Proc. Nº 3716/08.0TTLSB.L1-4 TRL 28
de Setembro de 2011
Verifica-se a nulidade da estipulação do termo, por
no contrato e suas renovações não se terem devidamente especificado, de forma a
permitir a sua sindicabilidade, as circunstâncias concretas que determinaram a
contratação a termo, se nos mesmos, se indica, como motivo daquela estipulação,
a necessidade de colmatar as ausências decorrentes de um plano sistemático de
recuperação de folgas, sem que, no texto do contrato, se especifique,
minimamente que seja, as circunstâncias concretas desse plano, designadamente
qual a sua duração previsível, qual o número de trabalhadores envolvidos, um
cálculo, ainda que aproximado e não necessariamente rigoroso, do número de
folgas em questão, e qual a relação da contratação com esse plano de
recuperação e a razão pela qual essa necessidade e recurso ao trabalho do Autor
era previsível que se prolongasse por tal período de 6 meses, ou pelo período
fixado (um ano) nas renovações
Acordam no
Tribunal da Relação de Lisboa:
A veio instaurar, no 2º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa, a presente acção emergente de contrato de trabalho, com processo comum, contra B, SA , pedindo que seja declarada a ilicitude do seu despedimento, e que, em consequência, seja reintegrado ou receba a indemnização em substituição da reintegração, condenando-se ainda a Ré a pagar a quantia de € 575,38 a título de trabalho suplementar, bem como as retribuições vencidas desde o despedimento e juros vencidos e vincendos.
Alegou para o efeito e em síntese, e tal como consta da sentença recorrida:
Foi contratado a termo por 6 meses, contrato que se renovou por um ano e, posteriormente, em nova renovação de mais um ano. Porém, os motivos invocados para justificar a contratação a termo não são verdadeiros ou a Ré não os demonstrou, sendo certo que a contratação do Autor não foi para acorrer a uma necessidade temporária, mas para uma necessidade permanente da Ré. Acresce que o Autor trabalhou em dias de descanso semanal, não tendo gozado descanso compensatório que, por isso, lhe deve ser pago.
A Ré, excepcionando, alegou que o Autor aceitou as compensações que recebeu pela caducidade do contrato, o que implica que reconheceu a caducidade do contrato, pelo que é abusivo o exercício do seu direito de impugnação.
Em qualquer caso defende a validade do contrato, bem como as razões que estiveram na base da sua elaboração e impugna os factos em que o Autor sustenta os seus créditos por trabalho suplementar.
Em reconvenção, caso a acção seja julgada procedente, pretende a devolução da quantia paga aquando da cessação do contrato, acrescida de juros à taxa dos juros legais comerciais, operando-se a compensação, bem como dos valores entretanto recebidos após a cessação do contrato.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença, decidindo da seguinte forma:
“Pelo exposto, conhecendo da acção e da reconvenção:
Declaro a ilicitude do despedimento do A. e, em consequência:
- Condeno a Ré a reintegrá-lo;
- Condeno a Ré a pagar ao A. todas as prestações salariais que se vencerem até à data da efectiva reintegração, como se o A. nunca tivesse sido despedido, deduzindo-se as quantias pagas pela Ré, e as auferidas pelo A. e que não teria auferido se não tivesse sido despedido;
- Condeno a Ré a pagar ao A. os juros legais civis sobre as quantias em dívida, desde o seu vencimento, tendo em conta nos respectivos cálculos o que já foi pago pela Ré, e até integral pagamento;
e absolvo a Ré do demais peticionado.
Custas por A. e R. na proporção do decaimento (artigo 446º do CPC)”.
Inconformada, a Ré interpôs o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:
(…)
O Autor contra-alegou, propugnando pela manutenção do julgado.
Foram colhidos os vistos legais.
A Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de dever ser confirmada a sentença recorrida.
x
Definindo-se o âmbito do recurso pelas suas conclusões, temos, como única questão em discussão, a de saber se se verifica a validade da estipulação do termo aposto no contrato, e suas renovações, celebrado entre as partes.
x
Na 1.ª instância foram dados como provados os seguintes factos, não objecto de impugnação, e que este Tribunal de recurso aceita:
A) O Autor foi contratado pela antecessora da Ré, (…), para lhe prestar trabalho de Assistente de Operações – Nível de Desenvolvimento – 1 A, em 10 de Fevereiro de 2006 - fls. 17.
B) Tendo o respectivo contrato sido celebrado nos termos “do corpo do no 2 do art. 129º, conjugado com o art. 139º, ambos do Código do Trabalho, para colmatar as ausências decorrentes da aplicação de um plano sistemático de recuperação de folgas de trabalhadores afectos à área de produção e emissão no que se refere à categoria de Assistentes de Operações.”
C) O dito contrato teve o seu início em 20 de Fevereiro de 2006 e termo em 19 de Agosto de 2006, isto é, foi celebrado pelo prazo de 6 (seis) meses.
D) Ainda antes de concluído o primeiro contrato em 19 de Agosto de 2006, a antecessora da Ré, em 24 de Julho, acordou com o Autor a renovação do mesmo, desta vez por um ano, até 19 de Agosto de 2007 – fls. 21.
E) Sendo que a título de fundamentação da nova contratação a termo o respectivo contrato rezava “tendo em vista acorrer a necessidades temporárias da empresa, até que esse quadro seja alterado com a integração da C no edifício sede da RTP na D, reduzindo-se, então, o volume de trabalho existente”.
F) Tendo-se, entretanto transmitido para a Ré os direitos e obrigações emergentes dos referidos contratos de trabalho, em 26 de Junho de 2007 Autora e Ré celebraram um acordo de deslocação em que regularam a deslocação do Autor para o Porto e Guimarães a fim de que este, entre 28 de Junho de 2007 e 8 de Julho de 2007, ali procedesse à cobertura da Presidência Portuguesa da União Europeia – fls. 23.
G) Antecipando o termo do contrato, em 31 de Julho de 2007, as partes celebraram um novo acordo de renovação de contrato de trabalho a termo certo, por mais um ano, desta vez até 19 de Agosto de 2008 (cfr. fls. 25),
H) Como fundamentação para esta nova contratação constava “... porque se mantêm os pressupostos de contratação inicial e a necessidade de continuar a assegurar as ausências decorrentes da aplicação de um plano sistemático de recuperação de folgas de trabalhadores afectos à área de produção e emissão no que se refere à categoria de Assistente de Operações, ainda não totalmente colmatadas com a integração das operações da C no edifício sede da RTP na D”.
I) Esta segunda renovação ocorreu após a integração da C no edifício sede da Ré RTP - (cfr. art. 10º da contestação e 16º da PI)
J) A 9 de Julho de 2008 a Ré comunicou ao Autor a caducidade do contrato a termo em vigor, com efeitos em 19 de Agosto de 2008 – fls. 26.
L) A Ré nunca mostrou ao Autor um plano definido, com objectivos concretos e reduzido a escrito, de recuperação de folgas de trabalhadores afectos à área de produção e emissão, nomeadamente no que se refere à categoria de Assistente de Operações.
M) A Ré esperava que a contratação do A. a ajudasse a reduzir as folgas acumuladas dos trabalhadores do quadro.
N) Logo após a saída do Autor a Ré utilizou outros trabalhadores, através de empresas em regime de outsourcing, conhecidas pelos trabalhadores da Ré como sendo a E, Lda ou a F, para desempenhar as funções de assistente de operações que o A. desenvolvia.
O) A Ré celebrou com a empresa “F, Unipessoal, Lda”, a 30.10.2007, o contrato de prestação de serviços de fls. 84-a, que prevê, entre outros, o fornecimento de assistentes às operações, celebrando ainda um aditamento ao contrato (fls. 84-j) a 01.11.2008 para o fornecimento de vários profissionais, mantendo-se os assistentes às operações.
P) A 11.09.2008 a Ré publicitou internamente a necessidade de contratação de um assistente de operações, a que podiam concorrer trabalhadores com contrato de trabalho sem termo, conforme doc. de fls. 42 (doc. n. 6 da PI).
Q) Tendo tal vaga ficado por preencher.
x
O direito:
Na situação em apreço, Autor e Ré celebraram um contrato de trabalho a termo, com início em 10 de Fevereiro de 2006, para valer pelo prazo de 6 meses, tendo sido objecto de duas renovações, cada uma pelo prazo de um ano.
A sentença sob recurso considerou que as razões para a estipulação do termo, vertidas no contrato e suas renovações, são insindicáveis, com a consequente nulidade de estipulação do termo.
E considerou bem.
Como corolário do princípio constitucional da Segurança no Emprego, consagrado no art.º 53º da Constituição, que condiciona o princípio da liberdade contratual no âmbito do direito do trabalho e no que respeita à estabilidade da relação laboral subordinada, a legislação ordinária tem colocado aos empregadores diversos entraves à liberdade de desvinculação, bem como restrições nas admissões que proponham à partida a existência de uma vinculação precária.
Assim, e neste contexto, surgiu toda uma legislação relativa à contratação a termo, que começou com o DL nº 781/76, de 28/10, permitindo o denominado contrato a prazo, substituído, posteriormente, pelo DL nº 64-A/89,de 27/2 (LDesp), que passou a regular de forma mais completa o agora denominado contrato a termo. Este diploma legal sofreu, entretanto, no que respeita à contratação a termo, as alterações introduzidas pela Lei n.º 38/96, de 31/8, que consagrou, no seu artº 3°, a necessidade da concretização factual do motivo justificativo para celebração de um contrato de trabalho a termo, que por sua vez foi alterado pela Lei nº 18/2001, de 3 de Julho.
Na linha desses diplomas, o Código do Trabalho de 2003 (que é o aplicável ao caso dos autos) estabeleceu, igualmente, uma regulamentação do contrato a termo rodeada de diversas exigências, tendentes a proteger interesses dos trabalhadores contra a precariedade da relação laboral e com vista a impedir a sua banalização ou proliferação.
Na verdade, o CT de 2003, na parte relativa à contratação a termo, começa, no seu artº 129°, por tipificar as situações da sua admissibilidade e, no artº 131º, estabelece as exigências de forma, designadamente a exigência da forma escrita, exigindo a assinatura de ambas as partes, bem como a obrigatoriedade de determinadas indicações, entre elas a indicação do seu motivo justificativo, sob pena da invalidade da aposição do termo – nº 4, configurando essa exigência a de uma formalidade ad substantiam ou ad essentiam na formação do contrato. É que a aposição no contrato a termo da sua razão justificativa visa prevenir eventuais e futuras divergências e permitir acção fiscalizadora. Por outro lado, também visa permitir ao trabalhador compreender as razões que levam à precariedade do seu vínculo, dando-lhe a possibilidade de, desde logo, avaliar sobre a sua veracidade e validade.
Como se escreveu no Ac. Rel. do Porto de 3/3/97, Col. Jur. 1997, II, 2, pag. 238, "a obrigatoriedade de indicar a razão justificativa do termo visa prevenir eventuais divergências entre as partes, permitir o exercício da actividade fiscalizadora por parte das entidades responsáveis nessa área. Visa, ainda, permitir que o trabalhador fique esclarecido sobre as razões que determinam a precariedade do seu emprego, dando-lhe a possibilidade de aferir da validade das mesmas e de as discutir em juízo. Para isso importa que no documento escrito que titula o contrato de trabalho a termo sejam explicitadas as razões justificativas do termo, da forma mais concreta possível, de modo que da simples leitura do contrato não restem dúvidas sobre os verdadeiros motivos que levaram a afastar a regra geral da estabilidade do emprego...".
Quer isto dizer que, para a validade de um contrato de trabalho a termo certo, não basta a remissão para os termos da lei para satisfazer a exigência legal da indicação do motivo justificativo, sendo indispensável a indicação concreta da factualidade real que motiva a necessidade de tal contratação.
Todavia, também não é legalmente admissível o contrato a termo em que os motivos indicados não correspondam à realidade.
A admissibilidade do contrato a termo, tal como resulta do artº 129º do CT, é restringida a determinadas situações de excepção, que visem fazer face a causas acidentais, temporais ou ainda para fomento do emprego.
No caso vertente, após se referir que o contrato é celebrado nos termos “do corpo do nº 2 do art. 129º, conjugado com o art. 139º, ambos do Código do Trabalho”, indica-se que o é “para colmatar as ausências decorrentes da aplicação de um plano sistemático de recuperação de folgas de trabalhadores afectos à área de produção e emissão no que se refere à categoria de Assistentes de Operações”.
Nas primeira e segunda renovações, acabou por se estabelecer o mesmo fundamento, embora também interligado com a alegada “integração da C no edifício sede da RTP na D”.
Ora, será que mostra suficientemente concretizada a justificação do recurso da contratação a termo do Autor e satisfeito o mencionado requisito de forma que a lei impõe?
A resposta, tal como se decidiu na sentença, terá de ser negativa.
Embora, numa primeira leitura, se pudesse pensar que o motivo que determinou a contratação a termo se apresenta como sindicável em termos da sua real, objectiva e transitória existência, ao apelar-se à necessidade de colmatar as ausências decorrentes de um plano sistemático de recuperação de folgas, o que é certo é que, no texto do contrato, não se especifica, minimamente que seja, as circunstâncias concretas desse plano, designadamente qual a sua duração previsível, qual o número de trabalhadores envolvidos e um cálculo, ainda que aproximado e não necessariamente rigoroso, do número de folgas em questão. E, sobretudo e decisivamente, qual a relação da contratação com esse plano de recuperação e a razão pela qual essa necessidade e recurso ao trabalho do Autor era previsível que se prolongasse por tal período de 6 meses, ou pelo período fixado nas renovações.
E, como se refere acertadamente na sentença, se havia um “plano sistemático de recuperação de folgas de trabalhadores ... da categoria de Assistentes de Operações” competia à Ré demonstrar que a contratação do A., por seis meses, se enquadrava exactamente nesse plano. E não era difícil: o número de folgas a recuperar era sabido e o número de trabalhadores beneficiários dessas folgas era conhecido, pelo que a Ré, sem dificuldade, poderia colocar no contrato celebrado entre as partes os dados que permitissem sindicar da validade do motivo invocado e do período necessário para a celebração do contrato, nomeadamente, da razão de ser dos 6 meses”.
E, mais à frente:
“Passado um ano e meio da celebração do contrato, a Ré, na segunda renovação, não obstante poder contabilizar o número de folgas a recuperar, o número e a identidade dos “assistentes de operações” beneficiários das folgas, e de poder estimar, ainda que com alguma margem de manobra (decorrente nomeadamente de um ano e meio de aplicação do “plano sistemático de recuperação de folgas”), o tempo necessário para a recuperação concreta das folgas, opta por continuar a refugiar-se numa formulação que, com todo o respeito por opinião diversa, continua a ser vaga e insindicável”.
Pese embora o brilho das alegações da apelante, elas não contrariam minimamente a realidade descrita- a Ré podia e devia ter vertido no contrato e suas renovações os motivos concretos da estipulação do termo, o que estava perfeitamente ao seu alcance, e que permitissem ao Autor - trabalhador ter o indispensável conhecimento desses motivos.
Por outro lado, os argumentos, igualmente trazidos pela apelante, ligados à contratação de empresas externas, em regime de outsourcing, não conseguem desmentir o indesmentível: que, tal como ficou provado, logo após a saída do Autor a Ré utilizou outros trabalhadores, através dessas empresas, para desempenhar as funções de assistente de operações que o Autor desenvolvia, o que inculca, claramente que, pelo menos ao tempo das renovações, a contratação do Autor se deveu a necessidades de carácter permanente.
Não merece, assim, qualquer censura a sentença recorrida, improcedendo, como tal, as conclusões do recurso
x
Decisão:
Nesta conformidade, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelo apelante.
Lisboa, 28 de Setembro de 2011
Ramalho Pinto
José Feteira
Natalino Bolas
A veio instaurar, no 2º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa, a presente acção emergente de contrato de trabalho, com processo comum, contra B, SA , pedindo que seja declarada a ilicitude do seu despedimento, e que, em consequência, seja reintegrado ou receba a indemnização em substituição da reintegração, condenando-se ainda a Ré a pagar a quantia de € 575,38 a título de trabalho suplementar, bem como as retribuições vencidas desde o despedimento e juros vencidos e vincendos.
Alegou para o efeito e em síntese, e tal como consta da sentença recorrida:
Foi contratado a termo por 6 meses, contrato que se renovou por um ano e, posteriormente, em nova renovação de mais um ano. Porém, os motivos invocados para justificar a contratação a termo não são verdadeiros ou a Ré não os demonstrou, sendo certo que a contratação do Autor não foi para acorrer a uma necessidade temporária, mas para uma necessidade permanente da Ré. Acresce que o Autor trabalhou em dias de descanso semanal, não tendo gozado descanso compensatório que, por isso, lhe deve ser pago.
A Ré, excepcionando, alegou que o Autor aceitou as compensações que recebeu pela caducidade do contrato, o que implica que reconheceu a caducidade do contrato, pelo que é abusivo o exercício do seu direito de impugnação.
Em qualquer caso defende a validade do contrato, bem como as razões que estiveram na base da sua elaboração e impugna os factos em que o Autor sustenta os seus créditos por trabalho suplementar.
Em reconvenção, caso a acção seja julgada procedente, pretende a devolução da quantia paga aquando da cessação do contrato, acrescida de juros à taxa dos juros legais comerciais, operando-se a compensação, bem como dos valores entretanto recebidos após a cessação do contrato.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença, decidindo da seguinte forma:
“Pelo exposto, conhecendo da acção e da reconvenção:
Declaro a ilicitude do despedimento do A. e, em consequência:
- Condeno a Ré a reintegrá-lo;
- Condeno a Ré a pagar ao A. todas as prestações salariais que se vencerem até à data da efectiva reintegração, como se o A. nunca tivesse sido despedido, deduzindo-se as quantias pagas pela Ré, e as auferidas pelo A. e que não teria auferido se não tivesse sido despedido;
- Condeno a Ré a pagar ao A. os juros legais civis sobre as quantias em dívida, desde o seu vencimento, tendo em conta nos respectivos cálculos o que já foi pago pela Ré, e até integral pagamento;
e absolvo a Ré do demais peticionado.
Custas por A. e R. na proporção do decaimento (artigo 446º do CPC)”.
Inconformada, a Ré interpôs o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:
(…)
O Autor contra-alegou, propugnando pela manutenção do julgado.
Foram colhidos os vistos legais.
A Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de dever ser confirmada a sentença recorrida.
x
Definindo-se o âmbito do recurso pelas suas conclusões, temos, como única questão em discussão, a de saber se se verifica a validade da estipulação do termo aposto no contrato, e suas renovações, celebrado entre as partes.
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Na 1.ª instância foram dados como provados os seguintes factos, não objecto de impugnação, e que este Tribunal de recurso aceita:
A) O Autor foi contratado pela antecessora da Ré, (…), para lhe prestar trabalho de Assistente de Operações – Nível de Desenvolvimento – 1 A, em 10 de Fevereiro de 2006 - fls. 17.
B) Tendo o respectivo contrato sido celebrado nos termos “do corpo do no 2 do art. 129º, conjugado com o art. 139º, ambos do Código do Trabalho, para colmatar as ausências decorrentes da aplicação de um plano sistemático de recuperação de folgas de trabalhadores afectos à área de produção e emissão no que se refere à categoria de Assistentes de Operações.”
C) O dito contrato teve o seu início em 20 de Fevereiro de 2006 e termo em 19 de Agosto de 2006, isto é, foi celebrado pelo prazo de 6 (seis) meses.
D) Ainda antes de concluído o primeiro contrato em 19 de Agosto de 2006, a antecessora da Ré, em 24 de Julho, acordou com o Autor a renovação do mesmo, desta vez por um ano, até 19 de Agosto de 2007 – fls. 21.
E) Sendo que a título de fundamentação da nova contratação a termo o respectivo contrato rezava “tendo em vista acorrer a necessidades temporárias da empresa, até que esse quadro seja alterado com a integração da C no edifício sede da RTP na D, reduzindo-se, então, o volume de trabalho existente”.
F) Tendo-se, entretanto transmitido para a Ré os direitos e obrigações emergentes dos referidos contratos de trabalho, em 26 de Junho de 2007 Autora e Ré celebraram um acordo de deslocação em que regularam a deslocação do Autor para o Porto e Guimarães a fim de que este, entre 28 de Junho de 2007 e 8 de Julho de 2007, ali procedesse à cobertura da Presidência Portuguesa da União Europeia – fls. 23.
G) Antecipando o termo do contrato, em 31 de Julho de 2007, as partes celebraram um novo acordo de renovação de contrato de trabalho a termo certo, por mais um ano, desta vez até 19 de Agosto de 2008 (cfr. fls. 25),
H) Como fundamentação para esta nova contratação constava “... porque se mantêm os pressupostos de contratação inicial e a necessidade de continuar a assegurar as ausências decorrentes da aplicação de um plano sistemático de recuperação de folgas de trabalhadores afectos à área de produção e emissão no que se refere à categoria de Assistente de Operações, ainda não totalmente colmatadas com a integração das operações da C no edifício sede da RTP na D”.
I) Esta segunda renovação ocorreu após a integração da C no edifício sede da Ré RTP - (cfr. art. 10º da contestação e 16º da PI)
J) A 9 de Julho de 2008 a Ré comunicou ao Autor a caducidade do contrato a termo em vigor, com efeitos em 19 de Agosto de 2008 – fls. 26.
L) A Ré nunca mostrou ao Autor um plano definido, com objectivos concretos e reduzido a escrito, de recuperação de folgas de trabalhadores afectos à área de produção e emissão, nomeadamente no que se refere à categoria de Assistente de Operações.
M) A Ré esperava que a contratação do A. a ajudasse a reduzir as folgas acumuladas dos trabalhadores do quadro.
N) Logo após a saída do Autor a Ré utilizou outros trabalhadores, através de empresas em regime de outsourcing, conhecidas pelos trabalhadores da Ré como sendo a E, Lda ou a F, para desempenhar as funções de assistente de operações que o A. desenvolvia.
O) A Ré celebrou com a empresa “F, Unipessoal, Lda”, a 30.10.2007, o contrato de prestação de serviços de fls. 84-a, que prevê, entre outros, o fornecimento de assistentes às operações, celebrando ainda um aditamento ao contrato (fls. 84-j) a 01.11.2008 para o fornecimento de vários profissionais, mantendo-se os assistentes às operações.
P) A 11.09.2008 a Ré publicitou internamente a necessidade de contratação de um assistente de operações, a que podiam concorrer trabalhadores com contrato de trabalho sem termo, conforme doc. de fls. 42 (doc. n. 6 da PI).
Q) Tendo tal vaga ficado por preencher.
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O direito:
Na situação em apreço, Autor e Ré celebraram um contrato de trabalho a termo, com início em 10 de Fevereiro de 2006, para valer pelo prazo de 6 meses, tendo sido objecto de duas renovações, cada uma pelo prazo de um ano.
A sentença sob recurso considerou que as razões para a estipulação do termo, vertidas no contrato e suas renovações, são insindicáveis, com a consequente nulidade de estipulação do termo.
E considerou bem.
Como corolário do princípio constitucional da Segurança no Emprego, consagrado no art.º 53º da Constituição, que condiciona o princípio da liberdade contratual no âmbito do direito do trabalho e no que respeita à estabilidade da relação laboral subordinada, a legislação ordinária tem colocado aos empregadores diversos entraves à liberdade de desvinculação, bem como restrições nas admissões que proponham à partida a existência de uma vinculação precária.
Assim, e neste contexto, surgiu toda uma legislação relativa à contratação a termo, que começou com o DL nº 781/76, de 28/10, permitindo o denominado contrato a prazo, substituído, posteriormente, pelo DL nº 64-A/89,de 27/2 (LDesp), que passou a regular de forma mais completa o agora denominado contrato a termo. Este diploma legal sofreu, entretanto, no que respeita à contratação a termo, as alterações introduzidas pela Lei n.º 38/96, de 31/8, que consagrou, no seu artº 3°, a necessidade da concretização factual do motivo justificativo para celebração de um contrato de trabalho a termo, que por sua vez foi alterado pela Lei nº 18/2001, de 3 de Julho.
Na linha desses diplomas, o Código do Trabalho de 2003 (que é o aplicável ao caso dos autos) estabeleceu, igualmente, uma regulamentação do contrato a termo rodeada de diversas exigências, tendentes a proteger interesses dos trabalhadores contra a precariedade da relação laboral e com vista a impedir a sua banalização ou proliferação.
Na verdade, o CT de 2003, na parte relativa à contratação a termo, começa, no seu artº 129°, por tipificar as situações da sua admissibilidade e, no artº 131º, estabelece as exigências de forma, designadamente a exigência da forma escrita, exigindo a assinatura de ambas as partes, bem como a obrigatoriedade de determinadas indicações, entre elas a indicação do seu motivo justificativo, sob pena da invalidade da aposição do termo – nº 4, configurando essa exigência a de uma formalidade ad substantiam ou ad essentiam na formação do contrato. É que a aposição no contrato a termo da sua razão justificativa visa prevenir eventuais e futuras divergências e permitir acção fiscalizadora. Por outro lado, também visa permitir ao trabalhador compreender as razões que levam à precariedade do seu vínculo, dando-lhe a possibilidade de, desde logo, avaliar sobre a sua veracidade e validade.
Como se escreveu no Ac. Rel. do Porto de 3/3/97, Col. Jur. 1997, II, 2, pag. 238, "a obrigatoriedade de indicar a razão justificativa do termo visa prevenir eventuais divergências entre as partes, permitir o exercício da actividade fiscalizadora por parte das entidades responsáveis nessa área. Visa, ainda, permitir que o trabalhador fique esclarecido sobre as razões que determinam a precariedade do seu emprego, dando-lhe a possibilidade de aferir da validade das mesmas e de as discutir em juízo. Para isso importa que no documento escrito que titula o contrato de trabalho a termo sejam explicitadas as razões justificativas do termo, da forma mais concreta possível, de modo que da simples leitura do contrato não restem dúvidas sobre os verdadeiros motivos que levaram a afastar a regra geral da estabilidade do emprego...".
Quer isto dizer que, para a validade de um contrato de trabalho a termo certo, não basta a remissão para os termos da lei para satisfazer a exigência legal da indicação do motivo justificativo, sendo indispensável a indicação concreta da factualidade real que motiva a necessidade de tal contratação.
Todavia, também não é legalmente admissível o contrato a termo em que os motivos indicados não correspondam à realidade.
A admissibilidade do contrato a termo, tal como resulta do artº 129º do CT, é restringida a determinadas situações de excepção, que visem fazer face a causas acidentais, temporais ou ainda para fomento do emprego.
No caso vertente, após se referir que o contrato é celebrado nos termos “do corpo do nº 2 do art. 129º, conjugado com o art. 139º, ambos do Código do Trabalho”, indica-se que o é “para colmatar as ausências decorrentes da aplicação de um plano sistemático de recuperação de folgas de trabalhadores afectos à área de produção e emissão no que se refere à categoria de Assistentes de Operações”.
Nas primeira e segunda renovações, acabou por se estabelecer o mesmo fundamento, embora também interligado com a alegada “integração da C no edifício sede da RTP na D”.
Ora, será que mostra suficientemente concretizada a justificação do recurso da contratação a termo do Autor e satisfeito o mencionado requisito de forma que a lei impõe?
A resposta, tal como se decidiu na sentença, terá de ser negativa.
Embora, numa primeira leitura, se pudesse pensar que o motivo que determinou a contratação a termo se apresenta como sindicável em termos da sua real, objectiva e transitória existência, ao apelar-se à necessidade de colmatar as ausências decorrentes de um plano sistemático de recuperação de folgas, o que é certo é que, no texto do contrato, não se especifica, minimamente que seja, as circunstâncias concretas desse plano, designadamente qual a sua duração previsível, qual o número de trabalhadores envolvidos e um cálculo, ainda que aproximado e não necessariamente rigoroso, do número de folgas em questão. E, sobretudo e decisivamente, qual a relação da contratação com esse plano de recuperação e a razão pela qual essa necessidade e recurso ao trabalho do Autor era previsível que se prolongasse por tal período de 6 meses, ou pelo período fixado nas renovações.
E, como se refere acertadamente na sentença, se havia um “plano sistemático de recuperação de folgas de trabalhadores ... da categoria de Assistentes de Operações” competia à Ré demonstrar que a contratação do A., por seis meses, se enquadrava exactamente nesse plano. E não era difícil: o número de folgas a recuperar era sabido e o número de trabalhadores beneficiários dessas folgas era conhecido, pelo que a Ré, sem dificuldade, poderia colocar no contrato celebrado entre as partes os dados que permitissem sindicar da validade do motivo invocado e do período necessário para a celebração do contrato, nomeadamente, da razão de ser dos 6 meses”.
E, mais à frente:
“Passado um ano e meio da celebração do contrato, a Ré, na segunda renovação, não obstante poder contabilizar o número de folgas a recuperar, o número e a identidade dos “assistentes de operações” beneficiários das folgas, e de poder estimar, ainda que com alguma margem de manobra (decorrente nomeadamente de um ano e meio de aplicação do “plano sistemático de recuperação de folgas”), o tempo necessário para a recuperação concreta das folgas, opta por continuar a refugiar-se numa formulação que, com todo o respeito por opinião diversa, continua a ser vaga e insindicável”.
Pese embora o brilho das alegações da apelante, elas não contrariam minimamente a realidade descrita- a Ré podia e devia ter vertido no contrato e suas renovações os motivos concretos da estipulação do termo, o que estava perfeitamente ao seu alcance, e que permitissem ao Autor - trabalhador ter o indispensável conhecimento desses motivos.
Por outro lado, os argumentos, igualmente trazidos pela apelante, ligados à contratação de empresas externas, em regime de outsourcing, não conseguem desmentir o indesmentível: que, tal como ficou provado, logo após a saída do Autor a Ré utilizou outros trabalhadores, através dessas empresas, para desempenhar as funções de assistente de operações que o Autor desenvolvia, o que inculca, claramente que, pelo menos ao tempo das renovações, a contratação do Autor se deveu a necessidades de carácter permanente.
Não merece, assim, qualquer censura a sentença recorrida, improcedendo, como tal, as conclusões do recurso
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Decisão:
Nesta conformidade, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelo apelante.
Lisboa, 28 de Setembro de 2011
Ramalho Pinto
José Feteira
Natalino Bolas
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