a presença de agentes no local de trabalho, tendo, pelas 14:55 horas, comparecido no local de trabalho do Autor os Agentes N… e O…, alegando temer pela sua integridade física. – factos 70. e 71.
- na presença da PSP o Vigilante-Chefe F… releu ao A. os dois citados relatórios de ocorrência, bem como um terceiro que foi elaborado por o A. estar fardado com sapatos castanhos, tendo o A. assinado apenas o relatório de ocorrência elaborado em virtude do fardamento, recusando-se novamente a assinar os restantes relatórios – factos 72. e 73.
- quando as chefias do autor se preparavam para finalizar a visita de apoio e inspecção, o A., ainda na presença dos agentes, levantou a voz às suas chefias e, tendo sido chamado à atenção, pelo Chefe de Secção, J…, alegou que tinha “problemas nas cordas vocais” – factos 74. e 75.
Está em causa, neste dia 20, a desobediência do A. ao seu superior hierárquico vigilante chefe F… que se concretizou:
● na recusa do A. em preencher uma comunicação de ausência e
● na recusa em assinar dois relatórios de ocorrência (um referente à recusa em preencher a comunicação de ausência e outro à recusa do dia 15 em assinar o check list e o diário de inspecção), esta segunda recusa reiterada por três vezes a primeira perante o vigilante chefe, a segunda perante este e as duas outras chefias e a última perante estes três superiores hierárquicos e a PSP.
No que diz respeito à primeira recusa do A. – em preencher a comunicação de ausência verificada no dia 14 de Novembro de 2012 – é certo que a sentença admite que possam existir dúvidas quanto à licitude do preenchimento e assinatura deste documento, por esta ausência se ter dado no exercício do direito de greve. Mas é também certo que afirma, logo após, que a comunicação da ausência “não é destituída de fundamento legal, até porque, como é sabido, os efeitos da ausência ao serviço por força do exercício do direito greve, que dão lugar, entre outros, ao desconto da retribuição correspondente, são distintos quer do regime das faltas justificadas, quer das injustificadas.” E acrescenta que “tendo cerca de 2.200 trabalhadores, a C… tem, a nível nacional, que assegurar o devido e necessário controlo das faltas dos trabalhadores e sua justificação, a que acresce a circunstância de muitos trabalhadores prestarem as suas funções fora das instalações da C…, pelo que o controlo da assiduidade tem que se revestir de cautelas acrescidas.”
Não vislumbramos, com efeito, que a ordem de preenchimento do impresso da “comunicação de ausências” documentado a fls. 92 do procedimento disciplinar apenso, com uma multiplicidade de razões para as ausências nos dias em causa (férias, descanso compensatório, nojo, obrigações legais, horas sindicato, greve, exames escolares, falta justificada, falta injustificada, etc.) que o trabalhador se limitaria a assinalar com uma cruz e a assinar, seja contrária aos direitos ou garantias do trabalhador.
Nos termos prescritos no artigo 536.º, n.º 1 do Código do Trabalho, a greve suspende o contrato de trabalho do trabalhador aderente, incluindo o direito à retribuição, pelo que se pode compreender que o empregador queira certificar-se da razão da ausência do trabalhador em dia de greve a fim de proceder em conformidade.
Além disso, constitui dever do empregador o de manter actualizado, em cada estabelecimento “o registo dos trabalhadores com indicação de nome, … datas de início e termo das férias e faltas que impliquem perda da retribuição ou diminuição de dias de férias” – artigo 127.º, n.º 1, alínea j) do Código do Trabalho.
Se é inequívoco que nenhum trabalhador é obrigado a comunicar previamente ao seu empregador que irá fazer greve, mesmo que interpelado por este nesse sentido – até porque tal declaração de vontade seria livremente revogável[35], admitindo-se que o trabalhador é completamente livre de exercer o direito à greve, bem como livre “de mudar de ideias” –, não se vislumbram motivos para, depois de passado o dia da greve, impedir que o empregador se queira inteirar das razões da ausência dos trabalhadores que não compareceram ao serviço naquele dia, até para se certificar de que a ausência, que em princípio se presume ter na sua base a adesão à greve[36], a tem efectivamente e não se fundou noutros motivos.
Não tem a nosso ver pertinência a alegação do recorrente de que o empregador não pode indagar da justificação para tal, sob pena de ficar na sua posse com os elementos necessários e suficientes para a criação de uma base de dados pessoais dos trabalhadores que aderiram à greve, o que tornaria ilegal a ordem dada ao A. pelo Vigilante chefe e possibilitaria ao A. desobedecer-lhe, como fez.
Com efeito, como salienta o Mmo. Julgador a quo, o que é proibido, e é isso que resulta do teor do parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados (Deliberação n.º 225/2007 da CNPD documentada a fls. 201 e ss.), “é a criação de uma base de dados pessoais dos trabalhadores que adiram às greves, o que no caso dos autos não se mostra evidenciado”.
Seja como for, uma vez que a sentença da 1.ª instância não tomou em consideração esta conduta do trabalhador para a caracterização da justa causa de despedimento há que acatar este juízo tendo em consideração que a R. não procedeu à ampliação do objecto do recurso nos termos possibilitados pelo artigo 636.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicável “ex vi” do art. 1.º, n.º 2 al. a) do Código de Processo do Trabalho.
No que diz respeito às demais condutas do A. verificadas nesse mesmo dia perante as ordens do vigilante chefe F… – que se consubstanciaram nas recusas em assinar dois relatórios de ocorrência (um referente à recusa em preencher a comunicação de ausência e outro à recusa do dia 15 em assinar o check list e o diário de inspecção), a segunda reiterada por três vezes nesse mesmo dia ao seu superior hierárquico, a última das quais perante os demais superiores presentes e a PSP – a sentença sob censura discorreu nos seguintes termos:
«[…] mal se compreende que tendo anteriormente contactado telefonicamente o referido Vigilante-Chefe F… para lhe colocar as dúvidas quanto à obrigatoriedade dos vigilantes assinarem o “Relatório de Inspeção” e a “checlist” quando as visitas eram realizadas pelos rondistas/chefes de grupo, e não pelos supervisores, o A. se tenha ulteriormente recusado a assinar, pelo menos, o relatório de ocorrência relativo à recusa em assinar o check list, bem como o diário de inspeção referentes ao dia 15 de novembro de 2012, na medida em que este relatório foi elaborado pelo Vigilante-Chefe, F…, jamais se tendo suscitado quaisquer dúvidas quanto à obrigatoriedade de assinar tais documentos.
O referido comportamento do A., para além de comportar uma direta desobediência a uma ordem legítima, traduz uma ostensiva violação dos procedimentos vigentes na empresa quanto à formalização das visitas de apoio e inspeção.
Não será despiciendo sublinhar que ao empregador compete, no âmbito dos seus poderes empresariais e dentro dos seus poderes organizativos e conformativos da prestação laboral, definir as atividades e tarefas que tem por relevantes e que entende ser de incumbir aos seus trabalhadores, assim como os procedimentos que deverão ser seguidos na execução dessas funções, aos quais aqueles devem obediência
O comportamento em análise traduz, igualmente, uma afronta e um desafio à autoridade da empresa, uma vez que colocou diretamente em causa a autoridade dos superiores hierárquicos, que o interpelaram no exercício legítimo das suas funções, estando devidamente mandatados pela empresa para exercer funções de chefia, de que o A. tinha perfeito conhecimento.
Mas a afronta do trabalhador à autoridade da empresa não se ficou por aqui.
Isto porque, face à recusa do A. em assinar os referidos relatórios, viu-se o Vigilante-Chefe, F…, na necessidade de requerer a presença do Chefe de secção, J…, bem como do Chefe de grupo, E…, para que estes pudessem confirmar e atestar que o Autor tinha tomado conhecimento do conteúdo dos relatórios de ocorrência.
Ainda assim, o A. persistiu no seu comportamento de recusa e sob o pretexto – não comprovado – de temer pela sua integridade física face à presença dos três superiores hierárquicos, não se coibiu de contactar e solicitar a presença no seu local de trabalho de agentes da Polícia de Segurança Pública.
Saliente-se, no entanto, que o A. não alegou – nem comprovou – qualquer facto que suportasse ou indiciasse sequer a razoabilidade do alegado temor para a sua integridade física que diz ter vivenciado.
A mera presença dos três superiores hierárquicos, no contexto apurado, mostra-se perfeitamente justificada, nomeadamente para que a conduta do trabalhador pudesse ser ulteriormente confirmada em sede de processo disciplinar [Sendo perfeitamente legítimo, por exemplo, que, em caso de despedimento verbal ou de facto, o trabalhador se faça acompanhar ao local de trabalho com testemunhas para que estas possam atestar o impedimento ou a recusa da entidade empregadora no recebimento da prestação do trabalho, por identidade de razão não vemos qualquer óbice a que, numa situação como a dos autos, em que o trabalhador presta a sua actividade num local onde, por cada turno, não existe qualquer outro colaborador ao serviço, o superior hierárquico demande a presença de outros colaboradores (no caso, todos eles superiores hierárquicos do A.) para poderem atestar, por exemplo para efeitos disciplinares, a recusa do trabalhador no acatamento de uma determinada ordem ou procedimento].
Acresce que o alegado temor da sua integridade física não se nos afigura compatível com a postura então assumida pelo A., o qual, ainda na ainda na presença dos agentes da PSP, não se coibiu de levantar a voz às suas chefias, o que pode ser configurado como violação do dever de respeito e de urbanidade para com os seus superiores hierárquicos.
Temos para nós que, a partir do momento em que um conflito laboral passa a ser pautado pela presença da autoridade policial, sem que se vislumbre qualquer fundamento válido para tal intervenção, a relação de confiança que deve presidir à referida relação laboral mostra-se definitivamente comprometida. Na verdade, atendendo ao referido antecedente, não será de excluir que, doravante, qualquer interpelação dos superiores hierárquicos à qual o A. manifeste a sua discordância redunde em nova solicitação (por parte deste) da presença no local de trabalho da autoridade policial competente, sem que esta entidade tenha qualquer legitimidade para dirimir conflitos do foro iminentemente laboral.
Ademais, essa postura, a repetir-se, é apta a causar sérios problemas na relação contratual que a empresa mantém com o cliente onde se situa o posto de trabalho do Autor, pois a (mera) presença da autoridade policial é suscetível de causar apreensão e perturbação social (não só no referido local de trabalho, como na vizinhança), bem como de colocar em causa o normal funcionamento e o bom nome da empresa, por esta dar uma imagem de não ser capaz de solucionar no seu seio um conflito de cariz meramente laboral.
Por último, mal se compreende que sendo o A. delegado sindical, e a existirem, alegadamente, irregularidades ou ilegalidades praticadas pela empresa, aquele se arrogue individualmente uma atitude de recusa ou desobediência às ordens que lhe são dadas pelos seus superiores hierárquicos, ao invés de tentar dirimir tais questões através da intervenção do Sindicato diretamente junto da empresa ou, se necessário, mediante o recurso às autoridades competentes (por ex. ACT ou Tribunais).
[…]»
Concordamos, na sua essencialidade, com este juízo.
Com efeito, nada justifica estas sucessivas desobediências do recorrente ao vigilante chefe verificadas no dia 20 de Novembro de 2012, pois que nenhuma das ordens dadas era contrária aos direitos ou garantias do trabalhador, todas elas se justificando face ao poder do empregador de estabelecer directrizes em matéria de organização da empresa e devendo-lhes o A. obediência, mostrando-se manifestamente violado o dever plasmado na alínea e), do n.º 1 do artigo 128.º do Código do Trabalho.
No que diz respeito à alegação do A. de que não lhe podia ser exigido que co-assinasse documentos a que é alheio e pelos quais não tem qualquer responsabilidade e que só o vigilante chefe teria que assinar os ditos relatórios porque foram por ele elaborados, esquece-se o A. que não lhe cabe a ele, no âmbito da organização laboral, estabelecer os termos em que se registam os acontecimentos que as suas chefias, incumbidas de tal pelo empregador, reputem de relevantes.
Essa competência incumbe ao empregador e cabe ao trabalhador, apenas, obedecer às directrizes emanadas do empregador ou do superior hierárquico, no âmbito da delegação de poderes laborais a que o empregador tenha procedido – artigo 128.º, n.º 2 do Código do Trabalho – pelo que lhe cabia in casu assinar os relatórios documentados a fls. 93 e 95 do procedimento disciplinar apenso como lhe foi determinado e deles fazer constar os comentários que bem entendesse no lugar destinado no documento para os comentários do colaborador ali visado.
Nos exactos termos previstos no artigo 128.º, n.º 1, alínea e) do Código do Trabalho, a única ressalva ao dever de cumprir as ordens e instruções do empregador consiste em serem as mesmas “contrárias aos direitos e garantias do trabalhador”, contrariedade esta que neste caso se não detecta.
Se o trabalhador discorda destes procedimentos do empregador, poderá exprimir a sua opinião perante o mesmo e, eventualmente, ver atendidas as suas ideias quanto a uma diferente forma de registar ocorrências relevantes, mas não pode recusar-se a cumprir ordens destinadas a implementar os procedimentos estabelecidos na empresa pelo empregador só porque deles discorda, ainda que por muito boas razões, desde que não estejam em causa violações aos seus direitos e garantias.
De todo o modo, ficou provado que o A. tinha conhecimento de que o relatório de ocorrência deveria, no período imediatamente subsequente à sua elaboração, ser assinado pelo trabalhador “para atestar que dele tomou conhecimento” (facto 57.), pelo que, sendo esta a razão de ser da sua assinatura do documento, não tem qualquer pertinência a alegação do A. de que não teria que o assinar por não ser de sua autoria.
Igualmente no que diz respeito à alegação do recorrente de que os “Relatórios de Ocorrências” elaborados pelo vigilante chefe F… em 20 de Novembro de 2012 se reportavam a factos já conhecidos da recorrida, tendo o A. assumido expressamente a sua recusa em ambos os casos, não tem a mesma qualquer relevo. Se o superior hierárquico, eventualmente no cumprimento de ordens que recebeu, elabora relatórios de ocorrência apesar de os factos neles relatados serem já do conhecimento do empregador e estarem confessados, ao trabalhador não cabe avaliar da necessidade ou conveniência da elaboração do relatório, devendo assiná-lo para atestar que dele tomou conhecimento, como lhe foi determinado.
Quanto à alegação de que a exigência do A. em os assinar constituiu uma tentativa abusiva, prepotente e ilícita de “vergar” o A., não vemos que os factos apurados a sustentem. Havendo impressos internos da empresa pré-preenchidos de relatórios de ocorrência em que se fez constar um local destinado à assinatura do colaborador para atestar que dele tomou conhecimento (facto 57.), e tendo-se verificado efectivamente ocorrências – actos de recusa do recorrente em obedecer a ordens emitidas no âmbito da empresa – é absolutamente natural que o superior hierárquico vigilante chefe tenha preenchido os referidos relatórios documentados a fls. 93 e 95 do procedimento disciplinar apenso e tenha solicitado ao A. que os assinasse, como se provou, não havendo quaisquer factos que indiciem que com tal solicitação, que o A. reiteradamente se negou a satisfazer, tenha agido de forma prepotente e com o objectivo de tentar vergar o A..
Finalmente, no que diz respeito à alegação de que não faz sentido a tese de que foi preciso chamar duas testemunhas para presenciar a recusa do A. em assinar os relatórios de ocorrências, não tem a mesma qualquer relevância para a caracterização do comportamento do trabalhador. Fiou provado que assim foi (facto 67.), sendo certo que este facto foi admitido por acordo das partes (alínea YY) e se tal faz sentido, ou não, na perspectiva do A., em nada adianta para a caracterização do seu comportamento e da relevância disciplinar do mesmo.
A apurada conduta do trabalhador a este propósito traduz-se em desobediências directas, reiteradas e dolosas a ordens legítimas do empregador e representa uma afronta e desafio à autoridade da empresa, uma vez que colocou directamente em causa as ordens de superiores hierárquicos que o interpelaram no exercício legítimo das suas funções, sendo de confirmar o juízo efectuado a propósito da sua caracterização infraccional na sentença sob censura.
5.2.3.3. Quanto ao terceiro fundamento
No que diz respeito ao terceiro fundamento invocado na decisão de despedimento – a falta que a R. considerou injustificada dada pelo A. no dia 08 de Novembro de 2012 – a sentença da 1.ª instância concluiu que foi observado o estatuído no n.º 2 do art. 253.º e que não se verificava a infracção disciplinar imputada ao trabalhador, pelo que tal fundamento não era apto a servir como justificativo para o despedimento do trabalhador.
Também aqui há que acatar este juízo, sem necessidade de outras considerações, uma vez que a R. não procedeu à ampliação do objecto do recurso nos termos possibilitados pelo artigo 636.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicável “ex vi” do art. 1.º, n.º 2 al. a) do Código de Processo do Trabalho.
*
5.2.4. Como resulta do exposto, mostra-se preenchida a primeira condição da justa causa de despedimento: a existência de um comportamento do trabalhador violador de deveres de conduta inerentes à disciplina laboral – o ora recorrente violou os deveres de respeitar e tratar o empregador, os superiores hierárquicos e os companheiros de trabalho com urbanidade e de cumprir as ordens e instruções transmitidas pelos seus superiores hierárquicos, que se mostra previsto nas alíneas a) e e) do artigo 128º, nº 1 do Código do Trabalho –, culposo e grave.
Cabe, pois, averiguar da existência da impossibilidade prática da relação de trabalho ou da "inexigibilidade" da sua subsistência, o que deverá ser feito em concreto, à luz de todas as circunstâncias que no caso se mostrem relevantes, mediante o balanço dos interesses em presença e segundo um critério de razoabilidade e normalidade[37].
A subsistência da relação de trabalho é neste sentido impossível quando, à luz do juízo efectuado, se conclua que a ruptura é irremediável e, portanto, nenhuma outra medida se revela adequada a sanar a crise contratual aberta pelo comportamento do trabalhador[38].
A este propósito, o recorrente limita-se a alegar conclusivamente a inexistência de justa causa de despedimento, o que se compreende já que centra a maior parte da sua motivação recursória na alegação da nulidade da prova consistente nos posts publicados no facebook e na negação da existência de um comportamento infraccional desobediente, no que não obteve êxito.
A sentença da 1.ª instância, neste preciso aspecto, discorre nos seguintes termos:
“[...]
Por referência aos dois primeiros fundamentos supra enunciados - seja individual ou conjuntamente considerados - o comportamento do trabalhador determina a quebra do suporte psicológico e confiança mínimas necessárias, por parte do empregador, à manutenção da relação de trabalho, em termos de não lhe ser esta mais exigível.
Por outro lado, não se nos afigura que a sanção, ainda que a mais gravosa do leque sancionatório disponível, seja desproporcional à gravidade das infracções, tendo em conta quer a gravidade das infracções, manifestadas por uma atitude de ofensa ao bom nome e numa clara desobediência e afrontamento da entidade patronal, quer o grau de culpa do A. que, não obstante ser conhecedor dos procedimentos vigentes na empresa, reiterou o comportamento anterior.
(…)
É certo que o A. têm a seu favor mais de 10 anos (dez) anos de antiguidade – por referência à prolação da decisão final do procedimento disciplinar.
Todavia, a seu favor não abona o seu passado disciplinar. A este respeito foram já movidos dois procedimentos disciplinares contra o Autor, os quais culminaram em sanções disciplinares de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade (cfr. al. JJJJ) dos factos admitidos por acordo), sendo que no primeiro processo, em 2006, o Autor foi sancionado com dois dias de suspensão do trabalho com perda de retribuição, e no segundo procedimento disciplinar, também instaurado no ano de 2012 e fundamentado numa múltipla prática de divulgação de comentários no Facebook, o Autor foi sancionado, por decisão datada de 10.05.2012, na sanção disciplinar de suspensão do trabalho, pelo período de 10 (dez) dias, (cfr. als. LLLL), KKKK) e MMMM) dos factos admitidos por acordo).
Além disso, o A. foi objeto de uma carta de advertência (cfr. resp. ao ques. 11 da base instrutória).
Assim, aquela antiguidade, em confronto com a gravidade e consequências dos próprios factos, é insuficiente para modificar o juízo de inexigibilidade de manutenção da relação de trabalho.
Aliás, sendo o Autor delegado sindical, o desempenho de tais funções trazia-lhe responsabilidades acrescidas, no tocante, designadamente, à imagem de cumprimento dos deveres laborais que devia transmitir aos seus colegas, permitindo-lhe ter plena consciência das consequências que a sua conduta podia implicar para a empresa.
Ora, os factos dolosos que praticou não podem deixar de considerar-se idóneos a frustrar naturalmente aquela expectativa, pois se apresentam contrários aos padrões de conduta nela pressuposto, deste modo suscitando fortes dúvidas no espírito do empregador quanto à eventualidade de, no futuro, comportamentos semelhantes não virem a repetir-se.
Em suma, a conduta do A. era – e é - merecedora de sanção disciplinar mais grave: o despedimento.
Conclui-se, assim, pelo preenchimento de todos os requisitos do conceito de justa causa e, logo, pela licitude do despedimento promovido pela Ré, improcedendo a impugnação do mesmo e, consequentemente, o direito à reintegração no posto de trabalho e o direito às retribuições vencidas e vincendas.
[…]”
Sufragamos, na sua essencialidade, estas considerações.
Tendo por horizonte os dois primeiros fundamentos enunciados na decisão do despedimento e nos limites do que se teve por provado na presente acção, cremos ser manifesta a gravidade dos factos apurados, a lesão de interesses da recorrida que os mesmos implicam e a sua aptidão para quebrar a relação de confiança que constitui a base de uma relação contratual de natureza laboral.
É certo que, no que diz respeito à infracção disciplinar emergente da publicação dos posts no facebook entendemos – e nesta sede em que se afere se a infracção disciplinar torna inexigível a subsistência da relação laboral cremos que se impõe uma apreciação autónoma deste Tribunal da Relação – que muitos deles se enquadram ainda nos limites da liberdade de expressão do trabalhador e do direito de crítica, maxime atendendo à qualidade de delegado sindical do seu autor, pelo que não seriam aptos a justificar, de per si, o despedimento.
Mas não podemos deixar de reconhecer que a atitude do A. revelada nalguns dos posts publicados é objectivamente ofensiva e extravasa o direito de crítica, o que sucede, designadamente, no dia 24 de Setembro, em que apelida de “oportunistas” e “parasitas” os trabalhadores que não aderem à greve, referindo que “desses já ninguém espera nada, continuarão unicamente limitados à sua insignificante existência” (facto 12.), no dia 27 de Setembro, em que refere serem “imbecis os que levam notícias aos padrinhos”, bem como “HIPÓCRITAS para o carago com eles”, apesar de referir que é uma expressão “à moda do Porto” (facto 13.), no dia 21 de Novembro de 2012, em que mencionou “o dia de ontem foi assinalado” e colocou uma imagem de três palhaços querendo retratar os seus superiores como palhaços (factos 23. e 24.) e no dia 23 de Novembro, em que retrata os rondistas da R. com o vídeo de um rato pequeno e veloz que constitui uma personagem de animação (factos 26. e 27.).
Na verdade, se a um delegado sindical no exercício das respectivas funções há-de ser consentida uma maior liberdade de expressão, também lhe são exigidas maiores cautelas com os termos que escolhe para expor as suas ideias e críticas (maxime se os escreve, o que permite maior ponderação), uma vez que goza de natural credibilidade e respeito por parte dos outros trabalhadores. São pois particularmente danosos os seus excessos neste domínio da expressão, extravasando o legítimo direito de crítica e de reacção ao que considera injusto ou ilícito, e redundando em ofensas à honra e consideração do seu empregador, colegas e superiores hierárquicos, o que não pode deixar de ser ponderado quando se afere da inexigibilidade da subsistência da relação de trabalho.
Seja como for, a reiterada atitude desobediente do trabalhador que emerge dos factos provados, conjugada com o teor de alguns dos posts publicados que são objectivamente ofensivos e humilhantes dos colegas de trabalho e superiores hierárquicos, de que destacamos ter retratado os superiores hierárquicos a quem desobedecera e levantara a voz na véspera como palhaços, com o específico intuito de assim os retratar, torna efectivamente inviável a continuação da relação de trabalho.
Cabe lembrar que o incumprimento do dever de obediência afronta o princípio do poder directivo do empregador, consignado no artigo 97.º do Código do Trabalho, que o mesmo é dizer, o princípio da subordinação jurídica, elemento basilar essencial do contrato de trabalho, que confere ao empregador um poder de autoridade sobre o trabalhador com vista a assegurar o bom funcionamento da empresa.
A desobediência ilegítima às ordens dadas por responsáveis hierarquicamente superiores está expressamente prevista, na alínea a), do n.º 2, do artigo 351.º do Código do Trabalho, como comportamento susceptível de constituir justa causa de despedimento.
Os comportamentos desobedientes do trabalhador demonstrados nos autos, nas circunstâncias concretas em que ocorreram, enquadram-se naquela previsão e são objectivamente graves, sobretudo se contextualizados com a atitude francamente violadora do dever de respeito ao empregador, colegas e superiores hierárquicos que destacamos dos posts publicados no “grupo de trabalhadores da C…”.
Particularmente no dia 20 de Novembro, o recorrente criou um ambiente de desobediência e afronta reiterada à sua hierarquia e, até, de algum desafio, atento o que se apurou relativamente à chamada da autoridade pública às instalações do cliente do empregador, sem que se vislumbre qualquer justificação plausível, permitindo-se o recorrente levantar a voz aos seus superiores em frente aos agentes da autoridade, com a alegação (indemonstrada) de que tinha “problemas nas cordas vocais”, quando foi chamado à atenção pelo chefe de secção para o não fazer, sem que também se encontre justificação para tal atitude.
Não podia o recorrente ignorar que devia respeito ao seu empregador e superiores hierárquicos e que não podia recusar-se a cumprir os procedimentos internos estabelecidos pelo empregador no que diz respeito ao preenchimentos dos relatórios de ocorrência, do checklist e do diário de inspecção, bem como que devia obediência ao vigilante chefe F… (o que o recorrente não questionou) e que (pelo menos) estava obrigado a cooperar com o chefe de grupo por força da comunicação interna da R.
É grave a culpa do recorrente, sendo a sua actuação levada a cabo com dolo directo.
A conjugação dos comportamentos desobedientes e desrespeitadores apurados – em claro desafio à autoridade do empregador e dos seus superiores hierárquicos, com a recusa ilegítima em cumprir os procedimentos estabelecidos e persistindo ostensivamente na sua atitude apesar das diversas solicitações que lhe eram feitas e de terem sido chamados outros superiores hierárquicos, que depois veio a retratar intencionalmente como palhaços perante os demais trabalhadores da empresa na imagem que colocou no dia seguinte no “grupo dos trabalhadores da C…” – traduzem uma conduta apta a afectar o normal funcionamento da organização empresarial, com evidentes reflexos ao nível da disciplina e ambiente geral da organização, e justificam que se crie no espírito do empregador a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta do trabalhador no desenvolvimento da relação contratual, maxime tendo o mesmo a qualidade de delegado sindical, pelo que, naturalmente, os demais trabalhadores perspectivam as suas atitudes como esclarecidas e correctas, vg. por conformes com o direito.
A alicerçar o juízo de que não é adequada para sanar a crise contratual e prevenir situações similares uma sanção disciplinar de natureza conservatória, cabe ponderar que o recorrente havia sido objecto de censura disciplinar – foi sancionado em 2006 com dois dias de suspensão do trabalho com perda de retribuição e em Maio de 2012 com dez dias de suspensão do trabalho com perda de retribuição e recebeu, ainda, uma carta de advertência (factos 89. a 92. e 100.) – a que se mostrou indiferente com a prática do comportamento apurado.
Em suma, e como decorre do exposto, o comportamento prosseguido pelo A. é grave e justifica, plenamente, à luz do critério objectivo do empregador razoável, que tenha levado a R. a instaurar o procedimento disciplinar e a nele concluir pela aplicação da sanção do despedimento, por se mostrar preenchido o conceito de justa causa, tal como é enunciado no artigo 351.º do Código do Trabalho de 2009.
Improcedem as alegações do recorrente, merecendo confirmação a sentença recorrida.
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5.3. Porque ficou vencido no recurso que interpôs, incumbe ao recorrente o pagamento das custas respectivas (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), devendo atender-se a que beneficia de apoio judiciário (cfr. fls. 295).
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6. Decisão
Em face do exposto, nega-se provimento à apelação e confirma-se a decisão contida na sentença da 1.ª instância.
Custas a cargo do recorrente, atendendo-se a que beneficia de apoio judiciário.
Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil, anexa-se o sumário do presente acórdão.

Porto, 8 de Setembro de 2014
Maria José Costa Pinto
João Nunes
António José Ramos
________________
[1] Clarificamos que fazemos referência aos termos “autor” e “ré” (ou A. e R.) para designar as partes desta acção na medida em que, apesar de as referências terminológicas constantes do articulado do diploma que alterou o Código de Processo do Trabalho (Decreto-Lei n.° 295/2009, de 13 de Outubro) se reportarem apenas ao “trabalhador” e ao “empregador” e ter havido uma alteração da estrutura clássica da acção de impugnação do despedimento com a nova acção especial regulada nos artigos 98.º-B e ss. do Código de Processo do Trabalho, não deixam as partes de se situar nas mesmas posições activa e passiva relativamente à generalidade dos pedidos de que cumpre conhecer nestas acções e o legislador denotou no preâmbulo do diploma, quando alude ao “formulário apresentado pelo autor” que o trabalhador assume na acção a posição de “autor” e, naturalmente, o empregador a posição de “réu”.
[2] Vide o Ac. do Tribunal Constitucional n.º 715/96, in DR II série, de 97.03.18.
[3] Gomes Canotilho e Vital Moreira, “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Coimbra, 2007, pp. 385 e ss. Em sentido não inteiramente coincidente, Jorge Miranda, “Manual de Direito Constitucional - Direitos Fundamentais”, IV, 3.ª edição, pp. 320 e ss. e Vieira de Andrade, “Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976”, 2.ª edição, pp. 251 e ss.
[4] In “O Direito Geral de Personalidade”, Coimbra, 1995, pp. 448 e ss., vg. p. 450.
[5] No seu estudo “Contrato de trabalho e meios de vigilância da actividade do trabalhador”, in Estudos em Homenagem ao Prof. Raul Ventura, vol. II, FDUL, 2003, pp. 815.
[6] José João Abrantes, “O Direito Laboral face aos novos modelos de prestação do trabalho”, in IV Congresso Nacional de Direito do Trabalho, pp. 83 e ss.
[7] No seu estudo “Contrato de Trabalho e Direitos Fundamentais da Pessoa”, in Estudos em Homenagem à Professora Doutora Isabel de Magalhães Colaço, II, pp. 393.
[8] In Código do Trabalho Anotado, sob a coordenação de Pedro Romano Martinez e outros, 8.ª edição, Coimbra, 2009, pp. 152-153.
[9] Vide Júlio Gomes, in Direito do Trabalho, Volume I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra, 2007, pp. 272 e ss. e Joana Veríssimo, Maria Macias e Sofia Rodrigues, “Redes Sociais Na Internet: Um Novo Conceito De Privacidade?”, in www.fd.unl.pt..
[10] Vide Júlio Gomes in ob. citada, p. 384, p. 379 e p. 370, nota 988.
[11] In Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, Coimbra, 2007, pp. 467-468.
[12] Vide Ricardo Nascimento, “O uso de redes sociais no local de trabalho”, in Maia jurídica: revista de direito. - Ano 6 n.º 2 (Julho-Dezembro 2008), p. 32.
[13] Duarte, Fábio e Frei, Klaus. Redes Urbanas. In: Duarte, Fábio; Quandt, Carlos; Souza, Queila. (2008). O Tempo Das Redes, p. 156, apud http://pt.wikipedia.org.
[14] Em 2012 havia em todo o mundo mais de mil milhões utilizadores do facebook activos mensalmente. (informação retirada de http://pplware.sapo.pt/redes_sociais). Segundo o jornal Público, citando a agência LUSA e o Eurostat, em peça de 2012.12.18, os portugueses são os europeus que mais utilizam a Internet para publicar mensagens nas redes sociais, sendo que, no ano de 2012, 75% dos internautas em Portugal utilizaram a Internet para publicar mensagens nas redes sociais, percentagem que se mostrou como a mais elevada entre os Estados-membros analisados e superior à média da UE (52%).
[15] Vide Maria Regina Redinha, “Redes Sociais: Incidência Laboral”, in Prontuário de Direito do Trabalho, n.º 87, Coimbra, 2010, p. 33.
[16] Estudo citado, p. 34.
[17] Vide Francisco Rui Cádima, “ O Facebook, as Redes Sociais e o Direito ao Esquecimento”, in Revista Media & Jornalismo, Vol.12, Nº1 – 2013, p. 207
[18] Vide Teresa Coelho Moreira no seu estudo “A privacidade dos trabalhadores e a utilização de redes sociais online: algumas questões”, in Questões Laborais, n.º 41, p. 54.
[19] Vide Maria Regina Redinha, in estudo citado, pp. 40-42.
[20] In ob. citada, pp. 49-50. Esta autora elege como factores essenciais a atender na apreciação a efectuar, a parametrização da conta e o tipo de serviço ou funcionalidade da rede social utilizada – in ob. citada, pp. 86 e ss.
[21] Colhemos estas informações da página oficial do facebook em Portugal (https://www.facebook.com/), acedida em Julho de 2014. Ali é dito, além do mais, o seguinte:
- “Os perfis pessoais destinam-se a uma utilização não comercial e representam pessoas individuais. Podes seguir perfis para ver atualizações públicas de pessoas que te interessam, mas que não são tuas amigas (…) O teu perfil é a tua coleção de fotos, histórias e experiências que contam a tua história. O teu perfil também inclui a tua Cronologia.”
- “As Páginas servem para as empresas, marcas e organizações partilharem as suas histórias e estabelecerem ligações com pessoas. À semelhança dos perfis, podes personalizar as Páginas ao publicar histórias, organizar eventos, adicionar aplicações e muito mais. As pessoas que gostam da tua Página e os amigos delas podem receber atualizações nos respetivos Feeds de notícias.”;
- “Os Grupos do Facebook facilitam o contacto entre conjuntos de pessoas específicos, como família, colegas de equipa ou de trabalho. Os grupos são espaços privados onde podes partilhar atualizações, fotos ou documentos e enviar mensagens a outros membros do grupo. Também podes selecionar uma de três opções de privacidade para cada grupo que criares: Público, Fechado e Secreto”.
[22] Por exemplo se as pessoas que têm o estatuto de “amigos” são jornalistas, este facto pode indiciar um aspecto mais público do grupo, como assinala Teresa Coelho Moreira, in estudo citado, p. 91.
[23] Vide Rabindranath Capelo de Sousa, in ob. citada, p. 323.
[24] Pense-se num desabafo feito numa conversa privada entre dois amigos sobre o bom ou mau feitio de um superior hierárquico.
[25] Vide Teresa Coelho Moreira, in estudo citado, pp. 86-87, elegendo este factor, de manifesta importância, como o primeiro a atender.
[26] A autora a que nos vimos referindo enuncia este factor sem grandes certezas (estudo citado, p. 91), mas cremos ser o mesmo de relevante importância por indiciar claramente um controlo mais difuso do titular da conta sobre o universo das pessoas que podem aceder ao grupo e uma maior expansão imediata e por um grande número de pessoas do que nele é publicado.
[27] Denominado “Redes Sociais Na Internet: Um Novo Conceito De Privacidade?”, in www.fd.unl.pt
[28] Esta é a realidade do que se passa online, apesar de o denominado “direito ao esquecimento” ter começado a preocupar as instâncias europeias, levando a que a Comissão Europeia tenha apresentado em 25 de Janeiro de 2012 uma proposta de Regulamento sobre protecção de dados pessoais para alterar a Directiva n.º 95/46, ali se regulando o direito ao apagamento de dados. Ainda antes de efectivada a alteração regulamentar proposta, o Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia de 3 de Maio de 2014, em resposta a um pedido de esclarecimento da Audiência Nacional de Espanha, deliberou que o cidadão espanhol Mario Costeja González tem direito a exigir que a Google deixe de mostrar nos resultados das pesquisas uma nota oficial sobre uma penhora publicada no jornal La Vanguardia em 1998, interpretando a Directiva n.º 95/46, além do mais, nos seguintes termos: “[…] 3) Os artigos 12.°, alínea b), e 14.°, primeiro parágrafo, alínea a), da Diretiva 95/46 devem ser interpretados no sentido de que, para respeitar os direitos previstos nestas disposições e desde que as condições por elas previstas estejam efetivamente satisfeitas, o operador de um motor de busca é obrigado a suprimir da lista de resultados, exibida na sequência de uma pesquisa efetuada a partir do nome de uma pessoa, as ligações a outras páginas web publicadas por terceiros e que contenham informações sobre essa pessoa, também na hipótese de esse nome ou de essas informações não serem prévia ou simultaneamente apagadas dessas páginas web, isto, se for caso disso, mesmo quando a sua publicação nas referidas páginas seja, em si mesma, lícita. 4) Os artigos 12.°, alínea b), e 14.°, primeiro parágrafo, alínea a), da Diretiva 95/46 devem ser interpretados no sentido de que, no âmbito da apreciação das condições de aplicação destas disposições, importa designadamente examinar se a pessoa em causa tem o direito de que a informação em questão sobre a sua pessoa deixe de ser associada ao seu nome através de uma lista de resultados exibida na sequência de uma pesquisa efetuada a partir do seu nome, sem que, todavia, a constatação desse direito pressuponha que a inclusão dessa informação nessa lista causa prejuízo a essa pessoa. Na medida em que esta pode, tendo em conta os seus direitos fundamentais nos termos dos artigos 7.° e 8.° da Carta, requerer que a informação em questão deixe de estar à disposição do grande público devido à sua inclusão nessa lista de resultados, esses direitos prevalecem, em princípio, não só sobre o interesse económico do operador do motor de busca mas também sobre o interesse desse público em aceder à informação numa pesquisa sobre o nome dessa pessoa. No entanto, não será esse o caso se se afigurar que, por razões especiais como, por exemplo, o papel desempenhado por essa pessoa na vida pública, a ingerência nos seus direitos fundamentais é justificada pelo interesse preponderante do referido público em ter acesso à informação em questão, em virtude dessa inclusão.” – consultável em http://curia.europa.eu/juris.
[29] Recordamos aqui a jurisprudência que vem indicada no estudo de Teresa Coelho Moreira consultado, bem como no trabalho de Joana Veríssimo et alii e citada na sentença, que aqui reproduzimos no seu essencial, a que juntamos um recente aresto brasileiro.
Assim, uma decisão precursora nesta matéria foi a do Conseil de Prud'hommes de Boulogne -Billancourt, de 19 de Novembro de 2010 - jurisdição de primeira instância competente para julgar litígios de trabalho, em França. Esta decisão julgou fundamentado o despedimento de funcionários acusados de terem manchado o nome da empresa através da rede social Facebook considerando que, “ao escolher dentro dos parâmetros da privacidade da conta estabelecer que não só os amigos mas também os amigos dos amigos teriam acesso, permitindo desta forma um acesso aberto, nomeadamente aos colegas de trabalho e mesmo aos antigos colegas da empresa, o acesso à página do Facebook ultrapassa as fonteiras da esfera privada”. E afirmou que o conteúdo colocado tinha natureza pública e que a página Facebook que constituía um meio de prova lícito para o despedimento.
Num segundo caso, um tribunal holandês deu também razão a um empregador que despediu um funcionário, depois de este ter publicado insultos numa rede social, não aceitando a argumentação do trabalhador de que os comentários eram privados e que o Facebook pertence ao seu domínio privado uma vez que todos os comentários e mensagens publicadas poderem ser republicadas facilmente, tal como ali aconteceu, o que fez com que a informação seja visível para outras pessoas e seja considerada semi-pública.
No Reino Unido, o tribunal considerou que, embora os comentários do trabalhador despedido pela empresa tenham sido feitos fora da hora de expediente e na sua página privada, tal não é garante de privacidade e as opiniões expressas podem ser utilizadas pelos seus «amigos» na rede social, que poderão espalhá-las por um vasto número de pessoas.
A Cour d`appel de Rouen, por seu turno, mediante decisão datada de 15 de Novembro de 2011, numa situação de uma trabalhadora que tinha injuriado o seu empregador na rede social Facebbook, tendo trocado com mais cinco trabalhadores da empresa críticas ao seu empregador, considerou que o empregador, a quem incumbe o ónus da prova dos factos que basearam o despedimento, não conseguiu provar quais os parâmetros que a trabalhadora tinha definido para a privacidade da sua conta, nem conseguiu precisar como teria obtido as páginas que apresentou em tribunal, e que justificaram o despedimento da trabalhadora, o que não permitiu chegar à conclusão se elas seriam visíveis ou não por todos.
Por decisão de 22 de Maio de 2012, o Conseil de Prud`hommes de Lens, entendeu que o despedimento de uma trabalhadora enfermeira que colocou comentários sobre o seu empregador era desprovido de uma causa real e séria, referindo que “as comunicações feitas através do site Facebook são de natureza privada”, além de que naquele caso os comentários não eram injuriosos para o empregador. A trabalhadora alegou que os seus comentários eram apenas visíveis para os seus contactos no Facebook e que nenhum dos seus colegas de trabalho tinha acesso aos mesmos.
No Brasil, um trabalhador foi demitido por justa causa em Jundiaí, no interior de São Paulo por ter “curtido” no facebook [crê-se que a expressão se reporta ao denominado “gosto” ou “like”] um post ofensivo da empregadora e de uma das sócias da mesma, publicado por um ex-trabalhador da empresa. Após uma decisão da 1ª Vara do Trabalho de Jundia favorável à empregadora, o Tribunal Regional Trabalhista da 15ª Região, em Campinas, São Paulo, por decisão de 22 de Junho de 2014, confirmou a validade do despedimento e afirmou que “se sabe o alcance das redes sociais”, que “a liberdade de expressão não permite ao empregado travar conversas públicas em rede social ofendendo a sócia proprietária da empresa”, que o facto “é grave” e que “prejudicou de forma definitiva a continuidade de seu pacto laboral, mormente quando se constata que seu contrato de trabalho perdurava por pouco mais de quatro meses”.
[30] Subscrito também pela ora relatora, como primeira adjunta.
[31] Mesmo no âmbito da tutela conferida pelo artigo 22.º do Código do Trabalho às mensagens enviadas por e-mail, o Acórdão da Relação de Lisboa de 30 de Junho de 2011, processo n.º 439/10.3TTCSC-A.L1-4, admitindo que constituía o uso de prova ilícita (em violação do artigo 22.º do CT) o visionamento de e-mails enviados para o correio pessoal do trabalhador durante o seu horário de trabalho que denunciavam, pretender ele, à revelia do empregador, criar uma empresa concorrente desviando clientes e negócios, deu no caso prevalência ao direito à prova, considerando como interesse preponderante no caso concreto a descoberta da verdade material.
[32] Uma nota se impõe para indicar que, concluindo-se não havendo qualquer escolho ao conhecimento pelo empregador dos posts publicados pelo trabalhador e ao uso dos inerentes elementos probatórios, é despiciendo averiguar por que forma deles tomou conhecimento (por indicação de pessoas que as divulgaram ou porque foram afixadas cópias dos posts nos postos de trabalho, como terão referido as testemunhas ouvidas – vide a decisão que decidiu a matéria de facto em litígio a fls. 458, sendo certo que não podem considerar-se neste aresto tais factos como assentes pois não foram incluídos pela 1.ª instância na matéria a atender para a decisão jurídica do pleito).
[33] Vide M. do Rosário Palma Ramalho in Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, Coimbra, 2006, p. 806, no que diz respeito ao Código do Trabalho de 2003.
[34] Vide o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2009.03.31, Revista n.º 351/09 - 1.ª Secção, sumariado in www.stj.pt. Vide também o Ac. do mesmo tribunal de 2010.06.22, Revista n.º 688/04.9TVLSB.L1.S1 - 6.ª Secção, sumariado no mesmo sítio.
[35] Vide Meneses Cordeiro, in Manual de Direito do Trabalho, Coimbra, p. 388.
[36] Embora ao nível do contrato individual de trabalho inexista norma expressa a enunciar esta presunção, assim se tem entendido e afirmava-o expressamente o artigo 19.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 100/99 de 31 de Março, que estabelecia o regime de férias, faltas e licenças dos funcionários e agentes da administração central, regional e local, incluindo os institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos, diploma que foi revogado pela Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho, que aprovou a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.
[37] Vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2001.05.31, proferido na Revista n.º 704/01 da 4ª Secção, de 2003.02.19, proferido na Revista n.º 2673/02 da 4ª Secção e de 2003.02.26, proferido na Revista n.º 1198/02 da 4ª Secção, todos sumariados in www.stj.pt
[38] Vide Monteiro Fernandes in "Direito do Trabalho", 13.ª edição, Coimbra, 2006, pp. 551 e ss., Jorge Leite e C. Almeida in "Colectânea de Leis do Trabalho", Coimbra, 1985 pp. 248 ss., B.Lobo Xavier, "Da justa causa de despedimento: conceito e ónus da prova" in R.D.E.S., 1988, pp.1 ss e, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2001.01.17, proferido na Revista n.º 3318/00 da 4ª Secção, de 2001.10.11, proferido na Revista n.º 591/01 da 4ª Secção, de 2001.12.12, proferido na Revista n.º 2167/01 da 4ª Secção e de 2007.06.21, Recurso n.º 3540/06 - 4.ª Secção, também sumariados in www.stj.pt
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