sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO - SUBSÍDIO DE DESEMPREGO - REVOGAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO - MÚTUO ACORDO



667/13.0TTMAI.P1              TRPorto     19  Janeiro 2015


I - Na ação em que invoca a ilicitude de despedimento por extinção do posto de trabalho e reclama os direitos dela derivados, não aproveita à trabalhadora a invocação da interrupção da prescrição determinada por citação ocorrida em anterior ação em que reclamou o pagamento de uma indemnização por, ao contrário do que lhe foi garantido e a levou a revogar por mútuo acordo o contrato de trabalho, não ter conseguido o subsídio de desemprego.
II - A revogação do contrato de trabalho por mútuo acordo, mesmo quando consigna que o motivo é a extinção do posto de trabalho, não está dependente da instauração do procedimento de extinção do posto de trabalho, e a revogação não é materialmente equiparável a um despedimento, exigindo este a alegação e prova da factualidade reveladora da vontade unilateral do empregador em fazer cessar a relação laboral

Processo nº 667/13.0TTMAI.P1
Apelação

Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 428)
Adjunto: Desembargadora Paula Maria Roberto
Adjunto: Desembargadora Fernanda Soares

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório
B…, residente na Maia, veio intentar contra “C…, S.A.”, com sede em …, e “D…, S.A.”, com sede em Matosinhos, a presente acção declarativa sob a forma de processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, pedindo a final que na procedência da acção seja:
a) declarada a ilicitude do despedimento quanto à 1ª Ré, por não ter sido precedido de procedimento nem terem sido efectuadas as comunicações legalmente impostas, e em consequência a condenação da Ré C… a reintegrá-la, na categoria de administrativa, sem prejuízo da sua antiguidade e retribuições, e sem prejuízo de vir a optar pela indemnização de antiguidade, mais se condenando a Ré a pagar as retribuições que a A. deixou de auferir desde a data do despedimento até ao transito em julgado da decisão, acrescido dos juros de mora desde os vencimentos das mesmas e até integral pagamento.
b) a condenação da mesma Ré em sanção pecuniária compulsória no valor diário de 67 euros;
subsidiariamente, a titulo de abuso de direito, enquanto sociedade dominante, a 2ª Ré deve ser considerada parte legítima por ter sido real empregadora, e em consequência deve:
c) declarar-se o contrato celebrado em 18.2.2010 como sendo entre a A. e a 2ª Ré, contrato que subsistiu até 25.1.2012, ser declarada ilícita a extinção do seu contrato formalizada nesta data, porque improcedente o motivo invocado, ser a 2ª Ré condenada a ver judicialmente declarado ilícito o despedimento e assim a reintegrar a A. na sua categoria administrativa sem prejuízo da sua antiguidade e das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão final, acrescidas de juros moratórios, à taxa legal vigente, desde os respectivos vencimentos e até integral e efectivo pagamento;
d) mais se condenando a 2ª Ré em sanção pecuniária compulsória no valor diário de 67 euros.
Alegou a A., em síntese:
Por sentença datada de 17.9.2013 no âmbito do processo 778/12.8TTMAI, a ora Ré foi absolvida da instância, no âmbito de acção de processo comum emergente de contrato de trabalho.
Para os efeitos previstos no artº 279º nº 2 do CPC, o processo em causa deu entrada em juízo em 8.11.2012, a ré foi citada em 19.11.2012 e a decisão final transitou em 18.10.2013.
À data da cessação do contrato de trabalho da A., a Ré C…, antes denominada E…, S.A., era detida maioritariamente pela Ré D…, a qual integrava ainda a firma F…, Ldª, cujo representante legal era também administrador na E…. A 1ª e a 2ª Rés partilhavam identidade de alguns dos titulares dos órgãos societários, instalações, funcionários, serviços de contabilidade, programas de facturação.
A A. foi admitida em Abril de 2009 ao serviço da F…, Ldª, para trabalhar como administrativa, em Matosinhos. Actualmente, esta firma ainda existe, não desenvolvendo actividade e estando em procedimento de liquidação oficiosa.
No início de Fevereiro de 2010, a D… decide constituir uma nova firma – a F…, S.A. – e em 17.2.2010 a secretária do Conselho de Administração da D… enviou à A. e mais colegas, a ordem de trabalhos da 2ª reunião do Conselho de Administração. O material humano e logístico que fazia parte da “F…, Ldª” é transferido para a “E…, S.A.” desconhecendo a A. a forma como foi formalmente extinta a sua relação de trabalho com a F…, Ldª, tendo-lhe sido dito que esta tinha sido comprada pela D…. Apesar de convidada para vogal da administração, as funções reais da A. mantinham-se como mera administrativa. A nova versão formal do seu contrato de trabalho foi elaborada por advogado, remetida para o seu superior hierárquico e reenviada para si. A A. continuou a obedecer às ordens da mesma pessoa, desempenhando idêntico conteúdo funcional. Nunca à A. foi prestada informação de que tinha de optar pelos descontos como trabalhadora por conta de outrem ou como membro de órgão estatutário. Em Novembro de 2011, foi-lhe comunicado que a F…, S.A. iria fechar e que passaria para a D…. Posteriormente, a secretária do Conselho de Administração da D… contactou-a para que assinasse uma carta em que renunciava ao Conselho de Administração, o que fez.
Em finais de Janeiro de 2012, o administrador manteve uma reunião com a A. e mais colegas a propor a extinção dos contratos de trabalho por acordo, assegurando que seriam mantidos os mesmos direitos, que a antiguidade seria assegurada e que teriam direito ao subsídio de desemprego, e nessa convicção a A. assinou um acordo de extinção do contrato de trabalho, por motivo de extinção do posto de trabalho. Contudo não foi cumprido o procedimento legal de extinção de postos de trabalho, nem a A. veio a ter direito ao subsídio de desemprego nem veio a ser integrada na D…, ao contrário dos sues colegas. A subsistência do seu contrato não era impossível dentro do grupo D… e a A. tinha antiguidade superior à dos colegas. A C… mantém-se formalmente activa.
Em termos indistintos, a A. foi designada por assessora técnica, no seu contrato com a E…, S.A, por trabalhadora na revogação do contrato por mútuo acordo, por administradora e coordenadora administrativa e financeira nos cartões profissionais e por vogal, nas actas que subscreveu.
Não sendo aceite que o despedimento é ilícito, deve desconsiderar-se a personalidade jurídica entre as rés, por não haver motivo para extinção do seu posto de trabalho, por fraude e pela confusão das esferas jurídicas de ambas.

Contestaram as Rés invocando:
- a ineptidão da PI uma vez que a A. alegou ter acordado a revogação do contrato de trabalho e não invocou que tivesse revogado tal acordo ou que o mesmo fosse inválido por vício da vontade, e assim é ininteligível a causa de pedir – despedimento ilícito – e há contradição entre o pedido e a causa de pedir.
- prescrição, visto que o contrato cessou em 29.2.2012, a acção teria de ser proposta até 28.2.2013, pelo contrário foi-o em 17.11.2013 tendo as Rés sido citadas em 19.11.2013. Não aproveita à A. o artigo 279º nº 2 do CPC porque as Rés só foram citadas 31 dias depois e porque as duas acções não têm o mesmo objecto. Na acção anterior a A. nem sequer considerou nem alegou ter havido despedimento, pelo contrário, formulou o pedido de condenação no pagamento de 18 meses de subsídio de desemprego, e a condenação da Ré a pagar-lhe senhas de presença em reuniões do Conselho de Administração. Nenhum destes pedidos resultava do contrato de trabalho, um sendo um pedido de prestações sociais, sustentado numa garantia hipotética dada, e o outro assentava em direitos derivados da relação contratual de administração. De resto, as partes são diferentes, sendo aliás absurdo que em relação à 2ª Ré se invoque a interrupção da prescrição, quando ela nunca sequer foi citada para a primeira acção.
- abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium, uma vez que a A. revogou o contrato de trabalho e nem sequer devolveu o valor da compensação paga, e pretende adicioná-lo às consequências de ilicitude de despedimento que agora alega.
- por impugnação.

A A veio apresentar resposta às excepções deduzidas, pugnando, entre outros, pela tempestiva propositura desta acção em prevalência do artigo 279º do CPC.

Foi proferido despacho a ordenar a junção aos autos de cópia certificada dos articulados e decisão proferida no processo 778/12.9TTMAI, interposto pela aqui Autora contra a Ré C…, o que foi cumprido, certificando-se ainda que a sentença transitou a 14.10.2013 e que a acção foi instaurada a 9.11.2012 e a Ré citada a 19.11.012

Foi então proferido despacho saneador, no qual se fixou o valor da causa em € 32.560,00, se declarou a abstenção de conhecimento da excepção de ineptidão, nos termos do artigo 278º nº 3 do CPC, e se conheceu da prescrição, decidindo-se: (…) “conclui-se pela procedência da invocada exceção de prescrição e, nos termos do disposto no artigo 576.º/3 do Código de Processo Civil, absolvem-se as rés dos pedidos.
Custas pela autora”.

Inconformada, interpôs a A. o presente recurso, apresentando a final as seguintes conclusões:
A – A sentença recorrida, por total omissão da motivação da matéria de facto dada como provada, bem como da respectiva análise crítica, é nula, devendo ser revogada e determinar-se a continuidade da instância após tal acto decisório (artº 607º, nº 4 e 615º, nº 1, al. C) a D) do C.P.Civil).
B- Sem prescindir, assim se não considerando, há erro na apreciação e contradição entre a matéria probatória documental existente nos autos, quanto à prova da matéria dada como provada a ponto 9 da decisão recorrida, relativamente à data certificada pelo doc. junto na petição como nº 2 ( que certifica, o transito a 18.10.2013), antes optando o tribunal pela data 14.10.2013 ( da certidão judicial posterior, de fls. 187 a 254 ), sem que se compreenda ou justifique a opção pela posterior, em que a decisão se suporta, devendo antes ser os factos da anterior a figurar, nomeadamente quanto á data da propositura e transito ( artº 640, nº 1, al.b) e c) e nº 2, al. B) do Cód. de Processo Civil.
C- Ao considerar que não seria aplicável na situação sub judice nem o artº 327º do C.Civil, nem o disposto no artº 279º do C.P.Cviil, tal interpretação viola o princípio da unidade do sistema e se não sustenta no elemento sistemático, em virtude de postergar a existência da causa de pedir e pedido plurais, impedindo em sede de petição inicial, o que o direito adjectivo prevê admissível e até à audiência de discussão e julgamento - violando o artº 28º do C. P. Trabalho.
D- A fórmula que sustenta a decisão de mérito não permite um efectivo exercício do direito de defesa da recorrente.
NESTES TERMOS E NOS DEMAIS DE DIREITO QUE V. EXAS. DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVERÁ SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO DE APELAÇÃO, REVOGANDO-SE A DECISÃO RECORRIDA, COM OS FUNDAMENTOS INVOCADOS (…).

Contra-alegaram as Rés, requerendo a rectificação e/ou suprimento de nulidades invocadas pela recorrente, antes da subida do recurso, nos termos dos artigos 614º e 617º do CPC, e formulando, a final, as seguintes conclusões:
1. A invocada nulidade por falta de motivação da decisão de facto tem de ser suprida, antes da subida do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 617.º do CPC, e caso o não seja, sempre terá de ser ordenada a baixa do processo para o mesmo efeito, nos termos do n.º 5 do mesmo artigo.
2. O erro na matéria de facto provocado pela contradição entre as duas certidões judiciais tem de ser objecto de rectificação, nos termos do artigo 614º do CPC mediante esclarecimento do próprio Tribunal.
3. A rectificação e/ou suprimento de nulidades referidas em nada altera o teor da decisão recorrida.
4. O prazo para a Recorrente impugnar o despedimento cuja ilicitude agora invoca, é de um ano, nos termos dos artigos 387.º e 337.º do Código do Trabalho, a contar da cessação do contrato de trabalho.
5. O contrato de trabalho celebrado entre a ora Recorrente e a Recorrida C1… cessou por acordo assinado em 25.01.2012, tendo produzido efeitos em 29.02.2012.
6. A presente acção só foi instaurada em 15.11.2013, tendo as Rés Recorridas sido citadas em 19.11.2013.
7. Havia, assim, transcorrido muito mais de um ano a contar da cessação do contrato de trabalho celebrado entre a Recorrente e a Recorrida C1… quando as Rés, ora Recorridas, foram citadas para a presente acção.
8. Por outro lado a Autora, ora Recorrente, não pode beneficiar do disposto no n.º 2 do artigo 279.º do CPC porque a acção anteriormente instaurada:
a) tinha partes diferentes (a 2ª Ré não foi demandada);
b) causas de pedir diferentes;
c) pedidos diferentes;
d) e, fundamentalmente, não foi exercido o mesmo direito.
9. De facto, na acção anterior, a Autora Recorrente assumiu ter havido uma revogação do contrato de trabalho e pediu a condenação da ora 1ª Ré no valor de fundo de desemprego a que considerou ter direito e peticionou o valor correspondente a senhas de presença por participação em reuniões no conselho de administração.
10. Neste processo, a Autora considerou ter havido um despedimento ilícito, pedindo a sua reintegração, sem prejuízo de optar pela indemnização legal, demandando também a 2ª Ré, como sociedade dominante.
11. Como se decidiu no Acórdão do STA de 15.05.2013 (www.dgsi.pt), que então se referia ao artigo 289º, correspondente ao actual art.º 279.º do CPC, o direito exercido tem que ser o mesmo nas duas acções,:
i. A “nova acção” prevista no artigo 289º, nº2, do CPC não tem de ser exactamente igual à anterior, nada obstando a que a segunda petição – em que os autores nos aparecem a exercer o mesmo direito, contra os mesmos réus e pela mesma causa de pedir – apresente, relativamente à pretérita, variantes na descrição de alguns factos que desenvolvem a “causa petendi”.
12. Não podendo a Recorrente beneficiar da propositura da acção que correu termos no mesmo Tribunal sob o nº 778/12.8TTMAI, dúvidas não podem restar sobre a intempestividade da propositura desta acção e da consequente verificação da prescrição
13. A prescrição é uma excepção peremptória que conduz à absolvição do pedido (n.º 3 do artigo 576.º e artigo 579.º do Código de Processo Civil), como bem julgou a decisão recorrida.
Termos em que deve:
a) ser rectificada a sentença recorrida ou, caso assim não se entenda, serem supridas eventuais nulidades da mesma, antes da subida do presente recurso;
b) o presente recurso ser julgado improcedente e ser mantida a sentença recorrida (…)”

Sob informação da secção relativamente às datas[1] a Mmª Juiz a quo supriu a nulidade resultante da falta de motivação da factualidade considerada provada, consignando: “expressamente que ao considerar como provados os factos enunciados na decisão proferida em 03/04/2014, o tribunal firmou a sua convicção na análise dos presentes autos, no que respeita à data da instauração da presente ação, citação das rés e pedido formulado; na certidão referente ao processo n.º 778/12.9TTMAI, no que se refere aos mesmos pontos e decisão proferida; e no alegado pela autora e aceite pelas rés quanto à data da cessação da relação laboral”.
A A., recorrente, veio, ao abrigo do artigo 617º nº 3 do CPC, manifestar o seu interesse no recurso.
O recurso foi devidamente recebido.

A Exmª Senhora Procuradora-Geral Adjunta nesta Relação emitiu parecer no sentido do não conhecimento das nulidades, da procedência quanto à alteração de facto, sem que porém tal tenha relevância na questão da prescrição, cuja decisão recorrida se deve manter.
Dado cumprimento ao disposto na primeira parte do nº 2 do artigo 657º do Código de Processo Civil foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II. Direito
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões do recorrente, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, as questões a decidir são as de saber:
- se ocorre nulidade de sentença;
- se há erro na decisão sobre a matéria de facto no que toca ao ponto 9;
- se o direito da A. não prescreveu.

III. Matéria de facto
A matéria de facto dada como provada na 1ª instância é a seguinte:
“1. A presente ação deu entrada em juízo em 15.11.2013.
2. Pela presente ação pretende a autora que:
Seja “… declarada a ilicitude do despedimento da A. quanto à 1ª Ré por não ter sido precedido do respetivo procedimento, nem terem sido efetuadas as comunicações legalmente impostas e, em consequência, ser a Ré C… condenada a reintegrar a A., na categoria de administrativa, sem prejuízo da sua antiguidade e retribuições, e sem prejuízo de vir a optar pela indemnização legal em substituição da sua reintegração, mais se a condenando ao pagamento das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento, 25.01.2012, até ao transito em julgado de tal decisão; acrescidos tais montantes de juros de mora, computados à taxa legal, desde os respetivos vencimentos, até integral e efetivo pagamento;
(…)
Subsidiariamente, não sendo considerada a ilicitude do despedimento da A., a título de abuso de direito, enquanto sociedade dominante, deva a 2ª Ré ser: considerada parte legítima nos presentes autos, em virtude de terem sido eles, ao longo da vigência da sua relação de trabalho, os empregadores reais da A.; declarar-se o contrato celebrado em 18.02.2010, como sendo entre a A. e a 2ª Ré e que subsistiu até 25.01.2012; ser declarada ilícita a extinção do seu contrato de trabalho, formalizada em 25.01.2012, porque improcedente o motivo invocado; ser a 2ª Ré condenada a ver judicialmente declarado ilícito o despedimento em causa, reintegrando a A. na categoria de administrativa, sem prejuízo da sua antiguidade e das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento, 25.01.2012, até ao trânsito em julgado da decisão que o declare; mais se condenando a 2ª ré no pagamento dos juros moratórios que forem devidos, computados à taxa legal vigente, desde os respetivos vencimentos, até integral e efetivo pagamento …”.
3. A relação laboral em causa nos autos cessou em 25.01.2012.
4. As rés foram citadas para os termos da presente ação em 19.11.2013.
5. Em 08.11.2012 deu entrada neste tribunal o processo comum n.º 778/12.9TTMAI.
6. Tal processo foi instaurado pela aqui autora contra “C1…, S.A.”
7. Aí requereu a autora a condenação da ré a pagar-lhe:
“… o valor de € 18.720,00 correspondente ao montante global de subsídio de desemprego que teria direito …” (a) e, bem assim, “…o valor de € 18.000,00, correspondente ao montante que se encontra em débito …” (b).
8. No processo n.º 778/12.9TTMAI, a ré foi citada em 19.11.2012.
9. Nesse mesmo processo foi proferida decisão em 17.09.2013, transitada em julgado em 14.10.2013[2], em que se decidiu:
“ - conhecer da exceção de incompetência do tribunal em razão da matéria, para conhecer do pedido formulado na petição inicial, sob a al. b);
- conhecer da exceção de ineptidão da petição inicial, no que respeita ao pedido formulado sob a al. a), declarando nulo o processado;
- absolver a R. da instância”.

Apreciando:
1.
A recorrente não arguiu expressa e separadamente no requerimento de interposição do recurso as nulidades de sentença, não cumprindo o disposto no artigo 77º do CPT, razão pela qual tal arguição seria extemporânea, dela não se devendo tomar conhecimento. Todavia, como resulta dos autos, a Mmª Juiz supriu a arguição de nulidade no tocante à falta de fundamentação da sua convicção quanto à matéria de facto provada, o que aliás fez com precedência de esclarecimento por parte da Secção que emitiu a certidão relativa ao processo anterior, e desse suprimento foram as partes notificadas e a Autora veio informar que lhe interessava o prosseguimento do recurso. Como entender?
Interessava-lhe o prosseguimento do recurso obviamente, porque a matéria deste não se continha nos estritos limites da arguição de nulidade. Ao possibilitar à parte, perante o suprimento feito pelo juiz, que desista ou reduza o âmbito do recurso, a lei entende que estas opções procedem da aceitação, pela parte, dos termos em que o suprimento ocorreu. Ora, se a parte vem dizer que lhe interessa o prosseguimento do recurso, isto poderá ser interpretado como “não concordo com os termos do suprimento”, todavia, neste caso, haverá que dizer então porque não se concorda com os termos do suprimento, sob pena de falecerem ao tribunal de recurso razões a que atender. No caso concreto, a nulidade arguida era a “falta de motivação da convicção sobre a matéria de facto”. A Mmª Juiz supriu, consignando em que se tinha baseado. Assim, nesta parte, a nulidade está suprida e não há razões válidas para entender o contrário (independentemente da motivação estar ou não perfeita).
A nulidade invocada assenta ainda na omissão de pronúncia. Ora bem, a recorrente não explica em que consiste esta omissão, ficando por esclarecer se ela se refere ao facto de ter sido omitida a fundamentação da convicção do tribunal. Se assim é, está suprido. Mas, talvez, a omissão se refira à primeira argumentação alegatória, segundo a qual a Mmª Juiz violou a unidade do sistema jurídico ao conhecer da prescrição, sem conhecer ou permitir o conhecimento da ineptidão da petição inicial e das sucessivas alegações de abuso de direito de ambas as partes. Como é claro, não há qualquer omissão de pronúncia: a Mmª Juiz explicou, de resto, porque é que entendia não dever conhecer da ineptidão e passar directamente ao conhecimento da prescrição, fundando-se no artigo 278º nº 3 do CPC. Apesar do abuso de direito ser uma excepção peremptória, há evidentemente um nível de hierarquização de excepções peremptórias: a prescrição vem dizer, perdoe-se a facilidade de expressão, que toda a matéria da causa, factos e consequências jurídicas deles resultantes, entre elas, neste caso, o abuso de direito, estão vedados ao conhecimento por força da sanção da inércia do titular e em prol da segurança e certeza jurídicas. Isto significa que, mesmo que a Mmª Juiz não se tivesse expressamente pronunciado no sentido de “não conheço do abuso do direito, porque ele depende de produção de prova, e entendo que há uma primeira excepção peremptória que faz cair por terra a pretensão da autora e me impede de conhecer tudo o mais”, esta pronúncia está implícita, ou melhor dizendo, o não conhecimento do abuso de direito, dos abusos de direito invocados, resulta do mesmo ter ficado prejudicado pela decisão dada quanto à prescrição.
Improcedem assim as nulidades invocadas.

2. Relativamente ao erro na matéria de facto, em concreto, quanto a datas discrepantes nas certidões judiciais relativas ao trânsito em julgado da anterior acção e à sua propositura, repare-se que o mesmo não foi relevante para a decisão final proferida pelo tribunal recorrido, que depois de abordar esta questão (ultrapassagem do prazo de 30 dias sobre o trânsito da decisão anterior) como hipótese que levaria à conclusão da improcedência da prescrição, entendeu porém que assim não podia ser por via do segundo fundamento invocado pelas rés: os termos, digamos por agora assim, das duas acções eram diversos. É portanto irrelevante conhecer desta matéria.
Ainda assim, e como bem nota a Exmª Senhora Procuradora-Geral Adjunta nesta Relação, tendo a Autora beneficiado de uma certidão emitida pela secretaria, da primeira certidão que juntou ao processo, a fls. 11 vº, e da qual constava que o trânsito em julgado da decisão proferida no processo anterior tinha ocorrido a 18.10.2013, por força do artigo 157º nº 6 do CPC, sempre haveria de dar-se relevância à mesma sobre outra em que a secretaria considerou diferentes regras de contagem do prazo de trânsito. Assim sendo, altera-se a data constante do facto nº 9, de 14.10.2013 para 18.10.2013.

3. A Mmª Juiz a quo, numa bem fundamentada decisão, consignou:
“As rés, “C…, S.A.” e “D…, S.A.”, em sede de contestação, vieram invocar a prescrição dos créditos peticionados pela autora.
Trata-se de uma exceção perentória – artigo 576.º/3 do Código de Processo Civil – que cumpre desde já conhecer, face ao disposto no artigo 61.º/2 do Código de Processo do Trabalho.
A propósito da invocada exceção, sustentam as rés o seguinte:
De acordo com o alegado pela autora, o contrato de trabalho que havia celebrado com a 1ª ré cessou em 29.02.2012, tendo a presente ação dado entrada em juízo em 17.11.2013 e as rés sido citadas para a mesma em 19.11.2013, pelo que há muito havia decorrido o prazo de um ano a que alude o artigo 337.º do Código do Trabalho.
Acrescentam ainda as rés que no caso em apreço não é aplicável o disposto no artigo 279.º/2 do Código de Processo Civil, não podendo a autora aproveitar os efeitos da propositura da ação anterior, em que ocorreu a absolvição da instância, uma vez que as rés só foram citadas 31 dias depois do trânsito da sentença que assim decidiu e as duas ações não têm o mesmo objeto, pois que naquele mesmo processo a autora não alegou qualquer despedimento, pelo que também não o impugnou. Por outro lado, e ainda, a presente ação têm partes diferentes e as causas de pedir e pedidos são totalmente diferentes, sendo que, relativamente à segunda ré, a mesma nem sequer foi citada ou interpelada naquele outro processo.
Concluem, pois, as rés que o direito da autora a impugnar o alegado eventual despedimento há muito que se encontra prescrito.
*
Quanto à invocada exceção, pronunciou-se a autora, pugnando pela sua improcedência, por considerar que foram cumpridos os requisitos legais da proposição de uma nova ação dentro dos 30 dias após o trânsito em julgado da decisão anterior de absolvição da instância.
*
Com interesse para a decisão da exceção invocada, consideram-se provados os seguintes factos: (… v. supra).

A questão que se coloca neste momento à apreciação do tribunal é a de saber se os créditos invocados e peticionados nos autos pela autora se mostram ou não prescritos.
Antes de mais, cumpre notar que os pedidos formulados nos autos pela autora respeitam a um alegado despedimento que a mesma considera ilícito.
Ora, como bem se refere no AC TRC de 24.05.2012 [www.dgsi.pt], em todas as situações de despedimento individual que não caiam no âmbito de previsão do artigo 98.º-C do Código de Processo do Trabalho – por facto imputável ao trabalhador, por extinção do posto de trabalho ou por inadaptação – e, logo, para cuja impugnação o trabalhador deva recorrer à forma de processo comum não existe prazo de caducidade do direito de ação e os créditos emergentes do despedimento ilícito ficam apenas abrangidos pelo regime de prescrição previsto no n.º1 do artigo 337.º do Código do Trabalho.
Assim, e no caso presente, importa apenas averiguar se os direitos reclamados pela autora – emergentes da alegada relação laboral e da sua cessação também alegadamente ilícita – prescreveram ou não.
Vejamos, pois.
À luz do disposto no artigo 298.º do Código Civil, são requisitos gerais da prescrição:
a existência de um direito não indisponível; que possa ser exercido; mas que não o seja durante o lapso de tempo estabelecido na lei; e que não esteja isento de prescrição [Cordeiro Menezes, Obrigações, 157].
Como é sabido, a prescrição tem subjacente a necessidade social de certeza e segurança do direito, o interesse em que as situações jurídicas não permaneçam incertas indefinidamente e assenta na inércia do titular do direito que, ao não o exercer dentro de certo lapso de tempo, faz presumir que a ele renuncia [Mota Pinto, Teoria Geral, 374].
No que diz respeito aos créditos laborais, estabelece o artigo 337.º/1 do Código do Trabalho que «o crédito de empregador ou trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho».
Como resulta deste preceito legal, a prescrição dos créditos laborais só se inicia no dia imediato ao da cessação do contrato de trabalho – este regime específico do direito laboral encontra a sua justificação na subordinação jurídica em que o trabalhador se encontra por efeito do próprio contrato de trabalho, o qual envolve uma certa posição de inferioridade do trabalhador em relação ao empregador que o pode inibir ou impedir de fazer valer os seus direitos, durante a vigência do contrato.
Na verdade, e como se refere no AC TRL de 17.01.2007 [www.dgsi.pt, vide ainda AC TRL de 06.02.2002, no mesmo sítio], «há, com efeito, uma especificidade que tem em conta a efetiva desigualdade das partes que resulta de, na vigência do contrato de trabalho, uma delas ser titular de um poder de direção e autoridade sobre a outra que, por sua vez, se encontra numa situação de subordinação jurídica e económica, o que, por si só, é suscetível de a inibir de reclamar os seus créditos na pendência do contrato, com receio das consequências que essa reclamação possa ter sobre o futura da relação, de que depende (por via da retribuição) a sua subsistência».
Assim, e volvendo ao caso dos autos, tendo em conta a data alegada pela própria autora como aquela em que cessou o contrato de trabalho, 25.01.2012, temos que o prazo de prescrição a que alude o artigo 337.º do Código do Trabalho começou a correr no dia 26.01.2012 e terminou às 24 horas do dia 26.01.2013 – cfr. artigo 279.º, al. c) do Código Civil – data a partir da qual o beneficiário da prescrição, in casu as rés, têm a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito, isto é, e na situação, à exigência de qualquer prestação decorrente da relação laboral por parte da autora.
Saliente-se, por um lado, que o prazo de prescrição verifica-se pelo simples decurso do tempo, não estando dependente de qualquer ato ou declaração negocial e, por outro lado, que só se interrompe (além das situações de reconhecimento do direito e do compromisso arbitral – artigos 325.º e 324.º, respetivamente, do Código Civil, e que não se verificam no caso presente) por efetiva promoção do titular do direito, que manifestar a intenção de o exercer e pelos meios previstos – que conferem certeza e segurança – no artigo 323.º/1 do Código Civil, o qual estabelece que «a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito …».
Daqui ressalta, pois, que não basta o exercício extrajudicial do direito para interromper a prescrição, antes a mesma só se interrompe através de qualquer ato judicial que, direta ou indiretamente, deem a conhecer ao devedor a intenção do credor de exercer o direito.
Acresce que não é suficiente a simples propositura da ação, uma vez que a prescrição apenas se interrompe com a citação ou notificação do devedor, sendo necessário que esses atos judiciais tenham lugar enquanto estiver a correr o prazo de prescrição, pois consumada esta não tem cabimento falar-se em interrupção.
Ora, no caso dos autos, a citação ocorreu em 19.11.2013, logo, já muito depois de prescrito o crédito peticionado pela autora – 26.01.2013.
Sucede, porém, que já em 08.11.2012, a autora havia dado entrada neste tribunal de um outro processo em que demandava a aqui primeira ré, processo esse que terminou por absolvição da ré da instância por incompetência material deste tribunal para conhecer de um dos pedidos formulados e por ineptidão da petição inicial em relação ao outro pedido.
Ora, estabelece o artigo 327.º/2 do Código Civil que quando se verifique a absolvição da instância, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o ato interruptivo, acrescentando o n.º3 que se por motivo não imputável ao titular do direito, o réu for absolvido da instância e o prazo da prescrição tiver entretanto terminado ou terminar nos dois meses imediatos ao trânsito em julgado da decisão, não se considera completada a prescrição antes de findarem esses dois meses.
Por seu turno, o artigo 279.º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe alcance e efeitos da absolvição da instância, estabelece que a «a absolvição da instância não obsta a que se proponha outra ação sobre o mesmo objeto», acrescentando o n.º2 que «sem prejuízo do disposto na lei civil relativamente à prescrição (…), os efeitos civis derivados da propositura da primeira causa e da citação do réu mantém-se, quando seja possível, (…) se o réu for citado para ela dentro de 30 dias a contar do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância».
Analisados os factos já considerados como provados, constata-se que na referida primeira ação instaurada pela autora contra a primeira ré esta foi citada no dia 19.11.2012 e que esse mesmo processo veio a terminar pela sua absolvição da instância, por decisão transitada em julgado em 14.10.2013.
Atento o disposto no artigo 327.º/2 do Código Civil, e porque estamos perante uma absolvição da instância, o prazo de prescrição a que alude o artigo 337.º do Código do Trabalho, começaria a correr logo após o ato interruptivo, ou seja, começaria a correr no dia 20.11.2012 (dia a seguir àquele em que a ré foi citada no processo n.º 778/12.9TTMAI), pelo que, tendo as rés sido citadas para os termos da presente ação em 19.11.2013, seríamos tentados a concluir que a invocada prescrição não se verificou.
Não nos parece, contudo, que assim possa ser.
Com efeito, e sempre com o devido respeito por diversa opinião, afigura-se-nos que assiste total razão às rés quando estas sustentam que a autora não pode aproveitar os efeitos da propositura (e citação) da ação anterior, em que ocorreu a absolvição da instância, para os efeitos pretendidos, porquanto as duas ações não têm o mesmo objeto.
E, efetivamente, assim é, pois que não só os pedidos das duas ações não coincidem minimamente, como ainda também não coincidem as respetivas causas de pedir.
Senão, vejamos:
No processo n.º 778/12.9TTMAI, a autora pretendia a condenação da primeira ré no pagamento de uma determinada quantia correspondente ao subsídio de desemprego a que teria direito e não recebeu e de uma outra determinada quantia referente a participações em conselho de administração, enquanto vogal do mesmo, que não lhe foi liquidada.
Para fundamentar estes seus pedidos, alegou a autora que só assinou o acordo de revogação do contrato de trabalho com a primeira ré por ter sido informada e lhe ter sido garantido que teria direito a beneficiar do subsídio de desemprego, o que não ocorreu, por um lado, e, por outro lado, que como vogal do conselho de administração teria de direito a receber o valor de € 500,00 por cada participação em reunião do referido conselho, o que sucedeu em 36 vezes, sem que nada lhe tivesse sido pago.
Já nos presentes autos o que a autora pretende é algo completamente distinto, a saber: que se declare ilícito o seu despedimento, por não ter sido precedido do respetivo procedimento, nem terem sido efetuadas as comunicações legalmente impostas e por improcedência do motivo invocado, com as consequências advenientes dessa mesma ilicitude.
Parece-nos, pois, não restarem dúvidas de que estamos perante ações totalmente diferentes, com objetos desiguais, não se podendo, por isso, considerar que pela citação da primeira ação a autora exprimiu, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito que ora pretende exercer. É que, como já acima notámos, a prescrição só se interrompe, nos termos do disposto no artigo 323.º/1 do Código Civil, por efetiva promoção do titular do direito que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de o exercer. Ora, naquele primeiro processo, notoriamente, a autora não manifestou a intenção de impugnar a regularidade ou licitude de qualquer despedimento, antes invocou a celebração de um acordo de revogação do contrato de trabalho e alegou o erro na declaração por ter sido induzida nesse sentido pela ré a propósito da questão do subsídio de desemprego.
Não estamos, pois, perante uma renovação do pedido, fundado na mesma causa de pedir, [cfr. Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, em anotação ao artigo 289.º do Código de Processo Civil na redação anterior à Lei n.º 41/2013], mas perante outros e novos pedidos, fundados em outras e novas causas de pedir.
E, assim sendo, então já não tem aplicação no caso presente nem o disposto no artigo 327.º do Código Civil, nem o disposto no artigo 279.º do Código de Processo Civil.
De todo modo, cumpre ressaltar que em relação à segunda ré o efeito da interrupção da prescrição nunca se poderia estender, pois que, face ao disposto no artigo 279.º/2 do Código de Processo Civil, os efeitos civis derivados da citação do réu só se mantém “quando seja possível”, o que significa que tal nunca poderia suceder em relação à mesma, uma vez que não foi demandada na primeira ação, não podendo, por isso, tal efeito, dada a sua natureza pessoal, propalar-se a si.
Deste modo, e por todas as razões que se expuseram, conclui-se pela procedência da invocada exceção de prescrição e, nos termos do disposto no artigo 576.º/3 do Código de Processo Civil, absolvem-se as rés dos pedidos.
Custas pela autora”.

A recorrente não se conforma. As conclusões C e D são herméticas e a sua explicação encontra-se de facto na alegação. Entende a recorrente que:
- a sentença proferida na anterior acção não originou um caso julgado material mas tão-só formal, nada impedindo que a mesma questão processual fosse decidida noutra acção em termos diferentes. Ora, e vamos sintetizar, quer numa quer noutra acção está em causa o contrato de trabalho e os efeitos decorrentes da sua cessação. Na primeira acção a A. exprimiu uma intenção de exercer um direito indemnizatório e a mesma pretensão está na segunda (presente) acção, tendo a Ré C… ficado ciente de que a A. pretendia exercer tal direito. A A. porém não podia ignorar a defesa das Rés neste processo, sobre a nulidade do contrato de trabalho e a validade do acordo revogatório, não podendo omitir a alegação dos factos da mesma defesa. Assim, na acção inicial, estava uma causa de pedir singular e aqui está uma causa de pedir plural, mas que não deixa de ser integrada por aquela. A tese do tribunal é demasiado objectivista e formalista, e ignora a possibilidade concedida pelo artigo 28º do CPT, que possibilita a admissão de várias causas de pedir e pedidos até à audiência, assim violando o princípio da unidade do sistema. A decisão recorrida exagera ao supor que as duas petições têm de ser idênticas. A intervenção da Ré D… contem-se nos pressupostos da coligação e a sua legitimidade está demonstrada.

Sobre a conclusão D, onde a recorrente exprime que foi prejudicado o exercício do seu direito de defesa, pode dizer-se o que já acima se disse: - a lei processual (artigo 278º nº 3 do CPC) estrutura a acção, e a acção é um meio de defesa duma pretensão substantiva condicionado pela lei processual, estrutura a acção, dizíamos, com uma organização hierárquica lógica: - se há uma razão que impede a satisfação da pretensão do autor (a procedência, logo evidente e possível de ser afirmada, de uma excepção peremptória), é inútil apreciar seja o que for mais, porque a final a solução será sempre a mesma. Neste sentido, não pode falar-se dum prejuízo do direito de defesa.
Quanto à prescrição ter corrido quanto à 2ª Ré, a recorrente não aduz nenhuma razão válida: - não é porque esta Ré é parte legítima – salvo o devido respeito, isso não está em causa – que a prescrição não corre contra ela. Mesmo que a Autora viesse a provar uma relação substancial de comunhão de esforços e direcções, digamos, entre as duas Rés, isso não levava a que se considerasse que a prescrição tinha sido interrompida quanto à 2ª Ré, porque em rigor, o facto interruptivo da comunicação judicial da intenção de exercer o direito, quanto à 2ª Ré, nunca se tinha verificado, visto que contra ela não foi interposta a primeira acção. Este argumento é formal, sim, mas o defendido pela A., que parece apontar no sentido da equiparação material da levada ao conhecimento por qualquer forma, não tem particular suporte no texto legal e por isso esse sentido – artigo 9º do CC – não poderia prevalecer. Admitamos, ainda assim, que se a Autora provasse a desconsideração da personalidade jurídica, se poderia considerar que também a 2ª Ré tinha tido conhecimento da intenção de exercer o direito. Ainda assim, isto não resolvia já a questão a favor da Autora.
É que, e aqui vamos ao essencial, é claro que, sobretudo quando a acção anterior conduz a uma absolvição da instância por ineptidão da petição inicial, os factos e o direito invocados na primeira acção não podem ser os mesmos da segunda acção, sob pena de nova ineptidão. Todavia, para o aproveitamento da interrupção da prescrição feita pela interposição de uma acção que, sem culpa do autor, acaba por resultar numa absolvição da instância do réu, é necessário que o direito a exercer (que o direito cuja intenção de exercício foi anunciado pela primeira acção) seja o mesmo.
Esta identidade passa pela comunhão de alguns factos e não se afirma em abstracto apenas porque em ambas as acções se pretende uma indemnização (note-se aliás, que a A. pediu a reintegração, reservando-se o direito de opção a final, ainda que pudéssemos considerar a reintegração como uma indemnização “in natura”).
O que a A. pediu na primeira acção – e aqui uma nota prévia para dizer que a questão de ter ou não sido administradora não interessa nada à decisão tomada nem ao recurso, porque ela gerou incompetência absoluta na primeira acção – foi que, por ter sido induzida em erro no acordo de revogação do contrato de trabalho – que efectivamente ocorreu e cuja data marca, qualquer que seja a qualificação jurídica, a cessação de facto da relação laboral – a 1ª Ré a indemnizasse pelo valor dos 18 meses de subsídio de desemprego que lhe tinha sido “prometido” que iria obter da Segurança Social e que não conseguiu receber. Esta pretensão foi acolhida, na primeira acção, sob a forma de ineptidão da petição inicial com o argumento de que, mesmo que se provasse o erro, nunca o pedido podia ser aquele, portanto nunca o pedido podia proceder, visto que “a causa de pedir invocada … nunca poderá levar ao pedido por si formulado, pois que a anulação do acordo de revogação … nunca pode ter como consequência a condenação da ré no pagamento dos subsídios de desemprego que a autora teria auferido, caso tivesse direito aos mesmos – nesta hipótese, estar-se-ia a considerar o negócio (acordo de revogação) como válido e não como anulado” (certidão a fls. 108 destes autos).
A este entendimento a A. podia ter reagido mediante recurso ou mediante a interposição de uma acção em que seguisse o entendimento do decisor, isto é, neste último caso, uma nova acção em que, contemplando a eficácia retroactiva da anulação e a necessidade de devolver qualquer compensação que tivesse recebido, pedisse uma indemnização global pelos prejuízos causados.
Simplesmente, a A. optou por não recorrer e por interpor uma nova acção (esta) em que alega que ocorreu um despedimento por inobservância de formalidades procedimentais e pede reintegração/indemnização e demais efeitos decorrentes da ilicitude do despedimento.
Evidentemente, numa acção e noutra, está em causa a relação laboral, disso não há dúvida, mas a causa “induziram-me em erro e levaram-me a acordar a revogação do contrato” não se perpetua na presente acção, porque aqui o facto novo, absolutamente relevante e essencial para a procedência da acção é, não a diferente qualificação jurídica (isto que antes era um acordo anulável por vício da vontade agora passa a ser um despedimento por falta de procedimento), mas sim o próprio facto do despedimento, isto é, da manifestação da vontade de despedir.
Ora, se percorrermos os artigos 54º e seguintes da petição inicial, não encontramos este despedimento: encontramos a assinatura dum acordo de revogação donde consta que o motivo é a extinção do posto de trabalho, do qual a A. parte para dizer “Contudo, não foi cumprido o procedimento formal do despedimento por extinção do posto de trabalho” (artigo 57º) e (77º) “o despedimento em causa deve ser declarado ilícito”. Ou seja, a A. não vem dizer, na nova acção, que o recurso ao acordo de revogação, com indução em erro, foi o meio pelo qual se manifestou a intenção da patronal em lhe extinguir o contrato. De resto, na resposta à contestação, o que a A. disse foi: “Entende que o acordo subscrito, encapota, na realidade um efectivo despedimento ilícito dito por extinção do posto de trabalho, o qual implicava um procedimento formal, incumprido, um conjunto de comunicações, incumpridas, e um fundamento improcedente, porque a entidade patronal o que pretendeu foi evitar o formalismo legal necessário ao fundamento da extinção do posto de trabalho” (artigo 10º).
Simplesmente, convirá, isto é uma conclusão sua, à qual faltam os factos que habilitariam o tribunal a decidir-se pela continuidade do facto material integrante da extinção unilateral pela empregadora (sendo que neste caso ainda haveria que continuar a pedir nesta acção a anulação do acordo por erro, sob pena de não podermos passar por cima da bilateralidade de vontades extintivas do contrato). Salvo melhor opinião, parece que a A. liga a existência do despedimento e da sua ilicitude ao facto de o acordo revogatório mencionar a extinção do posto de trabalho e de não ter sido cumprido o respectivo procedimento. Ora, os acordos de revogação são absolutamente livres, não carecem de consignação de nenhum motivo, e mesmo quando este motivo seja consignado, melhor, mesmo quando seja consignado o motivo de extinção do posto de trabalho, a lei não exige que o mesmo seja contemporâneo ou obtido no decurso do procedimento de extinção de posto de trabalho (confrontem-se os requisitos do artigo 349º do Código do Trabalho), antes sempre se considera, e parece-nos que nada obsta a que se considere, ao menos do ponto de vista das partes (que não do ponto de vista de possível defraudação dos interesses da Segurança Social), que o mesmo acordo pode ser preventivo do despedimento por extinção do posto de trabalho.
Nestes termos, não há continuação da causa de pedir singular invocada na primeira acção numa causa de pedir plural nesta acção – e voltamos ao acima afirmado, não há por isso violação da unidade do sistema – e não é por isso o mesmo o direito em exercício, não podendo valer nesta acção o aproveitamento da comunicação da intenção de exercício de outro direito, realizada no âmbito da primeira acção. Assim, considerando a data efectiva de cessação da relação laboral e a de citação das Rés neste processo, foi ultrapassado o prazo de prescrição de um ano, tudo como melhor explicado na parte da fundamentação jurídica da sentença recorrida, que acima transcrevemos.
Entendemos pois que improcede o recurso e se deve manter o despacho saneador sentença proferido.
Tendo decaído no recurso é a recorrente responsável pelas custas – artigo 527º nº 1 e 2 do CPC.

IV. Decisão
Nos termos supra expostos acordam negar provimento ao recurso e confirmar o despacho saneador sentença recorrido.
Custas pela recorrente.

Porto, 19.1.2015
Eduardo Petersen Silva
Paula Maria Roberto
Fernanda Soares

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[1] “CONCLUSÃO - 12-06-2014, com a informação a V. Exª que na certidão constante de fls. 11 v.º quanto à contagem do trânsito da sentença levou-se em consideração os tês dias da multa (artigo 145º Código do Processo Civil), a fls. 187 contou-se apenas os vinte dias.
Quanto à data em que a ação foi instaurada a fls. 187 levou-se em consideração a data do carimbo da petição e não a data de entrada neste Tribunal dia 08-11-2012 (cfr. fls. 27 do processo em que foi extraída a certidão)”.
[2] Alterada a data para 18.10.2013, v. infra.
____________
Sumário a que se refere o artigo 663º, nº 7 do CPC:
I. Pretendendo a trabalhadora uma indemnização por não ter conseguido, ao contrário do que lhe foi garantido e a levou a revogar por mútuo acordo o contrato de trabalho, o subsídio de desemprego, e tendo a acção respectiva conduzido à absolvição da instância por ineptidão da petição inicial, não aproveita à trabalhadora, nos termos do artigo 279º nº 2 do CPC, a interrupção da prescrição determinada pela citação ocorrida nessa acção, quando na nova acção intentada aduz a ilicitude de despedimento por extinção do posto de trabalho e reclama os direitos dela derivados.
II. A revogação do contrato de trabalho por mútuo acordo, mesmo quando consigna que o motivo é a extinção do posto de trabalho, não está dependente da instauração do procedimento de extinção do posto de trabalho, e a revogação não é materialmente equiparável a um despedimento, exigindo este a alegação e prova da factualidade reveladora da vontade unilateral do empregador em fazer cessar a relação laboral.

Eduardo Petersen Silva
(Processado e revisto com recurso a meios informáticos (artigo 138º nº 5 do Código de Processo Civil)


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